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A perspetiva pedagógica do MEM

A estrutura desta tese

Capítulo 4 Os Modelos Curriculares na Educação de Infância

4.2. A abordagem ao modelo curricular Movimento da Escola Moderna (MEM)

4.2.2. A perspetiva pedagógica do MEM

Este modelo assenta num projeto democrático de autoformação cooperada de docentes, transferido por analogia para um modelo de cooperação educativa nas escolas. Trata-se, pois, de um modelo sociocentrado que defende uma prática democrática e cooperada na gestão de conteúdos, atividades, materiais, tempos e espaços (Grave- Resendes, 2002). No aperfeiçoamento do modelo pedagógico são reconhecidas as influências concetuais e teóricas da pedagogia institucional, do autogoverno, com referências a António Sérgio, bem como à aprendizagem social e interativa, inspirada em Vigotsky (Niza, 2002).

Preconiza-se metodologias ativas e diferenciadas de trabalho escolar, fomentando a participação democrática dos alunos na vivência em cooperação na sala de atividades, bem como nos diversos contextos da vida da instituição educativa e comunitária, partindo das necessidades e dos interesses das crianças para uma partilha de forma contratual e dialógica, em processos de negociação continuada de tempos, recursos e conteúdos. O modelo tem como finalidade o envolvimento e a corresponsabilização das crianças na sua própria aprendizagem, numa perspetiva de educação inclusiva, pelo que a organização social do trabalho de aprendizagem escolar assenta em três princípios fundamentais (Niza, 1998):

- As estruturas de cooperação educativa, que promovem a cultura de integração e de corresponsabilização do grupo pelo percurso de aprendizagem de cada um dos membros. Estas estruturas pressupõem que cada membro só possa atingir os seus objetivos quando cada um dos outros o atinja também, sendo que este mecanismo de facilitação social adquire tanto mais eficácia, quanto mais conscientes desta regra forem os membros participantes;

- A promoção dos circuitos de comunicação, considerada um dos fatores de desenvolvimento mental e de formação social, baseada na “cultura da expressão livre”

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que dá sentido social às aprendizagens escolares, cujos produtos culturais circulam em redes complexas de distribuição e de comunicação e cujos circuitos múltiplos de comunicação estimulam os alunos a desenvolver formas variadas de representação e a construírem, em interação, os conhecimentos sobre o mundo e a vida;

- A participação democrática direta, na organização e na gestão do currículo e da escola, onde os professores e educadores e as crianças vão experienciando e desenvolvendo a democracia na escola, integrando a construção de atitudes, valores, competências sociais e éticas, correspondentes a essa participação democrática.

Com a convicção de que os fins democráticos da educação devem ser veiculados pelos meios pedagógicos, foi delineado o seguinte conjunto de pressupostos do Modelo do Movimento da Escola Moderna que direciona o trabalho desenvolvido na sala de aula (Niza, 1998):

- A ação educativa centrada no trabalho diferenciado de aprendizagem dos alunos em oposição ao ensino simultâneo dos professores;

- O desenvolvimento de competências cognitivas e socioafetivas, que passa pela ação e pela experiência efetiva das crianças, organizadas em estruturas de cooperação educativa;

- A convicção de que o conhecimento se constrói pela consciência de percurso da sua própria construção, partindo dos processos de produção integrados em projetos de estudo, de investigação ou de intervenção para a compreensão dos conceitos e das suas relações;

- O sentido social do trabalho conferido pela tensão organizadora e estruturante do conhecimento adquirido ao longo da participação em projetos em que as crianças partem do estudo, da experiência e da ação nos projetos envolvidos, para a sua comunicação;

- A organização contratada da ação educativa que evolui por acordos negociados entre as partes envolventes e que resulta numa cooperação formativa e reguladora da gestão dos conteúdos programáticos, da organização dos meios didáticos, dos tempos e dos espaços;

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- A realização do trabalho escolar fora da sala apenas decorrendo do plano individual de trabalho, autoproposto e complemento de atividades de pesquisa documental, inquérito, leitura de livros ou produção de textos;

- A organização de um sistema de pilotagem do trabalho diferenciado dos alunos, através de estruturas de cooperação assentes num conjunto de mapas de registo, cujo sistema sustenta o planeamento e a avaliação cooperada das aprendizagens e da vida social da turma;

- A prática democrática da organização, partilhada por todos, formalmente instituída em Conselho de Cooperação Educativa, que efetiva a regulação social da vida escolar e processos de trabalho escolar que reproduzem processos sociais autênticos, da construção da cultura nas ciências, nas artes e na vida quotidiana, assim como as estratégias de aprendizagem orientadas por estratégias metodológicas de cada área científica e não por transposições didáticas;

- A cultura produzida e partilhada pelas crianças assente em circuitos sistemáticos de comunicação como validação social do trabalho de produção e de aprendizagem;

- O desenvolvimento curricular acompanhado de um sentido sócio-moral, dado pela cooperação pela entreajuda dos alunos na construção das aprendizagens;

- A intervenção das crianças no meio escolar e na comunidade, bem como a integração dos atores da comunidade educativa como fontes de conhecimento dos projetos de estudo dos alunos.

