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5.3 – Reparação do dano ambiental: ordem de medidas reparatórias a

Constatada a ocorrência de dano ambiental e verificada a presença do pressuposto do nexo de causalidade, surge para o agente responsável o dever de reparação. Essa reparação, há que se destacar, deve ser integral, a mais completa possível, de forma a impedir

171 Superior Tribunal de Justiça. 2.ª Turma. Recurso Especial n.º 650728/SC. Relator: Ministro Herman

Benjamin. D.J. 02.12.2009.

172 Cf. LEITE, José Rubens Morato; e AYALA, Patryck de Araújo. “Dano ambiental: do individual ao coletivo

extrapatrimonial.” Ob. cit., p. 201-203.

que a lesão ao direito de todos ao meio ambiente equilibrado e/ou ao bem ambiental em si considerado fique, mesmo que em parte, desprovida de ressarcimento.174

Nesse cenário, deve o aplicador do Direito ter em mente que a medida reparatória a ser adotada não fica a critério do poluidor. Há uma ordem a ser seguida, que deve ser observada por todos, principalmente pelo magistrado quando da prolação de decisão que determine a reparação de dano ambiental.

A primeira medida a ser buscada é a reparação natural in situ, que visa à restauração do bem agredido ao status quo ante, consistente na “recuperação da capacidade funcional ecológica e da capacidade de aproveitamento humano do bem natural determinada pelo sistema jurídico, o que pressupõe a recuperação do estado de equilíbrio dinâmico do sistema ecológico afetado, isto é, da sua capacidade de auto-regeneração e de auto- regulação”.175

Nesse sentido, vale mencionar que tanto a Lei n.º 7.347/1985, pelo que dispõe o artigo 11, como o Código de Defesa do Consumidor, em seu artigo 84, e o Código de Processo Civil, por meio do artigo 461, consagram expressamente a orientação pela

prevalência da tutela jurisdicional específica, o que, no caso da tutela reparatória em ação civil pública ambiental, se dá através da imposição judicial pela reparação natural in situ, de forma a garantir maior efetividade à tutela material do meio ambiente.

Trata-se, por certo, da modalidade ideal de reparação, que deve ser adotada ainda que se mostre financeiramente mais onerosa. É o que entende, de forma unânime, a doutrina e a jurisprudência176 pátrias. Como afirmam José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo Ayala, “a melhor forma de reparação, isto é, a ideal, é sempre a recuperação ou recomposição do bem ambiental, ao lado da cessação das atividades nocivas.”177 No mesmo sentido, Darlan Rodrigues Bittencourt e Ricardo Kochinski Marcondes asseveram que “a reparação do dano ambiental visará, sempre, à restauração do processo ecológico degradado, de forma

174 LUCARELLI, Fábio Dutra. “Responsabilidade civil por dano ecológico.” In: MILARÉ, Édis; e MACHADO,

Paulo Affonso Leme (orgs.). Doutrinas essenciais de Direito Ambiental: responsabilidade em matéria

ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, v. V, p. 195.

175 SENDIM, José de Souza Cunhal. “Responsabilidade civil por danos ecológicos: da reparação do dano através

da restauração natural.” Coimbra: Almedina, 2002, p. 51.

176 Os Tribunais vêm reiterando, em suas decisões, a “prioridade da reparação in natura.” Superior Tribunal de

Justiça. 2.ª Turma. Recurso Especial n.º 1071741. Relator: Ministro Herman Benajmin. D. J. 16.12.2010

compatível com o desenvolvimento econômico-social (art. 4º, I e IV, da Lei n.º 6.938/81). (...) A recomposição do ecossistema degradado, a fim de se obter a volta à situação anterior, é a primeira e principal forma de reparação.”178

Apenas no caso de se mostrar impossível a reparação natural in situ do dano ambiental é que entra em cena a segunda modalidade de reparação. Trata-se da compensação ambiental179, também denominada “reparação por equivalente”, fulcrada, na seara processual coletiva, no § 5.º do artigo 84 do Código de Defesa do Consumidor, ao prever a possibilidade de o magistrado determinar o cumprimento de obrigação apta a garantir o resultado prático

equivalente. É este, a nosso ver, o dispositivo legal que deve servir de fundamento para a prolação de decisão judicial que determine a reparação de dano ambiental através do mecanismo da compensação natural.

Nos dizeres de Annelise Monteiro Steigleder, “quando a reparação in natura for impossível ou desproporcional, a satisfação do interesse ecológico exige a busca de novas soluções que, ao menos, impeçam a ausência total de reparação ou sua automática substituição pela indenização pecuniária. Abre-se aqui a possibilidade de aplicação da compensação ecológica, consistente em uma forma de restauração natural do dano ambiental que se volta para uma área distinta da área degradada, tendo por objetivo assegurar a conservação de funções ecológicas equivalentes.”180

Caso seja a medida eleita, a compensação ambiental se prestará a recuperar área degradada diversa daquela que sofreu as consequências do ato lesivo, devendo ser observada a relação de proximidade geográfica entre a área a ser recuperada e a área impactada, com vistas a proteger o ecossistema específico em que se inserem.

Desse modo, na ordem das formas de reparação ora sugerida, a compensação ambiental é a segunda medida a ser adotada, situando-se entre a reparação natural in situ e o ressarcimento mediante o pagamento de indenização. Aliás, a prevalência da compensação

178 “Lineamentos da responsabilidade civil ambiental.” In: MILARÉ, Édis; e MACHADO, Paulo Affonso Leme

(orgs.). Doutrinas essenciais de Direito Ambiental: responsabilidade em matéria ambiental. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011, v. V, p. 195.

