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2.13 – O agravo de instrumento e a possibilidade de concessão,

Pela atual sistemática recursal, conforme redação do artigo 522 do Código de Processo Civil, o recurso de agravo de instrumento é cabível quando a decisão interlocutória recorrida “causar à parte lesão grave e de difícil reparação”.

Este pressuposto segue a lógica que estabelecemos no item “III.2.4.2”, relacionada à necessidade de atendimento à tempestividade dos provimentos jurisdicionais, de modo que será cabível o agravo na modalidade de instrumento quando o seu processamento pela via retida puder implicar a ineficácia do provimento recursal pleiteado, isto é, puder impor óbice à efetividade do processo.446 É que, segundo dispõe o artigo 523 do Código de Processo Civil, o agravo retido apenas será conhecido pelo Tribunal quando do julgamento do recurso de apelação. Assim, são recorríveis por meio do agravo de instrumento as decisões interlocutórias que tenham por objeto questões que não possam aguardar, sob pena de perecimento, o julgamento do recurso de apelação.

444 RT 739: 313. (destacamos)

445 “Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante.” Ob. cit., p. 908.

446 Cf. SANTOS, Ernane Fidélis dos. “As Reformas de 2005 e 2006 do Código de Processo Civil.” 2.ª ed.

São inúmeras as circunstâncias em que pode estar presente o referido pressuposto para a interposição de agravo sob a modalidade instrumental. Ao que é de interesse ao presente estudo, pode-se afirmar que a decisão que aprecia pedido de antecipação de tutela,

seja ela concessiva ou denegatória da medida pleiteada, via de regra, é oponível via agravo de instrumento, por não poder aguardar o decurso do tempo necessário até o julgamento do recurso de apelação. Apesar de tal entendimento se aplicar também às hipóteses de tutela antecipada de evidência, acima analisadas, a eleição da via de instrumento se mostra ainda mais cristalina quando se está a tratar de tutela antecipada fulcrada na urgência.

Nesse sentido, ao exemplificar os provimentos jurisdicionais recorríveis por meio de agravo de instrumento, José Carlos Barbosa Moreira cita expressamente a decisão “que defere ou indefere requerimento de antecipação da tutela.”447Ainda nesse sentido, Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery prelecionam:

“O agravo será de instrumento quando a decisão tiver aptidão para causar à parte lesão grave e de difícil reparação.

(...)

Pode-se observar, entretanto, que essa circunstância venha a ocorrer nas tutelas de urgência, como no mandado de segurança, tutela antecipada, medida cautelar e em todas as situações em que se pleiteia a concessão de liminar: a) indeferida a tutela de urgência, a parte pode interpor agravo de instrumento para que o tribunal conceda a medida; b) deferida a tutela de urgência, a parte que tiver que suportar os efeitos do cumprimento da decisão pode interpor agravo de instrumento para que seja cassada a medida.”448

Há situações, contudo, em que o direito versado no pleito antecipatório não pode aguardar a prolação da decisão colegiada final pelo Tribunal no âmbito do agravo de instrumento. Para resguardar a efetividade do processo nestas hipóteses, prevê o Código de Processo Civil, em seu artigo 527, inciso III, a possibilidade de o relator do agravo “atribuir efeito suspensivo ao recurso (art. 558), ou deferir, em antecipação de tutela, total ou parcialmente, a pretensão recursal.”

Desse modo, quando o magistrado deferir pedido de tutela antecipada, o réu poderá interpor agravo de instrumento e, nessa seara, pleitear o sobrestamento dos efeitos da

447 “Comentários ao Código de Processo Civil.” 13.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2006, v. V, p. 495. 448 “Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante.” Ob. cit., p. 912.

decisão de primeiro grau até o julgamento definitivo do recurso pelo Tribunal. É também o que dispõe o artigo 558 do Código de Processo Civil, ao determinar a suspensão do cumprimento da decisão antecipatória quando a sua efetivação puder resultar em lesão grave e de difícil reparação e, adicionalmente, quando estiver presente o requisito da relevância da fundamentação.

A respeito dos referidos pressupostos, William Santos Ferreira anota que “aqui há a necessidade de o agravante demonstrar o periculum in mora, isto é, comprovar que a demora para apreciação de seu recurso possa resultar em lesão grave e de difícil reparação, mas deve também demonstrar a relevância da fundamentação, isto é, que pelas razões recursais o recurso provavelmente será provido.”449

Noutro giro, sendo indeferido o pleito de tutela antecipada pelo julgador de primeiro grau, pode o autor, ao interpor o recurso de agravo de instrumento, apresentar ao relator pedido de concessão de antecipação da tutela recursal450, oportunidade em que deve demonstrar o preenchimento dos pressupostos previstos no mencionado artigo 558 do Código de Processo Civil.451

Caso deferida a medida suspensiva, caberá ao relator comunicar imediatamente tal fato ao juiz de primeira instância, de forma a impedir o início dos atos destinados à efetivação da decisão concessiva da antecipação de tutela ou a obstar a sua continuidade, caso já iniciados. O mesmo deve ser feito em caso de concessão de antecipação da tutela recursal.

