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Apesar de encontrarmos literaturas24 que têm revelado preocupação em

conceituar e/ou clarificar o conceito de formação, esta ainda se apresenta como um fenômeno complexo e de pouco consenso no que tange tanto às teorias quanto às dimensões mais importantes que possibilitam analisá-la.

Propondo uma reflexão sobre a noção de formação, Ferry (2004) alerta que ao utilizá-la nem todos lhe dão os mesmos sentidos, confundindo-a com certas condições da formação que são seus suportes. A formação, segundo o autor, não deve consistir em implementações de programas e conteúdos de aprendizagem, como algo que se consome ou que pode ser recebido de fora do sujeito, pois estes, apesar de serem indispensáveis para a formação, configuram-se em parte dos suportes e condições para que ela ocorra, mas não a definem. Ressalta o autor que a formação pode ser concebida como “algo que tem relação com a forma. Formar-se é adquirir certa forma. Uma forma para atuar, refletir e aperfeiçoar esta forma” (FERRY, 2004, p. 53, tradução minha).

O conceito de formação, também tem sido analisado por outras pesquisadoras como sendo

[...] conjunto de experiências vividas no trabalho de professor, que permitem que a identidade seja reconstruída dentro do seu quotidiano. Nessa perspectiva, trata-se de encarar as situações de formação como “reconstrução” das situações de trabalho vividas pelos professores no seu ofício, onde as aprendizagens que realizam se tornam importantes referentes para a sua formação. Incluímos, também, a possibilidade de compreender a formação como um processo de desenvolvimento individual destinado a adquirir ou aperfeiçoar capacidades. Não estamos a afirmar que a formação seja construída, apenas, por acumulação de cursos, de conhecimentos ou de técnicas. Para além dessas condições, ela compreende um trabalho de refletividade crítica sobre as práticas e de (reconstrução permanente de uma identidade pessoal) (ZANCHET; CUNHA; SOUSA, 2009, p. 97).

Presencia-se que a formação docente compreende toda uma dinâmica no ambiente acadêmico e possibilita aos profissionais o aprender da profissão.

A ideia de formação, na perspectiva de Marcelo Garcia (1999), na maioria das vezes vem acompanhada de alguma atividade, sempre que se trata de formação para algo. Conforme o autor,

A formação pode ser entendida como uma função social de transmissão de saberes, de saber-fazer ou do saber-ser que exerce em benefício do sistema socioeconômico, ou da cultura dominante. A formação pode

também ser entendida como um processo de desenvolvimento e de estruturação da pessoa que se realiza com o duplo efeito de uma maturação interna e de possibilidade de aprendizagem, de experiências dos sujeitos (MARCELO GARCIA 1999, p. 19).

Quando a formação é vista desta maneira, pode ser entendida como a dinâmica de um desenvolvimento pessoal. Nessa direção, Ferry (2004, p. 54) assevera que “uma formação não se recebe. [...] Ninguém forma o outro. O indivíduo se forma, é ele quem encontra sua forma, é ele quem se desenvolve [...]”. E, ainda, de acordo com o autor, é possível dizer que o sujeito se forma sozinho e por seus próprios meios.

Para Cunha e Isaia (2006, p. 351), o processo formativo docente

engloba tanto o desenvolvimento pessoal quanto profissional dos professores envolvidos, contemplando de forma inter-relacionada ações auto, hétero e interformativas. Logo, o que se designa por processo formativo compreende um sistema organizado no qual estão envolvidos tanto os sujeitos que se preparam para serem docentes quanto aqueles que já estão engajados na docência.

Corrobora Marcelo Garcia (1999), porém salienta que não se deve pensar que a formação acontece de forma autônoma. Tomando esse ponto de partida e com referência em Debesse, Marcelo Garcia (1999, p.19-20), apresenta a distinção entre autoformação, heteroformação e interformação.

A autoformação é uma formação em que o indivíduo participa de forma

independente e tendo sob o seu próprio controle os objetivos, os processos, os instrumentos e os resultados da própria formação. A heteroformação é uma formação que se organiza e se desenvolve “a partir de fora”, por especialistas, sem que seja comprometida a personalidade do sujeito que participa. Por último, a interformação define-se como a ação educativa que ocorre entre os futuros professores em fase de atualização de conhecimentos... e que existe como um apoio privilegiado no trabalho da equipe pedagógica [...].

