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2.12 – Da necessidade de observância do princípio da motivação

Como é de conhecimento correntio, a Constituição da República, em seu artigo 93, inciso IX, apregoa a inafastabilidade de motivação para qualquer decisão que afete direitos. No caso do processo civil, tal é a importância da motivação que o ordenamento lhe conferiu mais um dispositivo em nível infraconstitucional, consubstanciado no artigo 165 do Código de Processo Civil.

435 “Ação civil pública e reparação do dano ao meio ambiente.” Ob. cit., p. 106.

436 “Tutela relativa aos deveres de fazer e de não fazer: e sua extensão aos deveres de entrega de coisa (CPC,

arts. 461 e 461-A, CDC, art. 84).” Ob. cit., p. 249.

437 Cf. Idem, p. 259.

Portanto, mostra-se imprescindível a observância do princípio da motivação dos atos judiciais, sendo lícito afirmar que o magistrado possui o dever de fundamentar sua decisão, ainda que de forma concisa.

Por fundamentação concisa, aliás, deve-se entender aquela que dá as razões de fato e de direito que levaram o juiz a se convencer naquele determinado sentido. É o que assinala Nelson Nery Júnior, ao registrar que a motivação das decisões judiciais “pode ser analisada por vários aspectos, que vão desde a necessidade de comunicação judicial, exercício de lógica e atividade intelectual do juiz, até sua submissão, como ato processual, ao estado de direito e às garantias constitucionais estampadas na CF 5º, trazendo consequentemente a exigência da imparcialidade do juiz, a publicidade das decisões judiciais, a legalidade da mesma decisão, passando pelo princípio constitucional da independência jurídica do magistrado, que pode decidir de acordo com sua livre convicção, desde que motive as razões de seu convencimento (princípio do livre convencimento motivado).”439

Por tais razões, não há dúvida de que decisão desprovida da necessária fundamentação é nula e ofende a Constituição Federal (artigo 93, inciso IX) e o Código de Processo Civil (artigo 165). Nesse sentido, vale conferir julgado do Excelso Pretório, que representa a jurisprudência consolidada sobre o tema:

“A fundamentação constitui pressuposto de legitimidade das decisões judiciais. A fundamentação dos atos decisórios qualifica-se como pressuposto constitucional de validade e eficácia das decisões emanadas do Poder Judiciário. A inobservância do dever imposto pela CF 93 IX, precisamente por traduzir grave transgressão de natureza constitucional, afeta a legitimidade jurídica da decisão e gera, de maneira irremissível, a conseqüente nulidade do pronunciamento judicial.”.440

Não destoa desse entendimento a lição de Cândido Rangel Dinamarco, para quem “tão severa quanto a cominação de nulidade por falta de citação é o que a própria Constituição Federal endereça às decisões judiciárias em geral, as quais devem ser fundamentadas, sob

pena de nulidade (art. 93, inc. IX).”441

439 “Princípios do processo na Constituição Federal: processo civil, penal e administrativo.” Ob. cit., p. 286. 440 Supremo Tribunal Federal. 2.ª Turma. Habeas Corpus n.º 80892-RJ. Relator: Ministro Celso de Mello. D.J.

23.11.2007.

Tratando-se de decisão sobre pedido de tutela antecipada, prevê o artigo 273, § 1.º, que “o juiz indicará, de modo claro e preciso, as razões do seu convencimento.” Com efeito, tamanha é a importância da motivação para as decisões que versam sobre a antecipação de tutela que o legislador fez questão de enfatizar a necessidade de sua observância, não obstante esta imposição já decorrer naturalmente dos mencionados artigos 93, inciso IX, da Constituição Federal e 165 do Código de Processo Civil.

Por certo, se o princípio da motivação deve ser devidamente atendido nas decisões judiciais proferidas em juízo de cognição exauriente, para a qual o magistrado possui convicção plena a respeito da existência ou não do direito objeto da lide, já que decorridas todas as fases processuais e presentes todos os elementos necessários para tanto, com mais razão ainda impõe-se o dever de motivação quando se está diante de decisão que aprecia pedido de tutela antecipada.

