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DESIGN INDUSTRIAL, MATERIAL E CONHECIMENTO

1.4 MATERIAIS NA ÓTICA DOS DESIGNERS

Ao elaborar o livro “Material Conexion: the global resource of new and innovative materials for ar- chitects, artists and designers” os autores – Beylerian, Dent e Moryadas (2005, p. 254-273) – solicitaram a conceituados designers e arquitetos que opinassem sobre o papel dos materiais em seu trabalho. Pediram- lhes que pensassem na razão da preferência por um material específico, como eles podem inspirar e porque são significativos, como reflexos de valores visuais, funcionais e culturais.

São muitas as idéias expressas nas respostas dos profissionais e, dada a riqueza do conteúdo, foram selecionados alguns trechos mais relevantes que podem contribuir para um melhor entendimento das ques- tões desta tese.

Com relação à primeira pergunta, é importante explicar a complexidade do termo “inspirar” no contexto desta pesquisa. Como já mencionado, os materiais têm uma forte influência na maneira como cada profissional processa suas idéias, mentalmente, e concretiza ou materializa o artefato. Geralmente, os desig- ners adotam metodologias apropriadas para apoiar o processo criativo, na conceituação e configuração dos artefatos. Com a prática e a experiência adquirida, os profissionais adaptam métodos, criando sua própria maneira de trabalhar, ou seja, elaborando seu próprio método de trabalho. Esse conhecimento tácito é que será destacado das respostas selecionadas:

‚ De acordo com Gijs Bakker (designer holandês):

Materiais nunca me levam a um novo design. Desde o início da minha carreira aprendi que o conceito (o pensamento) é a única coisa que importa. Costumava dizer que a forma (o material) é o invólucro da idéia. Um conceito é como um sonho. Não se conecta à realidade concreta, mas vai além da realidade de forma inteiramente livre. Isso nos dá força e poder. Claro que tudo de- pende de suas habilidades e conhecimento sobre materiais e técnicas, de forma a permitir que o conceito se materialize de maneira adequada.

‚ Orlando Diaz Azcuy (arquiteto cubano) considera que há uma espécie de simbiose entre material e design:

lecionar um material depois de ter tido uma idéia – eles chegam juntos. Materiais e design são como “o ovo e a galinha” na

re um bom começo para se usar a criatividade.

‚ Ingo Maurer (designer especialista em iluminação) revela que:

Material, mente e percepção se unem numa relação única, singular: pode um deles existir sem os es materiais, utilizá-los por força da No design, os materiais me inspiram. Não tenho de esperar para se

minha criação. [...] Novos materiais são semp

A forma segue as características do material. Se tentar tirá-las, elas (ainda assim) se mostram. Compreender e desenvolver uma relação com o material é o primeiro passo a ser dado.

‚ Peter H. Meyer faz as seguintes considerações:

outros dois? [...] Perceber as diferentes qualidades de diferent

criatividade humana para os fins que melhor lhe convir, transformá-lo deliberadamente, isso é uma invenção do processo civilizatório – um incessante processo de inovação no uso dos materiais.

‚ Uma relação similar e mais estreita tem o designer alemão Wolfgang Joop com os materiais:

d (ver Figura 14) expressam suas

xas estão sendo hoje explo-

Figura 14 – Projetos de Z O trabalho de Greg máticas presentes n eu rte om a

Sobre o caráter expr

sso desconectar o material de sua aplicação e contexto. Mas posso ser inspirado por qual- É como uma fertilização cruzada entre minha visão e o material. [...] Todo tipo de material possui uma alma. Você apenas tem que ouvir o que essa alma tem a lhe dizer, seus segredos e desejos.

‚ Arik Levy (designer israelense) tem também uma relação curiosa com os materiais em seu trabalho:

Trabalho como um cientista com os materiais. Procuro seu código genético para deixar de lado uma parte e reconstruir de outra forma. São subconjuntos em nossas mãos; mesmo os materiais rígidos conceitualmente se transformam em moléculas macias para modelar, esculpir e identificar.

