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A arguição de relevância na Constituição de 1969 (EC nº1 à Constituição de 1967)

2 – ANTECEDENTES DA REPERCUSSÃO GERAL

2.2. A arguição de relevância na Constituição de 1969 (EC nº1 à Constituição de 1967)

Diante da crise do Supremo, ao menos desde 1958, tem-se buscado adotar medidas remediadoras. Foi neste ano que foi editada a Lei nº 3.396, atribuindo aos presidentes dos direito australiano, há previsão de institutos semelhantes ao writ of certiorari norte-americano e à licença para recorrer inglesa.

156 Cf. Artur May, Die Revision in den zivil-und verwaltungsgerichtlichen Verfahren; Alvaro Ragone, El Nuevo proceso civil alemán.

157 “4.7 Leave to appeal is granted to petitions that, in the opinion of the Appeal Committee, raise an arguable

point of law of general public importance which ought to be considered by the House at this time, bearing in mind that the matter will already have been the subject of judicial decision and may have already been reviewed on appeal. A petition which in the opinion of the Appeal Committee does not raise such a point of law is refused on that ground. The Appeal Committee gives brief reasons for refusing leave to appeal but does not otherwise explain its decisions”, disponível em [http://www.publications.parliament. uk/pa/ld199697/ldinfo/ld08judg/bluebook/bluebk-1.htm], acesso em 1.12.2013.

Tribunais locais competência para examinar os pressupostos de admissibilidade dos recursos extraordinários. Poucos anos depois, em 1963, foi instituída a Súmula de jurisprudência predominante da Corte, facilitando a inadmissibilidade de recursos e veiculando teses contrárias às Súmulas editadas. Em 1965, houve emenda ao regimento interno do STF para permitir aos relatores intimar as partes litigantes sobre o interesse no prosseguimento de recursos pendentes de julgamento há mais de dez anos, sendo que, na hipótese de silêncio, o respectivo recurso seria arquivado159.

Neste contexto, a Constituição de 1969 (Emenda Constitucional nº 1, à Constituição de 1967) trouxe nova medida buscando solucionar o problema de congestionamento do Supremo, concedendo à Corte competência para regulamentar as hipóteses em que, em razão da natureza, espécie ou valor da causa, seria cabível o recurso extraordinário com fundamento no inciso III, alíneas “a” e “d”, isto é, quando a decisão era contrária ao dispositivo da Constituição, negava vigência a tratado ou lei federal, ou dava à lei federal interpretação divergente da que lhe dera outro Tribunal160.

No RISTF de 1970, foram previstas as causas em que não se admitiria a interposição de recurso extraordinário, conforme o rol de incisos do artigo 308. Exemplificativamente, era inadmissível nos processos criminais envolvendo delitos puníveis com multa, prisão simples ou detenção, em litígios decorrentes de acidente de trabalho, ou nas causas cujo valor não excedia a 60 vezes o maior salário mínimo vigente.

Porém, mesmo nestas hipóteses, previu-se que o recurso extraordinário excepcionalmente poderia ser admitido quando se tratasse de ofensa à Constituição ou discrepância manifesta da jurisprudência predominante no STF.

Em 1º de agosto de 1975, passou a viger a emenda regimental nº 3, aumentando consideravelmente as hipóteses de inadmissibilidade do recurso extraordinário, conforme a competência normativa outorgada pelo parágrafo único do artigo 119 da Constituição de

159 Sobre as tentativas de solução da “crise”, ver Calmon de Passos, Da arguição de relevância no recurso extraordinário, p. 12-13.

160 “Art. 119. Compete ao Supremo Tribunal Federal:

I - processar e julgar originariamente (...); II - julgar em recurso ordinário (...);

III - julgar, mediante recurso extraordinário, as causas decididas em única ou última instância por outros tribunais, quando a decisão recorrida: a) contrariar dispositivo desta Constituição ou negar vigência de tratado ou lei federal; b) declarar a inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; c) julgar válida lei ou ato do governo local contestado em face da Constituição ou de lei federal; ou d) der à lei federal interpretação divergente da que lhe tenha dado outro Tribunal ou o próprio Supremo Tribunal Federal.

Parágrafo único. As causas a que se refere o item III, alíneas a e d, deste artigo, serão indicadas pelo Supremo Tribunal Federal no regimento interno, que atenderá à sua natureza, espécie ou valor pecuniário”.

