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Para a análise do princípio geral da prudência, que encontra origem na doutrina francesa, subdividido nos princípios da precaução e da prevenção, importante ter em mente que “o dano ambiental é de difícil reparação.”66 Nesse sentido, Marcelo Abelha Rodrigues assinala que “se ocorrido o dano ambiental, a sua reconstituição é praticamente impossível. O mesmo ecossistema jamais poderá ser revivido. Uma espécie extinta é um dano irreparável. Uma floresta desmatada causa uma lesão irreversível, pela impossibilidade de reconstituição da fauna e da flora e de todos os componentes ambientais em profundo e incessante processo de equilíbrio, como antes se apresentavam. Enfim, com o meio ambiente, decididamente, é melhor prevenir do que remediar.”67

Diante dessa circunstância, própria do bem jurídico tutelado, consistente no meio ambiente ecologicamente equilibrado, a doutrina mostra-se unânime no sentido de que o Direito Ambiental impõe que a sociedade se antecipe à ocorrência de agressões ao meio ambiente, de forma a prevê-los e, assim, evitá-los. Deve-se, dessa forma, obstar o dano antes que seja ocasionado, isto é, antes que se tenha que repará-lo.

Sobre essa lógica que vigora no Direito Ambiental, Antonio Herman V. Benjamin ensina que “o direito ambiental é – ou deve ser –, antes de mais nada, um conjunto de normas de caráter preventivo. Em todos os segmentos dessa disciplina jurídica se ressalta o aspecto da prevenção do dano ambiental. A tutela do meio ambiente, através de longa evolução, ultrapassou a fase repressiva-reparatória, baseada fundamentalmente em normas de responsabilidade penal e civil, até atingir o estágio atual em que a preocupação maior é com o

evitar e não com o reparar ou o reprimir.”68

Ainda sobre a questão da necessidade de se evitar a ocorrência do dano ambiental, Paulo Affonso Leme Machado preleciona que “o posicionamento preventivo tem por

66 MILARÉ, Édis. “Direito do Ambiente.” Ob. cit., p. 1123.

67 “Elementos de Direito Ambiental: parte geral.” Ob. cit., p. 203-204.

68 “Os princípios do estudo de impacto ambiental como limites da discricionariedade administrativa.” In: Revista

fundamento a responsabilidade no causar perigo ao meio ambiente. É um aspecto da responsabilidade negligenciado por aqueles que se acostumaram a somente visualizar a responsabilidade pelos danos causados. Da responsabilidade jurídica de prevenir decorrem obrigações de fazer e de não fazer.” 69

Com efeito, as ideias de antecipação e evitabilidade configuram-se como a essência de um princípio geral do Direito Ambiental, que engloba tanto o princípio da prevenção como o da precaução: o princípio da prudência.

A bem ver, a ideia de prudência é trazida por Philippe Kourilsky e Geneviève Viney, em relatório elaborado a pedido do Primeiro Ministro da França, que, atualmente, serve de base indispensável para os estudos relacionados à matéria. Vejamos:

“A prudência implica refletir sobre o alcance e as conseqüências dos atos e de tomar as medidas necessárias para que se evite causar dano a alguém. Inserido no âmbito da prudência, o princípio da precaução consagra a exigência social de um reforço da prevenção através da implicação inédita de seus instrumentos de prevenção aos riscos potencialmente graves e irreversíveis, mas onde a probabilidade de ocorrência ainda é pouco conhecida. As convergências entre precaução, prevenção e prudência podem justificar que o princípio da precaução possa ser substituído por um princípio da prudência, que englobaria a prevenção e a precaução.”70

Assim, apesar de praticamente não ser lembrado pela doutrina brasileira, entendemos que a prudência configura-se como princípio basilar do Direito Ambiental, uma vez que ordena, de maneira genérica, que a sociedade deve agir antecipadamente aos eventuais danos que suas atividades possam causar ao meio ambiente, sejam eles certos ou não.

Em vista de sua natureza, o princípio da prudência possui destacada relevância

no tema da tutela antecipada em ações civis públicas ambientais, notadamente quando se está a tratar das medidas fundadas na urgência, hipótese extremamente frequente, que incide na

69 “Princípios gerais de direito ambiental internacional e a política ambiental brasileira.” In: BENJAMIN,

Antonio Herman V. (coord.). Dano ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, v. II, p. 398.

70 Tradução livre, do francês para o português, do seguinte trecho: “La prudence implique de réfléchir à la portée

et aux conséquences de ses actes et de prendre ses disposicions pour eviter de causer des dommages à autrui. Inscrit dans le cadre de la prudence, le principe de precaution consacre l’exigence sociale d’un renforcement de la prévention et d’une application inédite des instruments de la prévention à des risques potentiellement graves e irréversible, mais dont les probablilités de réalisation sont faibles et mal connues.” In: “Le principe de précaution: rapport au Premier Ministre.” Paris: Odile Jacob, 2000, p. 21.

maioria das ações judiciais que têm por objetivo a proteção do bem ambiental. Como assevera Marcelo Buzaglo Dantas, a tutela de urgência é “medida indispensável à prevenção dos danos ao meio ambiente que estejam na iminência de ser causados ou mesmo que já estejam ocorrendo. Isso porque, em matéria ambiental, vigoram os princípios da precaução e da prevenção, o que leva à necessidade de se adotar uma tutela diferenciada.”71

Embora o princípio da prudência englobe tanto a prevenção como a precaução, não se pode olvidar a notável importância da distinção entre esses dois princípios, que, apesar de possuírem semelhanças, contam com características próprias, não devendo ser considerados como sinônimos pelo interprete.

Sob esse contexto, passamos a traçar as características desses dois princípios com maior especificidade.

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