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PARTE I – ORGANIZAÇÃO, GÉNERO E LIDERANÇA

2. A E SCOLA ENQUANTO O RGANIZAÇÃO

2.2. E SPECIFICIDADE DA O RGANIZAÇÃO E SCOLA

Envolta em celeuma, a análise da escola como organização é “olhada com grandes desconfianças e suspeições no terreno educativo. Os professores e os cientistas da educação não gostam que o seu trabalho seja pensado a partir de categorias de análises construídas, frequentemente, com base numa reflexão centrada no mundo económico e empresarial” (Nóvoa, 1992: 9).

Contudo, a análise da escola enquanto organização torna-se inevitável, no sentido em que, o sucesso da escola passa pelo “desenvolvimento integrado da escola como organização” (Bolívar, 1999: 157).

Apesar da polissémica questão, “será difícil encontrar uma definição de organização que não seja aplicável à escola” (Lima, 1992: 42), sobretudo quando se atenta nalgumas características próprias da escola, facilmente identificáveis como elementos característicos de uma organização, e que passamos a referir:

i) A escola tem uma composição: alunos, professores, funcionários e até pais e

autarquia, quando se trata de uma escola aberta à comunidade;

ii) As funções de cada um encontram-se diferenciadas consoante o lugar que ocupam

na organização, existindo mesmo um líder;

iii) Existe uma coordenação racional intencional que se revela nas diferentes estruturas

da organização: Departamentos Curriculares, Coordenadores de Departamentos e Directores de Turma são disso exemplo.

iv) Cada escola tem uma história subjacente, uma duração que se reflecte na

continuidade através do tempo.

v) Cada escola tem um espaço de actuação, as suas fronteiras: os alunos que

frequentam uma determinada escola ou residem numa determinada área ou os seus pais aí trabalham.

Convém no entanto, salvaguardar o facto da escola ser uma organização específica (Nóvoa, 1992; Lima, 1992; Alves, 1999), diferente das restantes organizações. Segundo Alves (1999), esta especificidade assenta nalguns pilares característicos desta organização, que convém referir (Alves, 1999: 11):

i) Socialmente construída por uma multiplicidade de actores com formação, percursos

e perspectivas educativas diferentes;

ii) O trabalho da organização, ao visar a educação de adolescentes e jovens, torna

singular os processos e os produtos;

iii) Os dirigentes e os professores têm o mesmo tipo de formação profissional e o

iv) Conforme refere Bush (1986), “os objectivos da organização são percebidos,

valorizados e avaliados diferentemente pelos actores que interagem no espaço escolar”;

v) A estrutura interna aparece debilmente articulada, o que dificulta o exercício

hierárquico de autoridade e torna ineficazes os mecanismos formais de coordenação entre os seus membros e níveis;

vi) Segundo Escudero Muñoz (1988), “a cultura escolar privilegia e protege a autonomia

individual dos professores, cultiva o sentimento de privacidade e responsabilidade individual no exercício das funções docentes”.

Para Santos Guerra (2002), o facto de muitos estudos procedentes do mundo industrial serem aplicados à escola constitui “um duplo perigo” (Santos Guerra, 2002: 186). Por um lado o de não permitirem a explicação da dinâmica interna da instituição e por outro lado, o “reducionismo institucional que converte todas as organizações num mesmo tipo de empresas” (idem). Neste sentido o autor corrobora a ideia de que a “a escola é uma instituição peculiar” (Santos Guerra, 2000: 27) que se diferencia das organizações industriais, na medida em que é de recrutamento obrigatório, tanto no aspecto legal, como no psicológico e social. Além disso é uma organização heterónima, na medida em que possui diferenças no aspecto hierárquico, teleológico, organizativo e metodológico.

A análise da escola enquanto organização e a salvaguarda da sua especificidade implicam um certo equilíbrio. Com efeito, embora seja necessário alertar para a especificidade da escola enquanto organização, essa especificidade não pode interferir negativamente na análise da escola. De facto, “as escolas são instituições de um tipo muito particular, que não podem ser pensadas como qualquer fábrica ou oficina: a educação não tolera a simplificação do humano (das suas experiências, relações e valores), que a cultura da racionalidade empresarial sempre transporta. E, no entanto, a afirmação da especificidade radical da acção educativa não pode justificar um alheamento face a novos campos de saber e de intervenção. Mais do que nunca, os processos de mudança e de inovação educacional passam pela compreensão das instituições escolares em toda a sua complexidade técnica, científica e humana” (Nóvoa, 1992: 16).

A peculiaridade da escola defendida por Santos Guerra (2000) leva-o a opinar que a identidade organizacional da escola se situa no dédalo entre três dimensões complementares. A primeira dimensão é composta pelas características comuns a todas as organizações; a segunda dimensão refere-se às especificidades que a escola tem enquanto instituição e que a transformam numa organização distinta das outras; a terceira dimensão refere-se ao contexto organizacional e à sua forma irrepetível de incorporar todas as características inerentes a qualquer escola. Em última análise, o autor sustenta que todas as escolas são semelhantes e, simultaneamente, distintas.

Assim, Santos Guerra (2002) considera que a organização educativa possui duas realidades: a realidade formalmente conhecida, visível, regulamentada e assumida, invariavelmente, por todas as escolas, e a realidade invisível (oculta), que diz respeito a cada escola em particular e que só é possível identificar segundo uma reflexão prática, qualitativa (estudo de casos), em cada escola. Esta perspectiva macro e micro política da organização escolar conduz o autor à utilização da metáfora de palco e bastidores para se referir às duas realidades escolares. Considerando que a grande maioria dos estudos sobre a organização educativa centram a sua análise no campo teórico, parte visível da organização, o autor defende a necessidade de investigar o invisível, o informal e a sua simbiose com o formalmente estabelecido. Na sua opinião, é dessa simbiose entre as duas realidades que resulta a realidade concreta e real de cada escola. Assim, o autor caracteriza a escola recorrendo à metáfora teatral, onde surgem as gambiarras que iluminam somente o palco e os actores, ficando no oculto, na penumbra, os bastidores. Como tal, é importante descortinar o que se encontra nos bastidores das organizações escolares e compreender as zonas pouco iluminadas, obscuras, da organização escolar.