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2.10 – Análise da tutela antecipada nos diferentes tipos de

É conhecida a divergência doutrinária a respeito da classificação das tutelas jurisdicionais. Sobre o tema, importa considerar, inicialmente, que “as classificações não devem ser pensadas como verdadeiras ou falsas, ao contrário do que supõem alguns. É que as classificações não se destinam a conceituar ou descrever realidades, mas somente agrupá- las.”401

Isso significa que as classificações de tutela jurisdicional elaboradas pela doutrina, seja a ternária, seja a quinária, ou outra que se pretenda sustentar,402 não devem ser avaliadas sob o prisma de sua correção, mas sim, sob o critério adotado para a respectiva classificação.

Sim, porque cada classificação toma como ponto de partida um critério objetivo específico. Nos dizeres de José Roberto Bedaque dos Santos, “classificar implica agrupar fenômenos que, segundo um determinado ponto de vista, possuam as mesmas características, visando a facilitar sua compreensão. Para ser homogênea, é fundamental que a classificação

seja feita sempre segundo um mesmo aspecto do objeto.”403

No caso da classificação ternária de tutelas jurisdicionais, leva-se em consideração o conteúdo dispositivo do provimento jurisdicional, isto é, a natureza do

provimento. De acordo com este critério, para a corrente doutrinária404 que defende a adoção

401 MARINONI, Luiz Guilherme. “Técnica processual e tutela dos direitos.” Ob. cit., p. 87. (destacamos)

402 Como, por exemplo, a adotada por Cássio Scarpinella Bueno, que, após analisar as classificações ternária e

quinaria, propõe uma terceira corrente, que distingue as tutelas em dois grupos: (i) as intransitivas, “assim chamadas porque não precisam de atividade jurisdicional complementar, bastando por si só” – representando as tutelas declaratória e constitutiva; e (ii) as transitivas, compostas pelas modalidades de tutela que “reclamam atividade jurisdicional complementar, não bastam por si sós”, nas quais se incluiriam as tutelas condenatória, mandamental e executiva lato sensu. In: “Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: teoria geral do Direito Processual Civil.” São Paulo: Saraiva, 2007, v. I, p. 312-313.

403 “Efetividade do processo e técnica processual.” Ob. cit., 509.

404 Representada, verbi gratia, por Cândido Rangel Dinamarco. In: “Instituições de Direito Processual Civil.” 6.ª

desta classificação, a sentença poderá ter natureza declaratória, constitutiva ou condenatória, as quais serão pormenorizadamente estudadas abaixo.

Por sua vez, a classificação quinária – que, além das tutelas declaratória, constitutiva e condenatória, aceita a mandamental e a executiva lato sensu – adota os efeitos

do provimento como critério definidor da natureza jurídica das tutelas. Para esses autores, ora representados por Luiz Guilherme Marinoni, as sentenças “devem ser classificadas de acordo com o resultado que proporcionam aos consumidores dos serviços jurisdicionais.”405

Assim, como se percebe, as classificações ternária e quinária partem de critérios

diferentes para qualificar as tutelas jurisdicionais. Enquanto a primeira adota o conteúdo do

provimento, a segunda se vale dos seus efeitos.

Nesse ponto, vale traçar, entre parênteses, algumas considerações sobre as eficácias mandamental e executiva lato sensu, que têm como elemento comum a atuação concreta do demandado sem a necessidade de processo executivo ex intervallo.406

Na eficácia mandamental,407 fulcrada nos artigos 14, inciso V, 461, caput e § 4.º, do Código de Processo Civil, no artigo 84, § 4.º, do Código de Defesa do Consumidor e no artigo 11 da Lei n.º 7.347/1985, “o cumprimento do comando emergente da sentença é ato exclusivo do demandado e não pode ser substituído pela atividade do juiz. Caracterizar-se-iam apenas pela emissão da ordem judicial dirigida ao sujeito passivo da obrigação, que deverá cumpri-la sob pena de sofrer sanções civis e penais.”408 Destarte, em geral, não há atos de execução, pois há ordem de cumprimento imediato da determinação jurisdicional pela própria parte destinatária do mandamento acompanhada da proporcional medida coercitiva, geralmente consistente em astreintes.

405 “Antecipação da tutela.”. Ob. cit., p. 59.

406 Cf. BEDAQUE, José Roberto dos Santos. “Efetividade do processo e técnica processual.” Ob. cit., p. 517. 407 A tutela mandamental tem origem no pensamento do alemão Kuttner e foi “importada” ao Brasil por Pontes

de Miranda com viés distinto do original. Enquanto na Alemanha a tutela mandamental era destinada a conferir ordem a ente público que não fora parte do processo, no Brasil possibilitou-se que essa ordem fosse proferida às pessoas físicas ou jurídicas, de direito público ou privado, tanto às partes quanto a quem não figura no processo. Cf. MOREIRA, José Carlos Barbosa. “A sentença mandamental: da Alemanha ao Brasil.” In: Temas de Direito

Processual: sétima série. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 53-69.

