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Variação de Gasto Social

MORTALIDADE INFANTIL

A mortalidade ocupa lugar especial no inventário demográfico das transformações socioeconômicas. [...], a mortalidade relaciona-se direta e obviamente com o bem-estar humano, mostrando-se como indicador relativamente sensível do nível e da distribuição das condições de vida. (TOMÉ, 1999, p.30).

Até o final da década de 1970, a análise da mortalidade infantil estava associada a problemas de desenvolvimento socioeconômicos, tais como o perfil de renda, educação, saneamento básico e acesso a programas e serviços de saúde. A partir da identificação de fatores sociais relacionados à saúde, permitiu-se a construção do coeficiente de mortalidade infantil (CMI), utilizado como um indicador das condições de vida da população, refletindo o estado de saúde de sua parcela mais vulnerável. O coeficiente é obtido pelo cálculo do número de óbitos de crianças menores de 1 ano para cada mil nascidos vivos, em uma determinada área geográfica e período. Assim, considera-se a estimativa do risco de um nascido vivo morrer durante seu primeiro ano de vida. Os valores altos (acima de 50%) refletem níveis precários de saúde, condições de vida e de desenvolvimento socioeconômico (DUARTE, 2007, p. 1511).

Também são levados em conta outros fatores de riscos associados à mortalidade infantil, divididos em três grupos: fatores biológicos (idade materna, paridade, estatura e peso antes da gravidez, ganho de peso durante a gestação, doenças maternas, intervalo entre o nascimento e perdas perinatais, peso ao nascer, duração da gestação), fatores sociais (instrução da mãe, ocupação dos pais, renda e hábitos familiares, condições de moradia) e fatores relacionados à assistência médica (disponibilidade de recursos, acessibilidade, aceitabilidade e resolubilidade do serviço de saúde).

O nível de mortalidade resulta da interação de três conjuntos de fatores que afetam o bem-estar da população: serviços públicos de saúde, que influenciam a mortalidade independente de decisões individuais; serviços que podem levar à melhoria do nível de saúde, como, por exemplo, a disponibilidade da água potável; e, por fim, uma série de características diretamente ligadas ao indivíduo, tais como a renda, a qual afeta a saúde através da nutrição, a moradia e a educação, associadas à rapidez e eficiência com as quais os indivíduos respondem aos serviços de saúde e às ameaças ambientais [...].

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Uma vez que o nível de mortalidade é determinado pelo efeito combinado de todos esses fatores, a taxa de mortalidade constitui medida sumária da qualidade de vida que prevalece em meio a uma população [...]. (TOMÉ, 1999, p.30).

Dessa maneira, o coeficiente de mortalidade infantil pode ser considerado um indicador de saúde que, além de informar a respeito dos níveis de saúde de uma população, sintetiza as condições de bem-estar social, político e ético de uma dada conformação social. Além de indicar a probabilidade de sobrevivência no primeiro ano de vida, reflete as condições de vida e o grau de compromisso de determinada sociedade com a sua reprodução social, ou seja, em que medida a sociedade protege a sua renovação geracional (TOMÉ, 1999).

Nesse ponto, é importante ressaltar que existe uma diferenciação entre a mortalidade infantil e a mortalidade na infância, assim definida:

A taxa de mortalidade na infância expressa o número de óbitos de menores de cinco anos em cada mil nascidos vivos – NV e estima o risco de morte dos nascidos vivos durante os cinco primeiros anos de vida. Da mesma forma, a taxa de mortalidade infantil – TMI expressa à frequência de óbitos de menores de um ano de idade em cada mil NV, estimando o risco de morte dos nascidos vivos durante seu primeiro ano de vida. (ESCALANTE e MORAES NETO, 2009, p.180).

Quanto aos dados sobre mortalidade na infância (taxa de mortalidade de crianças de até 5 anos de idade), em relatório publicado pela UNICEF (2012) realizado em parceria com o Grupo Interinstitucional de Estimativas sobre Mortalidade Infantil das Nações Unidas (composto por membros da Organização Mundial da Saúde (OMS), da Divisão de População do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU e do Banco Mundial), demostram que entre os anos de 1990 e 2011, o número de crianças menores de cinco anos que morreram em todo o mundo caiu do patamar de quase 12 milhões para 6,9 milhões. O Brasil aparece como o quarto país em redução da taxa de mortalidade na infância entre os anos de 1999 e 2011. Reproduzimos o gráfico publicado para compreendermos melhor a importância dada pelas agências internacionais à redução na taxa de mortalidade:

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Figura 5 – Gráfico de redução da taxa de mortalidade infantil

Fonte: UNICEF (2012, p. 11)

No mesmo relatório (UNICEF, 2012, p.13), o Brasil ocupa a posição 107 no ranking mundial de mortalidade na infância, ainda que tenha reduzido em 77% a taxa nacional, ocupando a 16ª posição no ranking dos países americanos.

