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O golpe armado e a oposição à Ditadura Militar e seus governantes

3. O 28 de Maio e a Ditadura Militar – a posição de O Democrático

3.1. O golpe armado e a oposição à Ditadura Militar e seus governantes

Cerca de uma semana depois da eclosão do golpe militar apareciam as primeiras reações. Na edição de 5 de junho de 1926, o jornal publicou uma nota oficiosa do PRP que, apesar de breve, se apresentava recheada de incerteza no futuro e se traduzia num apelo à continuação da defesa da República:

O Diretório do Partido Republicano Português, na hora grave que passa, entende dever aconselhar a todos os seus correligionários a máxima serenidade.

O PRP tem a consciência de ter sempre procurado servir com lealdade e dedicação a Pátria e a República. A situação em que hoje se encontra não diminui a inabalável decisão em que continua a defender o regime sempre que este careça dos seus esforços e sacrifícios.

E neste momento é-lhe grato saudar o povo republicano e todos aqueles que têm defendido e continuem a defender o prestígio das instituições71.

Ainda na mesma edição foram partilhadas outras primeiras impressões relativamente à triunfante insurreição militar. De facto, a incerteza e a dúvida são os sentimentos que melhor definem as “reações a quente” deste semanário republicano. Considerou que o “movimento militar nacional” que prevalecia “veio modificar profundamente a vida política” vigente desde 1910. Consequentemente, o jornal apontava “o momento político atual” como “difícil e delicado”, apesar de depositar a sua confiança nas capacidades do General Gomes da Costa e nos propósitos por ele anunciados, já que o via como “um militar valente e brioso, animado de um ardente patriotismo”72.

Por outro lado, o periódico – com o objetivo de proceder à defesa dos estadistas do PRP – fez questão de refutar a informação, que alguma imprensa vinha veiculando, de que António Maria da Silva, ex-Presidente do Ministério, escondera a verdadeira situação política do Presidente da República, Bernardino Machado, sobre a iminência da queda do regime. O periódico transcreveu o comunicado à imprensa do Chefe de Estado, no qual Bernardino Machado afirmava que o Governo de António Maria da Silva “chegara à convicção de que não podia dominar o movimento” e, por isso, pedia a sua demissão, com o receio de derramar sangue73.

Na edição seguinte, O Democrático abriu com um artigo que transcreveu integralmente de O Rebate, órgão das comissões do PRP em Lisboa. Neste texto afirmava-se que quem pensava que o Partido Republicano Português ia extinguir-se após ter sido “arrancado, violentamente do poder” estava enganado, pois a vida dos organismos políticos e sociais era cíclica, desenvolvendo-se “através de alternantes ascensões e depressões”, ou seja, de altos e baixos74. Desta forma, não se deveria avaliar a possível

extinção de um partido político tendo em conta apenas um episódio da sua existência, teoria que foi reforçada relembrando-se a turbulenta história do PRP e sua governação face às constantes tentativas do seu derrube: a crise de 1914, relativa ao pimentismo, que

71 “Partido Republicano Português – Nota Oficiosa”. O Democrático, nº 626, 05/06/1926, p. 2. 72 “Situação”. O Democrático, nº 626, 05/06/1926, p. 2.

73 “Para a História”. O Democrático, nº 626, 05/06/1926, p. 2. 74 “ Firmes!”. O Democrático, nº 627, 11/06/1926, p. 1.

“tomou, como pretexto, a intervenção dos elementos partidários na vida das instituições militares”, tendo o PRP adotado “uma atitude de neutralidade política perante o exército”; nova crise em 1917, em que o sidonismo apresentara como justificação, “a pretensa tirania do PRP”. A partir de então o partido praticaria “uma política de transigências e contemporizações”: de 1919 a 1925, subsistiu um clima de cooperação entre o PRP e as restantes fações políticas, à exceção dos defensores da Monarquia, mas apesar de todos os esforços e contendas, em 1926 rebentaria a terceira crise. É neste contexto que o periódico apontou uma das falhas do PRP: os resultados desastrosos que surgiram da união com outros grupos políticos. Assim, chegou à conclusão de que o caminho do partido, daí em diante, deveria ser solitário, sem recorrer a cedências nem alianças. Seria esta a receita que, segundo o semanário, permitiria ao PRP seguir firmemente, sem hesitações.

