• Nenhum resultado encontrado

Tráfico de seres humanos frente à legislação indiana

3.5. Citação da legislação penal estrangeira

3.5.9. Tráfico de seres humanos frente à legislação indiana

Existem dois a três milhões de prostitutas na Índia, sendo que uma parte significativa entrou no comércio sexual sem desejar. Um estudo realizado no ano 2008, em bordéis indianos, aponta que, cerca de metade das prostitutas começou a trabalhar coagida. Muitas começaram escravas e acabaram por aceitar seu destino por não saberem fazer mais nada e, ainda, estigmatizadas demais para conseguirem emprego em outra área.217

Nos países em que as sociedades são mais repressoras e sexualmente conservadoras, como a Índia, Paquistão e Irã, existem números altos de prostituição forçada. Tais mulheres são traficadas do Nepal, de Bangladesh ou de aldeias pobres da Índia. Há um acordo implícito para que as moças de classe alta mantenham sua virgindade, enquanto os jovens encontrarão satisfação sexual nos bordéis, que funcionam com garotas escravas, pobres e camponesas de baixa casta, com pouca educação.218

De todas as meninas que sofrem nos bordéis da Índia, provavelmente as que estão em pior situação são as nascidas no Nepal. Nesse contexto, até vinte mil nepalesas são vendidas a cada ano para serem exploradas sexualmente nesse país.219

A fronteira entre Índia e Nepal estende-se por 1.850 quilômetros de comprimento, através de remotos bosques, planícies e montanhas. No entanto, tanto os indianos quanto os nepaleses possuem livre trânsito, em razão do Acordo de Fronteira Aberta firmado em 1950, para facilitar o comércio entre esses países. Essa livre circulação também simplifica o transporte das vítimas pelos traficantes. Desse modo, muitos debates sobre a luta contra o tráfico centram-se em detê-lo na fronteira, sustentando a prática de controles fronteiriços mais rigorosos. Para outros,

217Nesse sentido: KRISTOF, Nicolas D.; WUDUNN, Sheryl. Metade do Céu: transformando a opressão em oportunidades para as mulheres do mundo todo. Osasco, São Paulo: Novo Século

Editora, 2011, p. 31-32.

218Nesse sentido:Idem. Ibidem, p.32.

cartazes de sensibilização e um diálogo com as mulheres, antes de cruzarem a fronteira, seriam mais eficazes na redução do tráfico.220

Desse modo, a Índia criminaliza a maioria das formas de tráfico para fins de exploração sexual, por meio do Código Penal Indiano (IPC) e The Immoral Traffic

(Prevention) ACT de 1956. No entanto, segundo o Trafficking Human Report-

2012221, as penalidades prescritas ainda não são suficientemente rigorosas.

No Indian Penal Code (IPC), seu artigo 366 (A)222, criminaliza o rapto, imputando o delito à pessoa que rapte ou abduza mulher com o intuito de forçá-la a se casar, ou que tenha conhecimento de que há probabilidade de ela ser forçada a se casar contra sua vontade, ou seja coagida ou seduzida a manter relações sexuais ilícitas, punindo-se com pena privativa de liberdade de até 10 (dez) anos e sujeição à multa.

Ainda, pune-se, conforme previsto no parágrafo anterior, a pessoa que, por meio de intimidação ou abuso de autoridade ou outro método de coerção, induza mulher a sair de um local para outro, com o intuito de forçá-la, ou que tenha conhecimento de que ela poderá ser forçada ou seduzida a manter relações sexuais ilícitas.

O artigo 372,223 criminaliza a venda de menores com o propósito de prostituição, punindo com pena privativa de liberdade de até 10 (dez) anos e

220Nesse sentido:KARA, 2010, p.109. Tradução livre realizada pela autora.

221Trafficking in Persons Report - 2012. Disponível em: <http://www.state.gov/j/tip/rls/tiprpt/2012/>.

Acesso em: 19/06/2012.

222

“Section 366. Kidnapping, abducting or inducing woman to compel her marriage, etc. Whoever kidnaps or abducts any woman with intent that she may be compelled, or knowing it to be likely that she will be compelled, to marry any person against her will, or in order that she may be forced or seduced to illicit intercourse, or knowing it to be likely that she will be forced or seduced to illicit intercourse shall be punished with imprisonment of either description for a term which may extend to ten years, and shall also be liable to fine; 1[and whoever, by means of criminal intimidation as defined in this Code or of abuse of authority or any other method of compulsion, induces any woman to go from any place with intent that she may be, or knowing that it is likely she will be, forced or seduced to illicit intercourse with another person shall be punished as aforesaid”. Disponível em: <http://www.vakilno1.com/bareacts/indianpenalcode/S376A.htm>. Acesso em: 15/05/2012.

223“Section 372. Selling minor for purposes of prostitution. Whoever sells, lets to hire, or otherwise

disposes of any [person under the age of eighteen years with intent that such person shall at any age be employed or used for the purpose of prostitution or illicit intercourse with any person or for any unlawful and immoral purpose, or knowing it to be likely that such person will at any age be] employed or used for any such purpose, shall be punished with imprisonment of either description for a term which may extend to ten years, and shall be liable to fine.

When a female under the age of eighteen years sold, let for hire, or otherwise disposed of to a prostitute or to any person who keeps or manages a brothel, the person so disposing of such female shall, until the contrary is proved, be presumed to have disposed of her with the intent that she shall be used for the purpose of prostitution.

sujeição à multa a pessoa que vender, permitir a contratação ou que de alguma maneira disponha de menor de dezoito anos com o intento de prostituição ou relação sexual ilícita ou para qualquer propósito ilegal ou imoral, ou que tenha conhecimento da probabilidade de que tal pessoa seja, em qualquer idade, contratada ou utilizada para tais intenções.

