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O período pós 25 de abril de

Capítulo I – Caraterização e qualificação jurídica do objeto de estudo

– ENQUADRAMENTO GERAL –

5. O período pós 25 de abril de

“O período revolucionário caracterizou-se por uma extraordinária instabilidade das relações laborais, consequência natural da euforia revolucionária que se seguiu ao movimento militar de 25 de Abril de 1974, em grande parte influenciada pelas doutrinas marxistas então em voga”34.

Neste período, vemos recuperada a dimensão coletiva do Direito do Trabalho, com a reposição dos vários direitos dos trabalhadores que haviam sido diminuídos ou extintos nestes últimos anos, sendo grande parte acolhidos no novo texto constitucional, embora com algumas incongruências.

A Constituição da República Portuguesa35 (doravante, Constituição), no artigo 270.º do seu texto originário, referia-se a “funcionários e agentes do Estado” para definir o conjunto de empregados da função pública, ao passo que no artigo 53.º, relativo aos direitos, bem como no restante texto constitucional, se utilizava a designação genérica de “trabalhadores”.

Apesar da nomenclatura diversa, certo é que a Constituição atribuía a todos os trabalhadores, sem distinção, os mesmos direitos, sendo este o ponto que marca o início da aproximação do regime público ao regime privado36.

32 RAMALHO, Maria do Rosário Palma - Tratado de Direito do Trabalho - Parte I…,, p. 86.

33 Aprovado pelo Decreto-Lei n.º 480/99, de 09 de novembro, na redação dada pela Lei n.º 63/2013, de 27 de agosto.

34 LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes - Direito do Trabalho…, p. 44-45. 35 Aprovada pelo Decreto de 10 de abril de 1976.

36 RAMALHO, Maria do Rosário Palma – Intersecção...

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No entanto, discutia-se ainda até que ponto o regime da função pública poderia servir de base constitucional para justificar restrições legais aos direitos fundamentais dos trabalhadores da função pública, numa visão ainda baseada na doutrina clássica que conduzia a relação jurídica de emprego público a uma de relação especial de poder do Estado perante o funcionário37.

A substituição do nomen iuris na revisão constitucional de 198238, passando a constar “os trabalhadores da Administração Pública e demais agentes do Estado” no agora renumerado artigo 269.º, acaba por sepultar aquela visão dicotómica39, demonstrando que “a relação de emprego público não pode ser configurada como uma relação especial de poder imune ou impermeável aos direitos fundamentais”40, exceto quanto às exceções indicadas no próprio texto constitucional41.

Em conformidade com esta alteração e também em virtude da ratificação da Convenção n.º 151 da Organização Internacional do Trabalho42, foi aprovado o Decreto-Lei n.º 45-A/84, de 3 de fevereiro, em que é reconhecido aos trabalhadores da Administração Pública o direito de negociação coletiva das respetivas condições de trabalho.

Embora o acordo obtido valesse apenas como recomendação, só produzindo efeitos com a adoção pelo Governo e mediante a integração dos respetivos resultados nas leis ou regulamentos adequados (cf. n.ºs 3 e 4 do artigo 5.º deste diploma), “ele não deixa de

introduzir um limite à posição de supremacia da Administração e, por conseguinte, uma profunda alteração no regime tradicional da função pública”43.

O paradigma muda totalmente com a aprovação da Lei n.º 23/98, de 26 de maio, que revogou o Decreto-Lei 45-A/84, de 3 de fevereiro44, impondo ao Governo a adoção das medidas legislativas ou administrativas adequadas ao integral e exato cumprimento do acordo que for obtido pelas partes (cf. n.º 3 do artigo 5.º desta Lei).

Contudo, como já vimos, o direito não se afasta da sociedade.

As alterações legislativas produzidas no final da década de 1970 e princípio da década de 1980, fruto do Estado Providencia, resultaram no “aparecimento de tantos serviços públicos quantas

37 CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II. …, p. 840. 38 Aprovada pela Lei n.º 1/82, de 30 de setembro.

39 CANOTILHO, J. J. Gomes; MOREIRA, Vital - Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. II. …, p. 837-840. 40 MIRANDA, Jorge; MEDEIROS, Rui – Constituição Portuguesa Anotada, Tomo III. Coimbra Editora, 2007, p. 638. 41 A Constituição admite expressamente as especificidades ao prescrever a sujeição dos trabalhadores da Administração Pública ao interesse público (artigo 269.º, n.º 1) e admite adicionalmente a restrição dos direitos colectivos de algumas categorias específicas de trabalhadores públicos, como os militares e agentes militarizados e os agentes dos serviços e forças de segurança, embora na estrita medida das exigências das suas funções próprias (artigo 270.º).