Defendendo pois a continuidade do PRP/PD, O Democrático demonstrou a sua incredulidade perante uma notícia redigida pelo “órgão da situação governamental”, A

Revolução Nacional, que informava que seria assinado um “decreto estabelecendo a

extinção pura e simples do Partido Democrático”, considerado “uma quadrilha antinacional”. Refutando tais declarações com ironia, O Democrático replicou: “E já agora, para a obra ficar completa, consta também que vai ser publicado novo decreto determinando que o sol não possa iluminar as pessoas que são democráticas, ficando assim os esbirros sabendo quem elas são para as pôr à sombra quando se tornar preciso e sem grande trabalho”75.

Cerca de um mês após o movimento revolucionário, surgia um artigo cujo título é, por si só, revelador do estado de espírito da equipa deste semanário: “Horas Tristes”. Apontava-se um clima pesado e de discórdia entre os republicanos, com uma crise política sem fim em vista. Neste seguimento, o jornal manifestou prontamente o seu descontentamento com a atuação dos líderes do golpe militar, que prometeram estabilidade e trouxeram tumulto. A demissão do “valente oficial” Cabeçadas, “que tanto

concorreu para o advento da República”, surgia como motivo de preocupação, pois só ampliava “os receios de tempestade, do perigo iminente”76.

Sendo Gomes da Costa o líder que a direita conservadora encontrara para liderar a revolução de 28 de Maio de 1926, não caiu nas “boas graças” deste jornal, que passou a tecer duras críticas ao General e seus apoiantes que sequestraram Cabeçadas e impuseram “a entrada no Governo de um outro político, mas este violento e faccioso” e que não oferecia “garantia alguma de amor e dedicação à República como sucedia com o Comandante Cabeçadas”77.

Apesar de muitos republicanos terem demonstrado confiança na “figura ereta de militar valente” e que não receava “perigos” de Gomes da Costa, o jornal afirmava que este oficial, rodeado pela direita extremista, não teria força suficiente para reagir, em conformidade com as aspirações da República, contra “essa nefasta camarilha que desde Braga até ao atual momento” o cercava, o guardava, o sequestrava, o inspirava, o dominava, o torcia, o vergava, o obrigava a mudar de ideias78.

De facto, a maior crítica apontada ao General Gomes da Costa era a inconstância e contradição constante patente nas suas decisões: “são todas as palavras, são todos os atos do General Gomes da Costa que se contradizem, que se modificam diariamente, a causa do receio em que vive a opinião republicana do país pela incerteza do dia de amanhã…”79. Neste contexto, o jornal apresentou um exemplo específico e demonstrativo

da pressão que considerava estar a ser exercida sobre Gomes da Costa e que comprometia gravemente a sua credibilidade. Tratou-se da exoneração de Ferreira do Amaral, Comandante da Polícia de Lisboa, ordenada por Gomes da Costa, quando, no dia anterior, o General tinha garantido ao Comandante que pretendia mantê-lo naquele cargo. Dito isto, surgia uma “revelação gravíssima”: corriam rumores de que o próprio Ferreira do Amaral tinha pedido a demissão quando, na realidade, havia sido exonerado do seu cargo por Gomes da Costa80.

76 “ Horas Tristes”. O Democrático, nº 629, 26/06/1926, p. 1. Ver anexo 2. 77 “Horas Tristes”. O Democrático, nº 629, 26/06/1926, p. 1.

78 “Horas Tristes”. O Democrático, nº 629, 26/06/1926, p. 1. 79 “Horas Tristes”. O Democrático, nº 629, 26/06/1926, p. 1. 80 “Horas Tristes”. O Democrático, nº 629, 26/06/1926, p. 2.

A conduta governativa de Gomes da Costa era de tal maneira motivo de preocupação para O Democrático que a edição de 3 de julho abriu com a notícia de que este General, “o mais categorizado membro do Ministério”, tinha “posto nos lugares de maior destaque dos vários serviços públicos autênticos monárquicos, sob o rótulo de competências, demitindo os homens de funda fé republicana”. Por outro lado, é de realçar a apreensão demonstrada pelo periódico relativamente à posição de Filomeno da Câmara no Governo, pois temia que Sinel de Cordes, “o General de ideias monárquicas bem definidas”, se reaproximasse do poder e ameaçasse a reconstrução da República. Adicionalmente, o semanário constatava com tristeza e ressentimento o facto de altas figuras republicanas, “que ao regime e à Pátria” tinham “prestado assinalados serviços”, estarem a ser conduzidas ao exílio e “cujo crime” consistia “em não se deixarem dominar por estes salvadores de marca bera”81.

