• Nenhum resultado encontrado

A PROBABILIDADE PARA A IDADE DA PEDRA

No documento Superprevisoes - Dan Gardner.pdf (páginas 115-118)

0% Impossível

A PROBABILIDADE PARA A IDADE DA PEDRA

reconhecidam ente hum anos. E durante a m aior parte desse tem po não tivem os acesso a m odelos estatísticos de incerteza, porque eles não existiam . Só depois de a história j á estar consideravelm ente avançada — segundo alguns apenas após a publicação em 1713 da Ars Conjectandi, de Jakob Bernouilli — foi que as m elhores m entes com eçaram a pensar a sério nas probabilidades.

Antes disso, as pessoas não tinham outra escolha a não ser confiar na perspectiva ponta-do-seu-nariz. Você vê um a som bra se m ovendo no capim alto. Deve se preocupar com leões? Você tenta pensar no exem plo de um leão atacando do capim alto. Se o exem plo lhe vier facilm ente à cabeça, corra! Com o vim os no capítulo 2, esse é o seu Sistem a 1 em operação. Se a reação é forte o bastante, pode produzir um a conclusão binária: “Sim , é um leão” ou “Não, não é um leão”. Mas se for m ais fraca, pode produzir um a inquietante possibilidade interm ediária: “Talvez sej a um leão”. O que a perspectiva ponta-do-seu-nariz não vai fornecer é um parecer tão refinado que possa distinguir entre, digam os, um a chance de 60% de que sej a um leão e um a chance de 80%. Isso exige pensam ento lento, consciente, cuidadoso. Claro, quando você estava lidando com os prem entes problem as existenciais enfrentados por nossos ancestrais, raram ente era necessário fazer tais distinções sutis. Talvez nem fosse desej ável. Um seletor com três aj ustes fornece orientações rápidas, claras. Aquilo é um leão? SIM = corra! TALVEZ = fique alerta! NÃO = relaxe. A capacidade de distinguir entre um a probabilidade de 60% e um a de 80% acrescentaria pouco. Na verdade, um a análise m ais refinada poderia retardar sua reação — e representar o seu fim .

Sob essa luz, a preferência por seletores m entais de dois e três aj ustes faz sentido. E há m uita pesquisa a enfatizar esse argum ento. Um pai disposto a pagar algo para reduzir o risco de 10% a 5% de seu filho contrair um a doença grave pode se m ostrar disposto a pagar duas a três vezes m ais para reduzir o risco de 5% a 0%. Por que um declínio de 5% a 0% é tão m ais valioso do que um declínio de 10% a 5%? Porque oferece m ais do que um a redução de 5% no risco. Oferece certeza. Tanto 0% com o 100% têm um peso m uito m aior em nossa m ente do que os m odelos m atem áticos dos econom istas dizem que deveria.8 Mais um a vez, isso não é de surpreender, se pensarm os no m undo onde nosso cérebro evoluiu. Sem pre houve ao m enos um a chance ínfim a de que um leão estivesse espreitando nas redondezas. Ou um a cobra. Ou alguém que cobiça sua cabana e está carregando um porrete. Ou qualquer um a das incontáveis outras am eaças enfrentadas pelas pessoas. Mas nossos ancestrais não podiam m anter um estado de alerta constante. O custo cognitivo teria sido grande dem ais. Eles precisavam de zonas livres de preocupação. A solução? Ignore pequenas chances e use o seletor de dois aj ustes o m áxim o possível. É um leão ou não é. Som ente quando algo inegavelm ente se posiciona entre esses dois aj ustes — apenas quando som os com pelidos — é que giram os o seletor m ental para talvez.9

