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Introdução É grande o interesse que, ao longo dos anos, o tema da qualidade de vida tem vindo a despertar, 

F. Prósperas: com uma economia local florescente, diversificada e inovadora; G Justas para todos: incluindo os que pertencem a outras comunidades, no 

9. CULTURA E LAZER 1 Cultura e lazer

3.2.2 Projectos à escala local

Na década de 80, Dowel Myers realizou um estudo académico sobre a qualidade de vida na cidade  de Austin, situada no Estado norte‐americano do Texas. Nele desenvolveu a proposta conceptual  de  um  novo  método  para  a  avaliação  de  tendências  ao  nível  local,  que  pudesse  constituir  um  instrumento  efectivamente  útil  para  o  planeamento,  o  “Community‐trend  Method”  (Myers,  1987).  Manifestando  um  grande  cepticismo  quanto  à  relevância  que  assumem  os  rankings  e  as  comparações entre lugares, quer para os residentes, quer para as organizações locais empenhadas  na melhoria das condições de vida e de bem‐estar, este autor veio sobretudo chamar a atenção para  a necessidade de se rever a relação entre as análises sobre qualidade de vida e as políticas públicas.  do inquérito foram publicados em 2004, 2006 e 2008. Em 2010 foi já realizado um novo inquérito mas os dados ainda não se encontram divulgados.

Uma  das  tónicas  da  abordagem  de  Myers  que  importa  destacar,  prende‐se  com  a  importância  atribuída  à  auscultação  dos  diferentes  actores  urbanos  para  que  se  possam  conhecer  as  suas  leituras sobre os aspectos mais importantes para a qualidade de vida local. Desta forma garante‐se  que a avaliação não fica subjugada ao ponto de vista de um determinado actor ou grupo e obtém‐ se um quadro de referência alargado para a selecção dos indicadores objectivos. Uma outra nota a  reter  diz  respeito  ao  facto  de  se  considerar  imprescindível  avaliar  a  qualidade  de  vida  numa  perspectiva  longitudinal,  ou  seja,  determinar  as  tendências  registadas  pelos  indicadores  seleccionados.  Este  enfoque  nos  processos  evolutivos  está  igualmente  presente  na  análise  dos  dados  relativos  à  opinião  dos  cidadãos,  uma  outra  componente  da  metodologia  preconizada  por  Myers.  Através  de  inquéritos,  é  pedido  aos  residentes  que  qualifiquem  o  sentido  positivo  ou  negativo em que progrediram cada um dos domínios da qualidade de vida. Estas inquirições são  igualmente  usadas  para  determinar  os  aspectos  da  vida  da  comunidade  que  as  pessoas  mais  valorizam  e  que,  consequentemente,  são  mais  mobilizadores  de  um  envolvimento  activo  das  populações na sua monitorização e nas intervenções que promovam a sua melhoria. 

Justamente esta abordagem participativa constitui uma vertente central de um grande número de  iniciativas  de  avaliação  da  qualidade  de  vida  que  surgiram  fora  do  contexto  académico,  a  maior  parte delas em meados dos anos 90, e que actualmente se repartem por todo o mundo. De acordo  com Flynn, Berry e Neintz (2002), na viragem do século havia mais de duzentos projectos ao nível  das cidades/comunidades locais, só nos EUA59

O  “movimento  dos  indicadores  locais”,  como  habitualmente  é  designado,  consistiu  na  multiplicação  de  processos  de  construção  e  utilização  de  painéis  de  indicadores  para  conhecer  e  acompanhar a evolução das condições de vida e de bem‐estar nas comunidades, apoiar as decisões  políticas  e  avaliar  o  desempenho  global  das  cidades  em  termos  das  respostas  dadas  aos  desafios  enfrentados (Figura 3.1). 

Este  movimento  global  congregou  abordagens  como  a  dos  “indicadores  de  qualidade  de  vida”,  mas  também  das  “cidades  saudáveis”,  das  “comunidades  sustentáveis  “  ou  dos  “indicadores  de  benchmarking”,  que  apesar  de  terem  subjacentes  enfoques  algo  particulares,  partilhavam  os  objectivos de fundo atrás enunciados (Hoernig e Seasons, 2004; Swain, 2002; Tanguay et al., 2010).  Além  disso  tinham  em  comum  o  facto  de  pretenderem  contribuir  para  que  fossem  encontradas  respostas  conjuntas  –  concertadas  entre  os  diversos  agentes  –  para  problemas  que  se  colocam  a  toda a sociedade. 

