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IV. Hiperligações e referências bibliográficas

1.7. A importância do primeiro despacho

O inquérito tem como objecto os factos constantes da notícia do crime que chega ao conhecimento do Ministério Público (artigo 241.º do CPP) e os diversos enquadramentos jurídico-penais que os mesmos podem integrar. A investigação que se inicia, visa comprovar a verificação (ou não) de determinado(s) tipo(s) de crime(s), designadamente, no que diz respeito aos seus elementos objectivos e subjectivos, e os seus agentes (artigo 262.º do CPP).

Por ser assim, quer nos casos em que o Ministério Público assume a própria investigação realizando os actos de inquérito, quer nos casos em que delega total ou parcialmente essa investigação nos órgãos de

polícia criminal, um dos momentos que pode determinar o sucesso da investigação em curso é a prolação do primeiro despacho. É nele que o magistrado que tem a seu cargo o inquérito deve proceder, desde logo, ao saneamento do processo e apreciar várias questões, tais como:4

– A sua legitimidade e competência para prosseguir com a investigação (artigos 48.º a 52.º e 264.º, n.º 1, do CPP);

– Proceder a validações de constituição de arguido (artigo 58.º, n.º 3, do CPP) e apreensões (artigo 178.º, n.º 6, do CPP);

– Ponderar a necessidade de aplicação de determinada medida de coacção; – Apreciar a aplicação do segredo de justiça (artigo 86.º, n.º 3, do CPP);

– Apreciar se estão a ser investigados crimes de natureza prioritária (Lei n.º 96/2017); – Indicar as diligências a executar e as que devem ser presididas pelo magistrado;

– A decisão de delegar ou não nos OPC a investigação, a totalidade dos actos de inquérito (genérica), ou apenas para certos ou determinados actos.

– Controlar a prescrição.

Este é o momento de definir a melhor estratégia investigatória, que pode ou não estar vertida no primeiro despacho, ponderar as diligências reputadas essenciais para o esclarecimento dos factos em investigação e ordenar a sua execução (se for o caso).

Certo é que nos casos em que se decida delegar a investigação, para que a direcção do inquérito seja efectiva e não meramente formal, o magistrado deve assumir de facto o seu controlo. Para tanto torna- se necessário que o mesmo ordene a realização das diligências que considera relevantes, tais como, inquirição de testemunhas e interrogatório dos arguidos, com a indicação das perguntas a fazer ou dos concretos pontos que pretende que sejam esclarecidos, podendo ainda estabelecer a ordem preferencial da sua realização para optimizar os resultados.

Além do mais, é o magistrado que investiga o crime que estará em melhores condições para saber o resultado que pretende com determinada diligência. No primeiro despacho deve ainda constar concretamente a identificação do OPC para onde a investigação será delegada, indicar um prazo para a realização das diligências e as instruções ao funcionário da secção para que o mesmo saiba o que fazer no caso de aqueles prazos serem ultrapassados.

Só estas medidas permitirão ter maior controlo da investigação de molde a permitir respeitar os prazos do inquérito e, assim, permitir que se administre a justiça num tempo razoável.5

Estes variam consoante o tipo de criminalidade que está a ser investigada e se existem ou não arguidos presos (artigo 276.º do CPP).

4 Sessão quatro de formação específica de direito penal e processual penal – Ministério Público 33.º curso – ministrada pelo Procurador da República Rui Cardoso.

5 Ventinhas, António, in Os Prazos de Inquérito, Revista Sábado 15/03/2017.

Certo é que, apesar da sua natureza ordenadora e não peremptória, como é unanimemente aceite, a ultrapassagem desses prazos, pode ter consequências negativas para o apuramento da verdade dos factos, inviabilizando, por exemplo, a realização, ou a realização com utilidade, de determinadas diligências, como, por exemplo, buscas, cujos resultados podem ficar seriamente comprometidos em determinado tipo de situações.

Para evitar o “vai e vem” dos processos de inquérito entre o MP e os OPC, e mesmo nos casos em que a investigação é feita directamente pelo Ministério Público e oficiais de justiça, é primordial que o magistrado faça um esforço no sentido de planear o desenrolar do inquérito e ponderar tão precocemente quanto possível a realização de todas as diligências essenciais.

Esta é uma tarefa tanto mais complexa, quanto mais complexos forem os factos em investigação. Ainda assim, para que seja possível imprimir celeridade à investigação criminal, embora sem atropelos, é primordial que o magistrado ordene, dentro do possível, a realização de todas as diligências úteis, evitando delegações de carácter genérico para os OPC, sem a indicação das concretas actividades a desenvolver. Naturalmente que esta circunstância assume particular acuidade nos processos dotados de especial complexidade, mas não só.

Antes de ordenar a realização de qualquer diligência, o magistrado titular do processo deve formular um concreto juízo de ponderação da sua necessidade e adequação para a prova dos factos que estão a ser investigados (artigo 267.º do CPP), sem descurar um concreto juízo de proporcionalidade reflectido na consideração dos respectivos custos e tempo necessários para a sua realização e, bem assim, a necessidade da restrição de direitos fundamentais que a mesma imponha (artigo 18.º, n.º 2, da CRP) em função dos bens jurídicos concretamente protegidos com a criminalização de determinada conduta e a prevalência do interesse da comunidade na realização da justiça e na descoberta da verdade.

2. Os Órgãos de Polícia Criminal 2.1. Enquadramento

É no título IX da Constituição da República Portuguesa que tem por epígrafe “Administração Pública”, mais concretamente no seu artigo 272.º, que encontramos referência ao papel da actividade policial na defesa e manutenção da ordem, segurança e da tranquilidade públicas, na defesa dos direitos dos cidadãos, intrinsecamente ligado ao direito à segurança plasmado no artigo 27.º, n.º 1, do diploma constitucional, e da prevenção da criminalidade. A sua actividade é orientada pelo princípio da legalidade e o princípio da proibição do excesso, preceitos tipicamente do foro administrativo, aplicáveis a estas entidades por também terem natureza administrativa.

Na senda dos Professores Gomes Canotilho e Vital Moreira, o princípio da legalidade significa que a actuação policial deve sempre pautar-se pelo respeito da lei, no sentido de que todos os actos que forem adoptados pelas autoridades policiais, quaisquer que eles sejam, devem estar nela previstos. No

que ao princípio da proibição do excesso concerne, o mesmo concretiza-se na verificação de três pressupostos: necessidade, exigibilidade e proporcionalidade, pelo que, no cumprimento dos mesmos, as entidades policiais devem actuar de forma justificada, através do emprego de medidas que se revelem necessárias às finalidades que lhes precedem, optando sempre por aquelas que se revelem menos gravosas, desde que, naturalmente, adequadas àquelas finalidades6.

Importa ainda referir que apesar da inserção sistemática do citado artigo 272.º, certo é que, os princípios acima referidos aplicam-se, tal como é unanimemente aceite, a todos os tipos de polícia (fala-

se apenas em polícia no seu sentido total), ou seja, a polícia administrativa, a polícia de segurança e a

polícia judiciária. 7

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