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5.1.4 – Dano ambiental: patrimonial e extrapatrimonial

Para o correto entendimento e definição do que seja dano ambiental, incumbe tecer algumas breves considerações sobre os danos patrimoniais e os extrapatrimoniais.145

Em sede constitucional, nos termos do artigo 5.º, inciso V, da Carta da República, é assegurada a reparação dos danos “material, moral e à imagem.”146

Em nível infraconstitucional, no âmbito da legislação relativa aos direitos difusos e coletivos, o artigo 6.º, incisos VI e VII, do Código de Defesa do Consumidor e o artigo 17

144 BENJAMIN, Antonio Herman V. “Função ambiental.” In: BENJAMIN, Antonio Herman V. (coord.). Dano

ambiental: prevenção, reparação e repressão. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993, v. II, p. 81.

145 No presente trabalho, preferimos adotar a denominação “patrimonial e extrapatrimonial”, em atenção às

lições de José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo Ayala. Confira-se: “Nota-se, entretanto, que o nome extrapatrimonial é menos restritivo, pois não vincula a possibilidade de dano à palavra moral, que pode ter várias significações e torna-se, desta maneira, falha por imprecisão semântica. O dano moral está, nas precisas ligações de Severo, mais ligado a um subjetivismo, devendo ser abolido no sentido do conceito se tornar obsoleto com o tempo e também mais circunscrito.” In: “Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial.” Ob. cit. p. 264.

146 O Superior Tribunal Justiça já assentou, por meio de sua Súmula 37, o entendimento de que “são cumuláveis

do Estatuto da Criança e do Adolescente asseguram a reparação tanto de danos patrimoniais quanto de danos extrapatrimoniais.

Especificamente no que se refere à tutela ambiental, o artigo 1.º da Lei n.º 7.347/1985 assim prevê:

“Art. 1.º Regem-se pelas disposições desta lei, sem prejuízo da ação popular, as ações de responsabilidade por danos morais e patrimoniais causados:

l – ao meio-ambiente; (...)”

O dano patrimonial ambiental147, relacionado com o próprio bem ambiental lesado, é pacificamente aceito pela doutrina e pela jurisprudência, não sendo necessário, portanto, tecer maiores considerações a seu respeito.

Já o dano extrapatrimonial ambiental, apesar de sua larga aceitação, ainda é objeto de algumas divergências, o que enseja a necessidade de análise do tema. Mas o que seria dano extrapatrimonial ambiental?

Ao diferenciar os danos patrimonial e extrapatrimonial, Álvaro Luiz Valery Mirra responde a essa pergunta, in verbis:

“Em resumo, a diminuição da qualidade de vida da população, o desequilíbrio ecológico, a lesão a um determinado espaço protegido, os incômodos físicos ou lesões à saúde, se constituem em lesões ao patrimônio ambiental.

Isso dentro do conceito da Constituição Federal, que assegura a todos um meio ambiente ecologicamente equilibrado.

O dano moral ambiental vai aparecer quando, além (ou independentemente) dessa repercussão física no patrimônio ambiental, houver ofensa ao sentimento difuso ou coletivo.”148

Também José Rubens Morato Leite e Patryck de Araújo Ayala classificam como dano extrapatrimonial ambiental “tudo o que diz respeito à sensação de dor experimentada ou conceito equivalente em seu mais amplo significado ou todo prejuízo não-patrimonial ocasionado à sociedade ou ao indivíduo, em virtude da lesão do meio ambiente.”149

147 “Dano patrimonial ambiental, relativamente à restituição, reparação, ou indenização do bem ambiental

lesado.” In: LEITE, José Rubens Morato; e AYALA, Patryck de Araújo. “Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial.” Ob. cit., p. 96.

148 “Responsabilidade civil pelo dano ambiental e o princípio da reparação integral do dano.” Ob. cit., p. 594. 149 “Dano ambiental: do individual ao coletivo extrapatrimonial.” Ob. cit., p. 96-97.

