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PARTE I – ORGANIZAÇÃO, GÉNERO E LIDERANÇA

3. C ULTURAS O RGANIZACIONAIS

3.1. C ULTURA O RGANIZACIONAL E T EIA O RGANIZACIONAL

Antes de tratarmos a evolução do conceito de cultura organizacional, importa salientar as diferenças entre os conceitos de clima e cultura organizacionais visto existir uma ideia de sobreposição entre ambos. Neves (2001) refere-se aos trabalhos levados a cabo pelos investigadores Reichers e Schneider (1990) que, através de um modelo do ciclo evolutivo, sistematizaram em três fases um vasto conjunto de literatura referente aos dois temas. Assim, os autores identificam a fase de introdução e elaboração, a fase de avaliação e

desenvolvimento e a fase de consolidação. Estas etapas têm diferentes características e

obedecem a uma ordem cronológica distinta dependendo do conceito abordado, conforme ilustra a Figura 4.

Podendo ser considerado como uma dimensão da cultura, o clima, por si só, não é suficiente para explicar o funcionamento das organizações, pese embora o facto de tradicionalmente ser mais estudado do que a cultura.

Baseando-se em Schneider (1975) e em Glick (1985), Neves (2001) menciona a natureza dos métodos de investigação como critério diferenciador entre ambos os conceitos. Assim, enquanto o clima se apoia em métodos quantitativos, a cultura baseia-se na metodologia qualitativa uma vez que tem maior afinidade com a vertente ideográfica da organização. O mesmo autor refere-se ainda a Rentsch (1990) e Hofstede et al. (1990) que consideram que a extensão da metodologia qualitativa ao estudo da cultura é a única forma de quantificá-la e, posteriormente, permitir uma comparação entre diferentes culturas existentes nas organizações. Apesar da matéria não reunir consenso, é de salientar a posição de Denison (1996) que, conforme refere Neves (2001), conclui que ambos os conceitos tratam o fenómeno comum que é o da criação e influência do contexto social no espaço organizacional.

Figura 4 – Fases da evolução dos conceitos de clima e cultura

(Neves, 2001: 446) Nesta linha de pensamento, a “cultura organizacional é um termo que assume diferentes significados para diferentes autores” (Neves, 2001: 446).

Possíveis definições seriam que “a cultura de uma organização é um conjunto de características que permite distingui-la de qualquer outra” (Teixeira, 1998: 173) ou que a cultura organizacional é “um conjunto de valores, crenças e hábitos partilhados pelos membros de uma organização que interagem com a sua estrutura formal produzindo normas de comportamento” (Mondy, 1991 cit. in Teixeira, 1998: 173). A permeabilidade das organizações a este conjunto de valores, normas e sentimentos, emergentes das diversas interacções entre os grupos, permite às organizações tornarem-se entidades distintas.

Na opinião de Neves (2001), os autores Trice e Beyer (1993), Shein (1985) e James et

al. (1990) são aqueles que se posicionam na mais consensual definição do conceito, “uma

estrutura composta por diferentes camadas de elementos (valores, normas pressupostos fundamentais, padrões de comportamento, artefactos, etc.), unidos por um núcleo comum que é o significado” (Neves, 2001: 446).

Apesar das distintas definições que possamos encontrar na literatura referente a este assunto, o conceito de cultura organizacional terá sempre implícitas as noções de “orientações partilhadas, unidade e identidade” (Sanches, 1992: 41).

Apoiando-se em Selznick (1953), Sanches (1992) sustenta que a unidade interna da organização provém do processo de socialização dos diferentes actores organizacionais e reflecte-se nos diversos aspectos da vida organizacional, nascendo desta forma a

CULTURA Ocorre quando um conceito é:  Inventado  Transferido  Descoberto CLIMA 1. Introdução  Decorre entre 1979 e 1985  Conceito transferido  Grande quantidade de literatura  Decorre entre 1939 e 1970  Pouca abundância de literatura  Estatuto indígena do conceito e visto na óptica da aplicabilidade 2. Desenvolvimento 3. Consolidação  Grande abundância de literatura

 Grande peso das questões metodológicas  Decorre entre 1970 e 1985  Reduzida quantidade de literatura  Decorre entre 1985 e 1990  Revisão crítica da literatura  Aperfeiçoamento das técnicas de medida  Marcar a singularidade do conceito  Surgimento de variáveis moderadoras  Ainda não abandonou a fase anterior  Indícios de consolidação a partir de 1985  Surgimento de artigos de ampla revisão  Diminuição das controvérsias  Revisões exaustivas  Formulação e inclusão do conceito no modelo teórico

instituição. A par de uma cultura normalizante, coexiste uma outra cultura, a cultura organizacional que “funciona como metáfora para um entendimento novo sobre o clima, o “ethos”, a atmosfera, o carácter e a imagem de uma organização” (Sanches, 1992: 40).

Segundo Neves (2001), Trice e Beyer (1993) alertam para dois aspectos a distinguir na análise do conceito de cultura (Neves, 2001: 447):

i) A essência ou substância da cultura – conjunto de crenças valores e normas que

condicionam de forma abstracta o comportamento do indivíduo;

ii) As manifestações ou formas da cultura – aspectos observáveis que de forma

concreta são a expressão da cultura por parte do indivíduo.