Ampliando um pouco nosso leque de análise, em estudo realizado por Magalhães Jr, Jaime e Lima (2013)243, analisando as taxas de mortalidade infantil nacionais em crianças menores de 5 anos, no período de 2004 a 2009, partindo das causas associadas à pobreza (desnutrição, diarreia e infecções respiratórias) e ao atendimento de saúde básica (vacinação, assistência pré-natal e internações hospitalares), os autores identificaram que em municípios com alta cobertura do Bolsa Família houve uma redução de 17% da mortalidade infantil, sendo ainda mais significativa a redução quando tomadas as causas em separado, como as associadas à desnutrição (65%) e a diarreia (53%).

243 O estudo é apresentado por MAGALHÃES JR, JAIME e LIMA (2013) como parte dos indicadores dos

resultados do programa Bolsa família: Effect of a conditional cash transfer programme on childhood

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Assim, com o intuito de compreendermos melhor as condições de vida da população brasileira244, coletamos dados sobre as condições domiciliares do PNAD dos anos de

implantação do Programa Bolsa Família. Cabe considerar que tais dados tomam a população nacional como um todo. Nosso objetivo é compreender como a melhoria dos serviços básicos no Brasil pode ter resultado em melhorias de fatores de salubridade e de dignidade humana quando associadas às políticas de combate e/ou erradicação da pobreza. Assim, montamos o seguinte quadro:

Água Esgoto Coleta de

Lixo Luz Elétrica

Média de Moradores 2003 82,5% 69,0% 85,6% 97,0% 3,5 2004 82,2% 68,9% 84,8% 96,8% 3,5 2005 82,3% 69,6% 85,8% 97,2% 3,5 2006 83,2% 68,6% 86,6% 97,7% 3,4 2007 83,3% 73,6% 87,5% 98,2% 3,4 2008 83,9% 72,9% 87,9% 98,6% 3,3 2009 84,4% 92,9% 88,6% 98,9% 3,3 2010* 82,8% 91,5% 87,4% 98,7% 3,3 2011 84,6% 93,8% 88,8% 99,3% 3,2 2012 84,3% 97,3% 88,7% 99,5%

Quadro 13 – Indicadores de Serviços Básicos Domiciliares

Fonte: Elaboração da autora245.

*Dados do CENSO/IBGE 2010.

Os dados obtidos apresentam crescimento em todos os elementos, apontando para melhorias nas condições habitacionais da população brasileira246: o percentual de domicílios com água encanada apresentou um crescimento de mais de 2%; o percentual de domicílios com canalização de esgoto obteve crescimento de mais de 40%; os domicílios com coleta de lixo obtiveram um crescimento percentual de mais de 3%; o percentual de oferta de energia elétrica cresceu cerca de 2,5% nos domicílios; apresentando na média de moradores uma redução de 10%247 no período248.

244 Importante ressaltar que para efeito de nossa pesquisa trabalharemos com os dados nacionais,

compreendendo que por isso as imensas disparidades regionais e locais não serão consideradas.

245 Fonte de dados PNAD/IBGE dos anos em estudo, exceto para o ano de 2010 com dados do CENSO/IBGE

2010.

246 Cabe aqui destacar a criação do Plano Nacional de Saneamento Básico (regulamentado pela Lei 11.445 de

05/01/2007) atendendo a um conjunto de serviços, infraestruturas e instalações de abastecimento de água, esgotamento sanitário, limpeza urbana e manejo de resíduos sólidos e drenagem de águas pluviais urbanas.

247 Considerando os dados disponíveis, de 2003 a 2011, no ano de 2012 ocorreu uma mudança de

metodologia, o dado referente a média de moradores por domicílio não foi considerado.

248 “As condições de vida também sofreram mudanças substanciais. Em 1970, apenas 33% dos domicílios

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Desde 1952, a Organização das Nações Unidas (ONU) trabalha objetivando criar métodos satisfatórios para definir e avaliar o nível de vida de uma população. A ideia é de utilizar um único índice que traduza o nível de vida de uma população, a partir de uma abordagem pluralista, levando em consideração os vários componentes passíveis de quantificação, tais como: saúde, incluindo condições demográficas; alimentos e nutrição; educação, incluindo alfabetização e ensino técnico; condições de trabalho; situação em matéria de emprego; consumo e economia gerais; transporte; moradia, com inclusão de saneamento e instalações domésticas; vestuário; recreação; segurança social e liberdade humana. Assim, em 2000 a ONU estabeleceu os 8 Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) a fim de melhorar as condições de vida população. O ODM de número 4 trata de reduzir a mortalidade infantil, com a meta a ser atingida até 2015 de 17,9 óbitos por mil NV.

