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Os agentes da missionação jesuítica foram os padres, irmãos coadjutores e irmãos escolásticos. Nas sete décadas da missionação, o pico do maior número de missionários coincidiu com o período da sua maior expansão pelo país e ao mesmo do início da guerra colonial. De facto, é a década de 1960 que conhece um número considerável de missionários, tendo atingido a cifra de 84 no seu auge, conforme o gráfico a seguir.

288 Na Angónia, um trabalho part-time é aquele que é pago no próprio dia em que é feito. O pagamento pode

Gráfico 2: A presença de missionários nas sete décadas de presença em Moçambique

Fonte: Catálogos da Companhia de Jesus, 1941-2012

A formação de mais catequistas foi em parte para reforçar o diminuído número dos missionários e ter intérpretes nas homilias e no contacto com as populações. Também servia para diminuir as distâncias a percorrer a partir da Missão e garantir protecção nas aldeias por visitar porque, no dizer de Pio XII, «as missões sem escolas, foram missões sem futuro, e que um missionário com seis colaboradores pode fazer mais que sete missionários estrangeiros289».

A abertura de abrir escolas de habilitação de professores e catequistas deveu-se em parte a falta de pessoal qualificado para responder as necessidades imediatas e impedir o êxodo para os territórios vizinhos. Entre 1966 e 1975 havia problemas essenciais que preocupavam os jesuítas. Por um lado o analfabetismo como causa e consequência do subdesenvolvimento e o subdesenvolvimento como causa e consequência do analfabetismo e a guerra colonial.

Assim, os missionários percorriam grandes extensões de terra a fim de evangelizar e monitorar o ensino que era dado pelos catequistas e alguns professores por eles preparados em Boroma e depois na Vila Coutinho. Usavam a imagem de Nª Sª para cativar, numa casa por dia e outros vão para lá, Também usavam altifalantes para convidar muita gente, os protestantes entregavam livros de volta, os casais em problema reconciliavam-se, projecção de filmes de catecismo. A expansão da cristandade não se deve apenas ao empenho dos missionários, mas também dos leigos que prepararam gerações de mais leigos. Na formação, professores, missionários, irmãs e irmãos coadjutores davam uma formação pedagógica humanístico-cristão aos alunos o que favorecia a abertura de mais escolas de terceira e quarta primarias nos centros afastados da Missão, tornando possível a muitos jovens uma frequência escolar regular, permanecendo junto da família sem ter de recorrer ao internato.

Os catequistas foram os primeiros colaboradores da evangelização. Foram eles que multiplicaram e potenciaram as forças dos missionários. Sempre presentes nos postos avançados onde era preciso começar do zero, disponíveis como intérpretes, professores e tradutores, nos dias litúrgicos à frente do pequeno grupo de catecúmenos e cristãos; sempre presentes nos lugares aonde o missionário passa poucas vezes por ano. A sua formação realizava-se através do contacto directo com os missionários e encontros periódicos que tinham lugar na Missão ou por ocasião das visitas às escolas-capelas.

A formação dos catequistas visava inseri-los bem no seu meio e aprofundar os temas de iniciação cristã. Todavia, o catequista como substituto do missionário trouxe problemas em várias partes por ser acusado de passividade perante o missionário, autoritarismo e arbitrariedades para com a comunidade cristã e de negligenciar as reais necessidades da comunidade. Além disso, a sua dependência fê-lo um funcionário da Missão com um contrato de trabalho, suscitando uma reacção de desinteresse de não colaboração nos outros cristãos. Os jesuítas não privilegiaram a formação de seus catequistas em locais distantes e pertencentes a outros missionários porque lá, como se viu, os formandos eram uma casta distanciada da comunidade. Em 1971, houve crítica na forma como os catequistas eram formados, segundo o esquema clerical através do qual um jovem ia à escola e mais tarde era mandado para a sua aldeia.

