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1.3 – Efetividade do processo coletivo ambiental

A Constituição Federal prevê, em seu artigo 5º, inciso XXXV, o princípio da

efetividade do processo, ao dispor que “a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”.

Interessa anotar que a referida orientação constitucional abrange tanto a tutela

preventiva, ao trazer a expressão “ameaça a direito”, quanto a tutela reparatória, ao enunciar o vocábulo “lesão.” Nos dizeres de Luiz Guilherme Marinoni, “atualmente, diante da inclusão da locução ‘ameaça a direito’ na verbalização do denominado princípio da inafastabilidade, não há mais qualquer dúvida sobre o direito à tutela jurisdicional de impedir a violação ao direito.”220 Tal consideração se mostra extremamente relevante em relação à tutela processual

218 Cf. NERY JÚNIOR, Nelson; e NERY, Rosa Maria de Andrade. “Constituição Federal comentada e legislação

constitucional.” Ob. cit., p. 826-827.

219 Tivemos a oportunidade de expor nosso entendimento sobre a questão da legitimidade ativa da Defensoria

Pública em ações civis públicas ambientais no seguinte artigo: GUETTA, Mauricio. “Análise acerca da legitimidade ativa da Defensoria Pública em ações civis públicas ambientais.” In: Revista de Processo. São Paulo: Revista dos Tribunais. No prelo.

do meio ambiente, ante a impossibilidade ou a dificuldade de reparação dos danos ambientais e a própria essencialidade do bem ambiental para toda a coletividade, conforme já referido acima, fatores que exigem a reiterada adoção da tutela preventiva, inclusive como resultado da observância do princípio geral da prudência – vale recordar, conforme expusemos no item “II.4.2”, que incorpora os princípios da precaução e da prevenção.

Os principais destinatários da norma, caso assim seja possível considerar, seriam o legislador, que está impedido de editar normas jurídicas restritivas da garantia constitucional em referência, e o intérprete, seja ele magistrado ou não, que deve compreender o ordenamento jurídico pela noção ampliativa de acesso à justiça e de adequação e tempestividade da tutela jurisdicional, de forma a conferir efetividade ao direito da parte, evitando a criação de injustificáveis óbices processuais à obtenção da pretensão resguardada pelo direito material.221

A importância da constitucionalização do direito a um processo efetivo é notória, uma vez que os mandamentos dele decorrentes são oponíveis a todo o sistema processual, de modo que todo processo, de índole individual ou coletiva, preventiva ou reparatória, deve ser apto a gerar os resultados pretendidos pela parte que estiver resguardada pelo direito material, mediante a adequação e a tempestividade da tutela jurisdicional. Como preleciona Carlos Alberto Álvaro de Oliveira, “a situação subjetiva assegurada ao longo do artigo 5.º da Constituição brasileira se traduz, portanto, no poder de exigir do órgão judicial, em tempo razoável, o desenvolvimento completo de suas atividades, tanto instrutórias, necessárias para a cognição da demanda judicial, quanto decisórias, com emissão de um pronunciamento processual ou de mérito sobre o objeto da pretensão processual, e que possa ser realizado efetivamente do ponto de vista material.”222

221 Segundo Soraya Regina Gasparetto Lunardi, “a efetividade trata-se da relação entre o direito e a sociedade, a

gradação da realização das práticas sociais nas regras enunciadas pelo direito. O termo sugere assim a comparação entre um modelo normativo de comportamento e as condutas reais dos destinatários, ou seja, a correspondência entre a regra jurídica e o comportamento. Querer que o processo seja efetivo significa querer que seja eficiente no seu papel de instrumento apto a realizar o direito material. O processo é o instrumento da jusrisdição, ou ainda o modo pelo qual o Estado atua para atingir ao final a paz social. A efetividade se traduz pela sua capacidade de fazer valer a pretensão da parte. A realização do direito e seu desempenho concreto nessa integração do jurídico e do social, ou a materialização no mundo dos fatos das normas.” In: “As ideologias do processo e a Ação Civil Pública.” In: MAZZEI, Rodrigo; e NOLASCO, Rita Dias (coords.). Processo Civil

Coletivo. São Paulo: Quartier Latin, 2005, p. 204.

222 “Os direitos fundamentais à efetividade e à segurança em perspectiva dinâmica.” In: SALLES, Carlos Alberto

(coord.). As grandes transformações do Processo Civil Brasileiro – homenagem ao Professor Kazuo Watanabe. São Paulo: Quartier Latin, 2009, p. 39.