Em  muitos  centros  urbanos  a  iniciativa  de  avançar  com  este  tipo  de  projectos  –  que  procuravam  essencialmente  encarar  os  desafios  da  comunidade  numa  perspectiva  holística  –  partiu  dos 

59 No endereço electrónico da rede “Community Indicators Consortium”, que promove a troca de experiências entre todas as pessoas interessadas no desenvolvimento e aplicação destes sistemas de indicadores, podem ser identificados muitos destes projectos implementados nos EUA, mas também no Canadá e na Austrália, países onde existem igualmente muitas iniciativas deste âmbito. Consultar em http://www.communityindicators.net/

governos  locais  mas,  noutros  casos,  foram  impulsionados  por  outro  tipo  de  agentes,  tais  como  organismos  públicos,  organizações  empresariais  e  associações  de  cidadãos  (Besleme,  Maser  e  Swain, 1999). 

Figura 3.1 Modelo de funcionamento dos projectos de indicadores locais

Valores Visão Conhecimento Indicadores Investigação/estratégias Prioridades/planos Efeitos Resultados Avaliação Indicadores Defesa de posições Visão Fonte: Swain, 2002, p. 6 Como sublinha Gahin (2001), a expansão do movimento dos indicadores locais – estando ligada a  uma ressurgência  do interesse  na  utilização  de  informação  quantitativa –,  foi alimentada  por  um  desejo de renovação das medidas tradicionalmente usadas para medir o progresso local, e ainda,  pelo  reconhecimento  de  que  o  próprio  processo  de  construção  do  sistema  de  indicadores  gerava  benefícios. Relativamente às vantagens deste processo, o autor refere: “Deciding which indicators to  include helps to define abstract and complex concepts such as sustainability in ways that have meaning for  the community. It creates a common vision for the future and defines the community’s values. Broad‐based  participation creates connections and synergy for new groups and working relationships to form and builds  support for the program” (id., ibid., p. 16).  O exemplo paradigmático deste tipo de iniciativa é a da cidade norte‐americana de Jacksonville, na  Florida,  intitulada  “Jacksonville  Indicators  for  Progress”.  Tendo  arrancado  em  1985,  constitui  o  exemplar  mais  antigo  de  um  projecto  de  indicadores  locais  que  se  mantém  em  actividade,  com  actualizações anuais regulares 60

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Na base deste projecto esteve uma parceria entre a câmara de comércio local e uma associação sem  fins lucrativos, cujo mandato era o de promover a qualidade de vida urbana através de um forte  envolvimento cívico nas tarefas de aprofundar o conhecimento e defender causas relacionadas com  a  vida  da  comunidade.  A  motivação  original  deste  partenariado  foi,  assim,  a  de  dinamizar  a  consciencialização e a compreensão colectiva dos factores mais relevantes para a qualidade de vida  local.  O  painel  de  indicadores  então  criado  resultou  de  um  exercício  participativo  no  qual  um  grupo  de  alargado  de  cidadãos,  com  o  apoio  de  técnicos,  escolheu  as  medidas  a  usar  para  monitorizar as dinâmicas de transformação da qualidade de vida em Jacksonville. 

Desde  essa  fase  inicial  até  à  actualidade,  vários  ajustamentos  têm  vindo  a  ser  introduzidos  ao  painel  de  indicadores,  de modo  a  garantir  a  sua  consistência  e adequação.  Este  é  constituído  por  medidas  objectivas  –  cujos  dados  de  base  são  fornecidos  por  diversos  organismos  produtores  de  estatísticas  e  que,  noutros  casos,  são  obtidas  através  de  um  inquérito  telefónico  realizado  anualmente  –  mas  também  por  medidas  subjectivas  relacionadas  com  as  opiniões  dos  residentes  sobre  a  qualidade  de  vida  local,  igualmente  recolhidas  através  do  inquérito  telefónico.  A  análise  recai  sobre  a  evolução  temporal  de  cada  um  dos  indicadores  seleccionados,  tendo‐se  assumido  a  opção de não criar qualquer tipo de índice para sintetizar esta informação. 

