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Estrutura da tese

QUADRO 32 QUANTIDADE DE RELIGIOSOS E LISTA DE PROPRIEDADES DA PROVÍNCIA DO CARMO DA BAHIA E PERNAMBUCO (1757-1800)

1.4 O espaço interurbano colonial ocupado pelos calçados

1.4.1 Os deslocamentos dos carmelitas entre conventos e propriedades lucrativas

Partindo do pressuposto de que uma rede religiosa-conventual não deve somente levar em consideração os pontos físicos como, por exemplo, cidades e edifícios, mas, também, deve trabalhar o aspecto social e as diversas relações (econômica, política, religiosa, entre outras), no intuito de captar os fluxos de pessoas, ou seja, a dinâmica entre aqueles pontos. Em nosso caso, uma vez que já sabemos onde os carmelitas calçados se fixaram, de que forma e com que intuito, podemos pensar nos deslocamentos dos carmelitas calçados por entre os edifícios religiosos e propriedades lucrativas deles.

A partir de informações contidas, principalmente, no “Livro Primeiro de Actas [...]” (1720-1780), afirmamos que os deslocamentos dos carmelitas calçados entre fundações religiosas ou para propriedades lucrativas ocorreu, em grande parte, por meio terrestre, em estradas coletivas (reais e públicas), com uso de cavalos (de propriedade dos conventos) e com o acompanhamento de escravos.

Segue trecho que determina os gastos de algumas viagens feitas pelos carmelitas calçados da Província a partir de 1722, que seriam repartidos por alguns hospícios e conventos:

Mais se determinou e se assentou que, para maior cômodo e conveniência dos conventos e sossego dos seus Priores e oficiais, se consignasse certa e determinada quantia para os gastos das viagens que nas suas visitas fazem os Padres Provinciais; e, para eles, farão consignados cento e quarenta mil réis que, proporcionalmente, se distribuirão e pagarão pelos sobreditos [os] Conventos [da] Bahia, Olinda e Sergipe e Hospício da Nazaré, da seguinte forma: pela Bahia, sessenta e dois mil réis, por Olinda, trinta e dois, e, por Sergipe e Hospício de Nazaré, quatorze. E, fora destas consignadas quantias, não serão obrigados os conventos e hospícios a fazer algum outro dispêndio para as ditas viagens e visitas exceto o que pertencer às conduções para elas precisas de escravos e cavalos, porque são obrigados a dá-los nas jornadas que se fizerem por terra.191

No “Livro Primeiro de Actas [...]” (1720-1780, p. 33), há o exemplo de um trajeto de religiosos, via terrestre, detalhado e determinado em 1722 pela Província:

E, assim, será obrigado o Convento da Bahia a mandar conduzir os Padres Provinciais até o Convento de Sergipe de El Rei até o Hospício de Nazaré e deste Hospício de Nazaré até Olinda os conduzirá o Convento de Olinda, e ao depois no regresso até as nossas Fazendas de Santa Izabel, de cujo lugar os tornará a conduzir o Convento da Bahia até a cidade, caso porém que os mais conventos fora deste da Bahia não tenham os precisos escravos e cavalos para as ditas conduções, que lhes pertencem, pagará, cada um deles, ao sobredito Convento da Bahia, os aluguéis dos escravos e cavalos, que para elas lhes administrar, ou emprestar segundo os dias que nelas gastarem tanto da ida quanto na volta ou retorno: e o aluguel de cada escravo por dia serão seis vinténs, e doze vinténs o de cada um dos cavalos ou bestas também por cada dia.

Lembramos que os percursos relatados no ano de 1722 consideraram o Hospício de Nazaré, apesar de na época ser apenas um hospício, mas suspeitamos que o Cabo de Santo Agostinho era uma região estratégica onde paravam diversas embarcações no período colonial e poderia ser parada obrigatória terrestre dos que por ali passavam. Os mesmos percursos relatados no ano de 1722 não consideraram outros hospícios como o de Alagoas do Sul, por exemplo, tendo em vista que ainda não havia sido fundado, mas que, depois, pode ter sido inserido no percurso terrestre da Província a partir de 1732. Os percursos terrestres relatados em 1722 excluem os Hospícios do Pilar, do Rio Real e de Santo Amaro, mas eles podem ter sido realizados por meio terrestre e, diretamente, do Convento de Salvador ou de São Cristóvão, fora do circuito habitual da Província. Deduzimos que, no percurso terrestre da Província de 1722, a passagem dos carmelitas calçados entre a Comarca de Sergipe d’El Rei e a Comarca das Alagoas deveria ser complementada através de embarcações coletivas, de uso da população em geral, para que os religiosos pudessem atravessar o Rio São Francisco junto com os escravos e cavalos deles.

