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PARTE I ENQUADRAMENTO TEÓRICO/REVISÃO DE LITERATURA 2 CAPÍTULO II SOCIEDADE EM REDE

2.2 Sociedade da Informação e do Conhecimento (SIC) ou Sociedade em Rede?

2.2.4 Tecnologias da informação e da Comunicação TIC

Na sociedade da informação, do conhecimento ou em rede, as TIC estão sujeitas a diferentes propósitos e contextos (e.g., Scherer, Rohatgi & Hatlevik, 2017). Vários estudos sugerem que as TIC estão se tornando uma dimensão central nas várias etapas do ciclo de vida das pessoas e sua adoção e seu impacto variam de acordo com características individuais e com sua fase de desenvolvimento (e.g., Carvalho, Francisco & Relvas, 2015).

O pensamento romântico de que as TIC são universais e seus resultados são aplicáveis a toda a sociedade como fator de desenvolvimento regional ou promoção do bem-estar social deve ser visto com ressalvas, porque existem desigualdades entre os países e pessoas que condicionam, com regras próprias ao seu contexto, o aprendizado, a aplicabilidade e a divulgação das TIC. Assim, pode-se dizer que não há certeza absoluta de que as TIC (por si só) sejam fatores de justiça social e/ou possam diluir as diferenças sociais e econômicas entre pessoas ou países, mas pode-se afirmar que o saber usar as TIC é antes de tudo um fator regulador para a existência dessas diferenças e da justiça social (e.g., Montargil, 2007).

Nesse sentido, mais importante do que definir diferenças regulatórias e padrão de uso das TIC, como, por exemplo, não usuários, usuários intermediários ou avançados, é necessário entender o contexto social, econômico e político das pessoas e dos países, e principalmente como as TIC afetam os seus

dinâmicos e complexos comportamentos no dia a dia para se viver na sociedade em rede (e.g., Bagchi, Udo, Kirs & Choden, 2015; Carvalho, Francisco & Relvas, 2015). “Calhoun, Teng e Myun (2002) apontaram que, embora as TIC sejam isentas de cultura, a tecnologia que afeta o comportamento humano é influenciada pela cultura.”3 (Bagchi, Udo, Kirs & Choden, 2015, p.78, tradução nossa). O comportamento das pessoas, ou seja, a forma como o seu dia decorre, o que fazem e como fazem “tem mais a ver com os seus hábitos e da sociedade em que vivem do que com o estado da tecnologia. [...] Em regra geral, a tecnologia é disponibilizada antes de a sociedade estar motivada para aplicá-la em grande escala” (Picoito & Almeida, 2007, p. 156).

Em virtude da acelerada evolução das TIC, sua disponibilização tem sido feita em grande escala por meio de redes não controláveis a diversos segmentos da sociedade, e tem se tornado uma realidade que traz grandes preocupações na sociedade atual, em especial com implicações de natureza ética advindas de seu uso incorreto. Por exemplo, quando são usadas para fazer pirataria, explorar a pornografia ou novas formas de terrorismo ou mesmo utilizações abusivas, quer por parte de empresas privadas ou públicas, na invasão de nossa privacidade, por meio do acesso, disponibilização ou venda de nossos dados pessoais, dentre outras (e.g., Coelho, 2007; Gomes, 2007; Dias, 2007). Depreende- se que “a dimensão ética dos grandes problemas humanos não se alterou substancialmente com as TIC, apenas mudou a forma de a equacionar” (Gomes, 2007, p. 678-679).

Reconhece-se que em simultâneo ao lado maléfico do uso da tecnologia, o seu uso dispõe de ingredientes para fazer o bem, para conquistar benefícios. Entre esses “há um empowerment dos cidadãos para acompanharem e intervirem por meio de via pública ou comunitária contrapondo-se aos centros de poder”, ou a evolução em termos de: saúde, educação, fiscal, transações comerciais, dentre outras (Gomes, 2007, p. 678-679). Com tecnologia também será possível obter proteção da nossa identidade real, nos induzindo a nos sentir sempre seguros e responsáveis como cidadãos nos planos financeiro, fiscal ou jurídico (e.g., Veríssimo, 2007).

Resume-se que a tecnologia são instrumentos para adoção e aplicação das TIC e que por si só não produzem o bem ou mal, e sim são as opções do comportamento humano que as tornam boas ou más para a sociedade atual (e.g., Coelho, 2007; Gomes, 2007; Dias, 2007).