42 A Lei 17/80, de 15 de julho, ratifica a Convenção n.º 151 da OIT, relativa à protecção do direito de organização e aos processos de fixação das condições de trabalho da função pública.

43 Cf. FERNANDES, Francisco Liberal, Autonomia Colectiva dos Trabalhadores da Administração – Crise do Modelo Clássico de Emprego Público. Coimbra Editora, 1995, pág. 160, Cit. por GOMES, Ana Cláudia Nascimento - O emprego público de regime privado: Uma análise da importação do modelo privatístico de trabalho subordinado pela administração pública não empresarial no direito brasileiro. Coimbra, 2013, p. 266-268.

44 Com exceção do artigo 10.º referente à exclusão destas matérias às Forças Armadas e militarizadas.

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as necessidades coletivas a satisfazer, causando o crescimento exponencial e desmesurado do aparelho burocrático”45.

Aos poucos, derivado de uma despesa pública incomportável e de uma função pública altamente ineficaz e ineficiente num período de estagnação económica, criaram-se novos modelos e paradigmas de administração, na génese daquilo a que se veio a chamar reforma administrativa, segundo os quais as organizações do sector público e do sector privado deveriam ser geridas por princípios similares, apesar de as organizações públicas poderem procurar satisfazer interesses socialmente globais e serem controladas pelo poder político46.

Já com este objetivo reformador no pensamento, especialmente impulsionado pela adesão de Portugal às Comunidades Europeias47, foram aprovados o Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho, definidor dos princípios gerais em matéria de emprego público, remunerações e gestão de pessoal da função pública, e o Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro, que define o regime de constituição, modificação e extinção da relação jurídica de emprego na Administração Pública (RJEP), diplomas que vieram admitir como modalidades de constituição da relação jurídica de emprego na Administração Pública, para além do regime geral de nomeação, o contrato administrativo de provimento e o contrato de trabalho a termo certo para “satisfação de necessidades transitórias dos serviços de duração determinada”48, por urgente conveniência de serviço (artigo 21.º, n.º 5, do RJEP), e com limites apertados à sua renovação (artigo 20.º, n.ºs 1 e 2, do RJEP), nos mesmos moldes em que já havia sido instituído no regime privado49. Ainda neste sentido, a Lei n.º 25/98, de 26 de maio, ao aditar o artigo 11.º-A ao Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho, passou a permitir a contratação de trabalhadores do grupo de pessoal auxiliar ao abrigo do regime do contrato individual de trabalho.

Para além destas preocupações em flexibilizar o regime de contratação público, manteve-se a tendência de aproximação ao setor privado de alguns direitos laborais, designadamente na área do direito coletivo, tendo sido aprovado o Decreto-Lei n.º 84/99, de 19 de março, que regulamenta o exercício da liberdade sindical dos trabalhadores da Administração Pública e também a Lei n.º 14/2002, 19 de fevereiro, que regula o exercício da liberdade sindical e os direitos de negociação coletiva e de participação do pessoal da Polícia de Segurança Pública com funções policiais50, ao mesmo tempo que se retirava da jurisdição administrativa, os litígios decorrentes das relações jurídicas advindas dos contratos individuais de trabalho, nos

45 AMARAL, Diogo Freitas do - Curso de Direito Administrativo, Vol. I. 3ª ed., Almedina, 2006, p. 25-28.

46 MADUREIRA, César; RODRIGUES, Miguel - A Administração Pública do século XXI: Aprendizagem organizacional, mudança comportamental e reforma administrativa. Comportamento Organizacional e Gestão. Vol. 12, N.º 2. 2006, p. 154-157.

47 Tratado assinado no dia 12 de junho de 1985 entre os Estados-membros das Comunidades Europeias e o Reino de Espanha e a República Portuguesa, relativo à adesão do Reino de Espanha e da República Portuguesa à Comunidade Económica Europeia e à Comunidade Europeia da Energia Atómica.

48 Conforme designação introduzida pelo Decreto-Lei 218/98, de 17 de julho, no n.º 1 do artigo 18.º do Decreto-Lei n.º 427/89, de 7 de dezembro.