1969. Mas além de aumentar o rol do artigo 308 do regimento interno, a emenda regimental nº 3 também modificou as exceções à inadmissibilidade: a partir de então seriam admissíveis os recursos extraordinários nos casos de ofensa à Constituição ou relevância das questões federais debatidas. Ou seja, foi retirada a referência à manifesta divergência jurisprudencial e introduzida a relevância da questão federal. Criou-se, assim, o chamado incidente de arguição de relevância, cuja verificação competiria privativamente ao Supremo Tribunal Federal (artigo 308, §3º, do RISTF161).

Em outubro de 1980 foi publicado o novo regimento interno do STF, tendo sido inicialmente mantida a sistemática quanto às hipóteses de cabimento e de inadmissibilidade de recurso extraordinário. Uma diferença foi que, além dos casos de ofensa à Constituição e relevância da questão federal, foi previsto o cabimento de recurso extraordinário quando houvesse “manifesta divergência com Súmula do Supremo Tribunal Federal” (artigo 325).

Após cinco anos, foi editada a emenda regimental nº 2, de 1985, invertendo a lógica da arguição de relevância. Com a nova redação do artigo 325, o regimento interno passou a prever as hipóteses de cabimento do recurso extraordinário – e não mais de inadmissibilidade:

Art. 325. Nas hipóteses das alíneas "a" e "d" do inciso III do artigo 119 da Constituição Federal, cabe recurso extraordinário:

I - nos casos de ofensa à Constituição Federal;

II - nos casos de divergência com a Súmula do Supremo Tribunal Federal;

161 “Art. 308. Salvo nos casos de ofensa à Constituição ou relevância da questão federal, não caberá o recurso

extraordinário, a que alude o seu art. 119, parágrafo único, das decisões proferidas:

I — nos processos por crime ou contravenção a que sejam cominadas penas de multa, prisão simples ou detenção, isoladas, alternadas ou acumuladas, bem como as medidas de segurança com eles relacionadas; II — nos habeas corpus, quando não trancarem a ação penal, não lhe impedirem a instauração ou a renovação, nem declararem a extinção da punibilidade;

III — nos mandados de segurança, quando não julgarem o mérito;

IV — nos litígios decorrentes: a) de acidente do trabalho; b) das relações de trabalho mencionadas no art. 110 da Constituição; e) da previdência social; d) da relação estatutária de serviço público, quando não for discutido o direito à Constituição ou subsistência da própria relação jurídica fundamental;

V — nas ações possessórias, nas de consignação em pagamento, nas relativas à locação, nos procedimentos sumaríssimos e nos processos cautelares;

VI — nas execuções por título judicial;

VII — sobre extinção do processo, sem julgamento do mérito, quando não obstarem a que o autor intente de novo a ação;

VIII — nas causas cujo valor, declarado na petição inicial, ainda que para efeitos fiscais, ou determinado pelo juiz, se aquele for inexato ou desobediente aos critérios legais, não exceda de 100 vezes o maior salário mínimo vigente no País, na data do seu ajuizamento, quando uniformes as decisões das instâncias ordinárias; e de 50, quando entre elas tenha havido divergência, ou se trate de ação sujeita a instância única”.

III - nos processos por crime a que seja cominada pena de reclusão; IV - nas revisões criminais dos processos de que trata o inciso anterior;

V - nas ações relativas à nacionalidade e aos direitos políticos; VI - nos mandados de segurança julgados originariamente por Tribunal Federal ou Estadual, em matéria de mérito;

VII - nas ações populares;

VIII - nas ações relativas ao exercício de mandato eletivo federal, estadual ou municipal, bem como às garantias da magistratura; IX - nas ações relativas ao estado das pessoas, em matéria de mérito;

X - nas ações rescisórias, quando julgadas procedentes em questão de direito material;

XI - em todos os demais feitos, quando reconhecida relevância da questão federal.

Veja que foi mantido o cabimento de recurso extraordinário nos casos de ofensa à Constituição e divergência com a Súmula do próprio STF. E, residualmente, foi inserido o inciso XI, prevendo o cabimento “em todos os demais feitos, quando reconhecida relevância da questão federal”.