Após  cinco  anos  de  monitorização  dos  indicadores,  foram  estabelecidas  metas  para  cada  um  destes.  Assim  o  relatório  de  1990  foi  o  primeiro  a  apresentar  uma  indicação  das  metas  que  se  desejava  atingir,  neste  caso,  para  um  horizonte  de  10  anos.  Uma  aposta  forte  deste  projecto  diz  respeito  à  difusão  dos  relatórios  de  avaliação  da  qualidade  de  vida,  designadamente  junto  dos  meios  de  comunicação  social.  Outros  grupos‐alvo  privilegiados  são  as  associações  locais  e  as  entidades  públicas  com  responsabilidades  ao  nível  do  planeamento.  Na  sequência  da  avaliação  anual da qualidade de vida são seleccionados aspectos a aprofundar através de estudos específicos.  Estes, por sua vez, constituem a base para a elaboração de recomendações para a formulação das  políticas  públicas  e,  de  um  modo  mais  genérico,  para  a  promoção  de  mudanças  positivas  para  a  vida  da  comunidade.  Tendo  constituído  um  modelo  para  o  desenvolvimento  de  muitos  outros  sistemas  de  indicadores  locais,  o  projecto  de  Jacksonville  destaca‐se  pela  forte  envolvimento  da  população e dos agentes locais na monitorização da qualidade de vida urbana. 

Na Europa, este movimento de indicadores locais tem vindo a assumir contornos algo diferentes.  No  que  diz  respeito  à  origem  das  iniciativas,  não  se  verificou  até  esta  altura  uma  tão  grande  espontaneidade  como  nos  EUA,  onde  fundações,  instituições  nacionais  e  internacionais  sem  fins  lucrativos,  associações  locais,  cidadãos  e  outros  grupos  de  agentes  se  têm  vindo  a  envolver  na  construção de abordagens próprias (Dluhy e Swartz, 2006; Innes e Booher, 2000). No caso europeu  muitos  dos  projectos  surgidos  têm  sido,  na  verdade,  estimulados  por  iniciativas  de  âmbito  internacional, que forneceram algum tipo de orientação estratégia e metodológica. O programa das  Cidades Saudáveis, dinamizado pela Organização Mundial de Saúde (WHO, 1997a), ou o projecto  “European  Common  Indicators”,  promovido  pela  Comissão  Europeia  (AI,  2003),  constituem  exemplos  de  iniciativas  que  ajudaram  a  formatar  sistemas  de  indicadores  tendo  em  vista  um  melhor diagnóstico da realidade urbana e uma visão mais partilhada dos desafios que se colocam  ao seu desenvolvimento. 