179 Segundo Érika Bechara, a compensação ambiental “consiste no oferecimento de um benefício ou ganho

ecológico às vítimas de lesão ambiental irreversível – coletividade –, para contrabalançar a perda sofrida.” In: “Licenciamento e compensação ambiental.” Ob. cit., p. 141.

180 “Responsabilidade civil ambiental: as dimensões do dano ambiental no Direito brasileiro.” 2.ª ed. Porto

ambiental em detrimento da indenização é medida que decorre da própria efetividade da tutela ambiental, pois se trata de uma forma de reparação específica do bem ambiental globalmente considerado. Vale dizer, se não é possível o retorno ao statu quo ante, outra forma de reparação específica deve ser buscada antes de se permitir sua conversão em montante indenizatório, menos benéfico à higidez do bem ambiental.

Por fim, apenas quando a reparação natural in situ e a compensação ambiental se mostrarem impossíveis ou menos adequadas ao atendimento da efetividade da tutela do meio ambiente, isto é, apenas subsidiariamente, é que se pode adotar o pagamento de indenização como forma de ressarcimento de danos ambientais.

A terceira modalidade, portanto, é a reparação pecuniária, pela qual o dano ambiental será reparado através do pagamento de indenização por parte do responsável pela sua ocorrência, a ser revertida ao Fundo de Defesa dos Direitos Difusos (no âmbito federal), previsto no artigo 13 da Lei n.º 7.347/1985 e disciplinado pela Lei n.º 9.008/1995, ou ao fundo estadual correspondente.

Como assinala Marcelo Abelha Rodrigues, “a reparação pecuniária do bem ambiental é, por assim dizer, uma última saída, quando seja completamente inviável a recuperação do meio ambiente degradado,”181 já que, além da evidente dificuldade de se definir o montante indenizatório182, trata-se da modalidade de reparação menos benéfica ao meio ambiente e, portanto, a que atende de maneira menos efetiva aos interesses (jurídicos) da coletividade.

Na linha do que afirmamos acima, a respeito da necessidade de ser integral e completa a reparação do dano ambiental, aventa-se a possibilidade de que sejam cumuladas duas medidas reparatórias distintas, tal como a reparação natural in situ e a compensação ambiental, ou, ainda, a reparação in loco e a reparação pecuniária. Nessa hipótese, caso seja

181 “Elementos do Direito Ambiental: parte geral.” Ob. cit., p. 83.

182 “É certo, contudo, que converter as reparações em indenizações não é coisa fácil e nem há fórmula para tanto.

E, ainda que se tentasse criar uma, as variantes seriam tantas que a conversão seria impossível. Há necessidade de que sejam consideradas as peculiaridades de cada caso, quando se terá em conta a extensão do território atingido, eventual imprestabilidade de algum recurso ambiental, reflexos para a fauna e flora, consequências para a saúde humana, etc. É uma atividade demasiadamente complexa e que implica contribuição de profissionais de várias áreas do conhecimento.” In: MARQUES, José Roberto. “Lições preliminares de Direito Ambiental.” São Paulo: Verbatim, 2010, p. 71.

possível a reparação natural apenas parcial dos danos ambientais, deve-se exigir a adoção de medida reparatória complementar para o atingimento da integralidade do ressarcimento dos prejuízos sofridos pela coletividade – o que inclui os prejuízos suportados até a efetiva reparação in situ –, quer seja a compensação ambiental, quer seja a reparação pecuniária, observada a ordem das formas de reparação ora sugerida.

Nesse sentido, o Superior Tribunal de Justiça já decidiu que “a restauração in

natura nem sempre é suficiente para reverter ou recompor integralmente, no terreno da responsabilidade civil, o dano ambiental causado, daí não exaurir o universo dos deveres associados aos princípios do poluidor-pagador e da reparação in integrum. A reparação ambiental deve ser feita da forma mais completa possível, de modo que a condenação a recuperar a área lesionada não exclui o dever de indenizar, sobretudo pelo dano que permanece entre a sua ocorrência e o pleno restabelecimento do meio ambiente afetado (= dano interino ou intermediário), bem como pelo dano moral coletivo e pelo dano residual (= degradação ambiental que subsiste, não obstante todos os esforços de restauração). A cumulação de obrigação de fazer, não fazer e pagar não configura bis in idem, porquanto a indenização não é para o dano especificamente já reparado, mas para os seus efeitos remanescentes, reflexos ou transitórios, com destaque para a privação temporária da fruição do bem de uso comum do povo, até sua efetiva e completa recomposição, assim como o retorno ao patrimônio público dos benefícios econômicos ilegalmente auferidos.”183

Resta claro, portanto, que o magistrado, na busca pela efetividade da tutela ambiental, tem o dever de seguir a mencionada ordem de reparação do dano ambiental, determinando, prioritariamente, o cumprimento de obrigação de fazer consistente na reparação natural in situ, aliada, é claro, à eventual obrigação de não fazer, relativa à cessação do dano. Quando essa primeira modalidade reparatória se mostrar impossível ou inadequada à proteção do bem ambiental, permite-se a imposição judicial da obrigação de fazer consistente em recuperar ambientalmente área diversa daquela agredida, mediante compensação ambiental. Subsidiariamente, a reparação na forma pecuniária consiste na medida última a ser buscada, apenas admissível quando as duas primeiras não forem possíveis.

183 Superior Tribunal de Justiça. 2.ª Turma. Recurso Especial n.º 1180078. Relator: Ministro Herman Benjamin.

III–A ANTECIPAÇÃO DE TUTELA COMO INSTRUMENTO PARA A EFETIVIDADE DA TUTELA DO MEIO AMBIENTE

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