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CAPÍTULO 5. OS BOLIVIANOS EM BUENOS AIRES

5.2. A Presença Boliviana no Espaço Público da Cidade de Buenos Aires: Espaços de

5.2.5 Bolivianos no Cinturão Verde de Buenos Aires

Desde meados de 1970 imigrantes bolivianos começaram a chegar ao cinturão verde da área metropolitana de Buenos Aires e, então, principiaram a participar do trabalho na horticultura, assumindo a posição de peones ou medieros. Com o passar do tempo, alguns

se tornaram produtores, tanto na qualidade de arrendatários quanto na de proprietários (BENENCIA; QUARANTA, 2006). Dessa maneira, constituiu-se em torno da atividade da horticultura localizada nessa região um mercado laboral com grande participação da imigração boliviana.

De acordo com Benencia e Quaranta (2006), no início da década de 2000, o Censo Nacional Agropecuário indicou existirem em torno de 1.200 estabelecimentos vendedores de produtos oriundos do cinturão da cidade de Buenos Aires, ocupando cerca de 13.000 hectares. A maioria desses estabelecimentos, assim como dessa superfície concentra-se na zona sul da cidade e soma praticamente dois terços do total da área do cinturão.

Na relação de mediería, os medieros recebem remuneração variável, com base em porcentagem do resultado econômico obtido na produção. Trata-se de uma espécie de sociedade desigual de capital e trabalho, que permite organizar e remunerar o trabalho de maneira flexível, favorecendo o produtor principal e ampliando o envolvimento dos trabalhadores no processo produtivo. O acordo estabelecido com o produtor principal define os aportes que o mediero realizará na relação, principalmente no que concerne ao seu trabalho, ao de seus familiares e até dos trabalhadores contratados pelo próprio mediero.

A mediería como relação de trabalho é muito comum entre imigrantes bolivianos, na posição de medieros e na de produtores. No ano de 2001, em Buenos Aires, quase quatro de cada dez estabelecimentos possuíam produtores bolivianos, dos quais 60% eram produtores familiares (BENENCIA; GUARANTA, 2006). Majoritariamente os bolivianos produtores arrendam as terras e quando contratam outros trabalhadores adotam o regime de remuneração fixa.88

A presença dos imigrantes bolivianos no cinturão verde de Buenos Aires é tão significativa que, de acordo com os Censos Hortícolas de la Provincia de Buenos Aires de 1998 e 2001, supera a metade do total de pessoas alocadas na horticultura do cinturão. Benencia e Guaranta (2006) expõem que os imigrantes bolivianos presentes no cinturão vêm majoritariamente dos vales andinos de Tarija, Cochabamba e Oruro; regiões onde se

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Benencia e Guaranta (2006, p. 428) destacam que "la propiedad de la tierra es una opción, pero creemos que en este momento no es la preferida por la mayoría de los horticultores bolivianos, al menos en el área hortícola bonaerense. Si bien los datos del Censo Hortícola de la Provincia de Buenos Aires 2001 registraron una importante cantidad de productores de origen boliviano: 39 por ciento en la zona Sur (La Plata), donde hay un 25 por ciento con categoría de propietarios a las 5 hectáreas".

pratica agricultura de características campesinas, cujos principais produtos são a batata, o milho e o feijão.