Portanto, ao se interpor o recurso extraordinário era necessário demonstrar a subsunção da tese exposta às exigências do artigo 119, inciso III, da Constituição de 1969. Estando-se diante das hipóteses das alíneas “a” e/ou “d”, seria ainda necessário demonstrar a subsunção a uma das hipóteses previstas no regimento interno do Supremo (artigo 325). Nestes casos, incabível a arguição de relevância, pois estava expressamente previsto o cabimento de recurso extraordinário. Caso não se tratasse de nenhuma das situações descritas no artigo 325, o recurso extraordinário apenas poderia ser excepcionalmente admitido nos casos de ofensa à Constituição, manifesta divergência à Súmula do STF ou relevância da questão federal162.

Essa estrutura normativa vigeu até a promulgação da Constituição de 1988, que transportou grande parte das competências do STF para o novel Superior Tribunal de

162 “Diante da configuração do RI S.T.F., é constatável que um grande número de causas e questões federais,

em princípio, e, como regra geral, resta excluído da esfera de cabimento do RE, uma vez que, clara e normalmente terá cabimento esse recurso só nas hipóteses discriminadas no RI, no seu art. 325, incs. I a X (redação da Em. Rg. nº 2/85); o que não estiver descrito, como hipótese ensejadora de RE, pela técnica da Em. Reg. nº 2/85, não comporta RE, mas pode vir a comportar RE, se acolhida a relevância. Neste passo, a técnica adotada pelo atual regimento, difere daquela empregada nos regimentos anteriores, em que casuisticamente se excetuavam as hipóteses de não cabimento” (ALVIM, Arruda. A arguição de relevância no

Justiça, deixando ao STF basicamente competências relacionadas com a proteção da Constituição, sendo que o recurso extraordinário não mais estava condicionado à demonstração de qualquer relevância163. Por isso, a doutrina entendia que a arguição de relevância tinha natureza de “excludente da inadmissibilidade do recurso extraordinário”164.

Os regimentos internos de 1970 e de 1980 possuem normas parecidas quanto ao procedimento para a arguição de relevância. Por razões práticas, abaixo serão tecidas breves considerações acerca do procedimento previsto no regimento interno de 1980, conforme a emenda regimental nº 2, de 1985, por ter sido o último procedimento aplicado à arguição de relevância.

Inicialmente, no que se refere à competência, previa o artigo 326 do regimento que competiria ao presidente do Tribunal de origem examinar a admissibilidade do recurso extraordinário interposto com fundamento nos incisos I a X do artigo 325, sendo que a competência para julgamento da arguição de relevância competia exclusivamente ao Supremo Tribunal Federal, conforme expressamente determinado no artigo 327 (a arguição de relevância se referia ao inciso XI do artigo 325, estando, pois, excluído do juízo de admissibilidade realizado pelo Tribunal local).

O recorrente deveria apresentar a questão relevante em capítulo destacado da petição do recurso extraordinário, onde também deveria já indicar as peças que deveriam integrar o eventual instrumento, sendo obrigatórios a sentença de primeiro grau, o acórdão recorrido, a petição do recurso extraordinário e a decisão relativa ao juízo de admissibilidade. Na hipótese de inadmissibilidade do recurso extraordinário pelo presidente do Tribunal de origem, o recorrente deveria agravar da decisão e reproduzir a arguição de relevância em capítulo destacado da petição de agravo, quando então subiriam por um mesmo instrumento. Caso o juízo de admissibilidade tivesse sido positivo, a arguição seria apreciada nos próprios autos originais da demanda.

No Supremo, ao relator cabia preparar um extrato da arguição de relevância e encaminhar para todos os demais ministros. O julgamento deveria ocorrer em sessão de Conselho, sendo considerada acolhida quando houvesse manifestação, neste sentido, de

163 Valendo ressaltar que a arguição de relevância sempre se relacionou com questões federais. Durante a

vigência da Constituição de 1969 jamais se exigiu arguição de relevância para a admissibilidade de recurso extraordinário com fundamento em ofensa à Constituição, situação em que a relevância era presumida pelos respectivos regimentos internos então vigentes.

164 Cf. Arruda Alvim, A arguição de relevância no recurso extraordinário; Calmon de Passos, Da arguição de relevância no recurso extraordinário; e Sergio Bermudes, Comentários ao Código de Processo Civil.

quatro ou mais ministros. Em qualquer hipótese, a decisão era irrecorrível (artigo 328, §5º, do regimento interno do STF de 1980, conforme emenda regimental nº 2, de 1985).