Querem os respostas. Um “sim ” ou “não” confiante é satisfatório de um a m aneira que “talvez” nunca sej a, fato que aj uda a explicar por que a m ídia com tanta frequência recorre a porcos-espinhos cheios de certeza sobre o que está por vir, por pior que possa ser seu histórico de previsões. Claro que nem sem pre é errado preferir um j uízo confiante. Tudo m ais perm anecendo constante, nossas respostas para perguntas com o “A população da França é m aior do que a da Itália?” têm m aior probabilidade de estar corretas quando estam os confiantes de que estão corretas do que quando não estam os. Confiança e precisão guardam correlação positiva. Mas a pesquisa m ostra que exageram os o tam anho da correlação. Por exem plo, as pessoas dão m ais ouvidos a consultores financeiros m uito confiantes, m esm o quando seu histórico de prognósticos é idêntico ao de consultores m enos confiantes. E as pessoas equiparam confiança a com petência, o que torna m enos digno de respeito o previsor que afirm a que algo tem um a probabilidade m ediana de ocorrer. Com o um estudo observou, as pessoas “tom avam tais j uízos com o um indicativo de que os previsores eram incom petentes de form a geral, ignorantes dos fatos no caso em questão ou preguiçosos, sem vontade de despender o esforço necessário para reunir inform ação que j ustificasse m aior confiança”.10

Esse tipo de pensam ento prim itivo explica em grande parte por que tantas pessoas têm dificuldade com probabilidades. Parte disso pode ser atribuído a sim ples ignorância e incom preensão — com o pessoas que acham que “um a chance de 70% de chuva em Los Angeles” significa que “vai chover 70% do dia e nos dem ais 30%, não” ou “vai chover em 70% de Los Angeles, m as não nos dem ais 30%” ou ainda “70% dos previsores acham que vai chover, m as 30%, não”. Mas existe algo m uito m ais básico subj acente a equívocos com o esses. Para captar o significado de “um a chance de 70% de chuva am anhã” tem os de entender que a chuva pode ou não acontecer, e que de cem dias em que prevem os chances de chuva, se nossas previsões forem boas, deve chover em 70% deles e não chover no resto. Nada poderia estar m ais distante de nossa inclinação natural por pensar “Vai chover” ou “Não vai chover” — ou, se você insiste, “Talvez chova”.11

A natureza profundam ente contraintuitiva da probabilidade explica por que até m esm o pessoas m uito sofisticadas com frequência com etem erros elem entares. Quando David Leonhardt alegou que o prognóstico de um m ercado preditivo estava errado porque fora afirm ado que havia 75% de chance de que um a lei fosse anulada, e ela não foi, tive certeza absoluta de que se alguém tivesse lhe apontado seu erro, ele teria dado um tapa na testa e dito: “Claro!”. Minha suspeita se confirm ou m ais tarde, quando Leonhardt escreveu um a excelente coluna exatam ente sobre essa arm adilha: se um previsor diz que há 74% de chance de que os republicanos obtenham controle do Senado num a eleição próxim a, Leonhardt advertiu os leitores, não concluam que a previsão

estava errada se o partido não tom ar o Senado, pois “um a chance de 74% de acontecer” tam bém quer dizer “um a chance de 26% de não acontecer”.12

A confusão causada pelo seletor m ental de três aj ustes é dissem inada. Robert Rubin, o ex-secretário do Tesouro, contou-m e com o ele e seu vice na época, Larry Sum m ers, costum avam ficar frustrados quando instruíam figuras im portantes na Casa Branca e no Congresso, pois as pessoas tratavam um a probabilidade de 80% de que algo acontecesse com o um a certeza de que não aconteceria. “Você quase tinha que bater na m esa, dizer ‘olha, tem um a alta probabilidade de que isso tam bém não aconteça’”, disse Rubin. “Mas do j eito que as pessoas pensam , elas parecem traduzir um a alta probabilidade para ‘isso vai acontecer’.” E no entanto, se tirássem os essas pessoas presum ivelm ente instruídas e talentosas desse contexto, se as sentássem os num a sala de aula e lhes disséssem os que a afirm ação “Há um a chance de 80% de que tal coisa vá acontecer” significa que há um a chance de 20% de que não aconteça, elas certam ente revirariam os olhos e diriam : “Isso é óbvio”. Mas fora da sala de aula, longe de abstrações, ao lidar com questões reais, essas pessoas instruídas e talentosas revertiam ao seu eu intuitivo. Som ente quando as probabilidades eram m ais próxim as de m eio a m eio elas captavam rapidam ente que o resultado podia ou não acontecer, disse Rubin. “Se você diz que algo é 60/40, as pessoas pegam m ais ou m enos a ideia.”13

Am os Tversky m orreu, cedo dem ais, em 1996. Mas isso o teria deixado com um sorriso no rosto.

No documento Superprevisoes - Dan Gardner.pdf (páginas 115-118)