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SOCIOPOLÍTICAS E EDUCATIVAS

II. 2.2.2.2 A aposta na educação e ensino – entre os ganhos alcançados e necessidade da sua consolidação, e os constrangimentos

III.1 Condições socioeconómicas e percursos escolares

III.1.2 Níveis e tipos de ensino frequentados

Nos seus percursos escolares, os alunos podem frequentar os vários níveis de ensino previstos pelo sistema de educação e ensino, desde o Ensino Pré-Escolar até ao Ensino Superior, passando pelo Ensino de Base (ou Primário) e Ensino Médio/PUNIV (ou Secundário Técnico-Profissional/Geral).263

O Ensino Pré-Escolar é, de uma forma geral, pouco frequentado pelas crianças angolanas. A grande maioria das crianças entra directamente para o Ensino de Base/Ensino Geral, na 1ª classe. Na origem desta frequência pouco significativa do Ensino Pré-Escolar encontram-se diversas razões, destacando-se os factores socioculturais e os relativos ao mercado de oferta educativa. Com efeito, o ambiente sociocultural em que vive a grande maioria das crianças em idades previstas para frequentar o Ensino Pré-Escolar contempla, regra geral, não a frequência de instituições formais de ensino escolar, mas sim as práticas educativas vivenciadas junto de familiares e vizinhos, na comunidade (vizinhança, bairro, aldeia), entre crianças da mesma idade, mais novas e mais velhas, e pessoas adultas.264 Por outro lado, o Ensino Pré-Escolar em Angola é um nível de ensino que nunca chegou a ser implementado de forma generalizada, sobretudo fora da capital;265 outrossim, as debilidades económicas e financeiras da grande generalidade das famílias angolanas não favorecem as possibilidades de comparticipação no pagamento dos custos inerentes à frequência desse nível de ensino, que tem lugar, sobretudo, fora das instituições públicas. Assim, as poucas crianças que frequentam o Ensino Pré-Escolar fazem-no porque têm mais oportunidades educativas que as outras, traduzidas no melhor acesso (oferta) a esses

263 Sobre as estruturas dos sistemas de ensino e as respectivas terminologias utilizadas, cf. supra

Organigramas dos sistemas de educação de 1977 (Decreto-lei 40/80, de 14 de Maio) e de 2001 (Lei nº 13/01, de 31 de Dezembro) (figura II.2.14).

264 As famílias (pessoas adultas) não deixam, por conseguinte, de educar ou socializar os filhos (jovens e

crianças) levando em consideração os modelos socioculturais que vivenciaram e vivenciam. E no confronto entre saberes, práticas sociais tradicionais (saberes populares) e normas familiares, por um lado, e saberes e comportamentos apreendidos na escola, por outro, os primeiros tendem a ter maior força. Sobre a coexistência de dois tipos/modelos de estruturação familiares na sociedade angolana - famílias tradicionais (que preservam hábitos e costumes tradicionais) e famílias urbanas (que conservam padrões culturais ocidentais) -, cf. Sousa Silva e Prata (2002); sobre a maior importância das normas e regras familiares do que as escolares no espaço social angolano, cf. Madeira (1999) e Silva (2011a); e, finalmente, sobre uma análise das tendências urbanas ou diferentes graus de integração e adopção da urbanidade em Luanda, destacando, entre outras variáveis, o nível de escolaridade ou a integração da Língua portuguesa, como língua veicular, cf. Rodrigues (2003).

265 A escassez de creches e jardins-de-infância ou a sua não existência em locais próximos das residências das

famílias, associadas à situação de conflito armado, estão na origem do fraco desenvolvimento do Ensino Pré-escolar, que contribui, por sua vez, para uma entrada tardia das crianças no sistema de ensino, aos seis, sete ou mais anos de idade (Nguluve, 2006).

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serviços, sobretudo na capital, e na posse de condições económico-financeiras e de «capital social e cultural» que favorecem a procura e frequência deste tipo de ensino.266

