Com base nos estudos realizados, pode-se indicar, por um lado, que o não, sem abandonar a sua função de advérbio, está se recategorizando como prefixo, o que está em conformidade com os princípios da estratificação e da divergência, previstos na trajetória de um item lexical em processo de gramaticalização.
No campo semântico evidencia-se a generalização do sentido do não, (antes associado apenas aos verbos); essa generalização avança em direção aos adjetivos e substantivos, com o valor de privação, falta de.
Atentando-se, portanto, para a observação de Bybee e Paliuca (1985:72) de que um item lexical em processo de gramaticalização é caracterizado pela freqüência e generalização do seu uso, pode-se defender que a gramaticalização do não é um fato evidente.
1 O código que aparece ao lado de cada exemplo retirado do corpus refere-se ao período e à folha do
jornal do qual o mesmo foi destacado.
2 O estudo das formas gramaticais como elementos em processo, não como objetos estáticos. 3 Além dos dois processos acima citados, Câmara Jr. (1992:53) considera também o processo em que
palavras com a mesma raiz opõem-se por prefixos de significação contrária; ex.: excluir x incluir, progredir x regredir. Foram incluídos, contudo, esses casos, na antonímia lexical, pois não se pode depreender nesses vocábulos uma forma base que possa funcionar, na língua, de maneira autônoma, sem o prefixo. Assim, por exemplo, não existe uma forma cluir, que funcione sem os prefixos ex- ou in-.
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