Parece que este método não tenha futuro, e com certeza não dará os verdadeiros líderes de que se precisa. Enquanto não se começar pela comunidade e não se fizer surgir os catequistas a partir de uma animação da mesma comunidade, o catequista será sempre um homem que vem de fora. Também nos programas, nada de antropologia. É necessário que estes catequistas tomem consciência da sua própria mentalidade, das crenças supersticiosas e dos valores da sua própria tradição. Falar de uma ruptura com tais crenças é um discurso teórico, eles devem poder conservar o que tem de valor nestas tradições, integrando-o na sua própria vida cristã. De toda a documentação resulta que a revelação é apresentada como cá na Europa, sem levar em conta o sujeito que a recebe. Seria necessário sensibilizar as comunidades, de tal modo que

constituam uma comissão que depois envie os seus animadores ao curso dos catequistas da região290.

Conscientes de que o catequista era visto como o homem da Missão, imposto pelo missionário, e não fruto do trabalho de animação da mesma comunidade, os jesuítas instituíram a figura do gurupa, normalmente mais experiente e produto da própria convivência comunitária. Com a instalação do catequista em determinados centros, os problemas tendem a agudizar-se, pois a visita do missionário é encarada como método de controlo. A falta de sugestões da parte dos catequistas criou limitação no desenvolvimento do trabalho, pois a maioria das vezes eles só esperam receber ideias do padre de forma vertical. A ausência de tratamento horizontal dos problemas, isto é, trato em que ambas as partes têm o que dar, dificulta a missionação e pode ser que o problema tenha continuidade nos próximos anos.

O uso de métodos diversificados contribuiu para a missionação das regiões em volta das missões jesuítas. Usaram-se as imagens, as cerimónias tradicionais aproximadas ao catolicismo, aquelas menos ofensivas, ridicularizaram algumas práticas enquanto deram relevo a outras, usaram-se as imagens de uma aldeia para outra e fizeram-se as vias-sacras de uma aldeia para outra, em vez de circunscrever-se apenas na Missão. As missas campais, fora da igreja e por vezes nos cemitérios dos missionários, ou em casa de pessoas caídas, velhas e doentes, também ajudaram na missionação rápida entre os habitantes incrédulos.

O uso da escola e do internato como forma de dar nova imagem contribuiu para formar nos jovens o espirito de oração e sua aproximação ao cristianismo. Além disso, os Jesuítas sempre deixaram que os jovens fossem acompanhados pelos pais, ainda pagãos, desde que aqueles aceitassem o baptismo dos filhos. Acima disso, a protecção que os missionários mostraram no tempo da opressão colonial pelos trabalhos forçados trouxe-lhes grandes simpatias da parte da população.

Com o eclodir da guerra colonial os Jesuítas foram encarregues pelo regime de nacionalizar e aportuguesar os indígenas através do ensino. Todavia, como deixamos notar anteriormente, os Jesuítas sempre mostraram que a independência era um direito dos povos. Queriam independência mas, seria uma independência em que os luso-moçambicanos seriam os governantes e não aquela dos negros. Acreditavam na possibilidade duma independência em que o domínio branco seria visível a exemplo do que sucederam na Rodésia com Ian Smith.

A guerra civil que se seguiu a independência não desmotivou os Jesuítas de continuarem a crer no povo moçambicano e não quiseram abandonar o trabalho por eles iniciado. Encetaram vários esforços no sentido de denunciar as injustiças que estavam a ser cometidas contra o povo por parte não apenas dos rebeldes como também das autoridades locais. A viragem da Frelimo, em 1977, quando abraçou o marxismo-leninismo, chamou atenção sobre os problemas discutidos em 1947, quando se falava de o comunismo como a verdadeira ameaça a que os Jesuítas deviam estar cientes.

Sabia-se das perseguições que dai podiam advir. Como forma de contornar a situação, evitaram ficar acumulados num mesmo espaço, optando por viverem dispersos. Proibidos de rezarem, continuaram a delegar as homilias aos catequistas locais enquanto eles iam apenas abençoando as hóstias. Assim, a cristandade pode continuar viva. A colaboração com os missionários malawianos conferia-lhes abrigo seguro na aprendizagem da língua e na estadia.