Ao nível do Ensino de Base (ou Primário), os alunos frequentam as oito/seis primeiras classes.267 Ao nível do Ensino Médio/PUNIV (ou Secundário Técnico-Profissional/Geral), os jovens podem optar por frequentar entre Ensino Médio Técnico, Ensino Médio Normal e Ensino PUNIV (ou Formação Profissional Básica, Formação Média Técnica, Formação Média Normal e Ensino Geral). Uma maior «preferência» dos alunos (e suas famílias) pela via do Ensino/Formação Técnico fica a dever-se, entre outros, às oportunidades educativas existentes, traduzidas em ofertas de vagas no sistema de ensino, e aos propósitos, natureza e organização das referidas vias de formação. Além de dispor de uma maior oferta em termos de vagas do que as vias do Ensino PUNIV/Formação Geral, as vias do Ensino Médio Técnico apresentam mais alternativas formativas e profissionais aos alunos (e famílias). O Ensino PUNIV (subdividido em duas grandes áreas de conhecimentos - Ciências Sociais e Ciências Exactas) ou o Ensino Geral (organizado em quatro áreas de conhecimento - Área de Ciências Físicas e Biológicas, Área de Ciências Económico-Jurídicas, Área de Ciências Sociais e Área de Artes Visuais) consiste em ciclos longos de estudos que preconizam a preparação dos alunos para a prossecução de estudos ao nível do Ensino superior,268 e não tanto para a aquisição de competências para a inserção no mercado de trabalho. A via do Ensino Técnico, pelo contrário, diz respeito a ciclos curtos de estudos que preconizam a preparação dos alunos para a entrada imediata no mercado de trabalho - permitindo-lhes adquirir competências específicas em determinadas áreas profissionais (por exemplo, Topografia, Jornalismo, Contabilidade, Saúde, Petróleo, Informática, Educação/Formação de Professor) -, sem descurar a possibilidade de continuidade de estudos ao nível do Ensino Superior. Como análises ulteriores demonstrarão, nas suas escolhas escolares, os

266 Os pais e encarregados de educação dos dois alunos entrevistados - Teotónio e Suzete (ambos estudantes

universitários) - que tiveram a oportunidade de frequentar o Ensino Pré-Escolar são detentores de formação escolar de nível Médio e/ou Superior e assumem-se, profissionalmente, como «Técnicos Médios» e «Quadros Superiores»: «[…] ele [pai] era comandante geral da polícia. Tinha curso superior, psicologia […] [a mãe] é directora de gabinete, exerce secretariado profissional. Está a formar-se em sociologia também» [Suzete]; «a minha mãe é engenheira química e o meu pai é biólogo» [Teotónio]. Note-se que os nomes dos entrevistados que surgem no corpo do texto e nos quadros (Anexo I) são fictícios, uma estratégia que visa garantir o anonimato dos mesmos e, simultaneamente, obedecer aos pedidos expressos de alguns deles. Por uma questão de consistência, manteve-se estratégia semelhante em relação a todos os entrevistados, mesmo nos casos em que não houve solicitação explícita ou insistente da observação do anonimato. Em todo o caso, os testemunhos apresentados no texto são acompanhados das necessárias e suficientes informações de contextualização.

267 Utilizando simultaneamente as terminologias adoptadas nas duas estruturas dos sistemas de ensino de

1977 e de 2001. Sobre esses dois sistemas de ensino, cf. supra, cap. II.2.

268 A necessidade de uma mais forte consistência entre as diversas áreas de conhecimento das formações de

nível não superior e a natureza dos cursos superiores que dão acesso é assumida no sistema de educação e ensino de 2001 implementado a partir de 2004; cf. supra cap. II.2.

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alunos (e suas famílias) tendem a levar em consideração as oportunidades proporcionadas por essas distintas vias de ensino e as suas reais possibilidades de continuidade de estudos/entrada no mundo de trabalho, numa estratégia de tomada de decisões que satisfaça da melhor forma possível os seus desejos e interesses.269 Mais de metade dos alunos entrevistados que realizam a sua formação ao nível do Ensino Médio estudam nos Institutos Médios Técnicos, sejam Institutos Médios Técnicos Profissionais, sejam Institutos Médios Técnicos Normais, constituindo uma minoria os alunos que estudam nos Centros PUNIV.270

O Ensino Superior não é, ainda, acessível a um grande número de alunos angolanos. Muitos dos que gostariam de realizar a sua formação neste nível de ensino não a podem concretizar, nomeadamente porque não conseguem vagas no sistema de ensino público, não dispõem de condições económico-financeiras que lhes permitem suportar as despesas com o ensino num Instituto/Universidade privado ou não conseguem obter apoios, como bolsas de estudo, das mais diversas instituições. Nota-se, no entanto, que o número de alunos angolanos que frequenta o Ensino Superior tem vindo a aumentar ao longo dos anos; um elevado número de alunos que se encontram a estudar no Ensino Médio Técnico/PUNIV e Ensino Secundário tenciona prosseguir os seus estudos no Ensino Superior, seja na Universidade pública, seja na Universidade privada; e muitos que estão a frequentar cursos de licenciatura manifestam desejo de prosseguir formação pós-graduada, tanto ao nível do mestrado como do doutoramento.271

Os alunos frequentam esses níveis de ensino em vários tipos de ensino, nomeadamente os ensinos público e privado, e o ensino promovido pelas confissões religiosas, mormente as cristãs (Igrejas Católica e Protestantes).

