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BREVE HISTÓRIA SOCIAL DO CINEMA

2 Formação do subcampo do cinema

2.7 As mudanças no subcampo: tecnologia, produção e mercado

A década de 1950 preparou o cenário para as décadas posteriores, marcando o fim do modelo de supremacia absoluta dos grandes estúdios cinematográficos – Metro Goldwyn Mayer, Warner Brother, Paramount, Fox, Universal etc. -, fragmentando a indústria em pequenos estúdios e fazendo crescer a chamada produção independente. Os pequenos produtores, cujo prestígio é crescente, a partir dos anos 1960, passaram a co-existir com os grandes, que perderam a força com os novos ares da década.

Entre a década de 1960 e 1970 um novo subcampo cinematográfico se desenhava nos EUA, com a emergência de uma produção com linguagem e temática mais ousadas, embora permanecendo narrativos no sentido clássico, que ajudou a encerrar a tradição dos filmes de gênero como os musicais e os dramas românticos adocicados.

O cinema narrativo começava a estabelecer uma nova relação com os espectadores. A partir dos anos 1960, o mundo ocidental passa por uma revolução nos costumes e o cinema tenta acompanhar essas mudanças, tentando atualizar-se o quanto possível. O cinema narrativo hollywoodiano passa a conviver com uma série de cinemas ditos alternativos e alinhados a uma nova modernidade que se configurou nessa década e nas décadas posteriores.

Uma grande mudança aconteceu com a estréia de Tubarão (Steven Spielberg, 1974) filme que alavancou e maximizou a indústria de cinema de Hollywood e é utilizado como paradigma para a grande mudança em termos de distribuição e promoção de filmes em larga escala, sendo o primeiro a ser distribuído com mil cópias e maciço apoio da mídia. Ao invés de distribuir poucas cópias em uma cidade, aumentando o número gradualmente, o filme foi promovido em rede de televisão, gerando o interesse por parte do público, o que afinal possibilitou ser lançado simultaneamente nos quatro cantos dos EUA.

Guerra nas estrelas (George Lucas, 1977) incorporou novo elemento nas estratégias de lançamento do filme e marketing de promoção, com o lançamento simultâneo de brinquedos, bonecos e outros artigos com a temática e personagens do filme. Então, os produtores hollywoodianos perceberam o potencial mercado que se abria para o crescimento da indústria cinematográfica e lançaram a moda de continuações e seqüências de filmes como Tubarão, Guerra nas estrelas, Rocky, um lutador (John G. Avildsen, 1976) e até de filmes de baixo orçamento de produção, mas que repercutiram positivamente nos números da bilheteria, como o terror/suspense O massacre da serra elétrica (Tobe Hooper, 1974).

A partir dos anos 1980, inicia-se novo tempo de mudanças com o avanço do processo tecnológico de desenvolvimento de suportes para a exibição de filmes fora das tradicionais salas de cinemas com o surgimento do VHS e, posteriormente, do DVD e das redes de videolocadoras. Assim, os filmes poderiam ser vistos em casa, provocando uma pequena revolução em um negócio cujos números só faziam crescer.

Depois do videocassete surgiu a TV a cabo. Os filmes, cuja fonte de renda anterior se limitava à exibição em salas de cinema e, mais tarde, na TV aberta, ganharam novos mercados, sendo revendidos mais de uma vez, cumprindo etapas de uma trajetória de exibição em mídias e suportes diferentes: primeiramente, o cinema; depois, o videocassete; em seguida, a TV paga, para finalmente chegar à TV aberta. Isto sem falar na exportação para outros países. Atualmente, os filmes produzidos para o cinema são possíveis de serem vistos pela internet, com a opção de serem gravados em DVD, alterando-se consideravelmente a relação dos espectadores com os filmes.

Conforme pede ser percebido, cada década torna evidente alguma transformação no subcampo do cinema, seja técnica ou tecnológica, mercadológica ou nas formas de produção e distribuição dos filmes. São mudanças internas que acomodam as relações de poder e força entre os agentes e os grupos de agentes pertencentes ao subcampo e que, por extensão, reconfiguram-no nas relações desse com o exterior. As lógicas de valor, capital simbólico e do que é legítimo no subcampo são acomodadas no decorrer da transformação. No entanto, o habitus narrativo, como orientação geral do pólo da produção, permanece inalterado, assim como o habitus perceptivo, situado no pólo da recepção, que nada mais é do que uma conseqüência direta das disposições gerais do habitus narrativo. Habitus narrativo como disposição geral do subcampo do cinema é abordado, mais detalhadamente, na segunda parte deste capítulo.

Durante as décadas de 1940 e 1950, o senso comum supunha que a Televisão, uma invenção da década de 1930, seria capaz de tomar o lugar do cinema na preferência dos espectadores e até mesmo extingui-lo. De fato, a partir da década de 1950, a audiência da televisão progressivamente reduziu o público freqüentador do cinema, mas não o extinguiu,

como bem se sabe. Pelo contrário, o cinema hollywoodiano enfrentou a concorrência da TV inventando formatos e novas tecnologias de filmagem e projeção dos filmes, com a utilização de cores, tecnicolor, cinerama, etc.

Mas, já nos anos 1950 iniciou-se, nos EUA, uma parceria do cinema com a TV, fazendo com que filmes fossem produzidos especialmente para a exibição na tela pequena. Diferentemente do Brasil, cuja parceria entre cinema e TV é ainda recente e embrionária, limitando-se basicamente aos canais pagos. Há algumas explicações para esse distanciamento, a exemplo de questões ideológicas, políticas e mercadológicas.

Nos EUA existe legislação que, de alguma maneira, protege o cinema norte-americano. As TVs abertas, de rede nacional, somente podem exibir 40% de produção própria. Os outros 60% de conteúdo audiovisual são adquiridos no mercado, através da produção independente. O objetivo é manter o mercado audiovisual ativo, diversificado e democratizado, não apenas na produção, mas também no consumo. O desenvolvimento da parceria com o cinema fez com a TV norte-americana, pelo menos no que concerne aos conteúdos dramatúrgicos (filmes, minisséries, séries dramáticas e cômicas), tenha, neste início de século, aderido quase por completo ao material audiovisual produzido em película (35 milímetros). O que estabelece uma nova distinção entre a realidade da TV no Brasil, ainda majoritariamente produzida em vídeo.

3 Formação do habitus narrativo