Nalguns países as próprias administrações nacionais fomentaram grandemente a monitorização de  indicadores  à  escala  local.  No  caso  concreto  do  Reino  Unido,  o  governo  –  na  sequência  de  um  trabalho conjunto envolvendo vários organismos da administração central e 90 autoridades locais –  publicou em 2002 um documento em que apresentava uma proposta de definição do conceito de  qualidade  de  vida,  assim  como  um  primeiro  conjunto  de  indicadores  que  as  administrações  das  cidades e os restantes actores poderiam usar para avaliar a qualidade de vida (AC, 2002). Em 2005,  este conjunto de indicadores foi revisto e actualizado de modo a constituir um “guião” consistente  que  abarcasse  aspectos  económicos,  sociais  e  ambientais  e  que  fosse  verdadeiramente  útil.  No  documento  em  que  se apresenta  este  novo  conjunto  de  medidas afirmava‐se: “we  believe that  they  [local  authorities  and  their  partners]  can  use  the  indicators  to  help  them  paint  a  picture  of  quality  of  life  issues locally; facilitate comparisons of performance between different areas; stimulate debate and raise public  awareness; inform local sustainable community strategies and local area agreements; review, justify and set  local objectives and priorities; change and assess and evaluate progress over time; and enhance partnership  working, shared ownership and joint action”(AC, 2005, p. 5).  Globalmente, o total de indicadores propostos aproximava‐se da meia centena, incluindo‐se neste  número, quer medidas de natureza objectiva, quer medidas relativas à opinião dos cidadãos. Em  qualquer dos casos a responsabilidade da recolha da informação de base era assumida pela própria  administração central. A partir destes impulsos iniciais, muitas cidades inglesas desenvolveram os  seus próprios sistemas de indicadores. Noutras, como por exemplo Bristol, o desenvolvimento de  indicadores  seguiu  esta  via  top‐down  (orientações  europeias  e  nacionais)  mas  esta  abordagem  foi  complementada  por  uma  outra  do  tipo  bottom‐up  através  da  qual  se  pretendeu  envolver  mais  directamente os agentes urbanos (McMahon, 2002). No caso concreto de Bristol, desde 2001 que a  respectiva  administração  local  promove  anualmente  inquéritos  à  população,  os  quais  constituem  um importante input para a divulgação de um conjunto muito alargado de indicadores61. Com base  num subconjunto destes parâmetros é analisada a evolução da qualidade de vida local e calculado  um índice sintético. No seu conjunto a informação reunida é utilizada para apoiar a actividade de  planeamento do município e de outros agentes urbanos. 

Muitos  outros  projectos  desenvolvidos  em  cidades  europeias  poderiam  ser  aqui  referenciados.  Aquilo que se verifica no entanto é que é escassa a literatura onde os exemplos concretos surgem  apresentados de forma detalhada sendo ainda mais raros os textos onde são avaliados quanto ao  seu processo de implementação e quanto aos resultados obtidos. A internet constitui, a este nível,  um  repositório  de  informação  mais  rico  do  que  a  bibliografia  convencional,  muito  embora  as  descrições dos projectos que são apresentadas nos sítios institucionais das cidades sejam, em regra,  muito breves e influenciadas por preocupações de marketing que marcam o estilo de comunicação  que aí é usado. 

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Informação sobre este projecto disponível em: http://www.bristol.gov.uk/ccm/content/Council-Democracy/Statistics- Census-Information/indicators-of-the-quality-of-life-in-bristol.en.

Destacam‐se, por isso, apenas mais dois exemplos de projectos, ambos concebidos e dinamizados  de forma bastante autónoma, no contexto dos respectivos países: Itália e Portugal.  

O  caso  da  cidade  de  Milão  é  demonstrativo  de  um  esforço  continuado  de  monitorização  da  qualidade  de  vida  urbana,  no  caso  concreto,  a  partir  de  um  conjunto  que  reúne  mais  de  100  indicadores de natureza objectiva62. Coordenado pelo economista Roberto Camagni, do Politécnico  de Milão, este projecto foi criado no âmbito da actividade da “MeglioMilano”, uma associação sem  fins  lucrativos,  fundada  em  1988,  com  o  objectivo  de  promover  a  investigação  e  de  organizar  projectos  inovadores  destinados  a  melhorar  a  qualidade  de  vida  nesta  metrópole  italiana.  O  observatório permanente, que desde há 20 anos recolhe e analisa a evolução das condições locais,  disponibiliza  relatórios  contendo  não  apenas  séries  temporais  para  os  indicadores  seleccionados,  mas também índices compósitos (temáticos e um índice global), com base nos quais a variação da  qualidade  de  vida  em  Milão  pode  ser  apreciada.  Em  cada  ano,  todos  os  indicadores  –  simples  e  agregados – são expressos em função do afastamento do seu valor face ao melhor valor registado  na  respectiva  série  temporal.  No  seu  conjunto,  esta  informação  visa  fornecer  um  retrato  muito  detalhado  da  situação  da  cidade,  mas  sobretudo  sobre  a  forma  como  as  condições  de  vida  e  de  bem‐estar têm vindo a evoluir.  