Na origem da procura e frequência dos diferentes tipos de ensino estão razões diversas, associadas, entre outras, à realidade socioeducativa do país e às condições

269 O Ensino PUNIV (no sistema de ensino de 1977) e o Ensino Geral (no sistema de ensino de 2001)

emergem enquanto tipos de ensino de estudos longos, orientados para o prosseguimento de estudos ao nível do Ensino Superior, enquanto o Ensino Médio Técnico e Médio Normal (no sistema de ensino de 1977) e Ensino Secundário, integrando Formação Profissional Básica, Formação Média Normal e Formação Média Técnica (no sistema de ensino de 2001) surgem, simultaneamente, como tipos de ensino de estudos curtos e longos, orientados para a entrada no mercado de trabalho e/ou continuidade de estudos. Este dualismo do ensino, que potencia as alternativas formativas (profissionais), favorece as representações sociais positivas dos alunos relativamente a estes últimos tipos de ensino, confirmando resultados de estudos de outras realidades sociais (Menandro e Sousa, 2010; Lima e Machado, 2012).

270 As informações produzidas através do inquérito por questionário corroboram essas preferências dos

alunos. A maioria dos alunos frequenta o Ensino Médio Técnico, 50,0% no Ensino Médio Técnico Normal e 6,0% no Ensino Médio Técnico; frequentam o Ensino PUNIV 41% de alunos, 26,1% na Área de Ciências Sociais e 14,9% na Área de Ciências Exactas; apenas 3,0% de alunos frequentam o Ensino de Base (quadro III.1.47).

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socioeconómicas dos alunos e suas famílias. Atente-se às experiências de alguns alunos. Bernardo inicia os seus estudos primários numa escola pública, na terra natal, Malange, com sete anos de idade, entrando para a 1ª classe. Na sequência do falecimento do pai, vai para Luanda com a mãe. Ali prossegue os seus estudos, também em escolas públicas, e obtém diploma no curso médio de Jornalismo. Nos três anos que se seguiram à conclusão do nível de Ensino Médio Técnico não consegue entrar no Ensino Superior público. Como não tem condições económicas e financeiras bastantes para custear os estudos numa instituição de Ensino Superior privado não prossegue a sua formação. No segundo ano de tentativas de entrada no Ensino Superior público, Bernardo apresenta apenas candidatura ao Curso de Direito, na Faculdade de Direito. Na verdade, a instrução dos processos de candidaturas autónomas a várias Faculdades/Cursos com vista à inscrição nas «provas de acesso» exige disponibilidades financeiras que não estão ao seu alcance. Quando consegue dinheiro suficiente para custear a instrução do processo de candidatura para o Curso de Sociologia, na Faculdade de Letras da UAN, os prazos tinham sido ultrapassados. Situação semelhante tinha ocorrido, aliás, quando do ingresso no Ensino Médio Técnico/PUNIV. Com efeito, apesar de, inicialmente, ter admitido a possibilidade de apresentar candidatura ao Instituto Médio Técnico de Petróleo, no Sumbe, não dispunha de condições económicas e financeiras que permitissem atender às exigências do referido curso, nomeadamente a aquisição do enxoval, que inclui, entre outros, uniforme, roupas de cama e objectos de higiene pessoal. Decidira, então, apresentar candidaturas a outros cursos, no caso a Construção Civil, no Instituto Médio Industrial de Luanda (IMIL), mais conhecido por Makarenko, e o Jornalismo, no Instituto Médio de Economia de Luanda (IMEL). Graciano estuda, igualmente, em escolas públicas. Faz as quatro primeiras classes, 1ª-4ª classes, em Viana, a 5ª e a 6ª classes no Bengo, e a 7ª e 8ª classes em Luanda. As «mudanças forçadas» de escolas, associadas às mudanças de locais de residência, ficaram a dever-se às fragilidades económicas e financeiras da família, agravadas com o falecimento do pai. É na sequência da morte do pai que Graciano vai viver com uma avó, no Bengo, e ali prosseguir os seus estudos, enquanto a mãe vive em Luanda. Apesar de serem muito limitadas as condições de estudo no Bengo, mormente a falta de infra-estruturas, tais como bibliotecas, estudar ali representa menos custos económicos e financeiros para a mãe de Graciano. Em Luanda, quando prossegue os estudos no Ensino PUNIV, na Área de Ciências Sociais (10ª classe), numa escola pública, Graciano interrompe a sua formação para trabalhar, devido às suas dificuldades económicas e financeiras e as da sua família. Saturnino faz o curso Médio Técnico de Informática, numa escola pública, em Luanda, frequentando a 11ª classe. Por falta de vagas na escola pública, estudara as 6ª, 7ª, 8ª classes e primeiro trimestre da 9ª classe numa escola privada. Por falta de pagamento das mensalidades,