A questão mais polêmica envolvendo a arguição de relevância se relacionava com o julgamento pelo Conselho. Segundo o regimento de 1970 (o primeiro a regulamentar o tema), o julgamento seria secreto165 e, da ata da sessão a ser publicada, deveria constar apenas a relação das arguições acolhidas e rejeitadas, dispensando-se motivação e não comportando pedido de vista (artigo 308 §4º, VIII e IX166).

A ausência de fundamentação e o julgamento secreto renderam muitas críticas ao modelo adotado, principalmente por parte da doutrina. Apesar de não haver na Constituição de 1969 norma expressa determinando a motivação e fundamentação das decisões judiciais, bem apontava J.J. Calmon de Passos que a “motivação é regra geral, sem exceção, em todos os feitos civis e penais, em nosso sistema jurídico, numa explicitação clara de princípio ínsito à garantia, assegurada pela Carta Magna, do devido processo legal”167. Nesta linha, condenando a ausência de motivação nos julgamentos da arguição de relevância, também se manifestaram Barbosa Moreira, Arruda Alvim e Sérgio Bermudes168.

Por outro lado, o então Ministro Sydney Sanches169 apresentou as seguintes justificativas para tal procedimento:

a sessão pode ser administrativa porque o julgamento não é de índole jurisdicional. E, se tivesse de ser pública, sempre haveria de ser admitida a sustentação oral de ambas as partes. E, se a decisão tivesse que ser fundamentada, estaríamos ampliando consideravelmente o número de sessões plenárias do Tribunal, que já são duas por semana. E a avalancha de processo continuaria invencível. Os julgamentos retardados. E o problema insuperado (aliás, esclareço que o Conselho julga mais de 150 arguições de relevância por semana, após a sessão plenária pública de 4ª feira).

165 “O Conselho não é um órgão novo na estrutura do Supremo, mas sim uma forma e modo de se reunir e

deliberar dos órgãos colegiados com poder decisório. (...) Reunir-se em Conselho, por conseguinte, não é reunir-se integrando um órgão diverso da Turma ou do Plenário, mas sim reunir-se em Turma ou em Plenário reservadamente, excluindo-se o público e as partes dos debates. Vê-se, pois, que decidir em Conselho importa apenas em subtrair ao público os debates, com vistas à formação da decisão colegiada” (Calmon de Passos, Da arguição de relevância no recurso extraordinário, p. 17-18).

166 “§ 4° — A arguição de relevância da questão federal processar-se-á por instrumento, da seguinte forma:

(...) VIII — da ata da sessão do Conselho, que se publicará para ciência dos interessados, constará apenas a relação das arguições acolhidas e rejeitadas; IX — a apreciação em Conselho não comportará pedido de vista, dispensará motivação e será irrecorrível”.

167 Da arguição de relevância no recurso extraordinário, p. 21. 168 Comentários, 1977, p. 312.

Encontrou a Corte um meio-termo: fundamentar apenas os acolhimentos das arguições de relevância, mediante verbetes. No artigo referido, o Ministro apresentou estatística demonstrando que das 4.148 arguições de relevância analisadas entre 1985 (após a vigência da emenda regimental nº 2) e outubro de 1987, foram acolhidas 885, ou seja, aproximadamente 27%, o que demonstraria a imparcialidade e bom funcionamento da arguição de relevância.

Até a emenda regimental nº 2, de 1985, não houve definição normativa sobre quando a questão federal seria relevante. Como visto, limitavam-se nas normas regimentais a apresentar um rol de situações em que se presumiria a relevância, visto que em casos tais não seria necessário arguir a relevância como pressuposto de admissibilidade do recurso extraordinário.

E, como os enunciados do STF eram demasiadamente concisos, imotivados e concluídos em procedimento secreto, cabia à doutrina a difícil tarefa de tentar desvendar um conceito para a relevância da questão federal. Em palestra proferida em 1977, concluiu Calmon de Passos que “sua configuração (da questão federal) foi deixada, portanto, ao sabor dos critérios subjetivos das partes, ao formulá-la, e dos ministros, ao apreciá-la”170. Além disso, entendia que verificar a relevância ou irrelevância de uma questão federal correspondia a um trabalho bastante complexo e árduo ante a ausência de uma definição normativa, afirmando que

a questão federal só é irrelevante quando dela não resulta violência à inteireza e à efetividade da lei federal. Fora disso, será navegar no mar incerto do ‘mais ou menos’, ao sabor dos ventos e segundo a vontade dos deuses que geram os ventos nos céus dos homens 171. Corroborando as primeiras correntes doutrinárias sobre o tema, Sergio Bermudes apontou que a relevância da questão federal estaria relacionada com a ideia de interesse público:

não basta que, nos limites da relação processual em que se proferiu o acórdão recorrido, a questão tenha relevo. É necessário que o interesse na sua solução transcenda os lindes do processo, para se projetar na vida social. (...) É da repercussão que o reexame do acórdão pelo Supremo tiver na vida social, na administração da justiça, que nascerá a relevância (...)172.