Também nesta edição se faz um balanço, trinta dias após a eclosão do movimento militar, que “derrubou o ministério presidido por António Maria Silva”. O periódico esperava “um Governo forte, inteligente e experimentado”, que “executasse o programa da revolução ou, por outra, resolvesse os assuntos pendentes e os que surgissem com desusado critério, honestidade e firmeza...”. Porém, não era este o cenário em que o país se via mergulhado quatro semanas após o triunfo golpe militar. Em vez disso, assistia-se a um caos instalado:

Em 30 dias temos assistido a paradas militares, muitas paradas, banquetes e movimento de tropas. Ministros que entram hoje e saem amanhã, quando não saem no mesmo dia, substituição de comandos, de autoridades e corporações administrativas e, para que a fita esteja completa, até já houve um golpe de

Estado82.

Por vezes, O Democrático apontava decisões mais ou menos irrelevantes da Situação para a depreciar e desacreditar; por exemplo, criticou com sarcasmo uma medida aprovada pela nova administração: a autorização do casamento a crianças com 14 anos,

81 “Confissão insuspeita – o perigo monárquico”. O Democrático, nº 630, 03/07/1926, p. 1. 82 “A Vitória”. O Democrático, nº 630, 03/07/1926, p. 1. Ver Anexo 3.

“uma medida acertadíssima, porque a população estava a diminuir assustadoramente!...”83.

De uma forma geral, O Democrático considerava que, perante a evolução da situação, todos saíram a perder: o povo, “sobrecarregado com uma despesa” que devia “aproximar-se de cem mil contos, feita com o movimento de tropas e banquetes”; o país que se viu afetado com a uma “interrupção forçada na marcha dos negócios públicos”; “os políticos perderam porque o Governo de [...] Gomes da Costa” era “uma miscelânea” que não servia “a nenhum dos grupelhos existentes” e “os monárquicos perderam porque contavam com um pássaro na mão e ele fugiu-lhe para nunca mais voltar”. O periódico considerava, numa atitude simultaneamente desesperada e inusitada, que só tinha saído a ganhar o PRP, “cuja força ninguém” seria “capaz de destruir”84, embora tivesse sido

derrubado em consequência do golpe militar, como se sabe.

Fiel às suas origens e convicções, o semanário insistiu na defesa do Partido Democrático que se via atacado por várias frentes, sendo apontado como o principal responsável pelos “males da Nação”. O Democrático contestava esta teoria, desafiando os críticos a considerarem a problemática “situação política da Europa”, nomeadamente os casos de Espanha e França. Desta forma, afirmava que a “ruína do país” se deveria a “um certo número de fatores inevitáveis” – comuns às situações de outros países – “e não à política do PRP”. Portanto, tirada a exclusiva carga de responsabilidade ao PRP pelo fracasso da política republicana, o jornal questionava os leitores e os críticos sobre o porquê da situação do país mesmo assim, e segundo esta lógica, não melhorar85.

Ao mesmo tempo que ia relatando “a quente” os desenvolvimentos do movimento militar, o jornal referenciou que em Vila do Conde os “acontecimentos políticos” tinham sido “o assunto de todas as conversações, sendo os jornais lidos com interesse”86, estando

o propósito da imprensa periódica local a ser cumprido: garantir que a população se mantivesse informada.

83 “A Vitória”. O Democrático, nº 630, 03/07/1926, p. 1. 84 “A Vitória”. O Democrático, nº 630, 03/07/1926, p. 1.

85 “Razão Claríssima”. O Democrático, nº 633, 24/07/1926, p. 1. 86 “Pelas aldeias. Labruge”. O Democrático, nº 631, 09/07/1926, p. 3.

Sem surpresa, o desmantelamento da estrutura republicana impunha-se como matéria fraturante. Uma das primeiras oposições consistiu na resistência à decisão dos Governos da Ditadura Militar em dissolver as corporações administrativas locais. O periódico não encontrava, nesta medida, quaisquer benefícios para os municípios. Considerava-a um ataque ao PRP e suas resoluções, que retirava poder e autonomia de ação “aos homens que dentro das povoações dirigiam os partidos ou tinham influência política”. Alterações na lei como a aprovação de um novo encargo atribuído às Câmaras Municipais, que ficavam doravante responsáveis pelo pagamento do vencimento dos “empregados das administrações dos concelhos e a aquisição de casas devidamente mobiladas, para residência do juiz da comarca e o respetivo Delegado do Procurador da República”, só traziam pesados encargos financeiros às respetivas Câmaras Municipais, o que provavelmente resultaria na criação de novos impostos ou agravamento dos existentes87.

