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A CONSCIENTIZAÇÃO DA DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

1 O SER HUMANO E A NATUREZA NA HISTÓRIA

1.2 A CONSCIENTIZAÇÃO DA DEGRADAÇÃO DO MEIO AMBIENTE NO MUNDO CONTEMPORÂNEO

A história recente da humanidade é marcada por avanços jamais vistos no domínio das técnicas e dos processos de produção de bens materiais. Hoje não só somos capazes de produzir em quantidades maiores e com melhor qualidade tudo o que nossos antepassados produziam, como temos, também, acesso a produtos que, há vinte anos atrás, não seriam sequer imagináveis. Todo esse avanço, todavia, não terá o seu preço?

A preocupação com temas ambientais vem se tornando mais intensa com a entrada no século XXI. Na Carta de São Francisco, que criou a Organização das Nações Unidas, o tema não se apresentava com o destaque contemporâneo. Em 3 de Abril de 2000, o Secretário-Geral da ONU, Kofi A. Annan, apresentou à Assembléia-Geral o relatório do

milênio. Nesse relatório, são identificados desafios ambientais e apresentadas soluções, no

Capítulo V, intitulado “Sustaining on Future”. Assim, Annan (2000, p. 25) afirma:

Os fundadores das Nações Unidas estabeleceram, nas palavras da Carta de São Francisco, o objetivo de promover o progresso social e melhores padrões de vida por meio dos direitos fundamentais – acima de tudo, liberdade de escolha e liberdade sem opressão. Em 1945, eles não puderam, entretanto, antecipar a necessidade urgente e atual de realização de um terceiro direito fundamental: o direito das gerações futuras de terem suas existências garantidas no nosso planeta. Nós estamos falhando na realização dessa garantia. Na verdade, nós estamos legando a nossos filhos uma herança de arcar com nossas práticas destruidoras do meio ambiente.

Para solucionar essa problemática, Annan (2000, p. 29-30) sugere a construção de uma nova ética global, baseada em quatro objetivos:

- incremento da informação pública para que os consumidores do mundo todo entendam que as suas opções de consumo têm conseqüências ambientais relevantes;

- colocação de temas ambientais nas políticas públicas,

evitando o trato isolado da questão ambiental a um único Ministério;

- criação pelo Estado de mecanismos reguladores de mercado incentivadores da proteção ambiental, cortando subsídios de

atividades econômicas poluidoras;

- criação de um sistema mundial de avaliação ambiental

(“Millennium Assessment of Global Ecosystems”), com o objetivo de mapear a saúde da terra.

Verifica-se, pois, que todos os quatro objetivos elencados vinculam a questão ambiental à econômica, o primeiro objetivo, ao tratar da relação entre os bens e os reflexos ambientais de seu consumo. O segundo, com a colocação do tema ambiental nas políticas públicas, inclusive com a realização de uma contabilidade pública que leve em conta os custos e benefícios ambientais. O terceiro objetivo, com a intervenção estatal sobre o mercado. O quarto, com o financiamento de um sistema de informação ambiental universal (ANNAN, 2000, p. 29-30).

Desde o final da Segunda Guerra Mundial, mais acentuadamente a partir dos anos sessenta, a comunidade cientifica passou a preocupar-se com os danos ambientais - resultantes do modelo de desenvolvimento tecnológico e econômico adotado - e suas conseqüências para a sobrevivência de todas as espécies de vida neste planeta (DIAS, 1997, p. 11).

Em 1968, grupo de estudiosos publicou ensaio intitulado Limites do Crescimento, onde sugerem resposta a essa pergunta: o ritmo de crescimento da economia mundial só se sustenta graças à exploração crescente e insustentável dos recursos naturais e ao comprometimento das condições do meio ambiente humano. Esse estudo teve grande repercussão e gerou uma série de previsões catastróficas quanto ao futuro da Terra. Dizia-se, por exemplo, que, até o ano 2000, ter-se-iam, praticamente, esgotado as reservas de combustíveis fósseis (petróleo e carvão), o que tornaria insustentável a continuidade das economias modernas (FAUCHEUX; NÖEL, 1995, p. 17).