Na linha do quanto defendido pelos citados doutrinadores, entendemos ser juridicamente possível a existência de dano extrapatrimonial ambiental. Mister, contudo, atentar-se para a seguinte ressalva: ao contrário do que sustentam alguns, a mera constatação do dano patrimonial ambiental não nos parece suficiente para pressupor, sempre, a ocorrência de dano extrapatrimonial ambiental, o que somente se dá quando efetivamente constatado sentimento de dor ou frustração da coletividade “decorrente da agressão a um determinado bem ambiental, ao qual a coletividade se sinta especialmente vinculada, seja por laços de afeição, seja por algum vínculo de especial respeito. Por exemplo: um determinado monumento especialmente importante para a história de uma certa cidade, cuja destruição possa ofender a memória ou a dignidade do povo daquela localidade; uma praça com árvores centenárias ou com um corpo ou curso d'água (um lago, uma queda d'água, um córrego, um rio, etc.) que define de maneira especial a paisagem de uma certa cidade, cuja degradação possa acarretar grande frustração para a coletividade como um todo. Nesses cursos, verificada a ofensa à dignidade do povo ou a ocorrência de sentimento de frustração da comunidade, como reflexo da degradação de um determinado bem ambiental, estará configurado o dano moral ambiental.”150

Foi exatamente essa a linha adotada pelo Superior Tribunal de Justiça quando do julgamento do Recurso Especial n.º 598281/MG.151 De acordo com o voto do Ministro Luiz Fux, “o dano moral ambiental caracterizar-se-á quando, além dessa repercussão física no patrimônio ambiental, sucede ofensa ao sentimento difuso ou coletivo – v.g.: o dano causado a uma paisagem causa impacto no sentimento da comunidade de determinada região, quer como

v.g; a supressão de certas árvores na zona urbana ou localizadas na mata próxima ao perímetro urbano. Consectariamente, o reconhecimento do dano moral ambiental não está umbilicalmente ligado à repercussão física no meio ambiente, mas, ao revés, relacionado à transgressão do sentimento coletivo, consubstanciado no sofrimento da comunidade, ou do grupo social, diante de determinada lesão ambiental.”152

150 MIRRA, Álvaro Luiz Valery. “Responsabilidade civil pelo dano ambiental e o princípio da reparação integral

do dano.” Ob. cit., p. 439.

151 A leitura da ementa desse julgado pode gerar interpretações equivocadas acerca da matéria ora estudada.

Apesar da negativa de provimento, três (Luiz Fux, Denise Arruda e José Delgado) dos cinco Ministros entenderam que o ordenamento jurídico reconhece a existência de danos extrapatrimoniais ambientais. Contudo, a Ministra Denise Arruda não se convenceu de sua presença naquele caso específico, o que gerou o desprovimento do Recurso.

152 Superior Tribunal de Justiça. 1.ª Turma. Recurso Especial n.º 598281. Relator: Ministro Luiz Fux. Relator

Outro julgado importante – e pioneiro – acerca do tema ocorreu no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro com o julgamento da Apelação Cível n.º 0140043- 19.1999.8.19.0001, de relatoria da Desembargadora Maria Raimunda Teixeira de Azevedo, no qual ficou mantida a condenação determinada em primeira instância para o ressarcimento dos danos extrapatrimoniais ambientais gerados pelo poluidor. Contudo, o fundamento utilizado para tanto foi diverso daquele exposto acima, que nos afigura como mais adequado, pelo qual a configuração do dano extrapatrimonial ambiental exigiria a constatação de transgressão ao sentimento coletivo. Segundo se infere do acórdão proferido pelo Tribunal fluminense, “o dano moral ambiental tem por característica a impossibilidade de mensurar e a impossibilidade de restituição do bem ao estado anterior.”153

De todo modo, ante essas considerações, parece-nos natural a aceitação do reconhecimento dos danos extrapatrimoniais ambientais pelo ordenamento jurídico pátrio.

II.5.1.5. – Finalmente, a definição do conceito jurídico de dano

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