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I. Introdução I Objectivos

1. Enquadramento jurídico e considerações gerais

2.4. Um espaço de iniciativa própria – as Medidas Cautelares e de Polícia

As medidas cautelares e de polícia, artigos 248.º a 253.º do CPP, não são ainda actos processuais, uma vez que os OPC não têm competência para determinar o processo penal com vista à decisão final, constituem outrossim actos de polícia que o legislador entendeu disciplinar no Código de Processo Penal, dada a sua estreita conexão com os actos de processo e a relevância que estes podem assumir35,

mas que só o passam a integrar se forem aceites e confirmados pelo Ministério Público (na fase de inquérito)36.

Como bem se destacou no parecer n.º 26/2012 do Conselho Consultivo da P.G.R, o processo penal português «apresenta-se incompatível com a proatividade de um órgão de soberania que integre o poder executivo (ou uma entidade dele dependente) na prossecução de fins de um processo penal concreto, apenas podendo os órgãos de polícia criminal praticar os actos cautelares necessários e urgentes para assegurar novos meios de prova de que tiverem conhecimento, sem prejuízo de deverem dar deles notícia imediata à autoridade judiciária competente (nos termos do disposto pelos n.ºs 1 e 3 do artigo 249.º do CPP)» É nesse sentido que Damião da Cunha considera que as medidas cautelares e de polícia são “actos de iniciativa própria dos órgãos de polícia criminal, no sentido de actos que lhes competem independentemente de uma qualquer ordem ou instrução prévia de uma autoridade 35 Neste sentido, SILVA, Germano Marques da, in Curso de Processo Penal, II, ob. cit., pág. 63.

36 Vide Parecer da PGR 1/2008. Sobre medidas de polícia, uso da força, emprego de armas e fogo e utilização de cães policias, cfr. Parecer do CC da PGR 108/206 – Relator Barreto Nunes publicado no DR, II Série, 16 de Maio de 2007.

judiciária e que funcionam como um “direito de primeira intervenção” de que os OPC dispõem sem, no entanto, disporem de uma competência processual penal que lhes permita determinar o rumo do processo. Simultaneamente as medidas cautelares e de polícia são normas restritivas e limitativas da competência de coadjuvação pois não permitem que os OPC, mote próprio, pratiquem actos de iniciativa própria indefinidos37. Porquanto a sua consagração, no CPP, é elucidada à luz da ideia de

concordância prática das finalidades do processo de forma a garantir que estas possibilitem, caso a caso, “a salvaguarda do máximo de conteúdo da realização da justiça, descoberta da verdade material, protecção dos direitos fundamentais das pessoas”38.

Com efeito, o legislador, ao autonomizar as medidas cautelares e de polícia, procurou alargar a competência dos OPC extravasando em parte os limites da coadjuvação, mas sem permitir que haja uma autonomização da actividade policial. Não se pode, contudo, deixar de sublinhar que os OPC devem aplicar as medidas cautelares e de polícia somente em situações de urgência ou «periculum in mora», pois, a notícia do crime, por si só, não lhes reconhece essa competência3940. Pese embora, tais medidas

serem maioritariamente de actividade pré-processual, tendo lugar antes do procedimento ter início, podem também ser desenvolvidas concomitantemente com fases processuais iniciais, inquérito e instrução, ao abrigo do n.º 3 do artigo 249.º do CPP, de molde a fundamentarem a notícia de um crime e 37 O Ministério Público e os Órgãos de Polícia Criminal, pág. 14.

38 RODRIGUES, Anabela Miranda, in “O inquérito no novo Código de Processo Penal” - Jornadas de Direito Processual Penal, CEJ, Coimbra: Livraria Almedina, 1991, pág. 71.