Esse relatório foi encomendado pelo Clube de Roma26 e elaborado por grupo de pesquisadores coordenados por Dennis Meadows (que deu o nome ao relatório). Nesse documento, foram apresentadas algumas conclusões básicas. Dentre estas, destacam-se as seguintes:

• Se as atuais tendências de crescimento da população mundial, industrialização, poluição, produção de alimentos e diminuição de recursos naturais continuarem imutáveis, os limites de crescimento neste planeta serão alcançados algum dia dentro dos próximos

26

“O Clube de Roma foi criado em Abril de 1968, por sugestão do industrial italiano Aurelio Peccei (1908- 1984). Em março de 1972, com uma considerável repercussão, o Clube lançou o relatório“The Limits to Growth”, preparado a seu pedido por uma equipe [...] do Núcleo de Estudos de Dinâmica dos Sistemas), dirigido pelo Professor Jay Forrester, no Massachussetts Institute of Technology (MIT). O Relatório Meadows, que tem o nome dos principais redatores, o casal Donella e Dennis Meadows, fez sensação. O público, chocado, reagiu vivamente, mas os adeptos do crescimento econômico e do desenvolvimento industrial conseguiram minimizar a gravidade da situação descrita no relatório, acusando imediatamente os seus autores de alarmistas e de espalharem a catástrofe” (GRINEVALD, 1995, p.38).

cem anos. O resultado mais provável de se alcançar este limite será de um declínio súbito e incontrolável, tanto da população quanto da capacidade industrial.

• É possível modificar estas tendências de crescimento e formar uma condição de estabilidade ecológica e econômica que se possa manter até um futuro remoto. O estado de equilíbrio global poderá ser planejado de tal modo que as necessidades materiais básicas de cada pessoa na Terra sejam satisfeitas e que cada pessoa tenha igual oportunidade de realizar seu potencial humano individual.

• Se a população do mundo decidir empenhar-se em obter este segundo resultado (estabilidade ecológica e econômica) , em vez de lutar pelo primeiro, quanto mais cedo ela começar a trabalhar para alcançá-lo, maiores serão suas possibilidades de êxito (MEADOWS et al., 1972, p. 20).

A divulgação do Relatório Meadows, em maio de 1972, contendo proposta de "congelamento do crescimento da população global e do capital industrial, em função da limitação dos recursos", repercutiu negativamente no hemisfério norte e sul. Para o hemisfério norte, visualizou-se diminuição da oportunidade de crescimento e melhoria da qualidade de vida de sua população. Os países em desenvolvimento do hemisfério sul, por outro lado, viram o Relatório como forma de manutenção do patamar de subdesenvolvimento e de dependência aos países desenvolvidos, "justificando, essa prática, com retórica ecologista" (BRÜSEKE, 1995, p. 30).

Alguns meses depois da bombástica divulgação do Relatório Meadows, foi realizada a Conferência Mundial sobre o "Meio Ambiente Humano", em Junho de 1972, cujo tema central se dirigia às relações entre o homem, o meio ambiente e a "poluição" urbana. No âmbito dessa Conferência, foram estabelecidos vinte e três princípios com objetivo de

orientar a humanidade para a preservação e melhoria do ambiente humano. Com a

criação da Comissão Brundtland pela ONU em 1983, novos princípios, em escala evolutiva crescente, são contemplados: a necessidade de preservação dos recursos naturais da Terra para as atuais e futuras gerações; a manutenção, restauração ou melhoria da capacidade da Terra de produzir recursos renováveis vitais; o reconhecimento do desenvolvimento econômico e social como indispensável para assegurar ao homem ambiente de vida e trabalho favorável; e, ainda, a necessidade de promover o desenvolvimento acelerado dos países subdesenvolvidos, com a transferência maciça de recursos financeiros e tecnológicos (COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE E DESENVOLVIMENTO, 1991, p. 388-391).27