Destaca-se, assim o facto de que a preocupação de promover a participação e a aprendizagem num contexto democrático que se quer de qualidade é uma constante, de onde resulta a democracia na escola como uma perspetiva de constituição da identidade. A sintaxe do modelo pedagógico do MEM, composta por cinco componentes: trabalho de aprendizagem por projetos cooperativos, trabalho curricular comparticipado pela turma, circuitos de comunicação para a difusão partilhada dos produtos culturais, trabalho autónomo e acompanhamento individual, a organização e gestão cooperada em conselho de cooperação educativa (MEM, 2009). Podemos observar a sintaxe do MEM no seguinte esquema:

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Figura 10 - Sintaxe do Modelo Curricular do Movimento da Escola Moderna

Fonte: MEM, 2009, Sintaxe do modelo curricular do movimento da escola moderna. Retrieved from http://ww2.movimentoescolamoderna.pt/modelo-pedagogico/sintaxe-do-modelo/

Verifica-se, então, que um dos aspetos chave deste modelo é o facto dos educadores e professores ligados a este movimento considerarem as suas práticas pedagógicas “ensaios estratégicos e metodológicos” promotores da autoformação cooperada de docentes, pois através do processo contínuo de reflexão cooperada os docentes criam uma identidade profissional. Nesta perspetiva, os encontros entre docentes são uma constante no sentido de se fazer a troca e partilha de conhecimentos através de reflexões teóricas e práticas. Consequentemente, professores e educadores experimentam, praticam e beneficiam da cooperação, da negociação, da partilha de responsabilidades e do regime democrático (Niza, 2004).

Assim sendo, podemos apreender, através de uma lista de verificação da operacionalização do modelo pedagógico do MEM para a educação pré-escolar (a que tivemos acesso) que a intervenção dos educadores deve proporcionar o seguinte: Ao

nível do cenário pedagógico: Organização das Áreas de Trabalho: Biblioteca /

centro de documentação; Oficina de escrita e reprodução; Laboratório de ciências e matemática; Oficina de construções e carpintaria; Ateliê de artes plásticas; Área de dramatização; Área Polivalente; Organização da Rotina diária e semanal: Acolhimento em conselho e planificação; Tempo de atividades Projetos e

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Comunicações; Trabalho curricular comparticipado pelo grupo /Animação cultural; Avaliação em Conselho; Utilização de Instrumentos de Pilotagem: Diário; Mapa de atividades; Mapa de presenças; Mapa de tarefas; Inventários; Lista de projetos; inscrições para “Quero mostrar, contar ou escrever”; Plano do dia. Ao nível da

organização e gestão cooperada em conselho de cooperação educativa: A avaliação dos instrumentos de pilotagem: Promoção da tomada de consciência sobre a

participação das crianças em diversas áreas da sala e em diversas atividades de grupo (comunicações, projetos, conselhos) procurando desocultar problemas, progressos e identificar estratégias para resolver problemas de crianças individuais ou do grupo, estabelecendo contratos; O Acolhimento em Conselho: Dar oportunidade às crianças de mostrarem coisas que trazem de casa, de falarem de assuntos pessoais, ou de escreverem um texto; Ajudar as crianças a clarificar as suas mensagens fazendo perguntas que levam à reconstrução e expansão do discurso; Promover a passagem do diálogo individual (criança-educador) para o grupo, encorajando as crianças a participarem em grupo e a comentar ou discutir assuntos; Apoiar o planeamento do trabalho / projetos decorrendo das experiências individuais trazidas de casa e partilhadas em grupo; Na Planificação da semana e do dia: Ler para os alunos a informação registada nos instrumentos de pilotagem, nomeadamente: na tabela com as componentes do diário: “queremos’ e ‘fizemos’, registadas na semana anterior, identificar/negociar a transição dos assuntos para a semana seguinte; Ajudar as crianças a pensar no planeamento das atividades e dos projetos, identificando as ações “quando”, “com quem” e “como”; Apoiar as crianças na negociação do planeamento fazendo um encontro entre os desejos e as necessidades de cada um e do grupo; Negociar com as crianças o que se irá fazer no dia, preenchendo o plano do dia; Na Distribuição de

tarefas: Identificar com o grupo um conjunto de tarefas indispensáveis ao bom

funcionamento; Implementar um sistema rotativo de responsabilidades semanais, promovendo pares estáveis entre crianças mais velhas e mais novas; Avaliar com as crianças a forma de desempenhar as tarefas da semana anterior, identificando evoluções, problemas e modos de resolução; Na Avaliação e planificação em conselho ou

balanço semanal no conselho (à 6ª feira): Leitura do Diário: Clarificação das

ocorrências negativas (identificar as fontes de conflito, o quê, onde, e como aconteceu o que se registou) sem atitude judicial; Estimular a clarificar eticamente os conflitos com base numa lista de operações: Explicar o que aconteceu; Explicitar intenções e