Segundo Duarte (2007), nos anos entre 1990 e 2000, a estimativa nacional sobre a mortalidade infantil apresentou uma queda de 31%, atribuída à implementação do Programa Saúde da Família249 (1994) e às alterações no sistema de financiamento da saúde pública decorrentes da Norma Operacional Básica (NOB-96250). Já no período de 1990 a 2012, a queda no índice de mortalidade infantil brasileiro chegou a 77%, segundo dados do IBGE (DUARTE, 2007, pp.1512-1513).

Segundo o IBGE, somente entre os anos de 1990 e 2008 a redução da taxa de mortalidade infantil brasileira foi de 47%, tal como apresentada pela ONU:

93% dos domicílios dispunham de água encanada, 60% tinham acesso a serviço de esgoto e a maioria, à eletricidade. [...]

Tais mudanças nas condições de vida afetaram a saúde e o comportamento de saúde dos brasileiros. A prevalência de sobrepeso e de obesidade está aumentando; 47,3% dos homens que vivem nas capitais brasileiras estão acima do peso 13,14. Cerca de um terço das famílias afirma não dispor de comida suficiente para se alimentar. Embora apenas 19% dos adultos, nas capitais, declarem comer uma quantidade suficiente de frutas e legumes (isto é, ao menos cinco porções de frutas ou suco de frutas e legumes por dia, cinco dias por semana ou mais), a qualidade da dieta da população parece estar melhorando com o tempo. A prática de atividade física é baixa nas capitais, mas o tabagismo diminuiu em virtude do Programa Nacional de Controle do Tabaco; em 2008, 17,2% da população fumava, em comparação com 34,5% em 1989, quando o programa teve início. O abuso do álcool é outro desafio; 17,6% das pessoas com 15 anos de idade ou mais afirmam passar por episódios de ingestão excessiva de bebida alcoólica.” (PAIM et all, 2011, p. 12).

249 Criado pelo Ministério da Saúde em 1994, visando reorganizar a prática de atenção a saúde básica, levando

os serviços de saúde para perto das famílias, melhorando suas condições de vida.

250 Mantendo a transferência da União para estados e municípios, alterou os parâmetros regulares de

transferências fundados na população e na oferta de serviços. Estabeleceu regras de risco epidemiológico, financiando programas de saúde familiar e de agentes comunitários de saúde.

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BRASIL: A mortalidade de crianças com menos de um ano foi de 47,1 óbitos por mil nascimentos, em 1990, para 19 em 2008. Até 2015, a meta é reduzir esse número para 17,9 óbitos por mil. A expectativa é de que esse objetivo seja cumprido ainda antes do prazo, mas a desigualdade ainda é grande: crianças pobres têm mais do que o dobro de chance de morrer do que as ricas, e as nascidas de mães negras e indígenas têm maior taxa de mortalidade. Por região, o Nordeste apresentou a maior queda nas mortes de zero a cinco anos. (ONU, 2014)251.

Se tomarmos por base os dados do Censo Demográfico, também publicados pelo IBGE, ampliando a série histórica (desde a década de 1930), podemos observar que a forte tendência de redução da taxa de mortalidade infantil brasileira inicia-se na década de 1970, apresentando resultados mais importantes a partir da década de 1980, tal como tabulamos abaixo:

Ano Taxa de mortalidade infantil

1930 162,4 1940 150,0 1950 135,5 1960 116,0 1970 115,0 1980 82,8 1990 48,3 2000 29,7* 2010 15,6*

Quadro 14 - Taxa de mortalidade infantil Brasil de 1930 a 2010

Fonte: Elaboração da autora252.

*Censo Demográfico 2010.

Utilizando os resultados calculados pelo IBGE, temos uma linha temporal de redução dos índices de mortalidade infantil nacional; em 1930, o percentual era de pouco mais de 162; na década de 1960 o índice cai para 116; chegando aos anos de 1990 a 48,3; e, em 2010 a pouco mais de 15. A crescente queda observada a partir da década de 1970 é atribuída às políticas públicas adotadas no campo da medicina preventiva, saneamento básico, ampliação de programas de saúde materno-infantil, ampliação de oferta de serviços médico-hospitalares, campanhas de vacinação, programas de aleitamento materno e de reidratação oral; associadas a mudanças nos padrões reprodutivos nacionais, com queda nos níveis de fecundidade, especialmente a partir dos anos de 1980 (IBGE, 1999, p.21).

