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A Expressão Dramática enquanto atividade autêntica

A estrutura desta tese

Capítulo 4 Os Modelos Curriculares na Educação de Infância

5.4. A Expressão Dramática enquanto atividade autêntica

É importante conjugar o impacto da aprendizagem escolar na história de cada aluno, com o respeito pela singularidade das suas práticas e vivências do quotidiano. Na opinião de muitos peritos nesta matéria, as oportunidades de aprendizagem escolar têm que ser reorganizadas no sentido de se voltarem para a pessoa do aluno, assumindo uma dimensão mais dinâmica, imbuída de interação e incentivadora da resolução de problemas, de modo colaborativo (Lave, 1988).

Assim, define-se a atividade autêntica como a prática habitual das pessoas comuns no interior de uma cultura, decorrendo de situações reais (Lave, 1988), pelo que inferimos que a atividade lúdica é uma ação real, própria e natural da criança. Por ser uma ação que nasce no real é autêntica, ao partir da perceção da realidade e desenvolver-se pelas condicionantes dos contextos conhecidos da criança.

A expressão dramática, enquanto atividade lúdica, surge espontaneamente e permite à criança expressar livremente os seus sentimentos, dar vazão à imaginação criativa, desenvolver o raciocínio e desempenhar os mais diversos papéis sociais, usando o corpo nas diferentes qualidades de movimento, apresenta-se como um método educacional voltado para o desenvolvimento equilibrado da personalidade da criança. Então, o jogo dramático destina-se, a proporcionar uma educação total, ao invés de servir de técnica de reforço de ensino-aprendizagem para os diferentes conteúdos do

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currículo (A. Sousa, 2003). A criança ao desempenhar no jogo faz de conta diversos papéis sociais, ao usar o corpo nas mais diferentes qualidades de movimento, está a aprender e a desenvolver quer o raciocínio prático, quer a sua própria personalidade através da atividade de expressão dramática.

Entendemos a expressão dramática sempre pela abordagem holística do conhecimento, pela construção de identidades, pela consciencialização dos percursos de desenvolvimento dos indivíduos, pela aprendizagem e pela prática em grupo. Neste contexto, enquanto espaço integrador de conhecimento, ela deve libertar-se dos constrangimentos curriculares.

Reforçamos a ideia da expressão dramática enquanto atividade autêntica, por: decorrer de situações da vida real; transparecer o mundo das vivências e a cultura das crianças; possibilitar a construção de conhecimento, através dos mecanismos de mediação cultural, entre os quais encontramos: artefactos culturais (ferramentas e outros objetos de mediação); a linguagem - os signos; os conceitos sobre o próprio corpo, espaço, objetos, as relações do corpo com o outro.

A escola atual, por vezes utiliza a expressão dramática como disciplina de recreação [(re)animação] apresentando os conteúdos curriculares estanques e desarticulados dos contextos reais. Isto sucede porque a escola tende a separar a atividade do contexto no qual a aprendizagem decorre, criando um conflito entre atividade autêntica e atividade escolar, fazendo passar a ideia de que o conhecimento é auto-suficiente independentemente das situações onde é aprendido. A atividade escolar resulta na prática descontextualizada do real, embora inserida no contexto escolar, verificando-se um desfasamento entre o contexto social e o contexto social escolar (Fino, 2006).

O conflito resulta da distância entre o contexto social, dado pela ação dos aprendizes em situações reais e o contexto social escolar resultado da atividade escolar descontextualizada daquele real (ainda que inserida no contexto escolar). A atividade e o contexto onde ocorre a aprendizagem são importantes do ponto de vista pedagógico mas neutros relativamente ao conteúdo aprendido.

Quando ocorre uma transferência da atividade autêntica para a sala de aula, alteram-se os contextos e aquela atividade passa a ser parte da cultura escolar. Os alunos desenvolvem, então, uma atividade sucedânea. As aprendizagens e o uso delas permanecem fechados no sistema escolar, contrariamente ao que seria de supor

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relativamente ao objetivo da escolarização. Por essa razão, verifica-se uma diferença entre o êxito escolar e êxito real. A nosso ver, a escola falha ao reproduzir situações da vida quotidiana e, por isso, também falha o objetivo de preparar para a vida, fora do mundo escolar.

Para Lave, a aprendizagem é um fenómeno inerente à prática e como tal inseparável desta. Assim, problemas formalmente semelhantes são de facto diferentes em função das atividades e dos contextos onde são desenvolvidos. A construção do conhecimento é um fenómeno situado, na medida em que as especificidades situacionais incluem as relações entre as pessoas, culturas, atividades e contextos e estão implicadas no fracasso ou sucesso das atuações dos indivíduos (Lave, 1988).

O jogo dramático destina-se a proporcionar uma educação total e não apenas para servir de técnica de reforço de ensino-aprendizagem para esta ou para aquela “matéria” desta ou daquela disciplina escolar (A. Sousa, 2003, p. 33). (A. Sousa, 2003b, p. 33)

De acordo com Alberto Sousa, o jogo dramático apela a processos de improvisação, dramatização, negociação e reflexão sobre situações e inquietações (re)inventadas pelas crianças enquanto principais atores da sua aprendizagem independentemente das temáticas ou conteúdos programáticos definidos pelo educador. Por vezes, em diferentes estabelecimentos de educação, a arte dramática é proposta às crianças de forma desajustada o que conduz, na maior parte das vezes, à reprodução do “verdadeiro teatro”, forçando as crianças a transformarem-se em atores falseados, a memorizarem peças ridículas, isto é, num ato de violência que passa por obrigá-las a um confronto com um público, em cima de um palco, numa atividade pouco significativa (Sousa A., 2003).

A figura que apresentamos seguidamente poderia representar uma atividade de expressão dramática suportada por um modelo curricular tradicional onde a educação pela arte, pela expressão, é considerada um meio de distração, um intervalo à efetiva aprendizagem através dos manuais.

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Figura 13 - Abordagem da Expressão Dramática na sala de aula

Fonte: Tonucci, F., 1988, Com olhos de criança. Lisboa: Instituto Piaget. p. 87.

Nesta perspetiva, e comentando a figura anterior, pensamos que a expressão dramática não pode ser: uma ação limitada da prática da expressão, com imposição, sem liberdade de expressão, sem implicação, sem participação ativa; uma ação

descontextualizada do real, sem a produção de artefactos com sentido intrínseco; uma ação, em última análise, que não tenha em conta o sistema de referência cultural das crianças.

Contrariamente àquilo que espelha a figura anterior, Henry Giroux refere que: Eu acredito que fundamental para uma pedagogia crítica realizável é a necessidade de encarar as escolas como locais democráticos dedicados a formas de fortalecer o self e o social. Nestes termos as escolas são lugares públicos onde os estudantes aprendem o conhecimento e as habilidades necessárias para viver em uma democracia autêntica (Giroux, 1997, p. 28).

Devemos então ponderar a possibilidade de desenvolvermos uma pedagogia crítica que dê ênfase e significado aos processos de aprendizagem e conhecimento das crianças na sala de atividades, enquadrada como um espaço de diálogo e de sentido democrático.

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5.5.

A Prática pedagógica liderada pelo educador e a atividade de

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