Mesmo antes da Constituição Federal de 1988, José Carlos Barbosa Moreira já apontava o que seriam, em sua visão, “os requisitos básicos que o processo há de buscar satisfazer, para merecer a qualificação de ‘efetivo’. (...) a) o processo deve dispor de instrumentos de tutela adequados, na medida do possível, a todos os direitos (e outras posições jurídicas de vantagem) contemplados no ordenamento, quer resultem de expressa previsão normativa, quer se possam inferir do sistema; b) esses instrumentos devem ser praticamente utilizáveis, ao menos em princípio, sejam quais forem os supostos titulares dos direitos (e das outras posições jurídicas de vantagem) de cuja preservação ou reintegração se cogita, inclusive quando indeterminado ou indeterminável o círculo dos eventuais sujeitos; c) impende assegurar condições propícias à exata e completa reconstituição dos fatos relevantes, a fim de que o convencimento do julgador corresponda, tanto quanto puder, à realidade; d) em toda a extensão da possibilidade prática, o resultado do processo há de ser tal que assegure à parte vitoriosa o gozo pleno da específica utilidade a que faz jus segundo o ordenamento; e) cumpre que se possa atingir semelhante resultado com o mínimo de dispêndio de tempo e energias.”223

Com efeito, a efetividade do processo deve ser observada com ainda mais acuidade quando se está a tratar de processos coletivos, uma vez consideradas as características que marcam a sociedade atual, de massa, globalizada, não sustentável ambientalmente, com graves desigualdades sociais e com alto grau de interligação entre indivíduos e instituições, públicas e privadas, nacionais e internacionais. Por certo, se essas são as notas da sociedade atual e se as crescentes demandas da coletividade são, cada dia mais, objeto de ações judiciais que visam à proteção dos interesses supraindividuais, temos que a própria vida em sociedade está a depender da efetividade do processo coletivo.

Para sua concretização, entendemos que devem ser atendidas as seguintes orientações jurídicas.

A primeira delas é a busca por uma tutela jurisdicional adequada. Sobre o tema, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery afirmam que “a garantia constitucional do direito de ação significa que todos têm direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada. Por tutela adequada deve-se entender a tutela que confere efetividade

223 “Notas sobre o problema da efetividade do processo.” In: Temas de Direito Processual: terceira série. São

ao pedido, sendo causa eficiente para evitar-se lesão (ameaça) ou causa eficiente para reparar lesão (violação). Pelo princípio constitucional do direito de ação, todos têm direito de obter do Poder Judiciário a tutela jurisdicional adequada. Não é suficiente o direito à tutela jurisdicional. É preciso que essa tutela seja a adequada, sem o que estaria vazio de sentido o princípio.”224

Tratando-se de lides coletivas ambientais, a adequação da tutela se mostra imprescindível para a garantia da efetividade da proteção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, incluindo-se os seus componentes, por se tratar de bem jurídico de natureza indisponível, indivisível, inalienável e de titularidade difusa, conforme exposto no item “II.3”. Para tanto, há que ser estabelecida intima ligação entre o processo e o direito subjetivo que compõe seu objeto, no caso, o direito de todos ao meio ambiente ecologicamente equilibrado.

Nesse sentido, o procedimento e os instrumentos processuais dispostos na legislação processual devem ser adequados à proteção do bem ambiental. Como analisado no item “III.1.1”, as ações coletivas, em especial a ação civil pública, passaram a contar com previsão em leis específicas a partir do desenvolvimento da tutela material do meio ambiente e dos demais direitos coletivos (lato sensu), antes desprovidos de mecanismos processuais adequados à sua efetiva preservação. Atualmente, o arcabouço legislativo existente permite

considerar a tutela processual ambiental com base nos princípios, regras, ritos e classificações próprias do Microssistema de Processos Coletivos.

Mais do que dispor de procedimentos e instrumentos processuais adequados, a própria tutela jurisdicional prestada pelo Poder Judiciário deve ser apta a produzir os efeitos objetivados pelo ordenamento jurídico ambiental, para o que deve ser enfatizada a aplicação prioritária dos meios mandamental e executivo lato sensu de efetivação da tutela, previstos nos artigos 3.º e 11 da Lei n.º 7.347/1985 e nos artigos 83 e 84 da Lei n.º 8.078/1990, na linha do quanto estabelecido pelos artigos 461 e 461-A do Código de Processo Civil.225 São estes os

224 “Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante.” 9.ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,

2006, p. 942.