Manter “relação sexual ilícita” significa a relação sexual entre pessoas não unidas pelo casamento ou por qualquer união ou ligação que, embora não constitua casamento, seja reconhecida por leis pessoais ou costumes de comunidade à qual pertençam, ou quando pertençam a diferentes comunidades, a ambas comunidades, assim constituindo uma relação quase-matrimonial.

Quando uma mulher com idade inferior a dezoito anos é vendida, contratada ou de alguma maneira colocada à disposição para o exercício da prostituição, ou seja, mantida em um bordel, aquele que a mantém à disposição, presume-se com o intuito de utilizá-la para o propósito de prostituição, até que se prove o contrário.

O The Immoral Traffic (Prevention) ACT, 1956224 surgiu como consequência da Convenção para Repressão do Tráfico de Mulheres e Crianças, da qual a Índia é signatária, com o objetivo de prevenir o tráfico.

For the purposes of this section "illicit intercourse" means sexual intercourse between persons not united by marriage or by any union or tie which, though not amounting to a marriage, is recognised by the personal law or custom of the community to which they belong or, where they belong to different communities, of both such communities, as constituting between them a quasi -marital relation”. Disponível em: <http://www.vakilno1.com/bareacts/indianpenalcode/S372.htm>. Acesso em: 15/05/2012.

224

“5. Procuring, inducing or taking person for the sake of prostitution.

(1) Any person who—(a) procures or attempts to procure a person whether with or without his/her consent, for the purpose of prostitution; or (b) induces a person to go from any place, with the intent that he/she may for the purpose of prostitution become the inmate of, or frequent, a brothel; or

(c) takes or attempts to take a person or causes a person to be taken, from one place to another with a view to his/her carrying on, or being brought up to carry on prostitution ; or (d) causes or induces a person to carry on prostitution; shall be punishable on conviction with rigorous imprisonment for a term of not less than three years and not more than seven years and also with fine which may extend to two thousand rupees, and if any offence under this sub-section is committed against the will of any person, the punishment of imprisonment for a term of seven years shall extend to imprisonment for a term of fourteen years:

Provided that if the person in respect of whom an offence committed under this subsection, is a child, the punishment provided under this sub-section shall extend to rigorous imprisonment for a term of not less than seven years but may extend to life.

5A. Whoever recruits, transports, transfers, harbours, or receives a person forthe purpose of prostitution by means of,— (a) threat or use of force or coercion, abduction, fraud, deception; or (b) abuse of power or a position of vulnerability; or (c) giving or receiving of payments or benefits to achieve the consent of such person having control over another person, commits the offence of trafficking in persons.

5B. (1) Any person who commits trafficking in persons shall be punishable on first conviction with rigorous imprisonment for a term which shall not be less than seven years and in the event of a second or subsequent conviction with imprisonment for life.

De modo que, o seu artigo 5 prevê punição com pena de prisão de 3 (três) anos a 7 (sete) anos e multa de até duas mil rúpias indianas, para aquele que: a) obtenha ou tente obter, induza ou se aproprie de uma pessoa para fins de prostituição, independentemente do consentimento desta; ou (b) induza a pessoa a sair de um lugar, com o intuito de que ela possa, tornar-se prisioneira ou frequentadora de bordel, para fins de prostituição; ou (c) leve ou tente levar a pessoa, ou cause o arrebatamento dessa pessoa de um lugar para outro com o intuito de que exerça a prostituição; ou (d) leve ou induza a pessoa a exercer prostituição. Caso alguma ofensa dessa subseção for cometida contra a vontade do indivíduo, a pena de encarceramento deverá ser estendida de 7 (sete) a 14 (quatorze) anos. Caso a vítima seja uma criança, a pena mínima será de 7 (sete) anos, podendo se estender à prisão perpétua.

No artigo 5A, quem recrutar, transportar, transferir, acolher ou receber uma pessoa com a intenção de explorá-la sexualmente, por meio de (a) ameaça, uso de força, coerção, rapto, fraude, engano; ou (b) abuso de poder ou de posição de vulnerabilidade; ou (c) pagamento ou recebimento de dinheiro ou benefícios para obter o consentimento da pessoa em questão, comete o delito de tráfico de pessoas.

Na hipótese de primeira condenação no crime de tráfico de pessoas, a pena será fixada em 7 (sete) anos e, no caso de uma segunda ou subsequente condenação, o encarceramento será perpétuo, sendo que a tentativa e o incentivo ao tráfico de pessoas deverão ser punidos igualmente, conforme dispõe o artigo 5B.

Nos termos do artigo 5C, qualquer pessoa, que visite ou for flagrada em um bordel com o propósito de exploração sexual de vítima de tráfico de pessoas, incorrerá, em primeira condenação, na pena de prisão de 3 (três) meses ou multa de até vinte mil rúpias indianas ou ambas. No caso de uma segunda ou subsequente condenação, a pena poderá chegar a 6 (seis) meses e multa de cinquenta mil rúpias indianas.

committed such trafficking in persons and shall be punishable with the punishment hereinbefore described.

5C. Any person who visits or is found in a brothel for the purpose of sexual exploitation of any victim of trafficking in persons shall on first conviction be punishable with imprisonment for a term which may extend to three months or with fine which may extend to twenty thousand rupees or with both and in the event of a second or subsequent conviction with imprisonment for a term which may extend to six months and shall also be liable to fine which may extend to fifty thousand rupees.” Disponível em: <http://www.ncpcr.gov.in/Acts/Immoral_Traffic_Prevention_Act_(ITPA)_1956.pdf>. Acesso em: 15/05/2012. Tradução livre realizada pela autora.

3.6. Análise pontual do ordenamento jurídico brasileiro: considerações iniciais

Outline

Documentos relacionados