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setting, porque é o jornal, e não o público, que decide os temas que entram

No documento AS CARTAS DOS LEITORES NA IMPRENSA PORTUGUESA (páginas 130-133)

na secção das cartas (cfr. Wahl-Jorgensen, idem).

ericson e outros autores

verificaram, de igual forma, que as cartas dos leitores são mais “reactivas” que “proactivas”,

no sentido em que os leitores escrevem sobre acontecimentos

que estão na ordem do dia, não introduzindo novos tópicos na agenda

noticiosa (cfr. ericson et al., op. cit.: 339).

gregory e Hutchins, que levaram a cabo entrevistas aprofundadas com editores de um jornal local australiano, mostraram que estes referem uma série de regras formais (como o tamanho, a boa escrita ou a identificação) e, ainda, práticas informais para escolher as cartas, práticas essas que representam critérios partilhados, de senso comum, sendo “o reflexo de um processo de socialização da redacção, através do qual as normas organizacionais são interiorizadas através do tempo” (cfr. Gregory et al., 2004: 194). por exemplo, os autores mostram que há um consenso, na redacção, sobre o que constituem “boas cartas” ou “más cartas”.

ericson, baranek e Chan são talvez os autores que descrevem, de forma mais detalhada, as razões que estão na base da selecção e exclusão das cartas dos

leitores, numa pesquisa apoiada na observação, durante oito dias, do processo de escolha das cartas num jornal canadiano de grande tiragem (com gravação áudio das verbalizações do editor quanto às suas decisões de aceitação ou rejeição de uma carta), e, também, na análise quantitativa de um total de 368 cartas, publicadas e não publicadas.

os autores elencam, assim, uma série de motivos que levam à inclusão de uma carta nas páginas do jornal (cfr. ericson et al., op. cit.: 358-369): opinião razoável ou as cartas fazem um comentário justo e equilibrado sobre um determinado tema; noticiabilidade ou as cartas focam assuntos actuais (estabelecidos na agenda jornalística dos media), acrescentam novas informações/perspectivas ou são passíveis de gerar controvérsia; justiça e equilíbrio ou as cartas respondem a críticas anteriores, representam o ponto de vista da maioria ou então oferecem uma perspectiva alternativa sobre o assunto em questão; correcção ou os textos incluem queixas bem fundamentadas em relação a uma determinada notícia;

adequação ao formato ou as cartas são concisas e fáceis de ilustrar com uma

fotografia; humor ou os textos proporcionam entretenimento e são por isso atractivos para os outros leitores; estatuto social ou as cartas são assinadas por autores com um proeminente estatuto social; características do leitor e

preferências do editor ou o ponto de vista da carta é semelhante ao do editor, o

texto é escrito por um leitor habitual que caiba nas preferências do editor ou o leitor está directamente envolvido no assunto sobre o qual escreve.

as nossas conclusões, provenientes do estudo de caso do jornal Público, foram muito semelhantes às de ericson, baranek e Chan, no que diz respeito às razões de publicação de uma carta – verificámos que a identificação do leitor, o tamanho da carta, a actualidade do tema, a qualidade de escrita, a posição social do autor da carta, o facto de o texto ser enviado por correio electrónico ou as preferências expressas pela responsável pela selecção dos textos dos leitores eram os factores principais de inclusão de uma carta nas páginas do jornal (cfr. silva, 2007: 115-7). Concluímos, ainda, que se há regras que são explícitas para o leitor, como a obrigatoriedade de identificação, o mesmo não se poderá dizer de outros critérios, com um carácter não explícito, como as preferências em relação a determinadas temáticas e leitores e, também, a prioridade quase exclusiva dos textos enviados por email (cfr. ibidem: 98).

