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91tividade e introdução de novas tecnologias Sua reação assumiu a seguinte feição: aceleraram a

No documento As ambiguidades da doutrina (páginas 93-95)

terceirização de atividades, abandonaram linhas de produtos, fecharam plantas, racionalizaram a produção, importaram máquinas e equipamentos, buscaram parcerias, fusões ou transferência de controle acionário, e reduziram custos, sobretudo os de mão-de-obra. (piquet: 2004, 146)

No caso brasileiro, muito das grandes empresas verticalmente integradas, diante do novo quadro concorrencial que se implanta no país, abandonam as a t ividades complementares ao processo produtivo (tais como transporte , segurança, limpeza e até mesmo atividades consideradas “no- bres”, como planejamento e desenhos) para comprá-las no mercado a menor preço. Assim, muitas atividades passam a ser exercidas por pequenos empresários, trabalhadores autônomos, coopera- tivas de produção etc., o que transforma um certo número de postos de trabalho de empregos formais em ocupações, que deixam de oferecer as garantias e os direitos habituais. A expressão pre- carização do trabalho descreve adequadamente essa situação. O declínio do emprego formal (…) indica que segmentos de mão-de-obra antes pertencentes aos quadros permanentes das empresas passam para um reservatório mal-pago e mal-organizado de trabalhadores, com as correspond- HQWHVFRQVHTrQFLDVQHJDWLYDVVREUHDTXDOLGDGHGHYLGD piquet: 2004, 151)

Novais e Mello discutem o mesmo processo por outro viés, apontando o crescimento e a divisão da classe dominante brasileira em vários estratos, tais como a classe política, os altos funcionários do poder judiciário, da segurança pública, das universidades, das Forças Armadas HWFRVGLULJHQWHVGHPXOWLQDFLRQDLVVHXVH[HFXWLYRVHJHUHQWHVRVIXQFLRQiULRVTXDOL¿FDGRV GRVLVWHPD¿QDQFHLURRVPpGLRVHSHTXHQRVHPSUHViULRVGDLQG~VWULDHGRVHWRUGHVHUYLoRVH seus técnicos; e ainda um agrupamento voltado à prestação de serviços simbólicos (bourdieu: 2008), que os autores explicam tratar-se de:

XPDFDPDGDGHSUR¿VVLRQDLVTXHSUHVWDPVHUYLoRVFRPJUDQGHSURYHLWR¿QDQFHLURDRFRUSRHV- tressado e à alma talvez atormentada dos endinheirados e de suas famílias: psicanalistas, psicól- ogos, astrólogos, fonoaudiólogos, acupuntores, pilotos de jatinhos e helicópteros, cardiologistas, prostitutas de luxo, mesmo que disfarçadas de modelo ou miss, cirurgiões plásticos, promotoras de festas, psiquiatras, banqueteiras, videntes, parapsicólogos, proprietários de prósperas academias de ginástica, de dança ou de balé ou de natação ou de tênis, donos de colégios particulares para a elite, ou de universidades empresariais, ou de cursos de línguas, especialmente a inglesa, gas- WURHQWHURORJLVWDV¿JXULQLVWDVHVWHWLFLVWDVSURIHVVRUHVSDUWLFXODUHVTXHVRFRUUHPDLQGROrQFLDGRV ¿OKRVJHULDWUDVRUWRGHQWLVWDVFDEHOHLUHLURVHOHJDQWHVDGYRJDGRVHVSHFLDOLVWDVHPGHVTXLWHVHGL- vórcios ou em tributação, secretárias obsequiosas, massagistas, decoradores, endocrinologistas, alfaiates elegantes, donos de spas, psicopedagogas, dermatologistas e tutti quanti. (novais e mello:

1998, 629)

Este é o quadro no qual se encaixam muitas das práticas do design que se tornaram fre- quentes a partir da década de 80, por meio da disseminação de projetos voltados à produção GH³REMHWRVGHHVWLOR´GHVWLQDGRVjVFODVVHVGRPLQDQWHVTXHHQWmRVR¿VWLFDYDPVXDVRSo}HVGH consumo, e que buscavam demarcar sua identidade de classe por essa via, lançando mão do de- sign como um mecanismo de distinção social. Este movimento foi caracterizado pela crescente

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valorização de formas artesanais de produção, pelo crescimento da ideia de “design autoral” e pelas críticas ao racionalismo modernista e à estética funcionalista, a exemplo do artigo O mundo que nos rodeia e atinge, publicado em 1987, na Revista Casa Vogue.

