• Nenhum resultado encontrado

3 ÉTICA ARISTOTÉLICA E A MACROÉTICA AMBIENTAL

3.3 MACROÉTICA AMBIENTAL: UMA ÉTICA SOCIAL QUE BUSCA EVITAR A INFELICIDADE DA COLETIVIDADE

3.3.2 Análise comparativa das éticas de Apel, Hans Jonas e Aristóteles

3.3.2.1 O progresso tecnológico e o homo faber como mecanismos ensejadores de uma nova ética

Assim, Jonas e Apel, assustados com a realidade da exploração ambiental pela tecnologia humana, elaboraram teorias macroéticas para o bem da humanidade.

Se Apel tenta construir uma razão prática independente da metafísica, com base na ética do discurso científico, Jonas, ao contrário, evidencia a fundamentação de sua ética em parâmetros metafísicos e ontológicos de um aluno de Heidegger. Ligada a uma ontologia, a ética de Jonas explora a responsabilidade para com o futuro pelo qual os viventes presentes são responsáveis.

Não obstante a diversidade de fundamentos da ética de Apel e de Jonas, diversamente da ética aristotélica, individualista, analisada anteriormente, com base na obra “Ética a Nicômaco”, tais éticas emergem de uma necessidade coletiva para resolução de

problemas coletivos.55

traição à pátria, homicídio, etc.) e, por isso, são perseguidos num processo penal e estatal muito mais rigoroso e severo (embora muitas vezes a partir de uma denúncia particular), pertencem ao direito penal [...] Comum a todos os delitos é o pressuposto da ilicitude da lesão.” No âmbito do Direito Moderno, a preocupação com a responsabilização objetiva do Estado pela energia nuclear, prevista expressamente na Constituição Federal Brasileira de 1988, na alínea “c” do inciso XXIII do art. 21 retrata a visão de que a amplitude do dano pode ensejar uma responsabilização independente de culpa.

55

“[...] a necessidade de uma ética, intersubjetivamente vinculada, de responsabilidade solidária da humanidade, diante das conseqüências de atividades e conflitos humanos” (APEL, 1994, p. 164-165) e “Lo que hoy puede hacer el hombre – y después, em el ejercicío insoslayable de esse poder, tiene que seguir haciendo – carece de parangón en la experiencia pasada. Toda la sabiduría anterior sobre la conducta se ajustaba a esa experiencia; ello hace que ninguna de las éticas habidas hasta aahora nos instruya acerca de las reglas de

Também, ambas têm preocupação com o progresso e com o tecnicismo moderno. Nesse sentido, ilustrativas são as passagens abaixo, respectivamente, de Jonas e Apel:

Tómese por ejemplo, como primer y mayor cambio sobrevenido em el cuadro tradicional, la tremenda vulnerabilidad de la natureza sometida a la intervención técnica del hombre, uma vulnerabilidad que no se sospechaba antes de que se hiciese reconocible em los daños causados (JONAS, 1995, p. 32).

Em síntese: A superação, pelo homo faber, das anteriores barreiras instintivas, organicamente condicionadas, sua intervenção no ambiente natural por meio de ferramentas e principalmente sua mortífera ação armada contra animais e contra o próximo (APEL, 1994, p. 195, grifo nosso).

Esta preocupação com o processo e com o tecnicismo moderno no termo “homo

faber” merece ser aprofundada no contexto da abordagem de Arendt (2001) na obra “A

condição humana”, a ser desenvolvida no << item 6.1>> desta primeira parte.

Na percuciente análise de Arendt, comprova-se a importância da passagem do homem de sujeito passivo da Natureza para sujeito ativo desta, na instrumentalização da natureza pelo homo faber, fato este, também, destacado por Apel e Jonas.

