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6. O Democrático e as representações de Vila do Conde

6.3. Principais melhoramentos e reivindicações locais

6.3.6. A degradação do porto e da barra numa terra de marinheiros

Segundo O Democrático, o estado de degradação do porto e da barra de Vila do Conde constituía um problema que atravessava gerações, numa terra “de marinheiros ousados” com fortes e históricas ligações à navegação – fonte de uma das suas atividades económicas mais relevantes. Neste contexto, outro dos temas mais debatidos ao longo do decénio de 1926-36 foi a premente necessidade de realização de obras profundas no porto e barra do município, uma aspiração já antiga.

Na edição de 20 de fevereiro de 1926, o periódico adiantou que o Governo tinha autorizado a transferência de um subsídio concedido em favor das obras do porto e barra da vila. Após anos de apelos ignorados, o jornal recebeu esta notícia com entusiasmo. Previa então que as obras se iniciassem o mais rapidamente possível e incentivava ao empenho de todos os responsáveis envolvidos nesta “tarefa laboriosa e importantíssima de interesse vital para esta terra”. O apelo alargava-se, como era habitual, a toda a população vila-condense para que se unisse em prol desta obra que projetaria a localidade “na senda do progresso”394. Na edição seguinte, em consequência de uma reunião

extraordinária da secção local da Junta Autónoma, tomou-se conhecimento de que já se encontraria depositado o subsídio do Estado, no valor de 100.000$00, na Caixa Geral de Depósitos da vila. Por outro lado, ficou também decidido que se deveria realizar “um estudo competente de todos os projetos existentes”, tendo em conta a opinião de técnicos capacitados, para chegar à melhor resolução possível395.

As obras só se iniciaram verdadeiramente em fevereiro de 1929, como noticiou O

Democrático:

Já começaram os trabalhos para que o nosso porto dentro em pouco tempo desempenhe as funções de um fator importantíssimo para o comércio e navegação e, ao mesmo tempo, a nossa terra ingresse no caminho aberto do franco progresso. Dezenas de operários já se empregam em abrir o canal que vai servir de entrada ao nosso rio, sob a direção do engenheiro Sr. Dr. Paulo Barbosa, coadjuvado pelo

394 “Obras na barra”. O Democrático, nº 615, 20/02/1926, p. 1. 395 “Junta Autónoma”. O Democrático, nº 617, 03/04/1927, p. 2.

trabalho inteligente e persistente do digno capitão do porto, o ilustre oficial da Marinha, Sr. Gabriel Teixeira396.

De forma a garantir o avanço das obras, Gabriel Teixeira gizou uma estratégia de propaganda a realizar pelas freguesias do concelho, “explicando o alto valor” que representava para a região “o regular funcionamento” do porto. O objetivo seria criar em todas as aldeias “delegações de um organismo intitulado Amigos do Porto e Barra de Vila do Conde” para que os cidadãos pudessem contribuir e auxiliar nas obras em curso. O jornal constatou com agrado o sucesso desta iniciativa junto da população vila-condense, que demonstrava entusiasmo e vontade em apoiar o melhoramento em causa397.

A partir daqui, o periódico foi dando conta do estado de progressão das obras. Em março de 1929, encontrava-se “bastante adiantada a «barragem»” que se estava a construir “pelo lado sul” e que haveria de “tapar a garganta que servia de acesso ao rio”. Adicionalmente, verificava-se também a existência de doações de materiais de construção, por exemplo, de madeiras oferecidas pelo “grande capitalista Sr. Bento de Sousa Amorim” e esperava-se a chegada de mais398. Foi também mencionada a visita ao

local das obras de Simão Neves, Secretário do Ministro das Finanças, tendo o periódico anunciado que o político havia ficado “com esplêndida impressão” relativamente aos trabalhos que se estavam a efetuar399.

Efetivamente, obras de reconstrução de tal envergadura exigiam os devidos recursos monetários. Neste contexto, o semanário noticiou a ação empreendida pelos Amigos do Porto e Barra de Vila do Conde. Esta associação iniciara a sua primeira “colheita das dádivas dos habitantes da vila” a reverter a favor das obras. O periódico fez questão de publicar a lista de nomes dos subscritores juntamente com o respetivo montante doado, de forma a incentivar a corrente solidária que assim dava novo alento às obras400.

396 “Porto e barra de Vila do Conde”. O Democrático, nº 754, 02/02/1929, p. 1. 397 “Porto e barra de Vila do Conde”. O Democrático, nº 754, 02/02/1929, p. 1. 398 “A nossa barra”. O Democrático, nº 760, 23/03/1929, p. 1.

399 “As obras do porto e barra”. O Democrático, nº 762, 05/04/1929, p. 4. 400 “Obras do porto e barra”. O Democrático, nº 772, 22/06/1929, p. 3.

Em inícios de 1931, noticiou que as obras prosseguiam “com toda a regularidade” e esperavam-se mais avanços:

Com a aprovação, por parte das instâncias superiores, da alteração ao primitivo projeto dos melhoramentos a realizar, é de esperar que os trabalhos se intensifiquem sem interrupção até final, para que em curto prazo de tempo vejamos realizada a obra mais grandiosa que se tem efetuado em Vila do Conde de há 50 anos aos nossos dias que lhe trará o progresso e desenvolvimento que todos os vila-condenses almejam401.

Contudo, as obras de reabilitação do porto e barra da vila não se fariam sem percalços e desentendimentos. O primeiro capitão do porto, Gabriel Teixeira, redigiu uma carta que foi entregue na redação d’O Democrático, por intermédio de um dos oficiais da Marinha Mercante do município. Nessa carta, o antigo capitão apontava alguns problemas existentes nas obras ainda a decorrer. A seu ver, os açudes deviam ser destruídos porque prejudicariam severamente o porto. Estas estruturas limitavam o fluxo das marés, reduziam quase em metade (ou até em mais de metade) o caudal da água que a cada maré passava na barra e consequentemente reduziam em igual importância a drenagem natural do rio. O periódico concordou com a visão do antigo capitão, esperando que esta fosse seguida para benefício de todos. Por outro lado, a falta de verbas continuava a representar um óbice, pelo que se esperava que até finais do ano económico chegasse a importância atribuída pelo Estado para que se tornasse possível a conclusão de tão urgente obra; caso contrário, Vila do Conde não alcançaria o movimento marítimo e comercial que lhe daria vida e prosperidade402.

A necessidade de auxílio financeiro era de tal forma imprescindível que um grupo de oficiais da Marinha Mercante vila-condense redigiu uma representação que foi entregue a Duarte Pacheco, Ministro das Obras Públicas e Comunicações, a fim de requerer ajuda monetária do Governo para dar seguimento – e, posteriormente, garantir a

401 “Pequenas notas. Obras da barra”. O Democrático, nº 851, 06/02/1931, p. 2. 402 “O porto de Vila do Conde”. O Democrático, nº 967, 30/06/1933, p. 3.

conclusão – da reabilitação do porto e barra403. Em 1935, o jornal anunciava que havia sido concedido um subsídio de cerca de 120.000$00 à Junta Autónoma da vila para a conclusão das obras. Porém, até ao final do ano de 1936, não surgiu notícia acerca desfecho deste melhoramento. Mais uma aspiração que não se realizaria com a celeridade e eficácia desejadas pelo periódico.

6.3.7. Reorganização e aproveitamento das potencialidades das feiras