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IV. Hiperligações e referências bibliográficas

7. Entraves à efectiva direcção do inquérito pelo Ministério Público – Breve apontamento

Em termos estatutários prescreve o artigo 12.º, n.º 2, alínea b), do EMP que cabe ao Procurador-Geral da República “Dirigir, coordenar e fiscalizar a actividade do Ministério Público e emitir as Directivas,

ordens e instruções a que deve obedecer a actuação dos respectivos magistrados”, sendo que o artigo

58.º, n.º 1, alínea d), refere que compete aos Procuradores-Gerais Distritais “Coordenar a actividade dos órgãos de polícia criminal”.

Apesar dos referidos preceitos apontarem para a atribuição da coordenação da investigação criminal a cargo do Ministério Público, como aliás também acontece com as disposições processuais penais e constitucionais já aqui referidas neste trabalho, a verdade é que, na prática, a direcção efectiva do inquérito está comprometida, colocando esta magistratura “arredada” da coordenação da investigação criminal.

Nos termos do artigo 13.º, n.º 1, da LOIC foi criado o Conselho Coordenador dos OPC, o qual é presidido por membros do Governo, mais concretamente, pelos responsáveis pelas áreas da justiça e da administração interna, dele fazendo parte o secretário-geral do Sistema Integrado de Segurança Interna (Lei n.º 53/2008 de 29 de Agosto), o comandante-geral da Guarda Nacional Republicana e os directores nacionais da Polícia de Segurança Pública, da Polícia Judiciária e do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras, os dirigentes máximos de órgãos de polícia criminal de competência específica e o director-geral dos Serviços Prisionais. Apesar de o Procurador-Geral da República poder participar nas reuniões deste órgão sempre que o entender, conforme decorre do artigo 13.º, n.º 5, a verdade é que não se compreende como é que o legislador, atentas as funções do Ministério Público na investigação criminal, não incluiu o Procurador-Geral da República na composição do conselho, e não reconheceu a essencialidade dessa solução em face daquelas competências.

Aliás, não se compreende como é que este órgão que tem funções tão importantes, tais como,

(a) Dar orientações genéricas para assegurar a articulação entre os órgãos de polícia criminal; (b) Garantir a adequada coadjuvação das autoridades judiciárias por parte dos órgãos de polícia

criminal;

(c) Informar o Conselho Superior da Magistratura sobre deliberações susceptíveis de relevar para o exercício das competências deste;

(d) Solicitar ao Procurador-Geral da República a adopção, no âmbito das respectivas competências, das providências que se revelem adequadas a uma eficaz acção de prevenção e investigação criminais;

criminais;

(f) Definir metodologias de trabalho e acções de gestão que favoreçam uma melhor coordenação e mais eficaz acção dos órgãos de polícia criminal nos diversos níveis hierárquicos,

não conta com a participação obrigatória do Ministério Público.

Por sua vez o artigo 15.º, n.º 1, da LOIC entregou a coordenação dos órgãos de polícia criminal ao secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, de acordo com as orientações genéricas emitidas pelo conselho coordenador dos órgãos de polícia criminal e sem prejuízo das competências do Ministério Público, competindo-lhe, designadamente, garantir a partilha de meios e serviços de apoio de acordo

com as necessidades de cada órgão de polícia criminal (artigo 15.º, n.º 2, alínea b)) e assegurar o funcionamento e o acesso de todos os órgãos de polícia criminal ao sistema integrado de informação criminal, de acordo com as suas necessidades e competências (artigo 15.º, n.º 2, alínea c)).

É verdade que a Lei de Organização da Investigação Criminal nos seus artigos 14.º, n.º 2, 15.º, n.º 2, afasta a possibilidade daqueles órgãos de emitirem Directivas, instruções ou ordens sobre processos determinados, embora, na prática, tal limitação não obsta a que ao abrigo das atribuições que lhe estão adstritas no âmbito deste diploma, tomem decisões que acabem por influenciar directamente o andamento de determinados processos em concreto.

Acresce que a possibilidade admitida pelo artigo 14.º, n.º 1, alínea d), que permite que o Conselho Coordenador dos OPC possa solicitar ao Procurador-Geral da República a adopção, no âmbito das

respectivas competências, as providências que se revelem adequadas a uma eficaz acção de prevenção e investigação criminais, acaba por inverter toda a lógica de um sistema assente no princípio da

autonomia e independência dos magistrados do Ministério Público, perante os membros do governo. Perante o que acaba de ser dito, as normas acima referidas, ao afastarem as autoridades judiciárias de matérias tão relevantes como as que referimos, no que à investigação criminal diz respeito, afrontam a constituição ao violarem não só da autonomia do Ministério Público, mas também a independência dos tribunais, constitucionalmente garantidas. 14

Impõe-se ainda chamar à colação, em virtude de também afrontar os princípios acima referidos, o facto de o acesso e funcionamento do Sistema Integrado de Informação concebido pela LOIC, com a redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 38/2015, que permite, nos termos do artigo 11.º, a partilha de informação entre os OPC dentro dos limites nele previstos e o acesso à mesma pelas autoridades judiciárias no âmbito da direcção da investigação e da respectiva coordenação, competir ao secretário-geral do Sistema de Segurança Interna, conforme decorre do artigo 15.º, alínea c), da LOIC, cuja nomeação e exoneração cabem ao primeiro-ministro.

14 Cardoso, Rui “Investigação Criminal Diagnóstico de um sistema (propositadamente) doente”, in Terra da Lei Separata n.º 3.

Também no que diz respeito à plataforma para o intercâmbio da informação criminal, criada ao abrigo do artigo 11.º da LOIC, nos termos do artigo 5.º, n.º 1, da Lei n.º 73/2009, de 12 de Agosto, alterada pela Lei n.º 35/2015, de 11 de Maio, que veio estabelecer as condições de acesso àquela informação, compete igualmente ao secretário-geral do Sistema de Segurança Interna garantir a implementação e coordenação da plataforma, assegurar as funcionalidades de intercâmbio de informação e a supervisão da mesma.

Em face do supra exposto, decorre que o controlo e a coordenação da informação, que é a “matéria- chave” na investigação criminal, acabam por escapar ao controlo efectivo das autoridades judiciárias (Ministério Público/Juiz de Instrução), na medida em que o controlo não é apenas feito ao nível do Código de Processo Penal e no próprio processo, para passar a ser feito também externamente, por

órgão de natureza política.15

Em suma, “O Ministério Publico tem hoje cada vez mais dificuldades para efectivamente orientar os

órgãos de polícia criminal, principalmente aqueles que o devem coadjuvar nas mais importantes investigações, naquelas em que a comunidade lhe exige a prestação de contas. Não havendo verdadeira titularidade do inquérito, não haverá verdadeira autonomia do Ministério Público no núcleo essencial da sua actividade – a acção penal”.16

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