Relativamente a este assunto, com impacto nas localidades do concelho de Vila do Conde, o semanário publicou as primeiras impressões dos correspondentes na freguesia da Junqueira: “em virtude do decreto que dissolve todas as corporações administrativas, lá se vai também a nossa Junta de Paróquia, que há anos, a contento de todos, vem gerindo os negócios da freguesia”. Enumeraram-se os feitos da junta em prol da freguesia e esperava-se, num misto de preocupação e insegurança, que a alternativa que lhe sucedesse fizesse tão bom ou melhor trabalho88.

A 13 de agosto deste ano, apareciam as primeiras referências à censura instaurada pelo regime de Ditadura Militar. O autor do artigo de abertura desta edição (que assina apenas com a inicial “A.”) começou por se declarar contra a censura à imprensa aplicada pelo Governo: “sou como toda a gente intransigente adversário dessa tirania, porque ela impede-nos de dizer todas as verdades e obriga-nos a situações deprimentes”. Mas, rapidamente, apresentou razões que fundamentavam a aplicação da censura na imprensa portuguesa, convidando o leitor a pôr a mão na consciência. Defendia que a censura podia e devia ser utilizada na imprensa se esta servisse de motor para a “desmoralização do

87 “Razão Claríssima”. O Democrático, nº 633, 24/07/1926, p. 1. 88 “Pelas aldeias. Junqueira”. O Democrático, nº 633, 24/07/1926, p. 3.

povo” ou se diminuísse “a autoridade dos homens por uma intensa e premeditada campanha de descrédito”. Por outras palavras, o autor afirmava que a imprensa não tinha “servido os propósitos da sua criação”, pois havia-se transformado num instrumento sem moral e sem princípios que não instruía, não informava, não moralizava. Assim, a censura parecia-lhe “não só uma medida justa e oportuna, mas também de necessidade permanente”, chegando mesmo a afirmar: “para que a imprensa seja correta, é preciso impor-lhe a censura. Só assim ela é o que deve ser. Abençoada censura!”89. Contudo,

como mais adiante se verá, esta posição relativamente à censura sofrerá uma modificação. Em finais de agosto de 1926, noticia-se – de forma irónica – a queda e o exílio de Gomes da Costa para os Açores, que chegara à Ilha Terceira em meados do mesmo mês: “O Sr. Gomes da Costa, novo Napoleão de cartolina, em breve conheceu a tristeza da aprazível Santa Helena dos Açores. O seu sonho de dominar teve a duração de um instante”. Ao mesmo tempo, quando o General Carmona assumiu o poder, o tom taciturno e pessimista do jornal relativo ao estado do país transforma-se, pelo menos em algumas linhas deste artigo, demonstrando que depositava confiança no novo estadista e na sua ação salvífica:

Veio a seguir o Sr. Carmona, homem de grande prestígio, e a atmosfera desagradável que se ia criando em volta do movimento desanuviou-se um tanto. E Sua Excelência, um homem de grandes virtudes, e se não é um sábio, um estadista, um grande homem, impõe-se por sólida cultura e até certa elegância espiritual. Nós acreditamos mesmo na grande virtude do seu civismo, do seu imenso amor pátrio. Não duvidamos um instante que ele seria contente de realizar uma obra de salvação nacional90.

Sobre este desenvolvimento político, chegaram por correspondência à redação de

O Democrático algumas reações dos vila-condenses. Em Gião, por exemplo, haviam

89 “Censura”. O Democrático, nº 636, 13/08/1926, p. 1.

causado “verdadeira surpresa os últimos acontecimentos de Lisboa, principalmente o passeio forçado do General Gomes da Costa até aos Açores. Ninguém previa tanto”91.