Contudo, os deslocamentos dos carmelitas calçados foram feitos por meio marítimo e fluvial, através de embarcações coletivas de uso da população em geral, que eram fretadas por aqueles religiosos. Mesmo assim, esse era o meio mais incomum, por ser mais dispendioso, sendo utilizado para as viagens mais difíceis de se realizar por terra ou mais longas, quais sejam: 1) a viagem marítimo-fluvial na Baia de Todos os Santos a partir do convento da Cidade de Salvador pela Baia de Todos os Santos até chegar ao Rio Paraguaçu com direção ao Convento da Vila de Cachoeira (ou vice-versa); 2) a viagem marítima feita a partir do Convento-Sede da Cidade de Salvador com destino ao Convento de Olinda (ou vice-versa). A seguir, apresentamos as decisões do ano de 1722, impostas no “Livro Primeiro de Actas [...]” (1720-1780, p. 33), a respeito desses dois percursos feitos através de embarcações:

E havendo o Padre Provincial de fazer jornada por mar deste Convento da Bahia para o de Olinda se pagará, então, frete da embarcação somente entre estes dois conventos. Excetua-se destas conduções o Convento de Cachoeira, por serem as suas jornadas, regularmente, feitas por mar; mas, para elas, pagará, também, os fretes de embarcação, em que for conduzido o Padre Provincial de ida e volta, e, juntamente, lhe fará as suas malotagens dando para elas, somente de ida e volta, dezesseis mil réis que lhe são taxados.

Lembramos que os trechos que demarcamos em todos os percursos apresentados a partir daqui são, meramente, ilustrativos e aleatórios, tendo em vista que não conseguimos dados mais específicos sobre quais caminhos os carmelitas calçados percorriam, que dependiam, certamente, da escolha dos religiosos ou de condições climáticas, geográficas,

econômicas, entre outras. Então, os percursos que simulamos dos carmelitas calçados são caminhos aproximados, tendo como base as ligações entre um ponto fixo e outro.

Diante do exposto, simulamos uma rede religiosa-conventual de deslocamentos (marítimo-fluvial: ida e volta em vermelho; terrestre: ida em verde e volta em azul) dos carmelitas calçados da Província Carmelitana da Bahia e Pernambuco (figura 25).

Figura 25: O percurso terrestre (azul e verde) e marítimo-fluvial (em vermelho) dos carmelitas calçados da Província do Carmo da Bahia e Pernambuco em 1722 representada no “Mappa Tipografico dos Portos [...]” (1776).

Fonte: FBN Digital; mapa modificado pela autora.

Nesse mapa, notamos que o percurso terrestre é dinâmico, não repetindo a passagem por uma mesma localidade tanto na ida quanto na volta. Ainda, podemos supor que o Hospício de Alagoas do Sul pode ter sido incluído no percurso terrestre da Província, pois, pelo menos desde 1717, já havia deslocamentos dos carmelitas calçados de Olinda para pedirem esmolas nas Alagoas e tal percurso era feito por meio terrestre.

No caso do percurso de 1722, o deslocamento era feito com o objetivo do Superior- Geral da Província, chamado de Provincial, visitar as principais propriedades e conventos. Contudo, com base no “Livro Primeiro de Actas [...]” (1720-1780) e “Livro Segundo de Actas [...]” (1780-1799), vimos que existiam deslocamentos anuais dos superiores de todos os conventos para participarem de reuniões no Convento-Sede de Salvador. Além disso, havia deslocamentos dos religiosos superiores eleitos nas votações trienais, que, por exemplo, moravam em um hospício ou convento, mas foram eleitos para serem superiores de outro hospício ou convento, então, deslocavam-se do local onde moravam para outra propriedade religiosa-conventual da Província. Ainda, verificamos que um religioso de algum convento ou hospício era designado para administrar as propriedades (sítio, fazenda, entre outros), para isso, deslocava-se da moradia conventual dele para a propriedade religiosa. Como, também, havia deslocamentos de religiosos de um determinado convento em direção às missões, para atuarem como missionários, ou aos hospícios, para serem superiores desses locais ou para repousarem

por um curto tempo, nesse caso, quando estavam de passagem. Por fim, averiguamos que os carmelitas calçados pediam esmolas, então, eles saiam de uma cidade onde havia convento ou hospício para outra na qual havia moradia religiosa da Província, passando de uma região à outra pedindo esmolas.

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