No  que  se  refere  ao  exemplo  português  da  cidade  do  Porto,  desde  2001,  que  o  respectivo  município,  com  a  assessoria  técnica  da  Faculdade  de  Economia  da  Universidade  do  Porto,  tem  vindo  a  desenvolver  um  projecto  de  monitorização  da  qualidade  de  vida  na  cidade  (Martins  e  Santos, 2008; Santos e Martins, 2007; Santos, Martins e Brito, 2007). Trata‐se de um instrumento de  apoio  à  actividade  interna  da  autarquia  nos  domínios  do  planeamento  e  gestão  urbana  que  pretende igualmente funcionar como uma plataforma de informação para o diálogo e concertação  com  os  diferentes  agentes urbanos  e  com  a  população,  contribuindo  para uma  maior  consciência  pública sobre os grandes desafios e problemas que a cidade enfrenta. Uma das componentes deste  projecto  diz  respeito  a  um  painel  de  indicadores  objectivos  repartidos  por  quatro  grandes  domínios:  “condições  ambientais”,  “condições  materiais  colectivas”,  “condições  económicas”  e  “sociedade”.  Para  cada  um  destes  conjuntos  foram  identificados  os  temas‐chave  a  analisar  e  os  correspondentes  indicadores  quantitativos  –  pela  equipa  multidisciplinar  do  projecto  em  colaboração  com  técnicos  dos  diferentes  serviços  municipais  –,  tendo‐se  chegado  a  uma  bateria  final  de  cerca  de  70.  Tendo  em  vista  a  recolha  periódica  dos  dados  estatísticos  de  base  foi  estabelecida  uma  rede  de  fornecedores,  na  qual  se  incluem  vários  sectores  da  própria  autarquia  mas também o Instituto Nacional de Estatística e diversas entidades públicas e privadas de âmbito  nacional, regional e local. 

Com  base  nesta  infra‐estrutura  de  informação  permanente  têm  vindo  a  ser  produzidos  diagnósticos  sobre  a  situação  da  cidade  do  Porto  face  a  cada  um  das  temáticas  consideradas  no 

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âmbito do modelo analítico estabelecido e uma leitura das respectivas trajectórias evolutivas63. Este  exercício  de  monitorização  –  em  que  não  são  adoptadas  medidas  de  síntese  –  tem  sido  acompanhado, sempre que possível, por um esforço de comparação do desempenho da metrópole  portuense  com  outras  unidades  territoriais,  concretamente,  com  o  conjunto  da  Aglomeração  Metropolitana  (NUT  III  correspondente  ao  Grande  Porto),  com  a  realidade  observada  à  escala  nacional e com valores de referência europeus, de modo a melhor poder apreender e caracterizar o  significado  das  mudanças.  Em  2010  foram  feitas  diversas  alterações  ao  modelo  de  análise  e  ao  sistema de indicadores, justificadas, quer com a emergência de novas preocupações em matéria de  qualidade  de  vida  urbana,  quer  com  a  disponibilidade  e  o  acesso  a  informação  de  base.  Uma  segunda componente deste sistema de monitorização prende‐se com a auscultação da opinião dos  residentes.  Esta  abordagem  subjectiva  é  desenvolvida  com  recurso  à  realização  de  inquéritos  aos  residentes na cidade, com base nos quais se torna possível conhecer directamente as opiniões e as  expectativas da população sobre a sua qualidade de vida individual e a sua experiência quotidiana  de viver no Porto. 

Revendo  globalmente  este  conjunto  de  experiências  relacionadas  com  o  desenvolvimento  de  indicadores locais, que leitura pode ser feita do seu impacto na concepção e acompanhamento das  políticas urbanas? 

Gahin  (2003),  na  sequência  de  uma  análise  baseada  numa  amostra  de  experiências  concretas,  fez  uma leitura daquela que tem vindo a ser a acção deste movimento nos EUA. Segundo este autor os  resultados  obtidos  podem  assumir  uma  natureza  muito  diversa,  variando  desde  ganhos  intangíveis até benefícios concretos e mensuráveis. (Figura 3.2). 

