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Várias imagens que ilustram este texto foram retiradas das páginas analisadas e demonstram um pouco a orientação de cada um dos espaços. Como é possível ver no quadro, as páginas são bastante distintas e refletem a pluralidade tanto do discur- so feminino dentro delas quanto no próprio entendimento de gênero apresentado aqui. A existência destas páginas, seus con- teúdos e debates dentro das postagens evidenciam peculiarida- des nas relações entre mulheres e o mundo dos videogames, de modo que se fizeram necessárias mais observações e métodos variados para se pesquisar estes objetos. As páginas analisadas inicialmente são bastante distintas entre si e possuem um es- pectro observável amplo, oportunizando a realização de vários tipos de pesquisa com abordagens e perspectivas distintas.

Por um lado, há o evento de construções de identida- de por meio de apreciação e disseminação de mensagens que

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tratam a cultura gamer como agregadora de valores, como es- truturas de relacionamentos, por exemplo, enquanto, por outro, temos a disseminação de representações da imagem feminina nem sempre bem aceitas pelas mulheres, mas também trata- das com naturalidade e valorizadas por tantos outros sujeitos. Afinal, por que seria tão importante para algumas mulheres se agruparem para mostrar aos outros que são gamers? Os discur- sos são muitos, as mensagens e interações variadas, mas o que se percebe em alguns discursos de mulheres em relação às suas afirmações dentro da cultura gamer é uma tentativa de inclusão, de afirmação. Fazer parte de comunidades virtuais que dizem respeito à cultura gamer e identificar-se enquanto sujeito que tem os jogos em seu cotidiano não deixaria de ser uma espécie de ação para o empoderamento feminino dentro de um ambien- te tradicionalmente “dos homens”.

Percebem-se vários indícios de ideias conservadoras, que, por exemplo, valorizam o casal heterossexual e evidenciam a busca por pares românticos idealizados. Também aparecem mensagens que contribuem para reforçar estereótipos e defini- ções duras de papéis sociais. No entanto, a própria existência das páginas, conteúdos e postagens que fomentam discussões nas quais não há relação com questões de gênero e até mesmo a diminuição da necessidade de comportamento ativista per- mitem a percepção de que estão ocorrendo mudanças graduais no senso comum acerca da relação das mulheres com os games, mas ainda haveria um longo caminho a ser percorrido até que a cultura gamer seja um espaço seguro para todos no que diz respeito às diferenças de gênero.

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Práticas re-criativas: um estudo sobre

fãs de Harry Potter e as TICs

Re-creative practices: A study about

Harry Potter fans and ICTs

Edu Jacques1

Resumo: O início das práticas conduzidas por fãs no seu mar-

co atual pode ser atribuído à década de 1960, mas em 50 anos os meios de comunicação atingiram graus de complexidade que alavancaram os indivíduos da condição de resistência para cocriadores na cultura. Harry Potter é um exemplo recente de práticas criativas que tomam fôlego com as novas Técnicas de Informação e Comunicação. Suas construções podem ajudar a compreender o papel do consumidor na atualidade, sobretudo esse que se encaixa na alcunha de fã, ao ajudar a disseminar sen- tidos derivados da obra original e se especializar a ponto de ser absorvido pela indústria da cultura.

Palavras-chave: Cultura do amador. Midiatização. Circulação.

Harry Potter.

1 Doutorando no Programa de Pós Graduação em Ciências da Comunicação - Uni- sinos, com auxílio de bolsa Prosup/Capes. Possui graduação em Comunicação Social - Hab. Jornalismo pela Universidade Católica de Pelotas (Ucpel) (2010) e Mestrado em Ciências da Comunicação pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos) (2014), e cursa graduação em História da Arte na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Tem experiência na área de Comunicação, com ênfase em estudos sobre indústria do entretenimento e narrativas. Contato: edu.jacques@gmail.com. CV Lattes: http://lattes.cnpq.br/0884068389959665.

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Abstract: The beginning of fan-driven practices within their

current paradigm can be attributed to the 1960s, but in 50 years the media have reached degrees of complexity that have trans- formed individuals from the condition of reactive receptors to co- creators in culture. Harry Potter is a recent example of creative practices that developed on the basis of the new Information and Communication Technologies. These productions can help to understand the role of consumers today, especially those who fit into the fan category, who help to disseminate derived mean- ings from the original work and specialize to the point of being absorbed by the culture industry.

Keywords: Amateur culture. Mediatization. Circulation. Harry

Potter.

1 Introdução

A série de livros Harry Potter se popularizou no Ocidente como narrativa mágica voltada a um público infanto- -juvenil. O primeiro volume escrito por Joanne Rowling (assina J. K. Rowling) data de 1997, em língua inglesa. Logo no início, o êxito da história no mercado enfraqueceu o senso de que os jovens se desinteressavam pela leitura em meio às ofertas de entretenimento digital na virada do milênio, navegando na in- ternet ou através de jogos digitais. A obra não apenas foi bem aceita na sucessão dos sete títulos, traduzidos em dezenas de idiomas, como Rowling conseguiu emplacar um dos maiores su- cessos literários dessa geração, culminando com a pottermania que se fortaleceu junto com a adaptação cinematográfica. O que ocorreu foi uma busca que saturou os mercados nos períodos de lançamento dos livros e dos filmes, que se intercalavam no início da década de 2000 e retornaram na metade da década seguinte.

Desde pelo menos aquele momento de consolidação da internet comercial começa-se a discutir a mudança de um para- digma comunicacional em que os meios de comunicação atua- riam como campo de debate sobre a esfera pública para nos pre- cipitarmos numa cultura midiática que racionaliza segundo seus parâmetros a quase totalidade das instâncias da vida cotidiana. Essa emergência demarca um rompimento da mesma ordem da-

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quele possibilitado pelo desenvolvimento da escrita com relação à referência oral que a antecedeu (GOMES, 2008).

Na experiência cultural a mudança não é menos visí- vel. A esfera de consumo alimentada por Harry Potter pode ser caracterizada como um desses fenômenos característicos da modernidade sociotécnica. Enquanto amplamente divulgada e interpretada, uma parte dos espectadores e leitores contribuirá para estender o raio de influência da narrativa. Cabe a este estu- do analisar as relações que estas práticas mantêm na web que se diferenciam dos registros anteriores, interpretados por Henry Jenkins (1992), e como se configuram. Não menos importante é a alteração no papel das “indústrias de conteúdo” que veem a centralidade de que gozavam numa sociedade orientada por meios de comunicação de massa ser tensionada pelas demandas dos consumidores que se familiarizaram com as mídias digitais, mais horizontais. Isto é, os modelos produtivos passam a convi- ver com gramáticas provenientes da maior projeção dos recep- tores na cadeia enunciativa.

Ainda hoje podemos observar a influência de Harry Potter nos discursos proferidos em ambientes de convivência coletiva. A narrativa original concluiu seu arco no cinema em 2011, mas os admiradores driblam essa orfandade de sentidos com emissões oriundas dos grupos de aficionados, dos fãs, for- temente articulados por dispositivos comunicacionais. O esforço de nossa tarefa se vincula ao conceito de midiatização, que pre- tende dar conta dos novos processos sociais que se tornam refe- rência com a evolução tecnológica e sua contrapartida social. A perspectiva fortalecida nesse posicionamento é de análises so- bre a circulação das narrativas nas redes de comunicação, nes- te caso online. Aqui, destarte, associamos a visada a referências históricas e técnicas.