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sentimentos - as razões de agir dos diferentes pontos de vista; Perceber as consequências dos atos e antecipação de outras possíveis consequências; Promover o colocar-se no lugar do outro; Decidir em conselho soluções, reparações ou estratégias de prevenção de problemas - mudanças no espaço e nos materiais; apropriação de regras do jogo social; reforçar a inter-ajuda convidando o grupo a apoiar-se /responsabilizar-se alargando a cooperação; Respeitar possíveis “não consensos” dando tempo a uma verdadeira negociação e construção de compromissos comuns; Envolver-se diretamente no registo de ocorrências positivas oferecendo-se como modelo ajudando as crianças a focalizarem-se em comportamentos; Escrever sobre ocorrências positivas que envolvem crianças muitas vezes referidas no “não gostámos” de forma a apoiar o seu desenvolvimento e promover o conforto moral; Clarificar as ações e as suas consequências, tomando consciência dos sentimentos e valores. Reforçar o sentido de comunidade fraterna; Fazer o balanço dos resultados alcançados e das planificações futuras; No trabalho de aprendizagem curricular por projetos cooperativos de

produção, pesquisa e intervenção: Promover sustentação, participação e

acompanhamento; Envolver-se nas várias áreas da sala promovendo a organização (escolha de materiais, identificação de ações, formas de cooperação) com vista ao trabalho autónomo; Tomar parte nas várias áreas da sala promovendo a apropriação de formas de trabalhar e brincar mais complexas através da ação conjunta e da linguagem, compartilhando o prazer da co-construção e da problematização; Participar em diálogos sustentados (pensamento partilhado sustentado) procurando entrar em comunicação com as ideias e intenções das crianças e co-construir significados mais avançados; Fomentar a cooperação entre as crianças, a tutoria e a responsabilização mútua das tarefas; Acompanhar o desenvolvimento de competências de acordo com os saberes de cada um (diferenciação); Desenvolver o registo de experiências das crianças como forma de tomada de consciência, reflexão sobre a ação, planeamento e como instrumento de comunicação. Nos Projetos: Apoiar as crianças avançando (modelando) uma ‘conduta de projeto’ como instrumento de pensamento em projeto na antecipação de uma representação mental do que se quer fazer, saber ou mudar; Ajudar a clarificar o significado social do trabalho previsto, com vista à sua utilização, apropriação, intervenção e difusão; Apoiar a elaboração do projeto de atuação desdobrando-o em ações; Ajudar a conceber um plano de trabalho distribuindo as ações no tempo e atribuindo as responsabilidades; Favorecer a sua execução em interação dialógica;

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Apoiar a monitorização dos processos e sua avaliação continuada, reformulações ou redirecionamentos; Impulsionar e apoiar a organização da comunicação dos resultados do projeto alargando as formas de difusão; Promover a avaliação do processo e da utilização social dos resultados pela reflexão crítica em grupo, recorrendo a vários pontos de vista (pais, elementos da comunidade, outras crianças, etc.); Nos Circuitos de

Comunicação: Expor nas paredes da sala os trabalhos recentes dos meninos, junto às

áreas em que foram desenvolvidos; Promover a difusão e partilha dos produtos culturais do trabalho realizado através de um tempo diário de comunicações de trabalho nas áreas Comunicações de Projetos, Exposições, Publicações, Correspondência com base numa lista de operações:

1) Mostrar /dizer e descrever, explicar - apoio à apresentação e explicitação do trabalho desenvolvido acentuando os seus objetivos, os processos que levaram à sua concretização (como, com quem) e os resultados;

2) Questionar e comentar - dar a palavra ao grupo para questionar, comentar, partilhar pontos de vista, no sentido da construção partilhada de sentidos e tomada de consciência coletiva sobre os processos e produtos;

3) Avaliar - fomentat a apreciação crítica do trabalho pelo grupo, modelando critérios relevantes para cada tipo de trabalho, no sentido de aprender a avaliar objetivamente e a encontrar formas de resolver os problemas, responsabilizando o grupo pelo progresso de cada um;

4) Sugerir ideias para melhorar ou continuar – promover o enunciar pelo grupo de ideias para melhorar, complementar ou desenvolver o trabalho apresentado, no sentido de promover o desenvolvimento das aprendizagens em cooperação; No Trabalho

Curricular Comparticipado pelo Grupo e também na Animação Cultural: Ter uma

rotina semanal consistente de atividades de animação cultural e trabalho coletivo nas várias áreas do currículo: Leitura de histórias e dramatizações; Cultura alimentar; Correspondência; Conferências; Expressão musical; Expressão motora; Relatos /balanço das visitas de estudo; trabalho de texto; conceitos matemáticos); Promover as visitas de estudo regulares como forma de relação com o meio, enriquecimento das aprendizagens (observação, questionamento, recolha de informação, contacto com áreas diversas da atividade humana) e interpelação do meio; Proporcionar a vinda de pais e elementos da comunidade à sala para partilharem saberes com o grupo; Incrementar a

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comemoração de datas festivas significativas da comunidade como forma de revitalização do património cultural, planeando com o grupo a sua operacionalização.

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