49 Regime jurídico da cessação do contrato de trabalho e do trabalho a termo, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-

A/89, de 27 de fevereiro.

50 Sobre este tema, veja-se RAMALHO, Maria do Rosário Palma - Tratado de Direito do Trabalho - Parte III - Situações Laborais Colectivas. Almedina, 2012, p. 91-96.

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termos da redação originária do artigo 4.º, n.º 3, alínea d), do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais51 (ETAF).

Este movimento culminou com a Resolução do Conselho de Ministros n.º 95/2003, de 30 de junho, que aprovou as linhas de orientação da reforma da Administração Pública “como uma exigência indispensável ao desenvolvimento sócio-económico, devendo constituir-se como vector de competitividade e dinamismo numa sociedade moderna”52.

No ponto 4.2 desta Resolução foi definido como objetivo, no quadro da organização da Administração Pública, que seria regulamentado “o regime do contrato individual de trabalho na Administração Pública, conciliando empregador público com regime laboral privado, devendo a intervenção neste domínio ser concretizada de forma gradual e selectiva, tendo em atenção, designadamente, as prioridades da reforma, as especificidades das várias áreas da Administração Pública e as necessidades mais prementes que importa satisfazer”.

Desta forma, ficou prevista a aprovação de legislação acerca do regime do contrato individual de trabalho na Administração Pública, o enquadramento das situações em que existam serviços com regimes laborais distintos e a definição das condições de expansão do contrato individual de trabalho, tendo em conta as especificidades das várias áreas da Administração e as necessidades que importa satisfazer.

Atendendo já a estas “especificidades”, foi publicada a Lei-quadro dos Institutos Públicos53, onde no n.º 2 do artigo 6.º, na versão original, se permitiu a aplicação a esse tipo de organismo público, “quaisquer que sejam as particularidades dos seus estatutos e do seu regime de gestão […] o regime jurídico da função pública ou o do contrato individual de trabalho, de acordo com o regime de pessoal aplicável”.

Com base nesta norma, vários institutos públicos passaram a optar pela formalização de contrato individual de trabalho com os seus trabalhadores, ficando estes sujeitos à legislação laboral comum dada pelo então Código do Trabalho, Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto (doravante, CT 2003), que no artigo 6.º do preâmbulo já previa a sua aplicação aos trabalhadores de pessoa coletiva pública que não fossem funcionários ou agentes da Administração Pública, sem prejuízo dos princípios gerais em matéria de emprego público.

Chamado a intervir em diversas situações54, o Tribunal Constitucional julgou conforme a Constituição os estatutos dos institutos públicos que criaram quadros para o pessoal em regime de contrato individual de trabalho, por não violarem o princípio da taxatividade das

51 Aprovado pela Lei n.º 13/2002, de 19 de fevereiro. 52 Parágrafo 1.º desta Resolução.

53 Aprovada pela Lei n.º 3/2004, de 15 de janeiro.

54 Vide o Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 162/03, de 25-03-2003, relatado pelo conselheiro Gil Galvão; Ac. n.º 406/03, de 17-09-2003, relatado pelo conselheiro Pamplona Oliveira; e Ac. n.º 61/04, de 27-01-2004, relatado pelo conselheiro Mário Torres, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt. Para mais informações sobre este tema, veja-se MOURA, Paulo Veiga e – Implicações Jurídico-Constitucionais da Introdução do Contrato de Trabalho na Administração Pública – A propósito dos Acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 406/03 e 61/04. Jurisprudência Constitucional, n.º 11. Julho-Setembro, 2006, p. 63-71.

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formas de constituição da relação de emprego na Administração Pública resultante da disciplina básica instituída pelos Decretos-Leis n.ºs 184/89 e 427/89.

Apesar da falta de autorização legislativa para emanação destes estatutos em diplomas editados pelo Governo, nos termos do artigo 165.º, n.º 1, alínea t), da Constituição, o Tribunal considerou que a criação de exceções aos princípios básicos definidores do regime e âmbito da função pública não constitui matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, pois no decreto-lei parlamentarmente autorizado que definiu as bases – o já referido Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de junho –, se previu, desde logo, a possibilidade de introdução dessa mesma exceção.