Espera-se que nesse jogo entre o bem e o mal, entre vícios e virtudes, a humanidade posa criar e usufruir da tecnologia para exercitar “de modo a que o bem da humanidade possa levar a melhor” (Moreira, 2007, p. 608).

2.2.5 Globalização

Globalização, sociedade em rede ou novo paradigma da comunicação? Para alguns autores, o conjunto de mudanças experimentadas em todos os níveis, do econômico ao político, do social ao cultural, é chamado de globalização; para outros, de sociedade em rede ou novo paradigma da comunicação. Não importa o nome, o que se tem verificado é uma “poderosa mudança que tem provocado uma alteração no contexto em que se desenvolvem as atividades humanas”, em especial, por permitirem

3“Calhoun, Teng, and Myun (2002) have pointed out that while ICT is culture free, the technology which affects

criar relacionamentos cada vez menos limitados a um espaço temporal e físico geográfico4 (Caraça, 2007, p. 150).

Destaca-se, entre muitas mudanças de contexto, a que chamamos de comércio eletrônico5, que, em função do aumento da acessibilidade, da literacia digital e dos processos de segurança digital, se tornou um dos vetores emblemáticos da globalização (e.g., Coelho, 2007).

Além disso, nesse contexto, apenas o aumento da acessibilidade e da literacia digital não são suficientes para a sobrevivência dos indivíduos na sociedade globalizada. É necessário que esses conquistem (“lutem”) o seu lugar no mercado, demostrando o seu desempenho por meio de um conjunto de saberes, que não apenas os tecnológicos, mas, também, os jurídicos, organizacionais, de marketing, etc., sempre com foco na conquista da rentabilidade das empresas (e.g., Coelho, 2007; Caraça, 2007).

Nesse império globalizado do século XXI, a conquista de um lugar no mercado está relacionada com a mudança de paradigma dos direitos adquiridos do trabalhador, em décadas anteriores, que foram sendo perdidos ao longo dos meados do século XX. Por isso, o indivíduo tem sempre uma necessidade de negociar, a cada trabalho, a permanência de direitos (e.g., Caraça, 2007).

Na sociedade globalizada, o indivíduo só tem valor se produzir ou tiver condições financeiras de consumir. Ou seja, o indivíduo tem que ser rentável, caso contrário, não mais interessa para o mundo global, em rede, tornando-se dispensável, descartável ou um peso para o império globalizado (e.g., Caraça, 2007; Zorrinho, 2007).

Em geral, uma profunda divisão social entre aqueles que obtêm conhecimento e habilidades valorizados na economia mundial global e aqueles que estão em desvantagem a esse respeito é uma característica fundamental da globalização e sua contribuição para a tendência de crescente desigualdade de renda dentro e entre países. Na sociedade de rede global, conhecimento e comunicação são recursos fundamentais para o desenvolvimento.6

Para minimizar esses impactos da substituição dos indivíduos na sociedade globalizada e salvaguardar a dimensão ética e humanista, o modelo socioeconômico da sociedade em rede deverá ser composto, em um de seus pilares, pela disseminação da informação e pela promoção do conhecimento, e sua viabilização só ocorrerá se grande parte das pessoas tiverem a oportunidade de ter bom nível de qualificação, competência e suporte tecnológicos modernos. Sabe-se que esse processo de mudança de contexto não será fácil e nem imediato, e nem se dará apenas pela vontade política ou das escolhas dos agentes econômicos e sociais, mas, sim, pela cultura da motivação para o uso responsável pelos indivíduos e pela própria sociedade (e.g., Zorrinho, 2007).

4 Disponível em: https://www.soas.ac.uk/cedep-demos/000_P523_MKD_K3637-Demo/unit1/page_10.htm 5“O comércio eletrônico é a realização de toda a cadeia de valor dos processos de negócio num ambiente eletrônico, por meio da aplicação intensa das tecnologias de comunicação e de informação, atendendo aos objetivos de negócio. Os processos podem ser realizados de forma completa ou parcial, incluindo as transações negócio-a-negócio, negócio-a-consumidor e intra-organizacional, numa infraestrutura predominantemente pública de fácil e livre acesso e baixo custo” (Albertin, 2000, p. 95).