Nesse ponto, insta chamar a atenção para a disposição contida no parágrafo único do artigo 527 do Código de Processo Civil, segundo a qual é irrecorrível a decisão que aprecia pedido de atribuição de efeito suspensivo ao agravo ou pleito de concessão de antecipação da tutela recursal, restando à parte prejudicada apenas a possibilidade de apresentar pedido de reconsideração ao prolator da decisão.

449 “Tutela antecipada no âmbito recursal.” São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000, p. 249.

450 Nesse sentido, William Santos Ferreira afirma que “o remédio a ser utilizado quando denegada em primeira

instância a tutela antecipada é a interposição do agravo de instrumento, com pedido expresso de concessão pelo relator da antecipação dos efeitos da tutela recursal, ou, de forma mais singela, a concessão pelo relator da tutela antecipada denegada pelo juízo a quo.” In: Idem, p. 258.

Afigura-nos que tal dispositivo pode ensejar violação às garantias constitucionais da ampla defesa452, da igualdade processual, do duplo grau de jurisdição e do juiz natural, o que se dá de forma ainda mais aguda na seguinte situação exemplificativa. Imagine-se que o juiz de primeira instância tenha indeferido determinado pedido de tutela antecipada antes mesmo da oitiva do réu. Interposto o agravo de instrumento, o relator, em atenção ao pleito formulado pelo autor, acaba por deferir a antecipação da tutela recursal. Intimado, o réu, por sua vez, não poderá recorrer desta decisão sumária, diante da disposição prevista no mencionado parágrafo único do artigo 527. Vê-se daí que o autor teve duas oportunidades para ver deferido o seu pleito antecipatório, uma em cada instância, enquanto que ao réu restou apenas se contentar com os prejuízos advindos da concessão da medida.

A corroborar o que se aduz, Cássio Scarpinella Bueno, ao sustentar a inconstitucionalidade do dispositivo em comento, afirma que a vedação nele contida estaria a impedir o acesso do recorrente ao pronunciamento do órgão colegiado, entendido como o “juiz natural” do julgamento dos recursos na sistemática processual constitucional, afrontando também o princípio do duplo grau de jurisdicional, que impõe a “possibilidade de, no âmbito dos Tribunais, serem contrastadas as decisões tomadas isoladamente pelos seus membros perante o órgão colegiado respectivo.”453

É claro que poderá o réu apresentar pedido de reconsideração; mas tal medida não consiste em recurso e, em geral, tem se mostrado inócua na prática forense, já que são raríssimos os casos em que o próprio relator se presta a reconsiderar a decisão monocrática. Poderá, ainda, impetrar mandado de segurança, direcionado ao Presidente do Tribunal454, o que também se mostra pouco eficaz na prática, ante os inúmeros empecilhos criados para o seu conhecimento455 e para a concessão da segurança pleiteada.

452 Cf. MOREIRA, José Carlos Barbosa. “Comentários ao Código de Processo Civil.” Ob. cit., p. 515.

453 “Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: recursos, processos e incidentes nos tribunais, sucedâneos

recursais: técnica de controle das decisões jurisdicionais.” São Paulo: Saraiva, 2008, v. V, p. 176.

454 O cabimento do mandado de segurança na hipótese em questão é fartamente reconhecido pela doutrina. Por

todos: NERY JÚNIOR, Nelson; e NERY, Rosa Maria de Andrade. “Código de Processo Civil comentado e legislação extravagante.” Ob. cit., p. 935; e THEODORO JÚNIOR, Humberto. “Código de Processo Civil anotado.” 13.ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009, p. 508. Em sede jurisprudencial, não pode deixar de ser mencionado o seguinte julgado de vanguarda, que confirma o cabimento de writ na hipótese analisada: Superior Tribunal de Justiça. 3.ª Turma. Recurso Ordinário em Mandado de Segurança n.º 22.847/MT. Relatora: Ministra Nancy Andrighi. D.J. 26.03.2007.

455 Sobre o assunto, vale observar que a parte da jurisprudência se coloca no sentido de que, no caso de

impetração de mandado de segurança contra decisão judicial, a decisão atacada terá de ser manifesta e inequivocamente ilegal, com traços de teratologia. Confira-se:

Tais medidas, contudo, não minimizam os efeitos deletérios impostos ao réu pelo parágrafo único do artigo 527 do Código de Processo Civil, que se vê impedido de recorrer da decisão monocrática que, em sede de antecipação da tutela antecipada recursal, defere o adiantamento do provimento final pleiteado pelo autor.

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