No referido artigo, a jornalista Maria Helena Estrada discute as contradições entre o as- sim chamado design universal e as particularidades culturais de cada povo ou localidade. Para a autora, estariam coexistindo, e sendo muitas vezes confundidos, dois diferentes conjuntos de problemas, merecedores de distintas abordagens de projeto: uma global, de grandes esca- las e largas séries, e outra individual, ligada ao campo das roupas e do mobiliário. Em meio à discussão, Maria Helena Estrada ataca a validade das fórmulas universalizantes para situações locais e/ou individuais, tecendo severas críticas à Escola Superior da Forma de Ulm:

Uma consequência desastrosa desse pensar [padronizador] já aconteceu no Brasil, onde uma rígi- da estrutura de pensamento, uma metodologia rigorosa e abstrata foi ‘importada’ e proclamada como única verdade universal e possível, capaz de trazer o Brasil à modernidade. Os pressupostos da Escola de Ulm tiveram o efeito de uma camisa-de-força e, no dizer de Andrea Branzi, o design brasileiro perdeu a sua riqueza expressiva, bloqueada na busca de uma improvável e inútil ordem. (revista Casa vogue: maio-junho/1987, p. 46)

No que diz respeito ao design autoral, Leon e Montore relatam que “objetos que eram

sobretudo domésticos, em pequena escala, começaram a ser vendidos em galerias de arte e design a preços altos, e destinados às classes mais privilegiadas” (leone montore: 2008, 81). São expoentes deste período os irmãos Campana, Etel Carmona, o estúdio de Fábio Falange e *LRUJLR*LRUJLGHGLFDGRVDGHVHQKDUHSURGX]LUSHTXHQDVVpULHVGHPyYHLVHREMHWRVVR¿VWLFD- dos, ditos “conceituais” ou ligados ao “design-arte”.

O caso dos designers Fernando e Humberto Campana – consagrados pelo Museu de Arte Moderna de Nova Iorque e também por diversas outras instituições e publicações nacionais e HVWUDQJHLUDV±pH[HPSODUGHVWDWUDQVIRUPDomR$WXDQWHVGHVGH¿QVGRVDQRVRV,UPmRV Campana, como são conhecidos, iniciaram suas atividades de maneira despretensiosa, fabri- FDQGRREMHWRVGHFRUDWLYRVQXPDSHTXHQDR¿FLQDHP6mR3DXORTXHHUDPSURMHWDGRVSURGX]L- GRVHGLVWULEXtGRVSRUHOHVPHVPRVGHYLGRjVXDSRXFDFDSDFLGDGHGH¿QDQFLDPHQWRQDTXHOH momento, e devido à resistência de outros fabricantes em viabilizar tiragens mais competitivas de seus produtos.

Segundo relatam em suas Cartas a um jovem designer (2009), as mudanças aconteceram a partir da intervenção de agentes consagradores do campo artístico, em função do projeto, desenvolvido por eles, de estranhas cadeiras metálicas (posterior-mente batizadas de Des- Confortáveis), cujo desenho tirava partido das falhas típicas dos processos de usinagem. As ca- deiras teriam chamado a atenção de ninguém menos que Pietro Maria Bardi, o diretor do masp, SDUDTXHPRV&DPSDQDDVPRVWUDUDPD¿PGHREWHUDYDOSRVLWLYR%DUGLWHULD¿FDGRLQWHUHV- sado em expô-las na loja do museu, mas os Campana teriam declinado do convite convencidos

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