Paralelamente a esses debates, a sociedade civil americana e européia, organizou-se para protestar, publicamente, contra a destruição do meio ambiente. Manifestações ambientalistas cresceram, de forma exponencial, na década de 80, à medida em que foram acontecendo vários desastres ecológicos, que afetaram a vida de milhares de pessoas, em diferentes partes do mundo.28

27

“O relatório Brundtland, publicado em 1987, foi redigido pela Comissão para o Ambiente e o Desenvolvimento da ONU, presidida por Gro Harlem Brundtland, então primeira-ministra da Noruega. O relatório, chamado Our Commom Future, identifica os principais problemas ambientais que ameaçam e entravam o desenvolvimento de muitos dos países do Sul: o crescimento demográfico, o esgotamento dos solos provocado pela criação de gado e pela agricultura em excesso, a desflorestação, a destruição das espécies, a alteração da composição química da atmosfera, que desestabiliza o clima mundial, etc. Segundo o relatório, a proteção do ambiente deve ser uma prioridade internacional que obrigue a uma vasta redistribuição dos recursos financeiros, científicos e tecnológicos à escala do Planeta” (DELÉAGE, 1995b, p. 43).

Tais movimentos representaram a tomada de consciência, pelos cidadãos comuns, de que os altos níveis de poluição do ar, da água, do solo, a destruição das florestas e os demais desastres ecológicos teriam suas raízes no modelo de desenvolvimento tecnológico e industrial adotado. Nesse sentido, Deléage (1995a, p. 44) afirma:

A consciência ecológica permite distinguir duas representações da natureza que apesar de serem falsas devido à sua extrema simplificação, ainda predominam. A primeira assenta na divinização duma antiga natureza e no desejo de voltar a um estado original que, evidentemente, nunca existiu, a não ser nas fantasias da sociedade contemporânea. A segunda, corresponde a uma imagem que se

impôs a partir do início da revolução industrial: a natureza não seria mais do que uma simples realidade físico-química, controlável por técnicas cada vez mais poderosas, segundo uma lógica puramente economica e financeira (grifo nosso).

Com isso, segmentos da sociedade começaram a questionar o modelo de desenvolvimento econômico, que visualiza a natureza como algo submetido à estrita

lógica do econômico-financeiro. Essas manifestações da sociedade civil, repudiando

publicamente as conseqüências nefastas da exploração da Natureza, tiveram grande repercussão junto aos políticos, que passaram a colocar, como linha de frente de seus discursos, as questões ambientais.

Nesse aspecto, na evolução da consciência mundial sobre a proteção do meio ambiente, deve ser destacado o conceito de desenvolvimento sustentado, inicialmente delineado no Relatório BRUNDTLAND,29 implementado na ECO92 30 e já objeto de controle na RIO +10, realizada em Johannesburgo (África do Sul) em 2002 .31

Apesar de literatura mais recente Lomborg (2002), demonstrar que em determinadas áreas houve melhora das condições ambientais do mundo, a preocupação com o meio ambiente é assunto vinculado a própria existência do homem no século XXI. Nesse aspecto, Gorbachev (2003, p.21-26) destaca que junto com a paz e a luta contra a pobreza, a proteção do meio ambiente encontra-se entre os desafios contemporâneos.

opinião pública mundial (Rachel Carlson publica seu famoso Silent Spring em 1962, e a partir de 1968 o Clube de Roma começou a trabalhar na série de seus famosos relatórios científicos), do mesmo modo, nos anos 70, o ambientalismo não-governamental se encontra firmemente institucionalizado dentro das sociedades americana e européia” (LEIS; AMATO, 1998, p. 80).

29

Cf. COMISSÃO MUNDIAL SOBRE MEIO AMBIENTE e DESENVOLVIMENTO (1991, p. 388-391).

30

Cf. Agenda 21 (1997, p. 13).

31

“Reaffirming in this regard the commitment to achieving the internationally agreed development goals, including those contained in the United Nations Millennium Declaration, and in the outcomes of the major United Nations conferences and international agreements since 1992” (UNITED NATIONS, 2002).

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