Tal entendimento encontra guarida em duas razões principais, as quais, vale dizer, se complementam. A primeira reside na assertiva de que, por meio da tutela antecipada, o que faz o magistrado é justamente antecipar os efeitos da tutela final, de modo que, caso ocorra o seu deferimento, a medida poderá incidi na esfera jurídica do réu com a mesma potência da tutela definitiva – ressalvada, obviamente, a definitividade da tutela jurisdicional final. A segunda consiste no fato de que o juiz, ao decidir sobre pedido de antecipação de tutela, avaliará a probabilidade do direito afirmado pelo autor, ao contrário do que ocorre com a tutela final, para a qual o julgador deve possuir certeza (relativa) sobre a procedência ou não do pedido, sendo certo que, para que a análise sobre o pleito antecipatório não sofra interferência indevida de aspectos subjetivos afetos à esfera individual do magistrado, impõe- se que a motivação acerca do juízo de probabilidade seja a mais completa possível.

Vale mencionar que a jurisprudência e a doutrina consolidaram entendimento no sentido de que a decisão que concede ou indefere tutela antecipada não pode se valer apenas e tão somente de “expressões tanto genéricas como comuníssimas no dia-a-dia forense, tais como ‘presentes os pressupostos legais defiro a tutela antecipada’ e seu contrário ‘porque ausentes os pressupostos legais, indefiro o pedido de tutela antecipada’. É mister que o

magistrado destaque quais são os pressupostos e em que medida eles se fazem presentes ou ausentes na espécie.”442

Na mesma linha, João Batista Lopes assevera que “a motivação deve ser clara e precisa, mas pode ser concisa, por se cuidar de decisão interlocutória (cf. art. 165 do CPC). Decisão concisa não se confunde, porém, com decisão lacônica (v.g., não deve o juiz limitar- se a dizer ‘defiro o pedido, nos termos da lei’; ‘presentes os requisitos do art. 273, defiro a tutela antecipada’; ou ‘indefiro o pedido por faltar amparo legal’).”443

A nosso ver, essa forma “sucinta” de justificação da decisão antecipatória, que se restringe apenas a afirmar pela presença ou ausência dos pressupostos processuais, não configura a motivação exigida do julgador, devendo ser considerada incompleta, ou, ainda, inexistente.

Em sede de ações civis públicas ambientais, a ausência de motivação mostra-se ainda mais grave, uma vez que afeta toda a coletividade, titular do bem ambiental, e desconsidera a multiplicidade de interesses envolvidos na lide, inclusive sob a perspectiva de que as lides coletivas ambientais geralmente têm grande repercussão na sociedade.

Interessante observar, ademais, que a ausência ou a incompletude de motivação pode impedir ou dificultar a interposição de recurso pela parte prejudicada, resultando em grave violação aos princípios do devido processo legal, mais especificamente da ampla defesa e do duplo grau de jurisdição.

Sendo constatada ausência da devida motivação, estará configurada omissão, passível de saneamento por meio da oposição de embargos de declaração. Nesse sentido, é a jurisprudência, in verbis:

“EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – Interposição contra decisão interlocutória – Admissibilidade pela ausência de motivação na decisão – Ofensa ao princípio constitucional do artigo 93, IX.

(...) E se a decisão interlocutória embargada se revela totalmente despida de motivação, em evidente afronta à garantia constitucional insculpida no inc. IX do artigo 93, com

442 BUENO, Cássio Scarpinella. “Curso Sistematizado de Direito Processual Civil: tutela antecipada. Tutela

cautelar. Procedimentos cautelares específicos.” São Paulo: Saraiva, 2009, v. IV, p. 33.

maior razão se justifica o acolhimento dos embargos, na medida em que a aludida omissão imporia, pela sua gravidade, o reconhecimento e a proclamação, até mesmo de ofício, da total invalidade do ato embargado.”444

Nesse caso, havendo, de fato, ausência de motivação que configure omissão no julgado, o seu necessário saneamento poderá, eventualmente, ter como consequência a atribuição de efeito infringente à decisão, com a sua alteração, o que, vale dizer, se coaduna perfeitamente com o sistema recursal adotado pelo Código de Processo Civil. É o que ensinam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery, in verbis:

“Outra hipótese comum de Embargos de Declaração modificadores da decisão embargada ocorre quando o vício apontado é o de omissão do julgado. A infringência é mera decorrência do suprimento da omissão e não ofende o sistema recursal do CPC.”445

Resta evidente, portanto, a necessidade de motivação clara e precisa da decisão que concede ou nega a tutela antecipada em ações civis públicas ambientais.

III.2.13. – O agravo de instrumento e a possibilidade de concessão, revogação

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