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tivera, no entanto, que abandonar este tipo de instituição de ensino e retomar os estudos numa escola pública. Marisol estudou as duas primeiras classes (1ª e 2ª classes) em Ndalatando, numa escola pública. De modo a poder continuar os estudos em melhores condições, vai viver para Luanda, com a irmã mais velha, a pedido e por insistência desta. Fagundes entra para a escola pública aos sete anos de idade, para a 1ª classe. Na 5ª classe fica excluído do sistema de ensino por não conseguir um lugar na escola pública situada no seu local de residência (Golfe). No ano seguinte retoma os estudos, ao conseguir uma vaga na escola da sua área de residência. Quando conclui a 5ª classe não prossegue estudos numa escola pública, visto não ter conseguido vaga em horário escolar diurno e os pais considerarem que estudar em regime nocturno é perigoso, sendo que, na altura, a única alternativa viável passava por continuar os estudos numa escola da Igreja Kimbandista. Prossegue os seus estudos ao nível do Ensino Médio em Luanda, uma escola pública, frequentado e concluindo o curso Médio de Jornalismo. Quando frequentava a 3ª classe, Anabela mudara de uma escola pública para uma escola privada num bairro de Luanda (Rocha Pinto), na sequência da mudança do local de residência do agregado familiar e da não obtenção de uma vaga em escolas públicas no novo local de residência. Frequentou a 9ª classe no Ensino PUNIV, na Área de Ciências Exactas, numa escola pública. Devido às reprovações nas Disciplinas de Matemática, Física, Química e Português, teve que sair do sistema de Ensino. Como não possuía condições económicas e financeiras para prosseguir os estudos numa escola privada, permanece em casa; não estuda nem trabalha. Tem realizado «provas de recurso», mas sem sucesso. Florêncio reprovara na 2ª classe, quando estudava numa escola pública. Essa reprovação, associada aos problemas de saúde que afectavam de forma negativa o seu próprio relacionamento com colegas, precipitou a decisão dos pais de o mudar de escola, indo estudar para uma sala de «Explicação», uma instituição de ensino privada. Saídas do sistema de ensino por falta de vagas; saídas do sistema de ensino público por acumulação de reprovações; vivências de situações de «mudanças forçadas» de locais de residência e tipos de escolas; saídas do sistema de ensino para se trabalhar, de modo a poder garantir a sobrevivência própria e/ou da família; saídas de escolas privadas, devido ao incumprimento de compromissos assumidos, como o não pagamento das mensalidades relativas a propinas escolares, e o retomar dos estudos em escolas públicas; a não apresentação de candidaturas aos Ensino Médio Técnico/PUNIV e Ensino Superior (privado ou público), por falta de condições económicas e financeiras que permitem custear as despesas inerentes - eis alguns elementos de percursos escolares de alguns alunos que ilustram e fundamentam as razões da procura e frequência dos diferentes tipos de ensino, e revelam, simultaneamente, alguns constrangimentos a que estão sujeitos os alunos angolanos.

