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UM ASSASSINATO MISTERIOSO

No documento Superprevisoes - Dan Gardner.pdf (páginas 99-101)

0% Impossível

UM ASSASSINATO MISTERIOSO

Em 12 de outubro de 2004, Yasser Arafat, aos 75 anos o líder da Organização para a Libertação da Palestina, ficou gravem ente enferm o, com vôm itos e dores abdom inais. Ao longo das três sem anas seguintes, sua condição piorou. Em 29 de outubro, foi transferido para um hospital na França. Ele entrou em com a. Décadas antes, quando ainda não adotara o papel de estadista, Arafat ordenara ataques com bom bas e arm as e sobrevivera a inúm eros atentados israelenses contra sua vida, m as, em 11 de novem bro de 2004, foi anunciada a m orte do hom em que um dia fora o inim igo aparentem ente indestrutível de Israel. A causa da m orte era ignorada. Mas, m esm o antes de m orrer, especulou-se que ele havia sido envenenado.

Em j ulho de 2012, pesquisadores do Instituto de Física de Radiação da Universidade de Lausanne, na Suíça, anunciaram que os testes com alguns pertences de Arafat resultaram em níveis atipicam ente altos de polônio-210. Isso era inquietante. O polônio-210 é um elem ento radiativo que pode ser letal, se ingerido. Em 2006, Alexander Litvinenko — ex-espião russo residente em Londres e crítico proem inente de Vladim ir Putin — foi assassinado com polônio- 210.

Em agosto daquele ano, a viúva de Arafat deu perm issão para seu corpo ser exum ado e exam inado por duas agências separadas, na Suíça e na França. Então a IARPA fez aos previsores do torneio a seguinte pergunta: “As investigações francesa ou suíça encontrarão níveis elevados de polônio no corpo de Yasser Arafat?”.

À prim eira vista, essa era um a pergunta difícil, um assassinato m isterioso ao estilo CSI: Jerusalém, com todas as com plexidades bizantinas do conflito entre Israel e Palestina com o pano de fundo. Com o um suj eito m ediano lidaria com isso? Provavelm ente, com eçaria pelo palpite que lhe ocorreu no m om ento em que leu a questão.

A força desse palpite vai depender da pessoa. Alguém que não soubesse m uita coisa sobre Arafat e o prolongado conflito Israel-Palestina talvez escutasse apenas um sussurro. Mas para um a pessoa bem inform ada e apaixonada por política nessa região volátil, estaria m ais para um grito. “Israel nunca faria isso!”, poderia achar. Ou “Claro que foi Israel!”. Essas são conj ecturas da perspectiva ponta-do-seu-nariz. Palpites tirados da cartola. Até que ponto são gerados pela pessoa que os deu, não posso dizer. Mas transform á-los em previsão é fácil. Quão forte é o pressentim ento? Se sua conj ectura for “Israel nunca faria isso!”, apresente um a previsão de 5% ou 0. Se for “Claro que foi Israel!”, prevej a 95% ou 100% e ponto final. Se estiver m eio que em cim a do m uro, escolha algo m ais próxim o de 50%. Quando os especialistas da tevê desfiam um a saraivada de previsões, é basicam ente isso que estão fazendo.

Essa não é a m aneira de fazer previsões precisas. Se a perspectiva ponta- do-seu-nariz contiver um erro, você não vai vê-lo — assim com o não vai notá-lo se for logo dizendo “Dez centavos!” no Teste de Reflexão Cognitiva.

E há um equívoco aqui. Você percebeu?

Leia a pergunta outra vez: “As investigações francesa ou suíça encontrarão níveis elevados de polônio no corpo de Yasser Arafat?”. Nem “Israel nunca faria isso!” nem “Claro que foi Israel!” constituem um a resposta genuína para a questão. Elas respondem a um a pergunta diferente: “Israel envenenou Yasser Arafat?”. O Sistem a 1 recorreu à clássica propaganda enganosa: a questão difícil de fato perguntada foi substituída pela questão fácil que ninguém fez.

Essa arm adilha poderia ter sido evitada. A chave é se fermizar. Bill Flack m ora em Kearney, Nebraska, no coração do Meio-Oeste e a um planeta de distância do Oriente Médio. Ele não é nenhum perito no conflito Israel-Palestina, para dizer o m ínim o. Mas não precisou ser um para com eçar a responder a questão com o pé direito.

Pensando com o Ferm i, Bill desencaixotou a questão perguntando a si m esm o: “O que seria preciso para a resposta ser sim ? O que precisaria para ser não?”. Ele se deu conta de que o prim eiro passo de sua análise nada tinha a ver com política. O polônio decai rapidam ente. Para a resposta ser sim , os cientistas teriam de ser capazes de detectar polônio nos restos de um hom em m orto anos antes. Será que conseguiriam ? Um colega de equipe postara um link para o relatório da equipe suíça sobre o teste nos pertences de Arafat, então Bill leu, fam iliarizou-se com a ciência do teste de polônio e ficou convencido de que podiam realizá-lo. Só então passou ao estágio seguinte de análise.

Mais um a vez, Bill se perguntou com o os restos de Arafat podiam ter sido contam inados com polônio suficiente para provocar um resultado positivo. Obviam ente, “Israel envenenou Arafat” era um a form a. Mas com o Bill decom pôs cuidadosam ente a questão, ele percebeu que havia outras. Arafat tinha m uitos inim igos palestinos. Eles poderiam tê-lo envenenado. Tam bém era possível que tivesse havido “contam inação intencional após a m orte executada por algum a facção palestina tentando fazer parecer que Israel reproduzira o caso de Litvinenko com Arafat”,8 Bill m e disse posteriorm ente. Essas alternativas eram im portantes, porque cada m aneira adicional para o corpo de Arafat ter sido contam inado com polônio aum entava a probabilidade de que tivesse sido de fato. Bill observou tam bém que apenas um a das duas equipes europeias precisou obter um resultado positivo para que a resposta correta à pergunta fosse sim , outro fator que em purrou a agulha nessa direção.

Isso foi só o com eço, m as, graças à análise ao estilo Ferm i de Bill, ele j á evitara a arm adilha e esboçara um roteiro para análises subsequentes. Foi um início fantástico.

No documento Superprevisoes - Dan Gardner.pdf (páginas 99-101)