Muchos de ellos han entrado por primeira vez en la Argentina como peones del tabaco, la caña de azúcar o el tomate, en Jujuy y Salta (provincias lindantes con Bolivia), a la edad de 8 a 11 años (con sus padres), o a los 16-17 (solos); después recorrieron otros cultivos, llegando en sus desplazamientos hasta la región cuyana, donde participaron de la cosecha de uva y de ajo. Comentan que al finalizar cada cosecha, siempre regresaban al lugar de origen. En estos viajes, muchas veces, las familias tenían hijos de nacionalidad argentina que posteriormente podían incorporarse a los mercados de trabajo con menos dificultades […] estas familias guardan estrechos contactos con sus comunidades de origen, a las que algún miembro del hogar regresa con periodicidad, al menos anual, donde suelen invertir en el mejoramiento de sus viviendas e, inclusive, en sus pequeñas explotaciones, que a menudo están a cargo de un pariente que permaneció en el lugar de origen. En algunos casos, cuando los trabajadores se retiran de estos mercados de trabajo hortícola, suelen retornar a sus comunidades, donde invirieron sus excedentes durante los años de actividad. En otros casos, se establecen definitivamente en la Argentina transformándose muchas veces en productores y alcanzando, en algunas ocasiones, a acceder a la propiedad de la tierra. (BENENCIA; GUARANTA, 2006, p. 420-421).

A significativa presença dos bolivianos no cinturão verde de Buenos Aires fomenta a negociação e o intercâmbio entre os imigrantes e os produtores argentinos, principalmente aqueles que empregam bolivianos na relação de mediería. A identidade boliviana diante da sociedade receptora também é negociada nesse espaço, sendo criados determinados estereótipos: "prefiero los medieros bolivianos porque trabajan los domingos, riegan de noche, cosechan con lluvia, son responsables, porque les interesa la ganancia" (BENECIA; GUARANTA, 2006, p. 421). Os argentinos enxergam os imigrantes bolivianos como uma boa opção de mão de obra barata, como trabalhadores disponíveis e predispostos a trabalharem em condições que não seriam aceitáveis para os argentinos. Além disso, os bolivianos são considerados trabalhadores obedientes e competentes, porém também sujeitos a certa carga de exploração:

"En general no hace falta una supervisión muy especial. Los bolivianos no tiene mayor problema en hacer las cosas como se les dice y muestran buena voluntad para aprender; generalmente, los bolivianos traen menos problemas para el patrón” o, según otro produtor, “el bolivianos jamás da

problemas; a los bolivianos uno les habla y ponen atención, el otro es como si no le importara” [...] “hay buenos y malos trabajadores, y éstos pueden ser bolivianos o criollos, pero el boliviano es preferido porque es mucho más dócil que el criollo para trabajar” […] “el boliviano no protesta, lo querés hacer trabajar un domingo y trabaja; lo sacas a las tres de la mañana para cargar un camión y se levanta." (BENENCIA; GUARANTA, 2006, p. 422).

Os medieros bolivianos são contratados por meio das redes de trabalhadores que se formam, nas quais um indica o outro ao produtor, na maioria dos casos, indicações feitas por parentes e amigos. Há, portanto, uma organização de fato entre os imigrantes bolivianos do cinturão de Buenos Aires, apontando para uma atuação ativa nesse espaço público.

A relação entre os trabalhadores bolivianos e os argentinos, contudo, não é desprovida de qualquer conflito. Muitos trabalhadores argentinos reclamam que perdem postos de trabalho para os bolivianos, pois estes aceitam trabalhar sob condições precárias com as quais aqueles jamais concordariam. Ademais, manifestam que são politicamente mais organizados do que os bolivianos, porque reivindicam seus direitos com maior ênfase e clareza, o que os prejudica na hora de serem contratados, uma vez que os produtores preferem a flexibilidade dos bolivianos. Esses conflitos geram atos discriminatórios contra os imigrantes bolivianos por parte dos argentinos.

Entretanto, mesmo havendo conflito com a sociedade receptora, há uma significativa organização da coletividade boliviana nesse nicho econômico do cinturão verde de Buenos Aires, atuando de maneira solidária e criando oportunidades para os trabalhadores imigrantes. Segundo Benencia e Guaranta (2006), essa presença organizada socialmente e envolvida em um nicho específico de produção de maneira complexa permite afirmar que "los bolivianos en la horticultura asumen una identidad étnica (atribuida y autorreferenciada) como horticultores (trabajadores y productores) y comercializadores de hortalizas."