225 Sobre o tema, Pedro Lenza entende que, “dentre os vários resultados decorrentes do fenômeno das

transformações (da sociedade, do Estado, do processo etc.) e do novo método de pensamento do processualista moderno, destaca-se, ao lado da tutela cautelar e antecipada e diversos outros instrumentos e técnicas processuais colocados à disposição do juiz e das partes, a tutela específica (...).”In: “Efetividade do processo coletivo: PL n.º 5.139/2009 – avanço em relação à ação revisional – coisa julgada secundum eventum probationis.” In: GOZZOLI, Maria Clara; CIANCI, Mirna; CALMON, Petrônio; e QUARTIERI, Rita. Em defesa de um novo

meios específicos que devem ser consgarados pelo julgador da lide coletiva para melhor resguardar o bem ambiental que lhe serve de objeto.226

Dessa forma, a adequação da prestação jurisdicional ao direito material, tanto quanto permitido pelo ordenamento jurídico, é ponto fundamental para o alcance da efetividade do processo, o que, segundo Luiz Fux, “marca o fim da neutralidade da ciência processual em relação ao direito material carente de prestação jurisdicional, sob forte inspiração do ‘princípio da efetividade’, cujo escopo maior é observar a experiência jurídico- processual sob a ótica da utilidade social do processo, assim compreendido como instrumento que possibilita conferir-se ao jurisdicionado uma tutela tempestiva justa.”227

A segunda orientação necessária para que o processo seja efetivo consiste na busca por uma tutela jurisdicional tempestiva. Com efeito, aquele que se encontrar em situação de lesão ou ameaça a direito e, por essa razão, demandar a proteção jurisdicional precisa de uma resposta tempestiva do Poder Judiciário, sob pena de inutilidade do processo.

Entre os óbices para o alcance da tempestividade da tutela jurisdicional, há que se considerar, inicialmente, o tempo regular dos atos processuais obrigatórios, existentes em razão do atendimento às garantias fundamentais do devido processo legal, da ampla defesa e do contraditório, previstos nos incisos LIV e LV do artigo 5.º da Constituição Federal. A esse respeito, Teori Albino Zavascki assinala que “entre o pedido e a entrega efetiva – período durante o qual se exercerão o contraditório e a ampla defesa – decorrerá, necessariamente, um razoável espaço de tempo, por mais sumário que seja o rito procedimental e por mais eficiente que sejam os serviços judiciários.”228 Além disso, a compreensão da problemática envolvendo o tempo no processo passa pela constatação da inegável deficiência estrutural e organizacional do Poder Judiciário, agravada pelo insuficiente número de juízes e o aumento do número de demandas judiciais.229

226 Conforme Soraya Regina Gasparetto Lunardi, “é possível buscar melhorar a atuação do processo

desenvolvendo as técnicas já disponíveis como tutela específica em processos meta individuais para torná-lo mais adequado às necessidades sociais, ou às ideologias da efetividade.” In: As ideologias do processo e a Ação Civil Pública.” Ob. cit., p. 209.

227 “Curso de Direito Processual Civil.” 3.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2004, p. 77. 228 “Antecipação da tutela.” 7.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 26.

229 Entre outros fatores, o aumento do número de ações judiciais resulta, paradoxalmente, “da adoção de técnicas

destinadas a facilitar o acesso à Justiça àqueles que reclamam a tutela jurisdicional.” (In: BEDAQUE, José Roberto dos Santos. “Efetividade do processo e técnica processual.” São Paulo: Malheiros, 2006, p. 47), como,

exempli gratia, a ampliação da legitimação do Ministério Público, a assistência judiciária gratuita (artigo 5º, LXXIV, da Constituição Federal) e a gratuidade da justiça (artigo 19 do Código de Processo Civil).