Figura 3.2 Resultados possíveis dos projectos de indicadores locais

Fonte: Gahin (2003, p. 663 )

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Com  base  na  investigação  empírica  realizada  constatou,  no  entanto,  que  os  resultados  mais  comuns são de tipo intangível e estão associados à capacidade de reforçar a consciência colectiva  em torno de conceitos relativamente abstractos, como o de qualidade de vida, de sustentabilidade  ou  de  comunidade  saudável,  bem  como  a  construção  de  redes  entre  os  actores  locais.  Menos  frequentes  são  os  resultados  obtidos  em  termos  da  capacidade  de  influenciar  a  concepção  das  políticas e o processo de tomada de decisão, designadamente junto dos responsáveis políticos.  Estas  mesmas  conclusões  ressaltam  no  trabalho  de  outros  autores  que  abordam  de  forma  mais  genérica o problema dos efeitos práticos da utilização deste tipo de indicadores relacionados com a  qualidade  de  vida  e  a  sustentabilidade,  (Brennin,  2007;  Mguni  e  Bacon,  2010).  É  pois  possível  detectar uma convergência de opiniões em torno da ideia de que a maioria dos projectos, estando a  ser bem sucedida no que toca à produção de dados de qualidade e à capacidade de mobilizar os  agentes locais, enfrenta grandes dificuldades na hora de converter a informação em conhecimento  e, posteriormente, em acção que possa melhorar realmente o bem‐estar das populações. 

Apesar  desta  leitura  genérica,  Scrivens  e  Iasiello  (2010)  fazem  notar  que,  apesar  de  tudo,  o  panorama  não  é  homogéneo  e  que  os  resultados  obtidos  dependem  de  vários  factores.  Estas  autoras  destacam  algumas  condições  que  consideram  particularmente  determinantes  do  sucesso  destas  iniciativas:  a  legitimidade  do  painel  de  indicadores,  a adequação da  informação aos fins a  que  se  destina  e,  finalmente,  os  incentivos  existentes.  Relativamente  à  primeira  condição  mencionada,  Scrivens  e  Iasiello  sublinham  que  quando  a  generalidade  dos  actores  locais  se  revê  nas  escolhas  feitas,  a  legitimidade  do  painel  de  indicadores  é  conseguida  e  a  sua  capacidade  de  influenciar  decisões  é,  consequentemente,  maior.  Esta  legitimidade  não  é,  contudo,  fácil  de  conseguir. Na verdade, como anteriormente foi visto, a selecção dos domínios e dos indicadores da  qualidade  constitui  um  exercício  eminentemente  subjectivo,  ainda  que  tecnicamente  possa  ser  apoiado  em  metodologias  muito  rigorosas  e  transparentes.  Neste  sentido,  a  via  dos  processos  colaborativos de definição do painel de indicadores, sendo por vezes muito exigente em termos de  implementação dada a diversidade de agentes – com interesses e valores por vezes muito distintos  –, apresenta‐se como uma boa solução para ajudar a promover essa legitimidade64. Já no que diz  respeito à adequação da informação aos fins a que se destina, o que está em causa é a capacidade  dos  indicadores  –  pela  sua  natureza,  grau  de  complexidade  e  quantidade  –  serem  eficientes  a  captar  a  atenção  e  a  ajudar  a  focar  a  análise  nos  aspectos  realmente  importantes.  Um  indicador  concebido para transmitir uma dada mensagem ao grande público será certamente distinto de um  outro pensado para medir o desempenho de determinado programa ou política pública posto em  prática. Em regra, a integração do painel de indicadores em sistemas mais abrangentes, em que a  informação  pode  ser  apresentada,  analisada  e  integrada  de  formas  alternativas  e  ajustadas  a  diferentes perfis de utilizadores, constitui um trunfo fundamental. Por último, quanto à existência  de incentivos, o que se verifica é que os indicadores conseguem ser mais influentes no processo de 

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Para um debate mais alargado das vantagens e as desvantagens deste tipo de abordagens bottom-up, por oposição à abordagem alternativa de tipo top-down, ver, por exemplo, Reed, Fraser e Dougill (2006).

decisão  quanto  é  exercida  uma  pressão  forte  para  a  acção  dos  diferentes  agentes  urbanos.  Estes  incentivos podem ser de vários tipos, desde campanhas de mobilização da atenção do público em  geral  para  certos  aspectos,  até  a  um  trabalho  de  proximidade  junto  de  determinados  grupos,