Nesse sentido, a formação pode ser considerada resultado da iniciativa, da vontade, da dedicação, do comprometimento e, principalmente, do envolvimento de cada sujeito em prol do objetivo previamente delineado. Trata-se, pois, de um processo de desenvolvimento individual e consciente, mas que pode ser facilitado por meio da interação com outras pessoas, aquelas que formam e aquelas que se formam, quando são promovidos diversos e diferentes contextos/possibilidades de aprendizagem.

Diante desse contexto, reporto-me a Cunha (2014) que pondera que, se a concepção de formação não é neutra, é fundamental analisá-la numa perspectiva que se distancie da compreensão meramente técnica, afastando qualquer possibilidade de negação da subjetividade.

Portanto, parece ficar evidenciado que a formação não é um fim em si mesmo, tampouco sinônimo de treino e/ou repetições, mas resultado de um empreendimento e de uma vivência que precisa estar carregada de significado, que possibilite a ativação e o desenvolvimento de processos formativos. Por isso, uma importante particularidade presente em ações de formação, de acordo com Marcelo Garcia (1999), é que o seu desenvolvimento se dá em um contexto específico, com uma determinada organização material e com certas regras de funcionamento.

No que diz respeito ao conceito de formação de professores, é possível encontrar uma variedade de definições. Partindo da premissa da docência como profissão e, por isso, a necessidade do desenvolvimento de competência para exercê-la, Marcelo Garcia (1999, p. 26) a define como:

[...] a área de conhecimentos, investigação e de propostas teóricas e práticas que, no âmbito da Didática e da Organização Escolar, estuda os processos através dos quais os professores – em formação ou em exercício – se implicam individualmente ou em equipe, em experiências de aprendizagem através das quais adquirem ou melhoram os seus conhecimentos, competências e disposições, e que lhes permitem intervir profissionalmente no desenvolvimento do seu ensino, do currículo e da escola, com o objetivo de melhorar a qualidade da educação que os alunos recebem.

Essa formação, segundo o autor, diferencia-se de outras atividades de formação em três dimensões:

- é uma formação dupla, em que deve ocorrer a combinação entre a formação acadêmica e a formação pedagógica;

- é um tipo de formação profissional, quer dizer, forma profissional, o que nem sempre se assume como característica da docência;

- é uma formação de formadores, o que influencia o necessário isomorfismo que deve existir entre a formação de professores e a sua prática profissional.

Portanto, refletir sobre o conceito de formação de professores exige que se recorra à pesquisa, à prática de formação e ao próprio significado do papel do professor na sociedade. A pesquisa acompanha os movimentos político-econômicos e socioculturais que dão forma ao desempenho docente, quer no plano do real, quer

no do ideal. E a prática é estabelecida a partir de uma amálgama de condições teóricas e contextuais (CUNHA, 2014).

Nesse sentido, a formação de professores dá-se em um processo o qual, conforme explica Cunha (2006b, p. 353-354), desdobra-se em:

Formação Inicial: processos institucionais de formação para uma

profissão. Em geral, garantem o registro profissional e facultam o exercício da profissão. Em profissões de maior prestígio, há um forte controle corporativo e legal sobre o exercício de práticas profissionais, privilégio dos portadores de diplomas que referendam a formação inicial. [...]

Formação Continuada: iniciativas de formação realizadas no período que

acompanha o tempo profissional dos sujeitos. Apresenta formato e duração diferenciados, assumindo a perspectiva da formação como processo. Tanto pode ter origem na iniciativa dos interessados como pode inserir-se em programas institucionais. Neste último, os sistemas de ensino, universidades e escolas são as principais agências de tais tipos de formação. [...]

Formação em Serviço: tipo de educação continuada que visa ao

desenvolvimento profissional dos sujeitos, no espaço do trabalho. No caso dos professores, destina-se a docentes em atividade e que são estimulados a participar de processos formativos, em geral promovidos pelos sistemas, pelos próprios empregadores ou pares.

