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182 AS HISTÓRIAS 1 ) 0 NOVO TESTAMENTO

HistóriAs d.A ÍAmíliA de Jesus

182 AS HISTÓRIAS 1 ) 0 NOVO TESTAMENTO

de Maria. Os modelos de discipulado nessa história não têm todos a mesma estatura — há maiores e menores.

Isabel é retratada como a precursora de Maria. Sua concepção milagrosa, fora da idade apropriada, contribui para dar mais certeza a Maria de que as palavras do anjo eram verdadeiras. De Na verdade, a relação entre Isabel e Maria é semelhante à que Lucas traça entre João e Jesus. Observe o tom respeitoso empregado em Lucas 1.42, 43 e 3.16. Assim como ocorre com Isabel, que recebe maior destaque do que Zacarias e é representada sob uma luz mais favorável como modelo de fé, Maria também tem proeminência em relação a José. O nome de José quase não é mencionado antes que as principais profecias e cânticos concernentes a Jesus tenham sido apresentados. No evangelho de Lucas, José é marcado pelo silêncio, assim como Zacarias, ao contrário do que ocorre em Mateus 1 e 2, em que Maria é que permanece em completo silêncio. E pela proeminência da precursora de Maria, Isabel, e da ausência de José que o retrato de Maria ganha relevo dramático, e ela continua a ter papel central nas histórias sobre Simeão e Ana.

Ana e Simeão representam a antiga ordem de judeus piedosos, as velhas esperanças e sonhos. Mas é a Maria que Simeão diz as palavras: “Este menino está posto para queda e para elevação de muitos em Israel, e como um sinal de con­ tradição. Assim, os pensamentos de muitos corações serão conhecidos. Quanto a ti, uma espada atravessará a tua alma!” (2.34, 35). Como Lucas não faz menção a Maria no local da cruz, é improvável que essas palavras tenham alguma coisa a ver com aquele momento. A espada provavelmente simboliza a angústia dolorosa que Maria sentiu ao ver seu Filho criticado e rejeitado por seu próprio povo. Ela faz parte de Israel, mas está dividida entre Israel e seu Filho. É possível, também, que essa frase se refira ao episódio em que Maria é repelida por Jesus (cf. Lc 2.49, 50; Lc 8.19-21). Ana é mostrada como profetiza, nos mesmos moldes de Maria, e passa a dar testemunho sobre Jesus após ver o menino. Enquanto Simeão é um velho cansado que, depois de ver Jesus, se sente pronto para partir em paz, Ana — assim como Maria — representa a nova ordem escatológica, em que as mulheres saem divulgando o evangelho e testemunhando sobre Jesus. Também devemos notar que, no contexto formado pelos retratos de Ana e Isabel, Maria se torna mais uma mulher crente entre outras mulheres crentes, e nem sempre é ela quem demonstra ter mais discernimento entre as que compõem o “verdadeiro” Israel.

A falta de entendimento de Maria se evidencia em vários pontos da narrativa (1.29, 34; 2.33, 50). Lucas 2.50 afirma explicitamente que ela e José não enten­ deram as coisas que Jesus lhes disse. Nesse aspecto, eles são muito semelhantes aos discípulos de Jesus (18.34). Portanto, Lucas não pinta um retrato idealizado de Maria, e sua história não é um mar de rosas. Lucas quer revelar tanto a alegria quanto a dor, tanto a perspicácia quanto a falta de entendimento. Existe sempre, porém, o lembrete de que, embora às vezes não saiba o que deveria fazer, ela guarda as palavras de Jesus e medita nelas (2.19, 51). Ela é retratada como uma

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mulher que caminha para o pleno entendimento. Levará muito tempo até que Maria compreenda essas coisas. Aparentemente, Lucas — assim como o quarto evangelista — não crê que seja possível entender tudo antes que chegue o momento da cruz.

Na história de Jesus no templo, que encerra a narrativa da infância em Lucas (2.41-52), são evidentes as tensões entre as responsabilidades da família física e da família espiritual sobre Jesus. E interessante notar que se pode traçar um paralelo entre Maria e Jesus nessa história, porque ambos crescem em sabedoria, estatura e graça, diante de Deus e dos homens, à medida que a história se desenrola. O aprendizado cuidadoso e atento caracteriza os discípulos (8.15; 18.21; 10.39). Maria é um modelo de fé acessível ao público de Lucas, pois ela tanto necessita de entendimento quanto o busca; tem fé tanto quanto sente ansiedade.

A história da pregação de Jesus em Nazaré, encontrada em Lucas 4, não inclui observação sobre Maria nem referência a seus irmãos e irmãs. A mãe e os irmãos são mencionados rapidamente quando Lucas se apropria de Marcos 3.31-35 em Lucas 8.19-21. Porém, Lucas apresenta a versão menos agressiva dessa história. Maria e os irmãos de Jesus vão simplesmente vê-lo, e esta é a palavra final de Jesus: “Minha mãe e meus irmãos são estes que ouvem a palavra de Deus e lhe obedecem”. Isso abre espaço para que a família terrena de Jesus seja incluída nessa descrição. Maria não torna a aparecer no evangelho de Lucas, mas nós a encontramos, juntamente com os irmãos de Jesus (onde estão as irmãs, em Lucas?).3 4 Atos 1.14 completa a história de Maria mostrando que ela fez a transição para o círculo de seguidores de Jesus em Jerusalém e estava orando enquanto aguardava o Pentecostes, como o resto dos discípulos. Lucas, portanto, nos apresenta o mais completo, honesto e cativante retrato de Maria, dos quatro evangelhos.

T I A G O '

Os evangelhos trazem apenas algumas breves referências a Tiago, e, na verdade, ele não é citado nominalmente nem no evangelho de Lucas nem no de João. Vejamos, primeiramente, o material joanino. João 7.1-5 diz sem rodeios que os irmãos não acreditavam em Jesus durante seu ministério. Tiago, com certeza, não era um dos discípulos de Jesus. Nós o encontramos numa breve citação, em João 2.12, descendo para Cafarnaum com Maria, Jesus e seus discípulos. Observe nesse texto como os irmãos são mencionados separadamente dos discípulos. No evangelho de Lucas, ouvimos falar que os irmãos e irmãs de Jesus — sem menção de nomes — estavam

3 Ao contrário de Mateus e Marcos, Lucas náo diz o nome dos irmãos e irmãs de Jesus, e, é claro, Mateus e Marcos só dizem o nome dos irmãos e revelam que havia mais de uma irmã.

4 Para um estudo mais completo sobre Tiago, v., de H. Shankse B. Witherington, The Brother o f Jesus: The Dramatic Story and Meaning of the First Archaeological Link to Jesus and His Family (San

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