170 Da arguição de relevância no recurso extraordinário, p. 14. 171 Da arguição de relevância no recurso extraordinário, p. 16. 172 Comentários, 1977, p. 302.

Foi somente com a emenda regimental nº2, de 1985, que surgiu uma resposta normativa para o que seria a “questão federal relevante”. Conforme disposto no artigo 327, §1º, devia-se entender como relevante “a questão que, pelos reflexos na ordem jurídica e considerados os aspectos morais, econômicos, políticos ou sociais da causa, exigir a apreciação do recurso extraordinário pelo Tribunal”.

Apesar da inovação normativa173, como se percebe, tratava-se de conceito elástico e

impreciso, continuando a merecer críticas da doutrina porque, aliado à ausência de necessária fundamentação, poderia levar a atos arbitrários do Supremo, pois a decisão quanto à arguição de relevância não estava sujeita a qualquer controle de legalidade. Ademais, as críticas referentes à ausência de fundamentação também consideravam que o sigilo impedia a possibilidade de se apontar qual seria o conceito de “relevância da questão federal” adotado pelo Supremo174. Lembrando que das mais de 30.000 arguições de relevância analisadas pelo Supremo, apenas aproximadamente 5% foram acolhidas, sendo que 75% foram rejeitadas e 20% não foram conhecidas por questões procedimentais.175

Mesmo assim, em que pese todo o esforço do STF em obstar a interposição de recursos extraordinários e com isso tentar aliviar o seu congestionamento, a arguição de relevância não alcançou os fins pretendidos:

em suma, o writ of certiorari impede que numerosas e importantes causas sejam debatidas e decididas pela Suprema Corte, mas em contrapartida aquele tribunal julga detidamente cerca de cento e cinquenta, tidas como relevantes. A arguição de relevância, por seu turno, impossibilita que se abra a instância extraordinária a um grande número de feitos, como se neles a lei federal fosse irrelevante, mas, ao mesmo tempo, não consegue fazer com que o Supremo Tribunal se desvencilhe de excessiva carga de trabalho, que prejudica, inelutavelmente, seu desempenho176.

Tal fato, aliado aos graves problemas procedimentais da arguição de relevância, levou o constituinte de 1988 a livrar o recurso extraordinário de tal requisito. Outras medidas foram pensadas, sendo a principal delas a criação de um Tribunal superior competente basicamente para uniformizar a interpretação da legislação federal, o Superior Tribunal de Justiça, deixando ao Supremo praticamente apenas a discussão de questões constitucionais.

173 De acordo com Arruda Alvim, “a identificação das hipóteses de relevância, e, mais ainda a explicitação

do(s) motivo(s) do acolhimento das arguições de relevância, faz com que hajam de ser transpostas as barreiras do caso concreto” (A arguição de relevância no recurso extraordinário, p. 31).

174 Neste sentido, Antônio Carlos Marcondes Machado, Argüição de relevância, p. 71-73. 175 Ives Gandra da Silva Martins Filho, Critério de transcendência no recurso de revista, p. 912. 176 Antonio Carlos Marcondes Machado, Arguição de relevância, p. 63.

Finalizando, em rápida comparação com o instituto da repercussão geral, pode-se dizer que, apesar da experiência da arguição de relevância poder ser apontada como uma das fontes de inspiração para a EC nº 45/2004, muitas são as diferenças, principalmente quanto aos equívocos ora evitados.

De início, se a finalidade de ambos os institutos é semelhante, no sentido de aliviar a carga de processos distribuídos ao STF, utilizam-se de técnicas completamente invertidas. A arguição de relevância correspondia a uma hipótese de excepcional de admissibilidade de recursos extraordinários a priori inadmissíveis. Já a repercussão geral é presumida existente em todos os recursos extraordinários, sendo que, na realidade, os ministros votam sobre eventual inexistência de repercussão geral das questões veiculadas

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