39 MOURA, José Souto de, in “Inquérito e Instrução”, in Jornadas de Direito Processual Penal, CEJ, Coimbra: Livraria Almedina, 1991, pág. 100: Tipologia das medidas cautelares: comunicação da notícia do crime (artigo 248.º do CPP); Exame dos vestígios do crime e manutenção do estado das coisas e dos lugares (artigos 249.º, n.º 2, a)), 171.º, n.º 2, e 173.º do CPP); Colheita de informações (artigo 249.º, n.º 2, b), e 250.º, n.º 8, do CPP; Identificação de pessoas suspeitas (artigo 250.º do CPP); Apreensões (artigo 249.º, n.º 2, c), do CPP; Revistas (artigos 249.º, n.º 2, c), e 251.º do CPP); Situações previstas no artigo 17.º, n.º 5, do CPP); De suspeitos em caso de fuga iminente ou de detenção, sempre que tiver fundada razão para crer que neles se ocultam objectos relacionados com o crime, susceptíveis de servirem a prova e que de outra forma poderiam perder-se (artigo 251.º, n.º 1, a), do CPP). Está-se neste caso perante um meio de obtenção de prova, como se depreende da sua inserção sistemática no Código, regido, quanto à sua produção e aos efeitos, pelas regras aí previstas. A revista pode, todavia, ser perspectivada num outro plano, como medida cautelar e de polícia, com vista a manter a ordem pública, balizada essencialmente pela defesa e tranquilidade e segurança públicas, aquela entendida como manutenção da ordem, esta última como um fim de prevenção de acidentes e de calamidades públicas, humanas ou naturais. De pessoas que tenham de participar ou pretendam assistir a qualquer acto processual ou que, na qualidade de suspeitos, devam ser conduzidos a posto policial, sempre que houver razões para crer que ocultam armas ou outros objectos com os quais possam praticar actos de violência (artigo 251.º, n.º 1, b), do CPP); buscas (artigos 249.º, n.º 2, c), e 251.º do CPP); situações previstas no artigo 174.º, n.º 5, do CPP); buscas ao lugar em que se encontrarem suspeitos (salvo buscas domiciliárias), em caso de fuga iminente ou de detenção, sempre que tiverem fundada razão para crer que nele se ocultam objectos relacionados com o crime, susceptíveis de servirem a prova e que de outra forma poderiam perder-se (artigo 251.º, n.º 1, a), do CPP); casos em que pode realizar buscas domiciliárias; apreensões (artigo 249.º, n.º 2, c), do CPP; apreensão de correspondência (artigo 252.º do CPP); localização celular (artigo 252.ºA do CPP).

Sem olvidar, outras medidas que assumem natureza cautelar: pedir ao suspeito “informações relativas a um crime e, nomeadamente à descoberta e à conservação de meios de prova que poderiam perder-se antes da intervenção da autoridade judiciária” (artigo 250.º, n.º 8, do CPP); deter suspeito em flagrante delito e mantê-lo detido durante 48 horas, deter suspeito fora de flagrante delito e mantê-lo detido por 48 horas; constituir o suspeito como arguido e interrogá-lo; recolher informações de "pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime" (artigo 249.º, n.º 2, alínea b), do CPP); recolher documentos que lhe sejam voluntariamente entregues pelas “pessoas que facilitem a descoberta dos agentes do crime”, pelo suspeito ou pelo arguido; proceder a exame das pessoas, dos lugares e das coisas, com o consentimento do visado ou titular do lugar ou da coisa e desde que não ofenda o pudor das pessoas; proibir a entrada ou trânsito de pessoas estranhas no local do crime ou quaisquer outros actos que possam prejudicar a descoberta da verdade; ordenar que uma pessoa não se afaste do local do exame e mantê-la no local, se necessário com auxilio da força; colher o compromisso de intérprete ou de perito (artigo 91.º, n.º 3, do CPP); nomear o intérprete (artigo 92.º, n.º 7, do CPP).

para a prova41. Conclui-se, estabelecido o âmbito das medidas cautelares e de polícia que preveja acções

por iniciativa própria de órgão de polícia criminal, após incursão pelo regime legal, que o sistema processual não compreende qualquer norma especial que preveja a derrogação da reserva judiciária, mesmo neste domínio particular. Pelo contrário, é o próprio n.º 3 do artigo 249.º do CPP que impõe, mesmo após a intervenção da autoridade judiciária, a imediata comunicação dos meios de prova de que tiverem conhecimento, àquela autoridade. A competência reservada das autoridades judiciárias é resultado de uma solução legislativa sobre a estrutura axiológica da fase pré-acusatória do processo penal, e de direcção do inquérito, a qual compreende, nomeadamente, regras dirigidas à responsabilização do titular da acção penal por decisões susceptíveis de envolver ponderações de valores sobre a necessidade e relevância de iniciativas probatórias com determinado potencial intrusivo. Definido o quadro legal e constitucional da posição do Ministério Público e dos OPC, cumpre agora analisar a dinâmica relacional que se estabelece entre ambos no seio do processo penal.

3. Relação funcional entre o Ministério Público e os OPC em sede de Inquérito

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