• Nenhum resultado encontrado

PARTE I – ORGANIZAÇÃO, GÉNERO E LIDERANÇA

2. O P APEL DA M ULHER NO S EIO F AMILIAR

2.1. A E MANCIPAÇÃO DAS M ULHERES

O papel da mulher na família, na sociedade e na escola sofreu modificações ao longo da história. Se antes a mulher não trabalhava fora de casa, cabendo-lhe tratar do lar, do marido e dos filhos, hoje a situação é diferente, pelo que se torna necessário analisar a evolução social da família.

Com a Industrialização, as famílias rurais alargadas transformaram-se em famílias nucleares e citadinas e o lar deixou de coincidir com o local de trabalho. As famílias passaram de unidades de consumo e produção para unidades de afecto. O movimento da

Descoberta da Criança, em curso desde o século XVII, conjugado com nova esta situação

familiar, traduziu-se na preocupação com a educação e a promoção da criança no seio familiar. Dentro da família o acompanhamento das crianças cabia à mulher. Com efeito, as tarefas destinadas aos homens diferiam das destinadas às mulheres, assistindo-se a uma “divisão sexual do trabalho na «esfera doméstica» onde as mulheres estavam encarregadas da educação das crianças” (Araújo, 2000: 113). Por esse facto, em 1939 o número de mulheres que trabalhava fora de casa era muito reduzido, para além de desempenharem um número restrito de profissões: professoras, enfermeiras e empregadas de serviços. Esta situação veio a inverter-se quando deflagrou a Segunda Grande Guerra. Conforme referem Vieira e Relvas (2003: 58-59), com os homens fora de casa as mulheres tiveram de desempenhar outras profissões no mercado de trabalho para que a economia dos países envolvidos fosse assegurada. Assistiu-se assim à entrada das mulheres no mundo laboral. Os seus filhos eram deixados ao cuidado de creches. Finda a guerra, e apesar da prestação das mulheres, alguns governos, como o dos Estados Unidos da América, exerceram uma forte pressão social no sentido das mulheres regressarem a casa, relegando-as mais uma vez para segundo plano familiar. Esta situação culminou com o fecho de algumas creches como medida política de forçar o regresso das mulheres ao lar.

Apesar de muitas das mulheres terem, de facto, retomado unicamente as tarefas domésticas, algumas permaneceram a trabalhar, o que fez com que nos anos 50 surgisse mais uma profissão desempenhada por mulheres: as secretárias. Nos anos 60, começaram a ser aprovadas, em diferentes países, leis de divórcio que ganharam força com o

Movimento Hippie e o Movimento pelos Direitos Civis. Nos anos 70, com o surgimento do Movimento Feminista foi reafirmada a recusa em aceitar a opressão das mulheres dentro da

família.

Contrariamente ao que seria de esperar, nos anos 80 assistiu-se a um retrocesso no desenvolvimento social da família enquadrado pelo aparecimento de partidos nacionais socialistas e fundamentalistas. Segundo Vieira e Relvas (2003), “nesta psicologia “de massas” de “ser membro de”, o racismo mistura-se com o sexismo” (Viera e Relvas, 2003: 59).

As sociedades modernas dos anos 90 e 2000 reflectem a evolução histórica descrita. A família nuclear transforma-se constantemente, sobretudo devido ao papel que a mulher desempenha enquanto elemento da organização família. Estas transformações estão relacionadas com o contexto social, económico, político e cultural da cada país. No caso de Portugal, podemos dizer que a forma familiar mais adoptada continua a ser a tradicional, se bem que esta sofreu também uma evolução. A família tradicional de hoje é bem distinta daquela de alguns anos atrás. A hierarquia deu lugar à democracia, à igualdade de oportunidades, à autonomia e à liberdade pessoal. A mulher trabalha quase sempre fora de casa, o que lhe confere independência relativamente ao seu parceiro. O autoritarismo e a obediência foram substituídos por uma relação entre pais e filhos mais democrática e negociada, privilegiando-se a comunicação horizontal em detrimento da vertical. Apesar disso, continua a recair sobre a mulher a responsabilidade social do cuidado do lar e dos filhos. Desta forma, a mulher vê o seu desempenho profissional condicionado pelas tarefas familiares que parecem ser apenas da sua responsabilidade e que se caracterizam pela sua invisibilidade. Com efeito, “as tarefas realizadas pelos homens acabam por ter uma visibilidade completamente diferente das tarefas de cumprimento diário obrigatório que são da responsabilidade quase exclusiva das mulheres (cuidar das toalhas e das roupas de uso diário e planear os menus, para além do cozinhar, arrumar a banca da cozinha depois das refeições, etc.). “O trabalho de uma mulher nunca está feito” diz o ditado (apetece acrescentar “por um homem”), porque o ciclo das tarefas que o compõem é muito curto, obrigando por vezes à repetição das tarefas várias vezes ao longo do dia (cozinhar, pôr a mesa, limpar e arrumar a louça)” (Ferreira, 1999: 215). Por outro lado, o cuidado dos filhos assume um importante papel pois social e culturalmente espera-se que seja a mãe a cuidar dos filhos quando estão doentes. Existe assim a ideia profundamente enraizada de que “quem tem de prejudicar o trabalho, e prejudica o seu perfil como profissional, quando há uma tarefa urgente a cumprir, como, por exemplo, o acompanhamento de um filho doente, é a mulher” (Cavaco, 1993: 151). Neste sentido, a história continua a ser pautada pelo patriarcado perpetuando-se a imagem distorcida da mulher como alguém que coloca as tarefas domésticas à frente das profissionais (Díez et al, 2003: 1). A propósito dos papéis de género, a dedicação da mulher à família e o reconhecimento social que homens e mulheres têm por parte dos outros, Coleman (2005) escreve que: “Gendered roles mean that women are identified with home, and the care of small children, and men are identified with the home, and the care of small children, and men are identified with the wider working environment. The work and world of men hás generally been valued over that of women, so that work identified with women is then seen as inferior, and stereotypes about women tend to give them lesser status in the public world” (Coleman, 2005: 3).