408 BEDAQUE, José Roberto dos Santos. “Tutela cautelar e tutela antecipada: tutelas sumárias e de urgência

Nos dizeres de Cândido Rangel Dinamarco, “a pressão psicológica a ser exercida pelo juiz (medidas de coerção) consistirá (a) em impor ou exacerbar astreintes razoavelmente proporcionadas e a serem devidas em caso de o obrigado continuar desobedecendo depois de decorrido o prazo fixado (...) ou (b) em desencadear outras medidas necessárias que, caso a caso, sejam adequadas, suficientes e razoavelmente proporcionais.”409

Já a eficácia executiva lato sensu, prevista nos artigos 461, caput e § 5.º, e 461-A, § 2.º, do Código de Processo Civil, bem como no artigo 84, § 5.º, do Código de Defesa do Consumidor, é marcada pela execução nos mesmos autos realizada de ofício pelo magistrado por meio de atos de sub-rogação. Como ensina Arruda Alvim, “exemplo de sentença executiva lato sensu seria a condenação do réu à entrega de coisa (sentença condenatória), sob pena de busca e apreensão, que pode ser determinada pelo juízo independentemente de instauração pela parte de uma fase de cumprimento de sentença, bastando que se informe nos autos o descumprimento da sentença (eficácia executiva lato sensu).”410

Com efeito, após a breve análise das eficácias mandamental e executiva lato

sensu, infere-se que a diferença que as marca relativamente à tutela condenatória pura é a

forma de sua efetivação, elemento extrínseco, portanto, ao conteúdo e à natureza do provimento.

Sobre o tema, há que se registrar, inicialmente, que, enquanto a eficácia condenatória pura é vocacionada para a execução, servindo de título executivo judicial para possibilitar à parte requerer ao juízo o ingresso no patrimônio do devedor por meio de atos expropriatórios, as eficácias mandamental e executiva lato sensu, geralmente, são marcadas pela ausência da fase executiva, dado que implicam a atuação concreta do réu para a satisfação do direito do autor.

Ademais, insta questionar: Qual é, de fato, a diferença entre a chamada tutela condenatória pura e os provimentos mandamental e executivo lato sensu? Certamente, apenas o meio de efetivação da ordem de pagar, fazer, não fazer ou entregar coisa. Na lição de José Roberto dos Santos Bedaque, “a partir da situação de direito material posta em juízo, não há diferença ontológica entre condenar, possibilitando o uso de meios de sub-rogação, e ordenar

409 “Instituições de Direito Processual Civil.” v. III, Ob. cit., p. 249. 410 “Manual de Direito Processual Civil.” Ob. cit., p. 1103.

o adimplemento, com ou sem o uso de meios de coerção. Da mesma forma, não deixa de ser condenatória a sentença apenas porque os atos materiais destinados a efetivá-la integram uma fase do mesmo processo.”411

A corroborar o que ora se afirma, vale trazer à colação a lição de Flávio Luiz Yarshell, in verbis:

“Ao lado das tutelas tradicionais, anteriormente expostas, a doutrina reconhece, cada vez com maior força, a existência das duas outras modalidades epigrafadas (mandamental e executiva lato sensu). Contudo, do ponto de vista lógico e sistemático – não obstante essa crescente aceitação –, tais categorizações não estão calcadas no mesmo critério empregado para a tipologia precedente e, sob esse ângulo, não podem ser cientificamente aceitas sem ressalvas.

A tipologia anteriormente exposta (trinária) leva em conta, conforme indicado, a natureza

do provimento jurisdicional ou, mais especificamente, aquilo que lhe é intrínseco. Isso,

contudo, não ocorre no caso das chamadas tutelas executivas lato sensu e mandamental, em que o respectivo dado conceitual é exterior ao próprio provimento, dizendo respeito ao modo pelo qual o mesmo é efetivado em termos práticos.”412

Em razão dessas considerações, concordamos com Arruda Alvim no sentido de que “as modalidades mandamental e executiva lato sensu são menos modalidades de ações, senão que formas de execução.”413

Diante disso, sem adentrar no mérito sobre a correção ou não da teoria quinária, entendemos ser mais adequada, para o estudo das tutelas jurisdicionais, a adoção da classificação ternária, visto que baseada no conteúdo e na natureza do provimento jurisdicional. Nesse sentido, compreendemos que as tutelas mandamental e executiva lato

sensu estão inseridas no âmbito da tutela condenatória, como veremos a seguir.

Passamos, então, a analisar o tema da tutela antecipada no âmbito dos provimentos de natureza declaratória, constitutiva e condenatória (incluídas, nesta, as eficácias mandamental e executiva lato sensu).

411 “Efetividade do processo e técnica processual.”. Ob. cit., p. 509. 412 “Tutela jurisdicional.” Ob. cit., p. 177. (destaques nossos) 413 “Manual de Direito Processual Civil.” Ob. cit., p. 1099.

III.2.10.1. – A tutela antecipada em ação civil pública ambiental de

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