A Poligamia e emigração eram causas da caída de cristãos. Para levanta-los, fazia-se procissão de casa em casa dos caídos, porque o maior sacrifício que se pode exigir a um indígena é ser monógamo291. Fazia-se campanhas do rosário pelas aldeias; campanha dos azibambo: baptismos de última hora e campanha dos caídos que viviam um pagão com uma cristã e vice-versa, baptizavam-se a todos que aceitassem. Mas também a missionação foi acompanhada pelas constantes visitas dos padres às comunidades de longe e os cristãos de longe vinham a Missão. Esta troca de visitas visava a não cansar os cristãos mas também a não deixa-los por muito tempo porque voltavam a sua vida antiga de pagãos.

As irmãs trabalhavam na saúde em condições difíceis por causa do isolamento, da insuficiência ou falta de remédios, das estruturas primitivas e dos meios inadequados. Além do sector sanitário, trabalhavam com as crianças presentes em asilos, orfanatos, creches e jardim-de-infância e com os leprosos e doentes mentais. Em caso de uma doença grave, os padres usavam as viaturas da Missão para transporte. Foram sendo promovidas campanhas de vacinação.

O que se nota é que a aproximação dos missionários aos residentes fez-se na base da promoção de acções sociais como abertura de abertura de escolas onde se dá catequese e a celebração das missas. Para facilitar a comunicação, usam intérpretes enquanto aprendem e estudam às traduções. É dentro desta dificuldade que surgem várias gramáticas das línguas

locais para o uso dos missionários292, traduções dos textos bíblicos e dos catecismos tradicionais europeus adaptados, recolha de cantos litúrgicos. A interacção entre os missionários e as populações locais contou com as visitas periódicas, levantamento dos caídos e privilégio na catequese da juventude, celebração de matrimónios e manutenção dos jovens nos internatos de modo a terem uma vida diferente da dos seus parentes, incorporação dos ritos tradicionais aos valores cristãos de modo a evitar atritos que durante muito tempo foram um impeditivo do avanço da cristandade, colaboração com as autoridades tradicionais e aliança com os grandes líderes entre os líderes e oferta de emprego aos formados nas missões.

Nem sempre houve um aprofundamento da mensagem cristã, por duas razões: a língua e a pressa. Numa primeira fase, o baptismo era dado como se fosse propaganda. À medida em que a cristandade ia crescendo, a formação começou a ser mais rígida. Por outro lado, a dificuldade residia no caracter autoritário que o catequista-professor tomava, algumas vezes como meio de defesa por ser jovem demais outras vezes por não ter compreendido bem a mensagem cristã. Os meios de transporte foram de todo o tipo: moto, bicicleta, carro e até a pé. Para as zonas recônditas levavam consigo um altar portátil, utensílios, comida e cobertores, mas aos poucos começaram a deixar a comida confiando no que haviam de encontrar lá, seguindo o mandamento de cristo.

O gurupa escolhia a melhor palhota e por vezes punha-se um guarda fora. Tinham contacto com ratos ao dormir e depois das missas resolviam os milando (problemas que afectavam a comunidade, alguns dos quais referentes a acusações de feitiçaria. Para aumentar a presença de pessoas na missa e garantir a continuação do fervor cristão o padre Faustino Rodrigues chegou a fazer o levantamento de cristãos por família e fazia chamada no fim da missa, na Missão da Fonte Boa.

Numa de suas cartas informa que «Para ir visitar a escola da Manyanga, sai de bicicleta. Na primeira descida, porém, verifiquei que os travões eram incapazes de segurar o veículo que começava a embalar algo desenfreadamente. A fim de evitar possível catástrofe, desmontei com agilidade e preferi seguir a pé. Como era bastante longe e sobretudo por levar pela primeira vez umas botas de canudo, os pés pagaram-nas a custa de algumas bolhas».

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