Por sua vez, Teixeira (1998) alude a Robbins (1993) que aponta um conjunto de dez características primárias que, no seu entender, são definidoras da cultura de uma organização (Teixeira, 1998: 173):

i) Identificação – medida em que cada indivíduo se identifica mais com a organização

como um todo do que com a sua função;

ii) Ênfase no grupo – medida em que o trabalho se encontra organizado mais na base

de grupos do que na base individual;

iii) Focalização nas pessoas – medida em que as decisões terão em conta o seu efeito

nas pessoas;

iv) Integração departamental – medida em que, nos departamentos, é encorajada a

coordenação e a interdependência dos diferentes departamentos;

v) Controlo – modo de usar as regras, regulamentos e supervisão que controlam os

comportamentos dos indivíduos;

vi) Tolerância do risco – medida em que os actores organizacionais são encorajados a

arriscar nas suas decisões;

vii) Critérios de recompensas – modo como os indivíduos são recompensados face ao

seu desempenho na organização;

viii) Tolerância de conflito – medida em que os indivíduos são encorajados aceitar

abertamente críticas e encarar conflitos;

ix) Orientação para fins ou meios – em que medida a direcção se preocupa mais com os

fins do que com os meios;

x) Concepção de sistema aberto – medida em que a organização tem em conta as

alterações do ambiente externo e se adapta a elas.

Relativamente às origens da cultura, Teixeira (1998) defende que a cultura de uma organização pode ter como base quatro origens distintas:

i) História – conhecimento que os actores organizacionais têm sobre o passado da

ii) Ambiente – um ambiente estável propicia a existência de uma cultura formal, ao

passo que um ambiente mais instável conduz a uma cultura que facilmente se adapta a constantes mudanças, sendo mais flexível e informal;

iii) Política de pessoal – tendência de recrutar indivíduos que se identifiquem com a

organização;

iv) Socialização – o processo de adaptação dos indivíduos à cultura da organização

traduz a preocupação que esta tem para com estes e permite dar a conhecer quais as expectativas da organização face ao indivíduo integrado.

Assim, constituindo-se uma mudança de perspectiva conceptual no estudo das organizações, a cultura organizacional surge quando se tem como foco de análise o carácter integrativo e fenomenológico da organização. Getzels e Thelen (1960) concluem que a dimensão cultural não pode ser descurada na análise das organizações pelo importante papel que aí desempenha, influenciando tanto a vertente nomotética como a vertente ideográfica da organização, conforme ilustrado na Figura 5.

Figura 5 – Modelo de Interacções Sociais mais complexas

DIMENSÃO CULTURAL

Ethos Costumes Valores

DIMENSÃO NOMOTÉTICA

Instituição Papéis Expectativas

SISTEMA COMPORTAMENTO

SOCIAL OBSERVADO

Individuo Personalidade Necessidades – Disposições Internas DIMENSÃO IDEOGRÁFICA

Ethos Costumes Valores DIMENSÃO CULTURAL

(Getzels e Thelen, 1960 in Sanches, 1992: 39)

Segundo Sanches (1992), Blumer (1976) considera que esta perspectiva constitui um paradigma no estudo da organização, visando o entendimento da acção (individual e colectiva), as complexas interacções sociais simbólicas existentes na comunidade organizacional e “atingir a realidade que lhe dá uma identidade diferenciada, original e única“ (Sanches, 1992: 41).

Dos vários modelos que analisam a dimensão cultural da organização, Costa (2003) destaca o modelo dos sete S da McKinsey (1977), assim designado pelos autores por propor uma análise de sete atributos que, na língua inglesa, começam pela letra S e que são fundamentais na formulação de uma estratégia. Conforme refere Teixeira (1998), os valores partilhados ocupam o lugar central de um diagrama de análise organizacional constituído por sete variáveis, assim por si descritas (Teixeira, 1998: 56-57):

ii) Estratégia (Strategy) – acções efectuadas ou planeadas em resposta ou antecipação

ao ambiente externo;

iii) Sistemas (Systems) – regras e procedimentos seguidos pela organização;

iv) Pessoal (Staff) – qualidade dos especialistas, técnicos e quadros na organização; v) Perícia (Skills) – atributos e capacidades da organização;

vi) Estilo (Style) – Padrões de comportamento e estilos de liderança;

vii) Valores Partilhados (Shared Values) – princípios fundamentais, filosofias ou

conceitos que a organização transmite aos seus membros.

A representação esquematizada do modelo desenvolvido pelos autores é dada a conhecer por Peters e Waterman (1987) e consta da Figura 6.

Figura 6 – Quadro dos 7 S da McKinsey

(Adaptado de Costa, 2003: 114 e Teixeira, 1998: 60)

Na mesma linha de pensamento, Teixeira (1998) socorre-se de Johnson e Scholes (1993) que se referem ao “conjunto de valores assumidos pela organização e perceptíveis pelas histórias e explicações dos gestores e por actos traduzidos em mitos, rituais, símbolos, sistemas de controlo e estruturas de poder formal e informal que os suportam e lhes dão relevo” (Teixeira, 1998: 176). Os autores denominaram este conjunto de valores fundamentais da organização de paradigma. Por outro lado, ao conjunto de manifestações nas mais variadas vertentes da organização apelidaram de teia cultural. A Figura 7 ilustra a forma como se estabelece a teia cultural de uma organização onde o paradigma se assume como o elo de ligação entre as diversas faces da organização.

Nesta mais recente corrente, a cultura é entendida como uma rede de relações sociais, assumindo-se que cada sistema integrante da estrutura organizacional é uma unidade funcional que contribui para a existência e continuidade da organização. Esta abordagem enriqueceu tanto a forma de ver a cultura das organizações como o modo de entender a importância da mesma. ESTRUTURA (Structure) PERÍCIA (Skills) ESTILO (Style) VALORES PARTILHADOS (Shared Values) SISTEMAS (Systems) ESTRATÉGIA (Strategy) PESSOAS (Staff)

Figura 7 – A teia cultural de uma organização

(Teixeira, 1998: 176)