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A perspetiva curricular do modelo High Scope

A estrutura desta tese

Capítulo 4 Os Modelos Curriculares na Educação de Infância

4.1. A abordagem ao modelo curricular High Scope

4.1.3. A perspetiva curricular do modelo High Scope

O Currículo Pré-escolar funciona porque dá às crianças poder para perseguirem os seus próprios interesses de forma intencional e criativa. No processo, as crianças desenvolvem iniciativa, interesse, curiosidade, desembaraço, independência e responsabilidade – hábitos de funcionamento que lhes serão úteis ao longo de toda a vida (Hohmann, 1997, p. 13).

O educador prepara o espaço pedagógico de forma intencional de maneira a responder aos projetos que decorrem dos interesses das crianças, negociando com estas diferentes formas de realização dos problemas levantados. Aqui, a estruturação do espaço é sentida como uma mais-valia na ação educativa do educador e condição necessária para que a criança se desenvolva e faça uma aprendizagem ativa (Oliveira- Formosinho, 2007a).

O educador High Scope prepara o contexto, de forma intencional, para responder a um projeto no quadro do desenvolvimento e do interesse das crianças. “Isto quer dizer

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que o espaço e os materiais, a organização do ambiente educacional são considerados uma área de intervenção curricular do educado.” (Oliveira-Formosinho, 2007, p. 69).

O espaço é uma dimensão curricular e requer uma reflexão sobre a ação educativa quer a nível da sala de atividades, quer ao nível da escola como organização.

O modelo curricular High Scope predispõe o ambiente educativo para a observação e resolução de problemas, onde o educador disponibiliza condições e materiais para a criança desenvolver as suas capacidades de pensamento e raciocínio, sendo que a metodologia de trabalho de projeto é desenvolvida constantemente, e a criança deve estar ativamente envolvida nas suas aprendizagens. Para concretizar o currículo, os educadores e outros atores educativos trabalham em equipa e partilham os pressupostos e a dinâmica de uma prática pedagógica suportada pelo modelo curricular High Scope porque:

O desenvolvimento curricular é um processo complexo que requer um compromisso com uma filosofia educativa abrangente e bem definida; um conhecimento extenso acerca do crescimento e do desenvolvimento humanos; uma experiência prática com crianças e a compreensão dos seus interesses; e uma capacidade de consolidar e interpretar um corpo de dados de investigação sempre crescente nas áreas de ensino e aprendizagem (Hohmann, 1997, p. 1).

O conjunto de crenças, os princípios sobre a forma como a criança aprende e o papel do educador na promoção da aprendizagem em ação representam o processo da abordagem High Scope. Neste contexto, a organização do espaço pedagógico e dos materiais respetivos promove a escolha, o poder de iniciativa aquando da realização das atividades (Hohmann, 1997).

Como poderemos observar na tabela seguinte, as experiências-chave, consideradas essenciais para que a criança construa o conhecimento em diferentes contextos, estão categorizadas e arrumadas em dez tópicos: representação criativa; linguagem e literacia; iniciativa e relações interpessoais; movimento; música; classificação; seriação; número; espaço e tempo. Esta lista vai sendo alterada conforme as sugestões oriundas da investigação e das equipas de educadores que refletem a educação de infância em contexto de formação e intervenção. Assim, o conteúdo curricular decorre das iniciativas das crianças e das experiências-chave, que apresentamos no quadro seguinte.

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Quadro 10 - As experiências-chave do modelo curricular pré-escolar High Scope Representação

criativa

Reconhecer objetos através de imagem, do som, do tato, do sabor e do cheiro; Imitar

ações e sons; Relacionar reproduções, imagens e fotografias com locais e objetos reais; Fazer de conta e representar papéis; Fazer reproduções com barro, blocos e outros

materiais; Desenhar e pintar. Linguagem e

literacia

Falar com os outros acerca de experiências pessoais significativas; Descrever objetos, acontecimentos e relações; Tirar prazer da linguagem: ouvir histórias e poemas, inventar

histórias e rimas; Escrever de diversas formas: desenhar, garatujar, formar grafismos,

soletrar de forma inventiva, utilizar formas convencionais; Ler de diversas formas: leitura de livros de história, de sinais e de símbolos, leitura pessoalizada; Ditar histórias. Iniciativa e

relações Interpessoais

Fazer e expressar escolhas, planos e decisões; Resolver problemas surgidos durante a brincadeira; Responsabilizar-se pelas suas próprias necessidades; Expressar sentimentos através da palavra; Participar nas rotinas do grupo; Ser sensível aos sentimentos, interesses e necessidades dos outros; Construir relações com as outras crianças e com os adultos;

Criar e experimentar jogos cooperativos; Lidar com o conflito interpessoal.

Movimento Movimentar-se sem locomoção (movimento com apoio: dobrar-se, rodar; balançar-se e mexer os braços); Movimento com locomoção (movimento sem apoio: correr, saltar, rodar, saltar ao pé coxinho, pular, marchar, subir); Movimentar-se transportando objetos;

Expressar criatividade através do movimento; Descrever o movimento; Mover-se de acordo com instruções; Sentir e expressar um compasso constante; Movimento sequencial de acordo com um compasso definido.