A preocupação da sociedade brasileira com o tempo do processo vem evoluindo sobremaneira nas últimas décadas, o que pode ser atribuído ao agravamento da crise do Poder Judiciário, bem como à globalização, à revolução tecnológica e ao imediatismo observado nas relações de cunho econômico, fatores que influenciam decisivamente no tempo que marca as relações sociais. É o que atentou Nelson Nery Júnior, ao elucidar que “o tempo no processo assume importância vital nos dias de hoje, porquanto a aceleração das comunicações via web (internet, e-mail), fax, celulares, em conjunto com a globalização social, cultural e econômica, tem feito com que haja maior cobrança dos jurisdicionados e administrados para que haja solução rápida dos processos judiciais e administrativos. Essa globalização deu maior visibilidade às vantagens e desvantagens, acertos e equívocos dos poderes públicos em virtude da exposição a que eles estão sujeitos, situação que é decorrente da transparência que deve existir no estado democrático de direito.”230

Em verdade, o tempo no processo deve ser enfrentado como ônus,231 a ser suportado inicialmente pelo autor e que pode vir a ser a ser distribuído pelo magistrado em determinadas situações previstas pelo ordenamento jurídico. Vale dizer, a tutela jurisdicional definitiva será prestada ao autor ao final do trâmite processual (obviamente, caso o direito lhe assista razão), incumbindo-lhe, geralmente, suportar este ônus do processo. Contudo, quando houver, por exemplo, abuso do direito de defesa ou manifesto propósito protelatório do réu (artigo 273, II, do Código de Processo Civil), deve o magistrado, caso plausíveis as alegações contidas na petição inicial, redistribuir o ônus do tempo no processo, passando-lhe à parte passiva por meio da concessão de tutela provisória ao autor.

Muitos esforços têm sido feitos rumo à tempestividade da tutela jurisdicional, como se deu com a já mencionada inserção da tutela antecipada no Código de Processo Civil pela Lei n.º 8.952/1994. Na seara constitucional, na linha do estabelecido no artigo 125, inciso II, do Código de Processo Civil, deve ser destacada a Emenda Constitucional 45/2004, que inseriu no artigo 5.º da Constituição brasileira a garantia fundamental à duração razoável do processo (o inciso LXXVIII), prevendo que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são

230 “Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil, penal e administrativo.” Ob. cit., p. 319-320. 231 Cf. MARINONI, Luiz Guilherme. “Técnica processual e tutela dos direitos.” Ob. cit., p. 142.

assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.”232

Com efeito, há determinados bens jurídicos que, pela sua natureza, exigem a adoção de técnicas processuais para a neutralização ou mitigação dos efeitos do tempo no processo. É o que ocorre com a proteção do bem ambiental, uma vez que, como mencionado, o dano ambiental é de impossível ou difícil reparação. Essa, aliás, a principal razão pela qual as tutelas de urgência possuem tamanha relevância em processos coletivos que visam à tutela do meio ambiente ecologicamente equilibrado.

É certo, portanto, que, em respeito ao princípio da efetividade do processo, previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, e em razão da problemática envolvendo esse inimigo dos direitos, que é o tempo, torna-se necessária, tratando-se de ações coletivas ambientais, a adoção de técnicas preventivas e urgentes que, de forma in continenti, assegurem a tempestividade da prestação jurisdicional.

A terceira orientação que deve ser seguida para a concretização do princípio da efetividade do processo consiste na sua harmonização com o princípio da segurança jurídica.233

Não se trata de tarefa fácil, pois esses dois valores do sistema jurídico se implicam

reciprocamente, visto que “incrementar a segurança pode comprometer a efetividade e, em contrapartida, incrementar a efetividade pode comprometer a segurança.”234

Pertinente, nesse aspecto, a ponderação de José Roberto dos Santos Bedaque, para quem “tão importante quanto acabar com a morosidade excessiva é preservar a segurança

232 Ao examinar o tema, José Afonso da Silva assim se manifesta: “O inciso foi acrescido pela Emenda

Constitucional 45/2004 com a nobre preocupação de garantir maior presteza na tramitação de processos judiciais e administrativos. À garantia da prestação jurisdicional é afirmada no inciso XXXV do mesmo artigo 5º, que, embora fonte do direito de acesso à justiça, não foi capaz de criar condições de tramitação rápida dos processos judiciais. (...) Enfim, o texto assegura a razoável duração do processo e também a celeridade de sua tramitação.”

In: “Comentário Contextual à Constituição.” 5.ª ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 176.

233 A relevância desta orientação foi percebida por José Roberto Bedaque dos Santos, ao incluí-la em sua

conceituação de processo efetivo. Confira-se: “Processo efetivo é aquele que, observado o equilíbrio entre os valores segurança e celeridade, proporciona às partes o resultado desejado pelo direito material.” In: “Efetividade do processo e técnica processual.” Ob. cit., p. 49.

