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Tradução e adaptação do University Student Depression Inventory (USDI)

PARTE II – ESTUDO EMPÍRICO

CAPÍTULO 5 – ESTUDO PRELIMINAR: PREPARAÇÃO DOS INSTRUMENTOS

2. Tradução e adaptação do University Student Depression Inventory (USDI)

Os dados existentes indicam que, embora a depressão nos estudantes seja qualitativamente semelhante à depressão da população em geral, há algumas diferenças, nomeadamente quanto à manifestação dos sintomas. Por exemplo, a depressão nos estudantes manifesta-se mais a nível cognitivo, através de sintomas como falta de concentração, pessimismo e auto-culpabilização do que na população em geral (Cox et al., 1999). Pelo contrário, alguns dos principais sintomas da depressão na população geral, como as alterações no apetite e no sono, não se revelam indicadores úteis de depressão nos estudantes, pois neste caso são muitas vezes causados por outros factores, tais como os horários académicos (Kitamura et al., 2004; Smith et al., 2001).

Por conseguinte, os instrumentos tradicionais de avaliação da depressão como o

Beck Depression Inventory-II (Beck et al., 1996) ou a Escala de Zung (Zung & Durham,

1965), apesar das suas excelentes qualidades psicométricas, poderão não ser os mais indicados para avaliar a depressão no estudante, uma vez que foram concebidos para populações clínicas.

O University Student Depression Inventory (USDI; Khawaja & Bryden, 2006) foi desenvolvido na Queensland University of Technology (Brisbane) na Austrália, com o intuito de medir adequadamente a depressão no estudante do ensino superior, apresentando, ao mesmo tempo, boas características ao nível de validade e fidelidade. Para assegurar que esses objectivos eram cumpridos, os estudantes do ensino superior estiveram envolvidos no processo de construção desta medida, tendo sugerido itens que pudesse traduzir a depressão do estudante. Os itens foram depois sujeitos a uma

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examinação e selecção criteriosa por parte de profissionais que trabalham em serviços de apoio psicológico ao estudante no ensino superior.

Seguidamente, apresenta-se o estudo das características psicométricas do USDI, tendo em vista a adaptação deste instrumento para população portuguesa.

2.1. Método

Participantes

A amostra foi constituída por 321 estudantes de várias instituições do ensino superior, com idades compreendidas entre os 18 e os 44 anos, sendo composta pelos mesmos sujeitos que integraram o estudo de tradução e adaptação do BHM-20.

Descrição do instrumento

O University Student Depression Inventory (Khawaja & Bryden, 2006) é um questionário de auto-resposta que visa avaliar a frequência com que vários sintomas depressivos foram experienciados nas últimas duas semanas pelos estudantes do ensino superior. É composto por 30 itens que se agrupam em três sub-escalas: Letargia (9 itens); Cognitivo-Emocional (14 itens) e Motivação Académica (7 itens). A resposta é dada numa escala tipo Likert de 5 pontos desde 1 (nunca) a 5 (quase sempre). A nota final resulta da soma dos valores brutos de todos os itens, ou seja, das três sub-escalas, não havendo itens invertidos. Quanto mais elevada a pontuação, mais deprimido está o aluno. A versão portuguesa deste instrumento intitula-se Inventário da Depressão em Estudantes Universitários ou IDEU (Santos, Pereira, & Veiga, 2008d).

Procedimento de tradução e adaptação

O procedimento seguido foi idêntico ao do estudo de tradução e adaptação do BHM-20, tendo incluído a tradução e retroversão dos itens, a comparação da retroversão com a versão original, a realização de alguns reajustes e a aplicação a uma pequena amostra, de 20 sujeitos, com o método da reflexão falada. Depois de mais alguns melhoramentos, a versão portuguesa final foi aplicada à amostra de 321 estudantes.

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2.2. Resultados

Em primeiro lugar, comparam-se as médias e desvios-padrão obtidos com as duas versões do questionário (Tabela 9).

Tabela 9 Comparação das médias e desvios-padrão da amostra portuguesa com a amostra australiana (versão original)

Amostra portuguesa (n=321) Amostra australiana (n=308)

Escala M DP M DP

Total 66.57 17.37 71.12 19.26

Cognitivo-emocional 26.86 9.25 32.03 10.55

Letargia 23.74 6.10 22.67 6.13

Motivação Académ. 15.93 4.70 16.42 5.21

Verifica-se que os valores médios obtidos na versão portuguesa são inferiores aos obtidos na versão original, com excepção para a escala de Letargia.

Fidelidade

Avaliou-se a fidelidade do USDI com recurso à consistência interna (alfa de Cronbach). Os resultados estão patentes na Tabela 10.

Tabela 10 Comparação da consistência interna obtida na versão portuguesa e na versão

original

Amostra portuguesa (n=321) Amostra australiana (n=308)

Escala Alfa de Cronbach Alfa de Cronbach

Total .94 .95

Cognitivo-emocional .92 ..92

Letargia .86 .89

Motivação Académica .82 .84

Como se pode observar, estes valores de α situam-se todos acima de 0,80, sendo muito semelhantes aos obtidos na versão original.

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Validade

Realizou-se uma análise factorial exploratória, com rotação varimax. Os factores extraídos, foram coincidentes com os da versão original. O primeiro factor explica 21,53%, o segundo 16,78% e o terceiro 13,47% da variância, explicando, no total, 51,77% (enquanto na versão original explicavam 78,86).

No que diz respeito à correlação de cada item com a escala total (consistência interna do item) e com a sub-escala a que pertence (validade convergente), todos os itens apresentaram valores corrigidos para sobreposição superiores a .30, o que é considerado adequado. Para além disso, em todos os itens as correlações foram mais elevadas com a sub-escala a que pertencem do que com as demais sub-escalas. No entanto, quando se avaliou a validade discriminante, estipulando-se que o valor da correlação do item com a sub-escala a que pertence deveria ser superior, em 10 pontos, ao da correlação com as sub-escalas a que não pertence, verificou-se que não satisfizeram tanto esse critério os itens 3, 10, 24 e 29 da sub-escala Letargia; 2, 6, 14, e 26 da sub-escala Cognitivo-Emocional e 13, 16 e 19 da sub-escala Motivação Académica.

Independência das escalas

As autoras do USDI verificaram que os três factores ou sub-escalas estavam positivamente correlacionados uns com os outros: os itens da sub-escala Cognitivo- Emocional estavam correlacionados com a Letargia (r=.50) e com a Motivação Académica (r=.41). Os itens da Letargia estavam correlacionados também com a Motivação Académica (r=.43). As correlações na versão portuguesa constam na Tabela 11.

Tabela 11 Correlações Pearson entre as sub-escalas do IDEU

Sub-escalas Cognitivo-emocional Letargia Motivação Académica

Cognitivo-emocional 1

Letargia .70** 1

Motivação Académica .49** .64** 1

**

p< .01

Na versão portuguesa, os valores das correlações foram superiores aos obtidos na amostra australiana.

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2.3. Comentário

As características psicométricas da versão portuguesa do University Student

Depression Inventory, a nível de fidelidade e validade, são, no geral, satisfatórias, pelo

que este instrumento pode ser considerado útil e adequado para avaliar a depressão na população portuguesa. Merece particular relevo o facto de este questionário se dirigir especificamente aos estudantes do ensino superior, população esta que carecia, em Portugal, de instrumentos que avaliassem estes sintomas, contribuindo assim para o preenchimento dessa lacuna. Ainda assim, será conveniente realizar, de futuro, estudos mais aprofundados.

3. Construção do Questionário de Comportamentos de Risco em Estudantes