Música Mover-se ao som da música; Explorar e identificar sons; Explorar a voz a cantar; Desenvolver melodias; Cantar canções; Tocar instrumentos musicais simples

Classificação Explorar e descrever semelhanças, diferenças e atributos dos objetos; Distinguir e descrever formas; Ordenar e fazer correspondências; Utilizar e descrever objetos de diferentes maneiras; Atender cognitivamente a mais do que um atributo em simultâneo; Diferenciar entre “alguns” e “todos”; Descrever as características que um objeto não possui ou a classe a que não pertence.

Seriação Comparar atributos (mais cumprido/mais curto, maior/menor); Dispor vários objetos uns a seguir aos outros numa série ou padrão de descrever as relações entre eles (grande/maior/maior de todos, vermelho/azul/vermelho/azul); Fazer corresponder um conjunto de objetos ordenados a um outro conjunto de objetos por tentativa e erro (chávena pequena-pires pequeno/chávena média-pires médio/chávena grande-pires grande). Número Comparar o número de objetos em dois conjuntos para determinar “mais”, “menos” e

“número igual”; Ordenar dois conjuntos de objetos efetuando uma correspondência um a um; contar objetos.

Espaço Encher e esvaziar; encaixar e separar coisas; Reordenar e dar nova forma aos objetos (embrulhar, torcer, esticar, amontoar, introduzir); Observar as pessoas, os locais e os objetos de diferentes pontos de vista espaciais; Experimentar e descrever posições,

direções e distâncias no espaço da brincadeira, no das construções e na proximidade do

Jardim de Infância; Interpretar as relações espaciais em desenhos gravuras e fotografias. Tempo Paragem e começo de uma ação a um sinal dado; Experiência e descrição de movimentos

com diferentes ritmos; Experiências e comparação de intervalos de tempo; Antecipação,

lembrança e descrição de sequência de acontecimentos.

Nota: Adaptado de Hohmann, M. W., D., 1997, Educar a Criança. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, p. 30.

Das cinquenta e oito experiências de aprendizagem que, no seu conjunto, definem o género de conhecimento que emerge durante a infância no percurso natural e diário da criança, num contexto de interações com materiais, pessoas, ideias e acontecimentos, destacámos a negrito as que consideramos estar relacionadas com a atividade de expressão dramática.

Uma vez que as crianças, no seu dia-a-dia, são encorajadas a interagir e a comunicar, de forma significativa e espontânea, com os colegas e adultos da sala, estas experiências sociais são equacionadas no contexto das atividades planificadas pelas

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crianças. Na continuidade desta abordagem, a aprendizagem acontece pela ação da criança, a qual implica a ação direta sobre os objetos; a reflexão (pensamento/linguagem) sobre as ações realizadas; a motivação intrínseca da criança; a criação e produção de artefactos e resolução de problemas (Hohmann, 1997).

Um outro fator importante na construção de ambientes educativos de qualidade é o clima na sala de atividades, onde podemos prever a emergência de três tipos de climas possíveis: clima de permissividade, clima diretivo e clima de apoio. Os dois primeiros demonstram fragilidades e pouca qualidade educativa, enquanto que o clima de apoio é aquele que é ideal construir com as crianças.

O quadro seguinte apresenta estes três tipos de clima, explicando as suas características do ponto de vista da criança, do adulto e do currículo:

Quadro 11 - Três tipos de climas possíveis nos contextos educativos

Clima de permissividade Clima de Apoio (o desejável) Clima diretivo

As crianças estão sob controlo a maior parte do tempo, com os adultos como espetadores que supervisionam.

As crianças e os adultos partilham processos de aprendizagem de forma negociada e democrática.

Os adultos detêm o controlo.

Os adultos intervêm para responder a pedidos, oferecer informações e restaurar a ordem.

Os adultos valorizam as potencialidades e os talentos das crianças, colaboram com elas, apoiam as suas brincadeiras intencionais e são mediadores das aprendizagens.

Os adultos dão ordens e informações.

O conteúdo curricular provém da brincadeira das crianças.

O conteúdo curricular tem origem nas iniciativas das crianças e é corporizado pela gestão curricular exercida pelo educador.

O conteúdo do currículo vem dos objetivos de aprendizagem estabelecidos pelos adultos. Os adultos valorizam intensamente

a brincadeira das crianças.

Os adultos valorizam, acima de tudo, a ação das crianças como meio de aprendizagem, num contexto de brincadeira.

Os adultos valorizam

intensamente o uso da prática e da repetição por parte das crianças.

Os adultos utilizam várias abordagens e estratégias para lidar com os comportamentos das crianças.

Os adultos fazem a gestão de conflitos apelando às estratégias de resolução de problemas, num sentido democrático e de bem-estar.

Os adultos utilizam o castigo e o isolamento da criança como estratégias educativas predominantes.

Nota: Adaptado de Hohmann, M. W., D., 1997, Educar a Criança. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, p. 73.

A partir desta sistematização, podemos concluir que num plano ideal, o educador deve proporcionar “um clima de apoio”, na criação e recriação do ambiente educativo, pelo que este deve partilhar a liderança, negociando democraticamente, valorizando as capacidades das crianças, colaborando nas brincadeiras como um meio propício para aprender, gerindo conflitos enquanto oportunidades educativas, e contribuindo para o bem-estar de todos. Pensamos que neste tipo de ambiente todas as atividades no âmbito

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da comunicação e das expressões, em particular a expressão dramática, foco do nosso estudo, acontecem valorizadas e ampliadas num contexto de liberdade onde o currículo emerge predominantemente das iniciativas das crianças.

4.2. A abordagem ao modelo curricular Movimento da Escola

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