Continuando a reforma, é aprovada pela Assembleia da República a Lei n.º 23/2004, de 22 de junho, que aprovou o regime jurídico do contrato individual de trabalho na Administração Pública e que “introduz uma permissão genérica de realização de trabalho subordinado para a

Administração Pública através da alteração dos Decretos-Leis n.º 184/89, de 2 de Junho, e 427/89, de 7 de Dezembro, estabelecendo como forma de contratação genérica o contrato de trabalho”55,56.

Aqui, para além da previsão de aplicação subsidiária do CT 200357, o contrato individual de trabalho passa a poder ser a forma usual de vinculação numa relação de trabalho subordinada para com uma entidade pública, exceto no âmbito da administração direta do Estado, em que não podem ser objeto de contrato de trabalho por tempo indeterminado as atividades que impliquem o exercício direto de poderes de autoridade que definam situações subjetivas de terceiros ou o exercício de poderes de soberania, conforme o artigo 1.º, n.º 4, na versão originária da Lei n.º 23/2004.

Contudo, este diploma faz aplicar uma série de modulações jurídico-públicas ao regime laboral aplicável à esfera privada, como, por exemplo, o procedimento público e imparcial de seleção dos trabalhadores (artigo 5.º), os deveres especiais dos trabalhadores (artigo 4.º), o afastamento da renovação automática do contrato a termo (artigo 10.º) ou a viabilidade da figura da cedência unilateral do trabalhador (artigo 14.º), o que leva a doutrina58 a entender que apesar da amplitude da privatização jurídica procedida nas relações de trabalho subordinado com a Administração Pública, a Lei n.º 23/2004 não representou uma efetiva “despublicização” dessas relações, antes constituindo um tertium genus59 entre a conjugação dos regimes laboral e da função pública.

55 RAMALHO, Maria do Rosário Palma; BRITO, Pedro Madeira de – Contrato…, p. 8.

56 Ver também RAMALHO, Maria do Rosário Palma - Tratado de Direito do Trabalho - Parte II - Situações Laborais Individuais. 4ª ed., Almedina, 2012, p. 338-343.

57 Prevista no n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 23/2004, de 22 de junho.

58 RAMALHO, Maria do Rosário Palma - O contrato de trabalho na reforma da Administração Pública: reflexões gerais sobre o regime jurídico instituído pela Lei n.º 23/2004 de 22 de Junho. Questões laborais, n.º 24, Ano XI. Coimbra Editora, 2004, p. 121-136.

59 RAMALHO, Maria do Rosário Palma - O contrato de trabalho…, p. 129.

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Muitas críticas foram feitas a esta opção legislativa60, afirmando-se que o seu intuito foi, sobretudo, o de conferir à Administração uma maior margem de liberdade na constituição, execução e extinção das relações jurídico-laborais em que é parte, tendo a prática demonstrado também a difícil articulação deste regime com o dos funcionários públicos, levando a tratamentos diferenciados entre pessoas que trabalham na mesma instituição61.

A “privatização da relação de emprego público”62 veio, no entanto, a ser determinada através da Lei 12-A/2008, de 27 de fevereiro63, que estabeleceu os regimes de vinculação, de carreiras e de remuneração dos trabalhadores que exercem funções públicas, mas não sem antes ter sido alvo de controlo abstrato sucessivo da sua constitucionalidade64.

Neste aresto, o plenário do Tribunal Constitucional pronunciou-se acerca da legitimidade constitucional da “privatização jurídica” empreendida pelo legislador através da Lei 12-A/2008, e a “necessária estabilidade, permanência e efectividade”, tendo sido apontada a violação aos princípios constitucionais da segurança jurídica e da proteção da confiança, além da garantia da segurança no emprego.

Todavia, o Tribunal não acatou os argumentos defendidos pelos autores, afirmando que o direito à segurança no emprego não impede que, havendo interesses com relevo constitucional que tal justifiquem, a relação jurídica de emprego na Administração Pública assuma uma certa precariedade, como sucede com a que se constitui por contrato pessoal, para além de que não existia a expectativa de uma situação de imodificabilidade da posição jurídico-laboral do trabalhador titular de um vínculo definitivo.

Tendo passado o teste da constitucionalidade, nos termos do artigo 9.º da Lei 12-A/2008, a relação jurídica de emprego passou a constituir-se por nomeação, por contrato em funções públicas ou, nos casos ali previstos65, por comissão de serviço.