3.3.2.2 Semelhanças e diferenças das éticas de Apel, Jonas e Aristóteles

A comparação da ética grega aristotélica com a ética moderna destaca, no dizer de Novaes (1992, p. 8), o caráter facultativo da primeira e o “obrigatório” da segunda:

[...] uma perda irreparável, a idéia de felicidade, e a sua substituição pelas noções de obrigação, dever, obediência; o desaparecimento do modelo ideal de virtude, que poderia ser seguido optativamente, e o surgimento das normas éticas e dos preceitos a que se deve obedecer. Jonas (1995, p. 33), também, divulga rica passagem caracterizando a ética da responsabilidade como ética antropocêntrica, o que a aproxima da ética clássica; mas, por outro lado, a afasta, no que se refere à ética clássica trabalhar com condutas não

cumulativas, verbis:

En la medida em que es el destino del hombre, en su dependencia del estado de la naturaleza, el referente último que hace del interés en la conservación de ésta un interés moral, también aquí há de conservarse la orientación antropocéntrica de toda la ética clásica. No obstante, la diferencia sigue siendo grande. La limitación a la proximidad espacial y a la contemporaneidad há desaparecido arrastrada por el ensanchamiento espacial y la dilatación temporal de las series causales que la praxis técnica pone em marcha incluso para fines cercanos. Su irreversibilidad, asociada a su concentración, introduce um factor novedoso en la ecuación moral. A esto se añade

creaciones han de someterse[...]” (JONAS, 1995, p. 15).

su carater acumulativo: sus efectos se suman, de tal modo que la situación para el obrar y el ser posteriores ya no es la misma que para el agente inicial, sino que es progresivamente diferente de aquellá y es cada vez más el producto de lo que ya fue hecho. Toda la ética tradicional contaba unicamente com comportamientos no acumulativos (grifo nosso).

Outra diferença entre a ética de Jonas e a de Aristóteles pode ser vista na ênfase ao destinatário da ética. Na ética aristotélica, a base essencial do destino é o indivíduo. Para Jonas (1995, p. 37), a ética da responsabilidade dirige-se primordialmente ao ESTADO (na confecção de políticas públicas que lhe dêem cumprimento), verbis:

Esto exige una nueva clase de imperativos. Si la esfera de la produción há invadido el espacio de la acción esencial, la moral tendrá entonces que invadir la esfera de la producción, de la que anteriormente se mantuvo alejada, y habrá de hacerlo en la forma de política pública. Nunca antes tuvo ésta parte alguna em cuestiones de tal alcance y em proyectos a tan largo plazo. De hecho la esencia modificada de la acción humana modifica la esencia básica de la política

[...] La frontera entre <<Estado>> (polis) y <<Naturaleza>> há quedado abolida. La ciudad del hombre, que antaño constituía um enclave dentro del mundo no humano, se extiende ahora sobre toda la naturaleza terrenal y usurpa su lugar (grifo nosso).

Há diferenças entre Apel e Jonas, apesar de ambos se preocuparem com o tecnicismo. Jonas discute a possibilidade de ética ecocêntrica ao indagar se a Natureza tem

valor moral próprio (JONAS, 1995, p. 35),enquanto Apel, nos textos em análise, não trata deste tema.

Ressalta Jonas, no âmbito da tradição européia, preocupação que, também, teve expressão no continente americano, conforme veremos com a análise de correntes éticas voltadas para a Natureza como valor intrínseco.

Jonas (1995, p. 35) destaca que esse tema, apesar de inovador e revolucionário no âmbito ético e científico, tem expressão no âmbito religioso, na expressão de que o homem é “fiduciário do criador”, verbis:

A excepción de la religión, ninguna ética anterior nos há preparado para ello la visión científica hoy dominante de la naturaleza. Esta visión nos niega decididamente cualquier derecho teórico a pensar em la naturaleza com algo que haya de ser respetado, pues la há despojado de la dignidad de los fines (grifo nosso).

Apesar de não se posicionar expressa e entusiasticamente em relação a esta visão ética, Jonas dá vulto à abertura de apreciação filosófica desta questão (JONAS, 1995, p. 35).

No campo dessa ética ecológica de responsabilidade coletiva, passível de análise e apreciação do Natural além do humano, podemos classificar algumas correntes – de macroéticas – contemporâneas para o trato da questão ambiental.

Outline

Documentos relacionados