Em outra série histórica que podemos elaborar a partir dos dados publicados pelo IBGE, compreendendo as últimas décadas (do ano 2000 a atualidade), tal como tabulados

251 Disponível em: < http://www.objetivosdomilenio.org.br/mortalidade/>. Acesso em 29 jun 2014. 252 Dados do IBGE (1999) e dados do Censo Demográfico 2010.

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abaixo, podemos novamente observar uma constante redução na taxa de mortalidade infantil:

Ano Taxa de Mortalidade Infantil por mil nascidos

vivos 2000 30,10 2001 29,20 2002 28,40 2003 27,50 2004 26,60 2005 25,80 2006 25,00 2007 24,10 2008 23,30 2009 22,50 2010 21,60 2011 21,00 2012 20,30 2013 19,60

Quadro 15 – Evolução da taxa de mortalidade infantil no Brasil de 2000 a 2013

Fonte: Elaboração da autora253.

Outra forma de verificarmos a tendência de redução da mortalidade infantil brasileira pode ser feita a partir dos dados apresentados pelo Sistema Único de Saúde (SUS), no portal DataSus, no qual estão tabulados os números de óbitos infantis (menores de 1 ano) por 1.000 nascidos vivos, tendo como fontes o MS/SVS (Sistema de Informações sobre Nascidos Vivos – SINASC e o MS/SVS - Sistema de Informações sobre Mortalidade – SIM):

Ano Taxa de óbitos infantis

2000 26,1 2001 24,9 2002 23,4 2003 22,5 2004 21,5 2005 20,4 2006 19,6 2007 18,6 2008 17,7 2009 16,8 2010 16,0 2011 15,3

Quadro 16 - Taxa de óbitos infantis (menores de 1 ano) para cada 1.000 nascidos vivos

Fonte: Elaboração da autora254.

253 Dados disponíveis em: < http://brasilemsintese.ibge.gov.br/populacao/taxas-de-mortalidade-infantil>.

Acesso em 30 de jun 2014.

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Ainda que possamos identificar algumas divergências nos dados apresentados, quando tomamos as duas últimas tabelas (com dados do IBGE e do SUS), podemos observar uma constante de decréscimo entre os valores apresentados; em outras palavras, ainda que os valores se diferenciem, podemos confirmar uma tendência constante na diminuição da taxa de mortalidade infantil brasileira a partir dos anos 2000, como demonstramos no gráfico abaixo:

Gráfico 6 – Comparação entre a taxa de mortalidade infantil e o número de óbitos infantis

Fonte: Elaboração da autora.

Na tentativa de identificar entre os beneficiários do Programa Bolsa Família a taxa de mortalidade infantil, criamos a tabela abaixo, buscando alguma correlação entre o número de beneficiários do Programa e a redução da taxa de mortalidade infantil nacional:

Famílias beneficiárias do Bolsa Família1 Percentual Taxa de Mortalidade Infantil

para cada mil nascidos vivos2 Percentual 2004 6.571.839 26,60 2005 8.700.445 32,38 25,80 -0,96 2006 10.965.810 26,03 25,00 -0,96 2007 11.043.076 0,70 24,10 -0,96 2008 10.557.996 -0,95 23,30 -0,96 2009 12.370.915 17,17 22,50 -0,96 2010 12.778.220 3,29 21,60 -0,96 2011 13.352.306 4,49 21,00 -0,97 2012 13.902.155 4,11 20,30 -0,96 2013 14.086.199 1,32 19,60 -0,96 2014 14.145.274 0,41 0 5 10 15 20 25 30 35 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 Series1 Series2

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Quadro 17 – Tabela de total de famílias beneficiárias e taxa de mortalidade

Fonte: Elaboração da autora.

1 Dado coletados no DataSocial/MDS255 2 Dados coletados IBGE256

O quadro nos permite identificar que no período de implantação do Bolsa Família ocorreu um aumento de 115,24% no número de beneficiários (até o ano de 2014), enquanto a taxa de mortalidade infantil apresentou uma redução em torno de 35% (até o ano de 2013). Ainda que não possamos identificar correlação entre os beneficiários do Programa Bolsa Família e a redução da taxa de mortalidade infantil brasileira, podemos aprofundar um pouco sobre as variáveis que estão relacionadas à redução da taxa de mortalidade infantil que fazem parte do leque de atendimento do Programa, tais como a redução das taxas de desnutrição infantil e de mortalidade materna.