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A escassez de ofertas educativas e as debilidades económico-financeiras das famílias da grande maioria dos alunos favorecem as preferências dos alunos (e famílias) pelo ensino público.272 Na verdade, a frequência de outros tipos de ensino - ensino privado e ensino ligado às confissões religiosas - exige o pagamento de certos valores monetários que não estão ao alcance da grande maioria da população. Devido ao elevado custo económico e financeiro, só um número muito reduzido de alunos tem a possibilidade de frequentar o ensino privado, mormente o Ensino Superior privado. Filho de pais detentores de formação de nível superior, quadros «superiores» que gozam de um estatuto socioeconómico e financeiro que se situa acima do da maioria dos alunos e famílias angolanos, Teotónio estudou as primeiras quatro classes (1ª-4ª classes) numa Escola ligada à Igreja Católica e as 5ª e 6ª classes na escola pública. Prossegue estudos da 7ª à 12ª classes num colégio privado, em Luanda, onde a mãe é professora, leccionando aulas aos alunos da 7ª e 8ª classes. Frequenta o 2º ano do curso de Informática, numa Universidade privada, em Luanda, onde, de resto, fizera o «curso propedêutico», tendo estudado então as Disciplinas de Matemática, Português, Inglês e Informática. Suzete, que estuda Geologia na Faculdade de Ciências da UAN, pertence, tal como Teotónio, a um agregado familiar cujos pais frequentaram ou concluíram formação de nível superior e detém condições económico-financeiras mais favoráveis do que a maioria das famílias angolanas. Frequentou e concluiu o Curso Médio Técnico de Petróleos num Colégio privado, em Luanda, uma formação que ia ao encontro dos seus desejos e interesses e os da sua família: realizar cursos das suas preferências, no local de residência da família (Luanda). Para os poucos alunos e famílias que possuem condições económicas e financeiras que permitem custear os estudos no ensino privado, a frequência deste tipo de ensino pode constituir, de facto, uma oportunidade para satisfazer os seus desejos genuínos, como realizar formações/cursos nos domínios de conhecimentos que desejam; satisfazer as necessidades e conveniências de pais e filhos trabalharem e estudarem «próximos uns dos outros» (nas mesmas instituições escolares ou em instituições escolares situadas próximo umas das outras, próximo das residências); ou escapar às experiências, quase sempre dolorosas, associadas à realização das «provas de acesso» e/ou «apresentação de candidaturas a inscrições/matrículas» nas escolas públicas. De resto, mesmo no quadro do ensino público, muitos alunos (e famílias) experimentam situações de «exclusão», traduzidas na impossibilidade de acederem ao sistema de ensino, quando não podem comparticipar

272 As informações proporcionadas pelo inquérito por questionário confirmam essa maior procura e

frequência do ensino público por parte dos alunos: a maioria dos alunos (61%) frequenta o ensino público (quadro III.1.48).

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financeiramente o pagamento de certos custos do ensino.273 No caso do Ensino Superior público em regime pós-laboral, cuja frequência exige o pagamento de uma propina mensal, estas fragilidades económicas e financeiras dos alunos (e famílias) ganham um relevo ainda maior, visto que as notas mínimas de acesso exigidas, resultantes das «provas de acesso», são inferiores àquelas exigidas para os cursos em regime diurno. Por outro lado, se é verdade que a oferta pública de ensino é insuficiente face à procura, não é menos verdade que a oferta privada não constitui, ainda, uma verdadeira alternativa, devido, entre outros factores, à sua insuficiência e aos elevados preços praticados. A frequência do ensino privado não constitui a primeira opção para a maioria dos alunos e famílias. Em muitos casos, a realização da escolarização em estabelecimentos de ensino privados está associada a razões que escapam ao controlo dos alunos e famílias, assumindo-se como constrangimentos e situações excepcionais. São os casos, por exemplo, de alunos que, na sequência de mudanças de locais de residência dos familiares, têm dificuldades em encontrar vagas em escolas públicas ou de alunos que experimentam as reprovações e enfrentam a escassez de vagas no sistema de ensino público.

A marca diferenciadora da procura e frequência de instituições escolares ligadas às confissões religiosas, sobretudo as escolas promovidas pela Igreja Católica, está associada às imagens de seriedade, honestidade e credibilidade das próprias instituições escolares, de que são exemplos o Instituto Médio Normal de Educação-Marista de Luanda (IMNE-Marista), a Universidade Privada de Angola (UPRA) - anteriormente conhecida por Instituto Superior Privado de Angola (ISPRA) -, o Instituto de Ciências Religiosas de Angola (ICRA) ou a Universidade Católica de Angola (UCAN); às imagens de qualidade das formações ministradas; aos sentimentos de segurança proporcionados, seja os de segurança económico-financeira, prestígio cultural e social, seja os de protecção física e psicológica, estes últimos, sobretudo, num passado não muito longínquo, marcado pela situação de conflito armado.274 Muitos alunos (e famílias) procuram e frequentam

273 O ensino tendencialmente gratuito é, para muitas famílias, incomportável em termos económicos e

financeiros. Cerca de metade das crianças que frequentaram a escola em 1996 pagou ou deu algum contributo, em géneros, para poder realizar os seus estudos, contrariando as indicações expressas do