Karin Wahl-Jorgensen, professora na universidade de Cardiff e a autora que detém o estudo mais sistemático e completo sobre a temática das cartas na imprensa, conceptualizou as quatro principais regras de selecção dos textos dos leitores nos jornais, a partir da pesquisa qualitativa que realizou aquando do seu doutoramento, na universidade de stanford (cfr. Wahl-Jorgensen, 2002b; 1999b), regras estas que não estão escritas e “que são mantidas pelas práticas da redacção” (idem, 1999b: 2). a regra da relevância determina que o conteúdo das cartas deve corresponder a temas que já estejam previamente estabelecidos na agenda mediática; por isso, tal como atrás referimos, os textos dos leitores devem versar sobre acontecimentos actuais, relevantes em termos de noticiabilidade. a regra da brevidade implica, por outro lado, que as cartas devem ser curtas e concisas, para permitir que um maior número de indivíduos possa dar a sua opinião. num artigo do The Masthead, um editor aconselha os leitores a escreverem cartas com concisão e lembra, inclusive, uma citação de Mark Twain: “teria escrito uma carta mais breve, mas não tive tempo” (Hurley, 2005: 5).

por outro lado, a regra do entretenimento está relacionada com a preferência pelas cartas polémicas ou de interesse humano, cujo estilo “emocional” constitui uma mais-valia em termos de publicação. Por fim, a regra da autoridade não só diz respeito à correcção gramatical do texto, como também a um certo estilo de escrita que o leitor deve demonstrar e, ainda, ao seu domínio relativamente a um determinado assunto. esta regra, habitualmente negada pelos editores, pode então emergir de duas formas: preferência pela publicação de cartas de figuras da autoridade; e preferência por cartas que tenham altos níveis culturais de eloquência. Isto significa que nem todas as cartas têm igual hipótese de serem seleccionadas, uma vez que “é preciso capital cultural para escrever bem e desenvolver argumentos fortes” (Raeymaeckers, 2005: 205).

se existem critérios quetornam mais passível a publicação de uma carta, há ainda motivos que podem ditar a exclusão de um texto do leitor, também eles comuns a vários jornais. As cartas anónimas ou não identificadas (cfr. Kapoor

et al., 1992: 6; Hill, 1981: 385; renfro, 1979: 825; Wahl-Jorgensen, 2007: 68;

silva, 2007: 81 e 82; gregory et al., 2004: 193), ilegíveis ou incoerentes (cfr. Kapoor et al., op. cit.; renfro, op. cit.; Wahl-Jorgensen, op. cit.; gregory et al.,

op. cit.), difamatórias (cfr. Hill, op. cit.; renfro, op. cit.; Wahl-Jorgensen, 2004:

5; idem, 2007: 68; gregory et al., op. cit.; raeymaeckers, 2005: 209), cartas abertas ou que aparentem fazer parte de uma campanha organizada ou que sejam enviadas a outros meios de comunicação social (cfr. renfro, op. cit.; cfr. Wahl- Jorgensen, 2007: 68; silva, op. cit.), entre outros motivos.

ericson e outros autores dividem estes e outros critérios de exclusão das cartas em cinco categorias: a inadequação ao formato ou cartas incompreensíveis, mal escritas, irrelevantes, demasiado extensas, emotivas, abstractas ou teóricas; a

falta de noticiabilidade ou cartas que não acrescentam nada de novo ao assunto

em questão, não tratam de temas actuais, são escritas por um leitor cujo texto tenha sido publicado recentemente; a falta de valores-notícia ou cartas que são falsas, injustas ou que contenham afirmações difamatórias; a inadequação

às políticas do jornal ou cartas anónimas, que são enviadas a outros meios

de comunicação social, que foram publicadas noutros jornais, que elogiam demasiado a publicação ou que criticam o jornal concorrente; as características

do leitor e as preferências do editor ou cartas que são escritas por leitores habituais

caracterizados pelo editor como “loucos” ou “maníacos” (v. Capítulo 3)13.

No documento AS CARTAS DOS LEITORES NA IMPRENSA PORTUGUESA (páginas 130-133)