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Conteúdos do material impresso: “Revolução tecnológica e currículo”

Capítulo III. O PEC Formação Universitária Municípios

3.4. As novas tecnologias no currículo do PEC Municípios

3.4.1. Conteúdos do material impresso: “Revolução tecnológica e currículo”

O material impresso do PEC, embora não estivesse dentre as mídias interativas que foram tão exaltadas como diferencial positivo do Programa, exerceu um papel importante em sua realização. As apostilas eram igualmente fornecidas a todos os alunos-professores como parte do MA aos seus estudos e concentravam, por meio do registro escrito, todos os temas tratados durante o curso: introduzindo-os ou os desenvolvendo. O trabalho com esse material acontecia, principalmente, durante as sessões de TM Off-line, com a mediação do PT, e, quando possível, deveria ser referenciado nas videoconferências. Para a sua produção, designava-se uma equipe de especialistas de acordo com o tema a ser abordado e, sob a supervisão do Comitê Gestor (a quem cabia também a palavra final), definiam-se seus conteúdos. O processo não era isento de polêmicas (segundo depoimentos de professores que dele participaram) e não é possível afirmar porque e como uns e outros conteúdos eram incluídos ou recusados e nem cabe, aqui, aprofundar essa questão. Mas, o fato é que, ao final, predomina uma linha de entendimento que, no caso específico deste trabalho diz respeito à relação entre as novas tecnologias e a educação, e que pôde ser identificada.

33 LearningSpace foi a plataforma utilizada para o TM On-line, no PEC. No Capítulo VI serão dados mais

Por princípio, todo conteúdo educativo é apenas um recorte dentre os possíveis e envolve uma forma específica de entendimento da realidade, no entanto, a formação exige também a possibilidade de questionamento, ou não seria possível a transformação. Pois, essa forma de produção das apostilas do PEC e juntamente à organização do trabalho que com elas se propunha, tendia a inviabilizar a reflexão: quando chegavam aos alunos-professores, os textos e atividades que traziam eram trabalhados de forma desconexa ou superficial, quando não acabavam reduzidos a conteúdos auto-instrucionais. Isso porque, de um lado, os PVC que, não raro não haviam participado de sua elaboração, nem sempre estavam de acordo com a forma de tratamento de determinado assunto e nem sempre se dispunham a dialogar com esses conteúdos. De outro lado, as discussões desenvolvidas em sala de aula com o tutor, no TM Off-line, estavam limitadas. Do PT não eram exigidos conhecimentos específicos – haja vista o fato de que o pré-requisito para a sua contratação era a formação em nível superior em qualquer área – e, sendo assim, nem sempre havia interlocutor possível. No limite, o material podia ser simplesmente desconsiderado.

A discussão dos conteúdos do material impresso, portanto, nem sempre acontecia. Sem a mediação de uma figura docente a padronização tendia a ser mais marcante e, nesse sentido, enquanto meio de formação, ao material impresso resta, de fato, um papel de menor importância. Resultado coerente com a valorização pelo Programa, em contrapartida, das mídias interativas. A convicção de que a didática apoiada nas novas tecnologias é um ideal a ser alcançado chega a direcionar todo o projeto editorial do Programa para a utilização de “recursos que se aproximam daqueles disponibilizados pelas mídias interativas” (Orientações

técnicas para elaboração do material de apoio, p. 4). No documento elaborado pelo Programa especialmente dedicado a orientar a produção do MA explicita-se, assim, a intenção de atribuir à mídia impressa uma identidade profundamente marcada pelo paradigma tecnológico (ou ao menos pelas características a ele atribuídas).

A criação das Orientações técnicas para elaboração do material de apoio visava a orientação aos docentes responsáveis pela elaboração do MA, a fim de que dessem corpo aos conteúdos de maneira mais ou menos coerente, mantendo uma certa unidade. Um diálogo deveria se estabelecer, desta forma, entre conteúdos das apostilas e os conteúdos do LS, que serão analisados mais adiante. E, de fato, o diálogo acontecia. Mas a pretensão de manter a especificidade de cada suporte e de adaptar os textos elaborados aos mesmos (Orientações

eletrônico34 quanto em relação ao suporte impresso. A tentativa de manter a especificidade do impresso parecia ser traída na própria tentativa de fazê-lo próximo às mídias interativas. Segundo o que consta nas Orientações, essa aproximação tornaria “a apresentação do material impresso dinâmica e mais atraente, sem descaracterizá-lo” (Orientações técnicas para

elaboração do material de apoio, p.4, grifo nosso). Atribui-se, assim, características positivas às novas tecnologias e retiram-se-lhes das “velhas”.

