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LIMITAÇÃO DA EXPRESSÃO EXCESSIVA DA DISFORIA

No documento TERAPIA COGNITIVA DA DEPRESSÃO Beck (páginas 154-156)

As pessoas afectadas pelo sofrimento psicológico, tal como as afectadas pela dor física, muitas vezes buscam alívio revelando a outrem seu sofrimento. Conquanto a atenção alheia não seja, como crêem muitos, a causa da tristeza, a discussão prolongada desses sentimentos pode intensificá-los. Ao falar aos outros sobre seu sofrimento, os pacientes ficam desnecessariamente comprometidos com o exame desses sentimentos. Além disso, pela discussão excessiva de sentimentos, muitas vezes trazem tensões a seus relacionamentos com parentes e amigos. Por essas razões, são encorajados a estabelecer limites restritos à discussão de sua infelicidade.

Depois de expor a lógica da limitação das discussões sobre o infortúnio, o terapeuta pode solicitar ao paciente que monitore o volume de tempo que gasta falando sobre seus sentimentos, já que muitos pacientes não têm consciência de quanto o fazem. O paciente pode buscar o auxílio de terceiros para mudar esse comportamento, assim como dizer aos que continuamente indagam como se sente que agradece seu interesse, mas que, actualmente, está procurando limitar a "tomada de temperatura" emocional. Se necessário, o terapeuta pode discutir esse tópico com pessoas significativas na vida do paciente.

Ocasionalmente, temos destinado um horário específico durante, o dia para o "sentir-se mal". Por exemplo, o terapeuta pode sugerir ao paciente que procure adiar a experiência integral de seus sentimentos até um espaço de tempo ao final da parte da tarde, digamos, das 4 às 5 horas.

Esses pacientes parecem achar que, por saber que disporão de uma oportunidade bem definida para "soltar-se", conseguem orientar-se melhor para atingir objectivos específicos no restante do dia.

"CONSTRUINDO UMA BASE" SOU A TRISTEZA

Outra abordagem útil consiste em ensinar o paciente a aumentar sua tolerância aos sentimentos disfóricos. Essa abordagem é conveniente para lidar com emoções

negativas, tais como a ansiedade. Em lugar de pensar, ou em resposta à ideia de que "Não posso suportar isso", o paciente é encorajado a dizer a si mesmo, "Sou suficientemente forte para tolerar isso", ou "Vou ver por quanto tempo posso suportar isso". Com a prática, as pessoas aprendem a aumentar sua tolerância a quase todas as formas de desconforto.

Pode-se dizer ao paciente que, aumentando sua tolerância à tristeza, ele se estará fortalecendo e "vacinando" contra ataques futuros de disforia.

Ao observar que é realmente capaz de tolerar elevados níveis de disforia sem se tornar agitado, o paciente frequentemente desenvolve um sentimento aguçado de controle, que pode, em si mesmo, sustar os efeitos da espiral descendente da tristeza. Ao combater a tristeza, os pacientes frequentemente recorrem a mecanismos comportamentais inadaptativos, tais como dormir, comer ou beber em excesso. O

paciente pode ampliar sua tolerância à tristeza aumentando o intervalo entre o sentir- se triste e o recorrer a esses "antídotos". De modo semelhante, até mesmo o adiantamento de medidas neutralizadoras adaptativas ao sentir-se triste ajuda o paciente a elevar seu nível de tolerância.

Visto que é esperável que o paciente continue a experimentar graus variados de tristeza enquanto durar sua depressão, é importante que ele empregue certas estratégias que o impeçam de agravar sua disforia. A demonstração de que é capaz de sustar o progresso de seus sentimentos dolorosos serve como antídoto à ideia de que "Essa dor irá ficar tão forte que se tornará insuportável".

Uma técnica simples, aplicável a pacientes que regularmente vivenciam seus piores períodos em horas específicas do dia ou da semana (por exemplo, nas primeiras horas da manhã), consiste em formular um plano de actividades de distracção para aquele intervalo de tempo. Exemplificando, uma autora estabeleceu uma programação que consistia em preparar esboços de capítulos e escrever tantos parágrafos quantos lhe fosse possível entre as 6 e as 8 horas da manhã - seu período diário de mais intensa disforia. Uma dona-de-casa usava o mesmo período para fazer limpeza e lavar roupas, Para os fins-de-semana, que lhe eram particularmente dolorosos, programou diversas actividades sociais.

Essas distracções não apenas diminuem o grau de conscientização da disforia, como também são úteis na canalização dos processos de pensamento do paciente para longe das interpretações acerca da importância ou do significado de sua disforia.

Uma técnica caracteristicamente cognitiva se mostra muitas vezes valiosa para neutralizar a tendência do paciente a atribuir significados "catastróficos" a seu moral baixo, ou a autocondenar-se por ele. Constatamos, por exemplo, que alguns indivíduos se desvalorizam por se sentirem tristes, o que os leva a sentir-se ainda pior. Uma paciente, que se mudara recentemente com seu marido e filhos de uma casa barulhenta no centro da cidade para uma residência nova num subúrbio, condenava-se por sentir- se mal. Seus pensamentos eram. "Tenho uma abundância de espaço - diversos acres de terra para as crianças brincarem, um jardim e muita privacidade. Eu deveria estar feliz". Na realidade, a mudança havia rompido seu relacionamento com vizinhos que tinham sido próximos, tanto de um ponto de vista pessoal como geográfico, e havia exigido volumes consideráveis de trabalho exaustivo. Assim, ao menos por algum tempo, ela suportara uma perda substancial.

O terapeuta assinalou que ela havia intensificado seus sentimentos de tristeza através de suas autodenúncias. Abordou o assunto da seguinte maneira:

Temos uma vasta gama de sentimentos. Os sentimentos de tristeza usualmente ocorrem quando as perdas se nos afiguram supremas. A princípio, você reagiu à mudança de modo normal, por exemplo, sofreu uma perda imediata de seus amigos e vizinhos e, portanto, sentiu-se triste. A seguir, no entanto, obrigou a si mesma a passar da tristeza à depressão, empregando seus "devos" e desvalorizado a si mesma. Você se

disse: "Eu deveria sentir-me feliz… Por que não me sinto feliz em nossa linda casa nova? Que há de errado comigo?"

Inicialmente, a paciente manifestou surpresa ao dar-se conta de que sua determinação de sentir-se feliz após a mudança não era realista. Ao aceitar a avaliação do terapeuta, contudo, pôde conter uma tristeza maior dizendo a si própria: "É natural que me sinta triste - temporariamente. No entanto, existem pessoas na vizinhança que virei a conhecer melhor... Na verdade, faz mais sentido pensar que eu deveria sentir- me triste do que alegre actualmente".

Esse caso ilustra a maneira como uma pessoa se deixa tiranizar pelo código dos "deveres" que absorve da sociedade, As regras sociais ditam que uma pessoa deve sentir-se feliz em circunstâncias que, a rigor, tendem antes a produzir tristeza (pelo menos a curto prazo). A pessoa propensa à autodepreciação conclui então que a ausência da resposta esperada de prazer indica uma grave falha em seu carácter e que jamais conseguirá ser feliz. Ao admitir que uma decisão específica (tal como mudar- se) não é fatal e que a perda a curto prazo será eventualmente compensada por ganhos a longo prazo, o paciente se capacita a mitigar, ao invés de exacerbar seus sentimentos actuais de tristeza.

No documento TERAPIA COGNITIVA DA DEPRESSÃO Beck (páginas 154-156)