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3 – REPERCUSSÃO GERAL

3.6. Repercussão geral presumida (artigo 543-A, §1º, do CPC)

3.6.1. Outras presunções

Por presunção, entende-se “um processo racional do intelecto, pelo qual do conhecimento de um fato infere-se com razoável probabilidade a existência de outro ou o estado de uma pessoa ou coisa”274. No Direito, podem ser classificadas entre presunções relativas, aquelas que admitem prova em contrário, e presunções absolutas, entendidas como ficções legais que não admitem demonstração em contrário.

Com relação à repercussão geral, parte da doutrina menciona que além da hipótese do artigo 543-A, §1º, do CPC, haveria outras situações de presunção sobre a repercussão geral. Neste contexto, Rodolfo de Camargo Mancuso propõe que

os recursos extraordinários tirados de acórdãos em ações coletivas – populares, civis públicas, ações no controle direto de constitucionalidade, mandado de segurança coletivos – também se beneficiem de uma sorte de ‘presunção de repercussão geral’, por conta da natural eficácia expandida, erga omnes ou ao menos ultra

partes, das decisões proferidas nesses feitos275.

seguida, o Tribunal poderá, quanto ao mérito, (a) manifestar-se pela subsistência do entendimento já consolidado ou (b) deliberar pela renovação da discussão do tema. Na primeira hipótese, fica a Presidência autorizada a negar distribuição e a devolver à origem todos os feitos idênticos que chegarem ao STF, para a adoção, pelos órgãos judiciários a quo, dos procedimentos previstos no art. 543-B, § 3º, do CPC. Na segunda situação, o feito deverá ser encaminhado à normal distribuição para que, futuramente, tenha o seu mérito submetido ao crivo do Plenário” (grifo nosso).

273 “No primeiro caso – o de reafirmação -, estaria evidenciado o dissídio pretoriano e incidiria a presunção

legal de repercussão geral, seguida de apreciação pelo Presidente do STF hábil a restabelecer a uniformidade jurisprudencial fragilizada pela decisão do tribunal a quo; no segundo caso – de rediscussão de orientação do STF -, a par do reconhecimento expresso da repercussão geral, o recurso seguiria para regular distribuição para posterior exame do mérito pelo Plenário, com a clara sinalização de que existe grande possibilidade de o STF modificar sua jurisprudência e aderir ao entendimento da instância inferior” (Bruno Dantas,

Repercussão geral, p. 305).

274 Candido Rangel Dinamarco, Instituições, v. III, p. 113.

Pedro Miranda aponta algumas situações em que haveria “presunção relativa” de repercussão geral, pois considera que “em virtude de suas peculiaridades, há a presunção da existência de elementos utilizados para aferir a repercussão geral: relevância e/ou transcendência”276. Dentre as hipótese por ele elencadas, estão: (i) as ações coletivas, tendo em vista a amplitude subjetiva da decisão judicial a ser proferida; (ii) divergência entre tribunais a respeito de determinada questão constitucional; (iii) declaração de inconstitucionalidade de tratado ou lei federal; e (iv) a existência de ação de controle concentrado de constitucionalidade.

Mas tais argumentos não convencem, pois são hipóteses em que apenas há maior

possibilidade de reconhecimento de repercussão geral, mas não propriamente uma

presunção, isto é, um juízo lógico que permita afirmar que, a priori, todos as questões constitucionais nestas situações gozam de repercussão geral.

Quer dizer, presunção há, pelo reconhecimento da repercussão geral, mas aplicável a toda e qualquer questão constitucional presente em recursos extraordinários, e não apenas às hipóteses apresentadas pelo autor. Pois essa foi a premissa adotada pela EC nº 45/2004: caberá ao STF, por decisão de ao menos 2/3 de seus Ministros decidir pela inexistência de repercussão geral277. Qualquer outra situação levará ao reconhecimento de tal pressuposto de admissibilidade do recurso extraordinário. Trata-se de presunção relativa, portanto.

Com relação ao artigo 543-A, §1º, do CPC, pretendeu o legislador infraconstitucional estabelecer as hipóteses de presunção absoluta a respeito da existência de repercussão geral: decisão recorrida contrária à súmula ou jurisprudência dominante do próprio STF.