Partindo de considerações feitas pela autora sobre formação de professores, destaco a formação inicial e a formação continuada, que numa dimensão mais pontual vem sendo assumida pela literatura como desenvolvimento profissional dos

professores e que ocorrem, preferencialmente, nesses dois espaços. Nesse

contexto, Cunha (2014, p. 34) afirma que, em sentido amplo, a formação de professores “se faz num continuum, desde a sua educação familiar e cultural até a trajetória formal e acadêmica, e se mantém como processo vital enquanto acontece o ciclo profissional”.

O entendimento de Pimenta e Anastasiou (2010) é o de que a docência configura-se como um processo contínuo que possibilita a construção de identidade docente e tem por base os saberes da experiência, construídos no exercício profissional mediante o ensino dos saberes específicos das áreas de conhecimento, por meio da reflexão e da análise crítica desses saberes, possibilitadas pelo campo teórico da educação. Ressaltam, ainda, que a docência envolve a construção de uma identidade profissional, considerando que se constitui em um campo específico de intervenção na prática social.

Dessa forma, as autoras, tal como Cunha (2014), defendem o uso do conceito de desenvolvimento profissional dos professores do ensino superior,

considerando que envolve ações e programas, quer de formação inicial, quer de formação em serviço.

Segundo Pimenta e Anastasiou (2010, p. 89), o desenvolvimento profissional dos professores tem se constituído um objetivo de propostas que “valorizam a formação docente não mais baseada na racionalidade técnica, que os considera meros executores de decisões alheias, mas numa perspectiva que reconhece a capacidade de decidir”.

É importante pensar que a perspectiva de desenvolvimento profissional docente seja mais abrangente e mais adequada que a de formação, considerando que, dependendo da interpretação que se faça, pode configurar como algo preconcebido, que venha de fora do docente, que seja dado a ele e não construído por ele, tal como Ferry (2004) alertou que não deve acontecer quando nos referimos à formação.

Existem diferentes entendimentos acerca do conceito de desenvolvimento profissional docente. Marcelo Garcia (2009a) destaca que esse conceito vem sofrendo modificações, em virtude das mudanças na compreensão de como se produzem os processos de aprender a ensinar. No entendimento desse autor, o desenvolvimento profissional de professores deve ser entendido como uma procura da identidade profissional, na forma como os professores definem a si mesmos e aos outros. É a construção do eu profissional que evolui ao longo das suas carreiras.

Nas observações de Day (2000), o sentido do desenvolvimento profissional depende da vida pessoal e profissional dos professores, bem como das políticas e contextos escolares nos quais realizam a sua atividade docente. Nesse enfoque,

O desenvolvimento profissional envolve todas as experiências espontâneas de aprendizagem e as atividades conscientemente planificadas, realizadas para benefício, direto ou indireto, do indivíduo, do grupo ou da escola e que contribuem, através destes, para a qualidade da educação na sala de aula. É o processo através do qual os professores enquanto agentes de mudança, reveem, renovam e ampliam, individual ou coletivamente, o seu compromisso com os propósitos morais do ensino, adquirem e desenvolvem, de forma crítica [...] o conhecimento, as destrezas e a inteligência emocional, essenciais para uma reflexão, planificação e prática profissionais eficazes das suas vidas profissionais (DAY, 2000, p. 20-21).

A definição reflete como o processo de desenvolvimento profissional é complexo e abrangente. Por isso, no entendimento de Day (2000), a natureza do ensino requer o empenho dos professores num processo de desenvolvimento profissional contínuo, que deve ocorrer ao longo de toda a carreira, porém as suas

histórias pessoais e profissionais e as disposições do momento condicionarão as suas necessidades individuais e a forma como essas poderão ser identificadas. O autor explica que “o crescimento implica aprendizagem que, muitas vezes, é natural e evolutiva, outras vezes, esporádica, outras, ainda, o resultado de uma planificação” (DAY, 2000, p. 16). Complementa que, no decorrer de toda a carreira, espera-se que aos professores sejam dadas oportunidades para participação em atividades variadas e com características formais e informais que propiciem processos de revisão, renovação e aperfeiçoamento profissional.