Quando se tornam os próprios conteúdos do curso, enfim, as NTIC ganham destaque na “Unidade 1.1. Revolução tecnológica e currículo” (Tema 1 do Módulo 2), onde ainda se encontram super-valorizadas: a linha entusiasta, crente nas virtudes da “Sociedade da informação” e na emergência do “aprender a aprender” predomina nas discussões propostas em torno do tema. Sendo assim, os conteúdos afinam-se aos discursos de organismos internacionais tais como a UNESCO, instituição a qual se ligam alguns dos autores cujos textos estão reproduzidos nesta Unidade. Supervalorizada por um lado, a disseminação das NTIC é subexplorada como discussão relevante por outro. Não se propõe o aprofundamento de conceitos e o questionamento da nova realidade é feita de maneira extremamente aligeirada. Termos como “Sociedade educativa”, novas “competências” e “habilidades” aparecem nos textos sem que sejam, antes, definidos ou problematizados. Por outro lado, reiteram a idéia de que à escola cabe o papel de aceitar os ditames da “Sociedade da informação” (ou “do conhecimento”, já que não se distinguem os termos), funcionando como uma empresa que atende a seus “clientes”, fornecendo-lhes o que precisam: tecnologias que educam para o trabalho, para os futuros “trabalhadores do conhecimento”35.

Nem conceitos, nem contexto, nem a didática são postos à prova: não se encontra no material impresso, também, a discussão do próprio valor pedagógico das novas tecnologias. Num curso fortemente apoiado nas mídias interativas esse parece ser o único aspecto que dispensou, de fato, a problematização: o(s) próprios uso(s) deram conta de possibilidades e limites reais (conforme será discutido no capítulo VI).

34 Essa “tentativa frustrada” ficará mais clara na análise seguinte, dos conteúdos do LearningSpace, e nas

análises dos usos das mídias interativas, no Capítulo VI deste trabalho.

35 Um discurso pouco consistente que, não por coincidência encontra-se muito presente na produção escrita dos

alunos-professores. O trecho do TCC, a seguir, é representativo disso: “A escolha do tema de pesquisa ocorreu em função de que vivemos numa sociedade de informação e conhecimento, onde os jovens recebem informação de todos os lados, não só da escola. Jovens que já estão de ‘saco cheio’ de aulas desinteressantes, apostilas mofadas e repetitivas lições de escolas, que acaba gerando desinteresse, indisciplina, etc. (...) Não existe receitas prontas, nem metodologia para se trabalhar a informática como recurso pedagógico, sendo necessária uma mudança de postura dos envolvidos no processo tecnológico da escola, onde o professor tem que rever suas práticas, perder o medo, tomar uma atitude perante o novo, enfrentando os desafios, investindo em sua formação, em conhecimentos, aprendendo a aprender, nem que seja com o próprio aluno, para que ele possa alcançar novas possibilidades, fazer a leitura do mundo (...).” (Trecho de TCC, grifos meus)

Por outro lado, como se viesse relativizar o discurso entusiasta, outros conteúdos trazem a preocupação com a centralização do controle da mídia por poucos e propõem o questionamento da “fidedignidade e neutralidade” das informações divulgadas. Dada a inevitabilidade da adaptação da escola à nova realidade, faz-se uma advertência para os professores: é preciso orientar seus alunos para selecionar qualidade, em detrimento da quantidade de informação disponível pelos novos meios. Curiosa proposta que se mostra útil na própria operacionalização do PEC, uma vez que a quantidade excessiva de informação a ser consumida em curto espaço de tempo foi uma de suas características marcantes. E, sendo assim, o material impresso ganha importância, em verdade, como um meio informativo no PEC Municípios. A informação que, por ser tanta e tão fugaz, desinforma, foi uma queixas freqüentes nos depoimentos de alunos-professores, tanto com relação ao material impresso quanto às atividades on-line, no LS.