Logo, é possível concluir que todas as questões constitucionais gozam de presunção relativa a respeito do reconhecimento de repercussão geral, sendo que algumas hipóteses específicas são objeto de presunção absoluta. No entanto, não se pode afirmar que outras situações também estariam sujeitas a presunções absolutas, assim como não há hipóteses

276 Pedro Miranda, Recurso extraordinário, p. 313.

277 “A norma constitucional estabelece duas claras diretrizes. Por um lado, consagra o princípio da

repercussão geral das questões constitucionais. É o que se extrai da previsão de que o reconhecimento da falta de repercussão depende de um quórum qualificado. É dizer: em princípio, a questão constitucional veiculada em recurso extraordinário reveste-se de repercussão geral (...). Por outro lado, como decorrência desse primeiro traço, põe-se um limite de competência. A manifestação negando a existência de repercussão geral precisará provir do Supremo Tribunal – mais especificamente, do seu Plenário, que reúne todos os seus membros” (Eduardo Talamini, Novos aspectos da jurisdição constitucional, p. 26).

de presunção de inexistência de repercussão geral. Isso porque apenas a lei assim poderia determinar.

Com efeito, uma questão polêmica, mas que já foi inclusive apreciada pela Corte, trata da interpretação inversa da presunção prevista no artigo 543-A, §3º, do CPC. Isto é, se necessariamente deve ser negada a repercussão geral quando a decisão recorrida tiver sido proferida no mesmo sentido da jurisprudência dominante ou súmula do STF. Pela resposta afirmativa votou a Ministra Carmen Lúcia, relatora no julgamento do RE 563.965-7/RS:

o artigo 543-A, §3º, do Código de Processo Civil contém, expressamente, norma determinante no sentido de haver repercussão geral sempre que o recurso impugnar decisão contrária à súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal. Naquele dispositivo se contém, como parece certo, uma segunda norma, ainda que inexpressa, segundo a qual, quando, inversamente àquela primeira hipótese, o recurso impugnar decisão de acordo com a súmula ou jurisprudência dominante do Tribunal não há repercussão geral.

No mesmo sentido votaram os Ministros Cezar Peluso, Joaquim Barbosa e Menezes Direito.

Contudo, a maioria dos Ministros entendeu que “não se presume a ausência de repercussão geral quando o recurso extraordinário impugnar decisão que esteja de acordo com a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”, tendo sido vencida a tese dos Ministros acima mencionados, em julgamento cujo resultado foi publicado no dia 18 de abril de 2008.

A respeito do tema, vale ainda mencionar parte dos argumentos do voto da Ministra Ellen Gracie, ao ponderar que a existência de repercussão geral

não pode ser afastada pela circunstância de já ter sido enfrentada em sucessivos julgados anteriores desta Corte. Ao contrário, a existência de julgados em outros processos, antes de afastar a repercussão geral, a afirma, indicando que se trata de matéria que ultrapassa os interesses subjetivos da causa.

Além disso, também se argumentou que as decisões do STF apenas podem implicar negativa de repercussão geral, com a consequente inadmissibilidade do recurso extraordinário, se respeitado o artigo 543-B do CPC. Quer dizer,

enquanto não for efetivamente apreciada a existência de repercussão geral de determinada matéria e realizado o julgamento de um acórdão paradigma, que possa efetivamente demonstrar o posicionamento do Supremo Tribunal Federal a respeito dessa

questão constitucional, não terão aplicação as consequências de julgamento estipuladas no artigo 543-B do Código de Processo Civil 278.

De nossa parte, entendemos correto o resultado do julgamento proferido no precedente acima citado279. Na realidade, a presunção primeira que deve ser levada em consideração se refere à existência de repercussão geral das questões constitucionais, conforme previu o constituinte reformador. Apenas e tão-somente nas hipóteses expressamente previstas é que se poderá decidir pela inexistência de repercussão geral. Trata-se, acima de tudo, de norma limitativa do direito de acesso ao Supremo Tribunal Federal e interposição de recurso extraordinário, razão pela qual deve ser interpretada de forma restritiva e bastante criteriosa. Por isso, equivocada a leitura inversa da presunção trazida pelo artigo 543-A, §3º, da Lei Processual.

3.6.2. Situações em que há maior probabilidade de reconhecimento da repercussão

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