Paralelamente, o jornal apontou os “problemas gravíssimos” nas várias pastas do Ministério que continuavam “sem solução e sem […] probabilidades de se solucionarem”. Na pasta da Instrução, o semanário considerava urgente a efetuação da republicanização do ensino nacional, “porque de facto em todas as escolas” se sentia “ainda a influência de um velho jesuíta coimbrão”. Não deixa de ser curiosa esta opinião de O Democrático, pois se em algum campo a obra da República se fez sentir com particular acuidade foi justamente no da educação; por essa razão a Ditadura Militar e o Estado Novo (nos seus primeiros tempos) porfiariam durante anos na destruição do ensino republicano e seus valores. O periódico referia também o gabinete das Finanças que continuava numa situação crítica, sendo que nas outras pastas nada se via ainda “de útil e bom”. Assim, apesar de se erguer uma nova esperança na governação, o país – cerca de três meses após o golpe armado – continuava “moribundo”92.

Como seria de prever, visto ser mais uma forma de enaltecer a República e fazer oposição à Ditadura Militar, O Democrático não deixava que o aniversário do 5 de Outubro de 1910 passasse em claro nas suas páginas. Para além dos inúmeros “Vivas à República” e elogios a feitos passados, a mensagem principal do semanário era que se deveria fazer “menos ruído nas festas e mais firmeza nos propósitos tantas vezes afirmados, de emendar os erros tão repetidamente cometidos”. Resumidamente, ao mesmo tempo que o periódico clamava que se recordasse e celebrasse sempre a República, suplicava para que se trabalhasse de maneira a melhorá-la para torná-la digna da Nação93. E este tom manter-se-ia durante toda a década, sempre que o calendário

marcava a efeméride da implantação da República, com O Democrático a abordar o assunto, uma vez que a esperança pelo retorno do republicanismo esmorecia no horizonte.

Nos inícios de 1927, o periódico deu grande destaque à questão do reordenamento do território, que se traduzia, nas palavras deste semanário, na dissolução e criação “de distritos, concelhos e deslocamento de freguesias de um lado para o outro”. Apresentando

91 “Pelas aldeias”. O Democrático, nº 633, 24/07/1926, p. 3. 92 “Per Omnia Saecula”. O Democrático, nº 637, 20/08/1926, p. 1. 93 “Na Hora de Festa”. O Democrático, nº 643, 05/10/1926, p. 1.

a sua oposição a estas medidas, o jornal prosseguiu com a crítica ao novo regime: “não há dúvida nenhuma que a Ditadura está fazendo uma sementeira de ódios por esse país fora”, visto que os “protestos fazem-se continuamente por parte dos povos prejudicados” que veem, de um momento para o outro, “os seus direitos seculares postergados, em benefício, na mais das vezes, de interesses de povoações que desejam prosperar e engrandecer-se à custa do vizinho”. Nota-se, portanto, que o grande objetivo do semanário com a redação deste artigo era fazer ver que a Ditadura Militar não tinha em conta o supremo interesse da Nação nem procurava saber se era “da vontade dos povos a deslocação para os concelhos absorventes”94. Sobressai neste artigo, com efeito, o

imperativo de respeitar a vontade da população e de conferir uniformidade na aplicação das medidas, se estas viessem, de facto, a ser implementadas. Quer isto dizer que se estas medidas fossem aprovadas, deveriam ser obrigatoriamente executadas em todo país e não só em algumas regiões. Efetivamente, como já foi referido, a falta de critérios de uniformização dera azo a exemplos concretos de indignação que proliferavam pelo território nacional: “Para Santo Tirso estavam designadas duas localidades do concelho de Famalicão. Os famalicenses bateram o pé, falaram alto e de chapéu na cabeça. E a Ditadura houve por bem desistir de levar por diante o atentado contra o concelho de Famalicão”95. Adicionalmente, ainda sobre esta matéria, O Democrático evidenciou a sua

inquietação relativamente ao seu próprio concelho, afirmando que a sua integridade se encontrava ameaçada “e a gente de Vila do Conde” estava “adormecida” e não dava “o apoio devido aos homens” que trabalhavam para que o “atentado” não se efetivasse96.

Na edição publicada a 28 de maio de 1927, o semanário apresentou a análise da situação política nacional, compilando os acontecimentos de maior visibilidade, precisamente um ano depois da eclosão do movimento militar. É, mais uma vez, notória a crítica à Ditadura que, doze meses após o golpe, segundo o periódico em apreço, nenhuma melhoria trouxera a Portugal. Recuando até ao período monárquico, O

Democrático afirmou neste texto que, “durante muitos anos”, o país viveu numa

“passividade absoluta” e que apenas com a proclamação da República em 1910 se