234 OLIVEIRA, Carlos Alberto Álvaro de. “Os direitos fundamentais à efetividade e à segurança em perspectiva

proporcionada pelo devido processo legal. Temos de – e esta é a nossa principal missão – encontrar o ponto de equilíbrio entre ambos.”235 É o que também observa José Carlos Barbosa Moreira, ao defender que, “se uma Justiça lenta demais é decerto uma Justiça má, daí não se segue que uma Justiça muito rápida seja necessariamente uma Justiça boa. O que todos devemos querer é que a prestação jurisdicional venha a ser melhor do que é. Se para torná-la melhor é preciso acelerá-la, muito bem; não contudo, a qualquer preço.”236

Como será melhor explorado no item “III.1.4”, a seguir, tratando-se de princípios constitucionais e, portanto, de mesma hierarquia, sua composição deve ser analisada em cada caso concreto, quando o aplicador do Direito deverá encontrar solução que contemple ambos, não lhe sendo facultado afastar por completo nenhum desses dois mandamentos. Sim, pois “a busca da efetividade deve ser norteada pelo escopo de alcançar um processo justo, ou seja, que respeite as garantias processuais consagradas na Constituição e cumpra o papel de instrumento de realização prática do direito material. Essa noção é que parece essencial.”237

Por fim, a quarta orientação a ser seguida para o alcance da efetividade do

processo coletivo ambiental diz respeito ao papel do magistrado de buscar, tanto quanto possível, oferecer a prestação jurisdicional de modo a tentar compor os interesses envolvidos na lide e a considerar a realidade física, biológica e antropológica, de caráter local, regional e nacional envolvida.

Como é sabido, as ações coletivas que visam à tutela do meio ambiente ecologicamente equilibrado, em geral, têm repercussão em diversos interesses da sociedade protegidos pelo ordenamento jurídico. Nesse sentido, ao mesmo tempo em que assegura, nos artigos 1.º, IV, e 170, o exercício das atividades econômicas, a Constituição Federal pretende a efetivação dos direitos sociais, notadamente a promoção da justiça social e da erradicação

da pobreza, como previsto nos seus artigos 3.º, I e III, e 170, VII, bem como almeja a

preservação do bem ambiental, já que direito de todos, na forma determinada pelos artigos 170, VI, e 225.

235 “Efetividade do processo e técnica processual.” Ob. cit., p. 48.

236 “O futuro da Justiça: alguns mitos.” In Temas de Direito Processual: oitava série. São Paulo: Saraiva, 2004,

p. 05.

237 GUTIÉRREZ, Daniel Mota. “Notas sobre os princípios e as garantias fundamentais do processo civil no

Projeto do novo CPC.” In: ROSSI, Fernando; RAMOS, Glauco Gumerato; GUEDES, Jefferson Carús; DELFINO, Lúcio; MOURÃO, Luiz Eduardo Ribeiro (coords.). O futuro do processo civil no Brasil: uma

Além disso, a vasta extensão territorial do Brasil impõe sejam consideradas as

peculiaridades físicas, biológicas e antropológicas envolvidas na ação coletiva ambiental, isto é, todos os componentes que integram o equilíbrio ecológico e que compõem o meio de vida cultural e social da região objeto da lide.

Nessa linha, Consuelo Yatsuda Moromizato Yoshida ensina que a solução a ser adotada pelo julgador da demanda coletiva ambiental deve “levar em consideração, em cada situação examinada, o contexto das desigualdades sociais e regionais, bem como das diversidades dos meios físico, biótico e antrópico, buscando contemplar e conciliar os múltiplos e conflitantes objetivos constitucionalmente assegurados a todos, a saber: o desenvolvimento nacional, a erradicação da pobreza e da marginalização, redução das desigualdades sociais e regionais, promoção do bem de todos, afora os objetivos da Política Nacional de Meio Ambiente e das políticas setoriais, como a política urbana.”238

E continua a autora, aduzindo que, “à medida que o ambientalismo se afirma como fenômeno jurídico, social, econômico e político global, surgem diferenciadas visões jurídico-ideológicas da proteção ambiental, que, a rigor, não são antagônicas, mas complementares entre si; e o magistrado, em face das lides ambientais, deve ter o discernimento suficiente para definir a visão que deve preponderar, de forma integrada, ou

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