No entanto, a vinculação por nomeação66, que antes constituía a modalidade regra, passa a assumir um papel residual e limitado, sendo restrita aos trabalhadores com atribuições, competências e atividades relativas a certas funções do Estado, taxativamente referidas no

60 Para uma melhor perceção do tema, ver MOURA, Paulo Veiga e – A privatização da função pública.Coimbra Editora, 2004, p. 386 e ss.

61 RAMALHO, Maria do Rosário Palma - O contrato de trabalho…, p. 125.

62 Na expressão de LEITÃO, Luís Manuel Teles de Menezes - Direito do Trabalho…, p. 462. Neste sentido também RAMALHO, Maria do Rosário Palma - Tratado de Direito do Trabalho - Parte II…,p. 345 e ss.

63 Acerca desta lei, ver ainda MARECOS, Diogo Vaz - As Modalidades de Constituição do Vínculo da Relação Jurídica de Emprego Público. Revista da Ordem dos Advogados. Ano 71, Jan./Mar. 2011, p. 207-237.

64 Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 154/2010, de 14-04-2010, em que foi relatora a conselheira Maria Lúcia Amaral, disponível em www.tribunalconstitucional.pt.

65 O artigo 9.º, n.º 4, prevê: “A relação jurídica de emprego público constitui-se ainda por comissão de serviço quando se trate:

a) Do exercício de cargos não inseridos em carreiras, designadamente dos dirigentes;

b) Da frequência de curso de formação específico ou da aquisição de certo grau académico ou de certo título profissional antes do período experimental com que se inicia a nomeação ou o contrato, para o exercício de funções integrado em carreira, em ambos os casos por parte de quem seja sujeito de uma relação jurídica de emprego público por tempo indeterminado constituída previamente.”

66 A este respeito, foi publicada a Portaria n.º 62/2009, de 22 de janeiro, que aprova os modelos de termos de aceitação da nomeação e de termo de posse.

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artigo 10.º, o que, dado o âmbito igualmente restrito da comissão de serviço, teve como consequência que a generalidade dos trabalhadores do Estado fossem abrangidos pelo regime residual, o contrato de trabalho em funções públicas, conforme previsto no artigo 20.º, sendo esta transição efetuada automaticamente e sem outras formalidades, nos termos do artigo 88.º.

Já no seu artigo 87.º, indica-se a criação do Regime do Contrato de Trabalho em Funções Públicas (RCTFP), diploma que seria aprovado pela Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, juntamente com o respetivo Regulamento, tendo sido decalcado do CT 200367.

A definição deste contrato, previsto no n.º 3 do artigo 9.º da Lei 12-A/2008 como o “acto bilateral celebrado entre uma entidade empregadora pública, com ou sem personalidade jurídica, agindo em nome e em representação do Estado, e um particular, nos termos do qual se constitui uma relação de trabalho subordinado de natureza administrativa.”, apresenta, no fundo, as mesmas características do contrato de trabalho “privado”, previstas no artigo 1152.º do Código Civil68 e também no CT 2003, ou seja, a prestação de trabalho ou de uma atividade, a subordinação jurídica e a retribuição, preservando apenas algumas especificidades decorrentes da natureza pública da entidade empregadora e da sujeição ao princípio do interesse público, previsto no artigo 266.º da Constituição69.

Se conjugando estes dois fatores, o modo de constituição do vínculo jurídico-laboral preferencialmente por contrato em funções públicas, por um lado, e as características que este apresenta, por outro, ao princípio do favor laboratoris70, previsto no artigo 4.º do RCTFP, temos uma manifesta aproximação do regime de emprego público ao regime de emprego privado, certo é que foram também introduzidas mudanças que resultaram num afastamento dos regimes, como por exemplo, em matéria de competência jurisdicional, uma vez que o artigo 4.º, n.º 3, alínea d), do ETAF, na redação que lhe foi dada pelo artigo 10.º da Lei n.º 59/2008, de 11 de setembro, passa a sujeitar à jurisdição administrativa e fiscal os litígios emergentes do contrato de trabalho em funções públicas, do mesmo modo que, contrariamente ao regime laboral comum71, o regime do contrato de trabalho a termo não pode ser afastado por instrumento de regulamentação coletiva de trabalho e os contratos a termo resolutivo não podem, em caso algum, ser convertidos em contrato por tempo indeterminado (artigo 92.º, n.º 1 e 2, do RCTFP).

Atendendo a esta “duplicidade”, há quem defenda que, em termos gerais, o RCTFP tinha um

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