É nessa vertente que, de acordo com o entendimento de Soares e Cunha (2010a, p.35), o desenvolvimento profissional envolve as perspectivas institucional e pessoal. A perspectiva institucional refere-se a um “conjunto de ações sistemáticas que visam alterar a prática, as crenças e os conhecimentos profissionais dos professores, portanto, vai além do aspecto informativo”, enquanto na “perspectiva pessoal o desenvolvimento profissional se projeta por uma disposição interna e uma postura de busca permanente de crescimento pessoal e profissional” (SOARES; CUNHA, 2010a, p. 35).

No entanto, ressaltam as autoras que, essas ações precisam ser assumidas tanto pelos indivíduos como pelos demais profissionais que deverão atuar de forma integrada na instituição, pressupondo a inter-relação entre os desenvolvimentos profissional e organizacional.

O entendimento de Pimenta e Anastasiou (2010) é o de que a docência configura-se como um processo contínuo que possibilita a construção de identidade docente e tem por base os saberes da experiência, construídos no exercício profissional, mediante o ensino dos saberes específicos das áreas de conhecimento, por meio da reflexão e da análise crítica desses saberes, possibilitada pelo campo teórico da educação. Destacam, ainda, que a docência envolve a construção de uma identidade profissional, considerando que se constitui um campo específico de intervenção na prática social. Dessa forma, defendem o uso do conceito de desenvolvimento profissional dos professores.

Esse conceito, ao constituir-se um objetivo de propostas educacionais que valorizam a formação docente, possibilita o cotejamento das ações cotidianas com as produções teóricas, permitindo a revisão de suas práticas de ensino (PIMENTA; ANASTASIOU, 2010).

Marcelo Garcia (1999) ressalta que conceber a formação de professores como um processo contínuo, sistemático e organizado significa entender, assim como Day (2000), a sua extensão por toda a trajetória da carreira docente. Isso porque o conceito “desenvolvimento” tem conotação de evolução e continuidade que sugere a superação da justaposição entre a formação inicial e o aperfeiçoamento de professores. Esse conceito presume uma abordagem de formação de professores que respeite e valorize a sua característica contextual, organizacional e sua orientação para a mudança.

Feixas (2004), em uma análise acerca da influência de fatores pessoais, institucionais e contextuais, define o desenvolvimento profissional como um processo gradual em que a profissão se desenvolve por meio da acumulação de descobertas e aprendizagens, individuais e coletivas, fruto da reconstrução da experiência, oriundas de uma série de interações com o contexto. Enfatiza a autora que o conhecimento e a aprendizagem do professor dependerão do tipo e da variedade com que se insere no contexto. As múltiplas interpretações que podem surgir, a variedade de respostas e suas possíveis combinações culminarão em histórias de vida pessoais distintas e únicas. No entendimento da autora, o desenvolvimento profissional dos docentes é diferente de qualquer desenvolvimento biológico, no qual as etapas se sucedem em uma ordem natural determinada. Os professores, no que tange ao processo de desenvolvimento, não seguem uma ordem prefixada, isto é, podem passar de uma etapa a outra quando as preocupações da etapa em que se encontram tenham diminuído, as concepções tenham mudado ou a dinâmica educacional melhorado, porque foram amplamente tratadas.

Ainda sobre o desenvolvimento do professor, Feixas (2004) nos induz a concluir que é um processo individual, em que cada um segue seu próprio ritmo, portanto, não se pode pensar num coletivo de professores como um coletivo homogêneo, considerando que existem diferentes níveis de maturidade pessoal e profissional. É importante conhecer essas variáveis quando as atividades de formação são pensadas, elaboradas, implementadas e avaliadas, no sentido de que elas possam oferecer informações válidas para conhecer o efeito das propostas e/ou programas que são desenvolvidos, no que se refere à contribuição, para o desenvolvimento profissional do docente. Portanto, é importante frisar que o desenvolvimento é fruto de uma vontade e conscientização pessoal de aprender e

querer melhorar continuamente, o que para o docente que está no início da carreira torna-se imprescindível, considerando ser este o momento em que tem início à construção de sua identidade profissional.