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IV. Hiperligações e referências bibliográficas

4. Consequências da “violação” das regras de competência de coadjuvação

Cabem aqui as situações em que um determinado acto processual foi praticado por um OPC diferente daquele que seria o competente ao abrigo das regras de competência de coadjuvação vertidas na Lei de Organização da Investigação Criminal que analisámos.

A reflexão sobre esta matéria remete-nos, desde logo, para o artigo 5.º da LOIC que tem como epígrafe “Incompetência em matéria de investigação criminal”, segundo o qual:

“1 – Sem prejuízo dos casos de competência deferida, o órgão de polícia criminal que tiver notícia do crime e não seja competente para a sua investigação apenas pode praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar os meios de prova.

2 – Sem prejuízo dos casos de competência deferida, se a investigação em curso vier a revelar conexão com crimes que não são da competência do órgão de polícia criminal que tiver iniciado a

10 Sessão dois de formação específica de direito penal e processual penal – Ministério Público 33.º curso – ministrada pelo Procurador da República Rui Cardoso.

investigação, este remete, com conhecimento à autoridade judiciária, o processo para o órgão de polícia criminal competente, no mais curto prazo, que não pode exceder vinte e quatro horas.

3 – No caso previsto no número anterior, a autoridade judiciária competente pode promover a cooperação entre os órgãos de polícia criminal envolvidos, através das formas consideradas adequadas, se tal se afigurar útil para o bom andamento da investigação”.

Na LOIC não encontramos qualquer outra norma dedicada a esta temática. Da sua leitura decorre, desde logo, que a mesma não prevê qualquer consequência que afecte a validade do acto praticado em face da inobservância das regras de competência em matéria de investigação criminal.

Perante esta ausência de resposta da LOIC relativamente a este assunto, será que estamos perante uma nulidade ou uma irregularidade nos termos plasmados no artigo 118.º do CPP?

Adiantamos, desde já, que consideramos que não.

A este propósito debruçou-se o Acórdão da Relação de Lisboa de 09/06/2016, relatado por Maria do Carmo Ferreira, no processo 50/14.0SLLSB (disponível em www.dgsi.pt). O Acórdão apreciou o recurso de um despacho proferido pelo tribunal a quo (…) “que indeferiu a invalidade arguida pelo recorrente no

que concerne à prática de actos de investigação criminal no decurso do inquérito pela Polícia de Segurança Pública, cuja competência só pode ser delegada na Polícia Judiciária, nos termos dos artigos 7.º e 8.º da Lei n.º 48/2008 de 27 de Agosto (…)”.

Em síntese, defende o recorrente que a inobservância destes normativos configura uma nulidade insanável, nos termos do artigo 119.º, alínea b), do CPP, ou, pelo menos, uma irregularidade, nos termos do artigo 118.º, n.º 2, do CPP.

Acompanhamos a posição assumida na resposta ao recurso apresentada pelo Ministério Público o qual defendeu que a situação em apreço não pode, nunca, acarretar qualquer invalidade (nulidade ou

irregularidade – artigo 118.º e seguintes do CPP) pois a LOIC não é uma “lei do processo penal”.

Dito de outra forma, a prática de um determinado acto processual por um OPC diferente do OPC competente de acordo com as regras atributivas de competência plasmadas na LOIC não afecta a sua validade.

De acordo com o n.º 1 do citado dispositivo legal "A violação ou a inobservância das disposições da lei

do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei"

(sublinhado nosso). Por sua vez, o n.º 2 da mesma norma refere que nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular.

Conforme já aqui foi referido, o Código de Processo Penal não faz qualquer distinção entre órgãos de polícia criminal, nem opera qualquer tipo de distribuição de competências entre os mesmos, como acontece com a LOIC. Destarte, apenas cabe verificar se os actos praticados pelo OPC, seja ele qual for,

foram delegados pelo Ministério Público nos termos do artigo 270.º do CPP, por ter considerado que no caso em concreto era o que estava em melhores condições – técnicas/logísticas – para melhor desempenhar a tarefa investigatória.

Assim, o despacho de delegação de competências emanado pelo Ministério Público é legitimador da actividade do OPC no processo penal. Pelo que, cabendo-lhe definir a que OCP vai delegar a prática de determinados actos processuais, a partir do momento em que o faz, não se poderá pôr em causa essa atribuição de competências.

Aliás, a direcção efectiva da acção penal exercida em nome do Estado cabe ao Ministério Público, assistido pelos OPC, os quais actuam na sua dependência funcional (vide artigo 263.º do CPP). Ora, sendo a LOIC uma lei de carácter administrativo, que visa regular as respectivas funções dos OPC e não tendo ela previsto qualquer consequência para a situação que vimos analisando, não se pode cair na “tentação” de ir buscar à lei processual penal uma consequência para a alteração de competências. Além do mais, a admitir-se essa solução, estaríamos a afrontar a efectividade da direcção do inquérito que cabe ao Ministério Público consagrada na nossa lei fundamental e concretizada na lei processual penal.

No sumário do Acórdão pode ler-se que:

“I – Os OPCs exercem uma função de ajuda ao Mº.Pº. e Autoridades judiciárias, mas os actos determinados são sempre da Autoridade Coadjuvada, actuando os OPCs na sua dependência funcional (…), o que, naturalmente não significa uma dependência hierárquica.

II – Embora a PJ tenha competência exclusiva para a investigação criminal relativamente aos crimes de catálogo, nos termos da Lei especial LOIC, na verdade, nada proíbe que o Mº.Pº. enquanto detentor originário da investigação, entenda e ordene a realização de diligências de investigação desses crimes de área reservada, a OPCs diferentes, uma vez que a própria Lei Penal não faz qualquer distinção entre os OPCs”.

Opinião em sentido contrário tem André de Sousa Pinto. Na sua tese de mestrado defende este autor que situações como a acima referida padecem de nulidade insanável.11

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