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De acordo com a definição fornecida por Kazuo Watanabe, “a cognição é prevalentemente um ato de inteligência, consistente em considerar, analisar, e valorar as alegações e as provas produzidas pelas partes, vale dizer, as questões de fato e as de direito que são deduzidas no processo e cujo resultado é o alicerce, o fundamento do judicium, do julgamento do objeto litigioso do processo.”241

Como afirma Cássio Scarpinella Bueno, “trata-se de saber, para bem implementar o ‘modelo constitucional do processo civil’, em que condições se pode otimizar a prestação jurisdicional, pensada esta a partir da quantidade e da qualidade de informações a serem levadas em conta pelo magistrado de cada caso concreto.”242

Kazuo Watanabe considera que a cognição jurisdicional pode ser entendida em dois planos distintos: (i) o horizontal, relativo à sua extensão, cujo limite é o trinômio dos elementos objetivos do processo civil (questões processuais, condições da ação e mérito), podendo ser plena (total) ou limitada (parcial); e (ii) o vertical, concernente à sua profundidade, que pode ser classificado em exauriente ou sumário.

Especificamente a respeito da cognição vertical, que guarda maior pertinência com o objeto deste trabalho, compreende-se que a cognição exauriente consiste na condição de convicção plena do magistrado como resultado do desenvolvimento completo do processo, com a manifestação das partes, a instrução do processo, a eventual realização de audiências de conciliação e de instrução e julgamento, de modo que, por haver certeza (relativa) quanto à solução a ser adotada para a resolução da lide, o que se decidir tem o ânimo de se tornar imutável, revestindo-se de coisa julgada. Por outro lado, a cognição sumária consiste na

241 “Da cognição no processo civil.” 2ª ed. São Paulo: Central de Publicações Jurídicas: Centro Brasileiro de

Estudos e Pesquisas Judiciais, 1999, p. 58-59.

hipótese em que o juiz, apesar de não dispor de todos os elementos necessários à sua convicção, tem o dever de decidir, o que determina seja adotada solução provisória.

De fato, devendo o magistrado harmonizar as garantias fundamentais da efetividade da prestação jurisdicional e da segurança jurídica, o ideal seria que o julgador prolatasse sua decisão após formar, de forma inequívoca e irretorquível, sua convicção. Ocorre que há inúmeras situações em que o decurso do tempo necessário para que o magistrado possa realizar a cognição exauriente, proferindo decisão baseada em alto grau de certeza, pode implicar lesão ou ameaça a lesão ao direito pleiteado pelo autor. Nesses casos, em que, por se encontrar em sede de cognição sumária, o magistrado não dispõe do tempo necessário para deliberar de forma inequívoca, “premido pela urgência do pedido de prestação jurisdicional, ele tem de decidir – veja-se, desde logo, ele é obrigado a decidir –, independentemente de ter condições para formar uma convicção definitiva, em seu ânimo, sobre o que está a ocorrer entre o autor e o réu.”243

Está-se, nesse caso, diante de conflito entre a segurança jurídica a efetividade da prestação jurisdicional. Teori Alberto Zavaskci assim se manifesta sobre o problema:

“O decurso do tempo, todos o sabem, é inevitável para a garantia plena do direito à segurança jurídica, mas é, muitas vezes, incompatível com a efetividade da jurisdição, notadamente quando o risco de perecimento do direito reclama tutela urgente. Sempre que se tiver presente situação dessa natureza – em que o direito à segurança jurídica não puder conviver, harmônica e simultaneamente, com o direito à efetividade da jurisdição – ter-se- á caracterizada hipótese de colisão de direitos fundamentais dos litigantes, a reclamar solução harmonizadora.”244

Em processos cujo objeto é a preservação do bem ambiental como direito de todos, como temos sustentado, esse conflito se agrava, pois se está a tratar de bem jurídico que, dada sua natureza e os princípios que regem o Direito Ambiental, muitas vezes exige a concessão de medida provisória para a sua preservação.

Aliás, percebe-se da prática forense que tal medida provisória é, em muitas ocasiões, requerida pelo autor para que seja concedida antes mesmo da manifestação do réu. Mesmo nessa frequente hipótese, deve o magistrado buscar harmonizar as garantias

243 Idem, p. 18.

fundamentais da efetividade do processo e da segurança jurídica, facultando ao réu, quando a situação fática posta em juízo permitir, que se manifeste urgente e previamente à prolação de sua decisão, de modo que possa, com isso, obter mais qualidade e quantidade de dados para a formação de sua convicção e, ao mesmo tempo, atender ao devido processo legal, ao contraditório e à ampla defesa. É o que indicam os artigos 12 da Lei n.º 7.347/1985 e 84, § 3.º, da Lei n.º 8.078/1990, ao estabelecerem a possibilidade de “justificação prévia.”

Quando, contudo, a preservação do bem objeto da lide for incompatível com o tempo necessário para a manifestação do réu, ainda que o faça em prazo exíguo, o magistrado deverá decidir imediatamente. Caso estejam preenchidos os pressupostos autorizadores e, por consequência, seja concedida a medida provisória inaudita altera parte, impõe-se que o julgador revise sua decisão, se acertada ou equivocada, após a apresentação da Contestação, quando terá à sua disposição outros elementos para a formação de um juízo mais seguro de convicção.

Como se nota, não é simples a tarefa de harmonizar a efetividade da prestação jurisdicional com a segurança jurídica. A cognição jurisdicional deve ser realizada pelo julgador de forma a analisar se efetivamente estão ou não presentes os pressupostos para a concessão da medida pleiteada, sendo esse, portanto, o caminho sinalizado pelo legislador para que se possa encontrar, também com base em critérios de proporcionalidade, o ponto de equilíbrio entre a dualidade em questão. Tal postulado encontra respaldo no princípio da necessidade, pelo qual se busca a harmonização prática entre as supramencionadas garantias fundamentais por meio da análise, pelo juiz, da real necessidade de concessão da medida urgente com base na verificação do concreto preenchimento dos pressupostos processuais indispensáveis, conforme será pormenorizadamente analisado a seguir.

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