As formas sinuosas das obras da arquiteta e designer iraquiana Zaha Hadi idéias sobre os materiais:

No ambiente do design, dominado por novos softwares que nos permitem repensar forma e es- paço radicalmente, existe uma necessidade urgente de materiais que se adaptem às formas com- plexas e às condições espaciais proporcionadas pelo computador. Desejamos uma expansão no desempenho dos materiais e tentamos não pensar nos limites que se impõe a certos materiais a partir de aplicações convencionais. Técnicas que nos permitem “esticar” um material – como a formação térmica de forma a alcançar superfícies altamente comple

radas para interiores e para fachadas. De um lado, podemos aperfeiçoar qualidades ergonômi- cas em interiores; do outro lado, essas técnicas nos permitem produzir uma expressão formal completamente nova no caso de aplicações exteriores.

aha Hadid: (a) exterior de uma obra; (b) interior da estação de trem na Áustria; (c) cozinha de Corian® (Du Pont)

Lynn (filósofo, arquiteto e designer) se destaca por utilizar relações geométricas e mate- a natureza para criar formas zoomórficas, tanto nos objetos quanto na arquitetura. O s comentário faz referência a aspectos estéticos e perceptivos dos materiais:

A liberdade para modelar materiais como o titânico e o alumínio traz todo tipo de novos usos para os materiais assim como formas exóticas[...]. Na Alessi, a cerâmica que uso é tão fo quanto o metal, mas produz um resultado melhor de toque e sabor quando em contato c boca. Sempre começo com a aparência e a sensação que um material traz, e então tento dese- nhar a partir as características físicas.

essivo, comunicativo e de linguagem dos materiais:

‚ Stefano Marzano (diretor da Philips Design) revela suas idéias sobre os materiais:

quer material a partir de conotações históricas que ele me suscite, pela maneira como desperta minha imaginação, com seus elementos expressivos, sua funcionalidade e racionalidade. Me agra- dam, em especial, os materiais que eu posso perceber, da superfície ao interior. São materiais com os quais possuo um código de comunicação e interação com alto nível de envolvimento.

retor de design da BMW) comenta sobre dois pontos importantes – a expressão própria cebido pelos consumidores:

Sou fascinado pelo uso das propriedades dos materiais como a expressão do design [...]Materiais com funções múltiplas e múltiplas “vidas” são os mais interessantes, embora a

‚ Chris Bangle (di

dos materiais e o valor per

transformação de um “velho material” em uma nova forma pode ser igualmente inspiradores Há alguns anos, tínhamos um projeto para substituir o uso da madeira em carros para algo menos caro e que tivesse um efeito similar na percepção do consumidor. O material que procurávamos, denominamos de home, por todas as associações que a madeira nos traz. Continuo procurando.

Sobre os materiais e meio ambiente:

‚ Michael Braungart (químico do Greenpeace) introduz o termo re-materialização:

não na desmaterialização da indústria e dos produtos, mas na rematerialização. Quando os ma-

‚ O chinês Eric Ch

‚ Sobre a questão do to Ezio Manzini defende o mesmo ponto de vista de Chan:

Para se atingir essa meta, precisamos de que nos importa aqui, de

Andrea Cancellato ( racional dos materia

As pessoas vêem materiais por toda parte, mas raramente elas os observam com atenção [...] umados a pensar de forma equivocada.

A expectativa dos us

Sou um adepto do material. O caminho para um mundo saudável, abundante e sustentável está teriais são sustentáveis, com bom desempenho e benéficos do ponto de vista ambiental, eles se tornam “nutrientes”, e se tornam parte de um metabolismo industrial que renova e regenera as pessoas, o ambiente e a economia.

an defende que o menor consumo de materiais depende do seu maior desempenho:

A desmaterialização é a tendência futura. Consumimos muitos materiais e esperamos deles muito pouco em termos de desempenho. Chegaremos à uma hora em que quanto maior for nossa ex- pectativa quanto a desempenho dos produtos menor será o emprego do material.

meio ambiente, o engenheiro e arquite

[...] devemos consumir 90% menos de recursos naturais.

um novo estilo de vida, de novas formas de organização social e, para o

novas famílias de materiais. Isso implica que os materiais devem ser altamente eficazes. Quanto mais desejamos reduzir materiais, mais temos de prestar atenção a eles e a suas propriedades.

diretor da Triennali di Milano) demonstra a preocupação com o lado intangível e menos is, semelhante ao contexto desta pesquisa:

Geralmente dizemos que materiais são matéria inanimada, embora provoquem uma vasta quan- tidade de sentimentos. Talvez estejamos acost

uários por materiais mais personalizados é abordada por Eric Chan:

Consumidores esperam por novas sensações, mas a maior parte do processo de produção em massa é padronizada.

Nota-se que os desig sensoriais dos usuár

enta que:

azes de tocar e sentir, pe-

‚ Issey Miyake (de

‚ O designer egípcio Karim Rashid (ver Figura 15 a) fala sobre os materiais:

Vejo os materiais como inspiradores do novo comportamento humano. Eles asseguram o desen-

(a)

ners da área da moda e do design têxtil são aqueles mais preocupados com as questões ios.

‚ Fern Mallis, designer de moda com

[...] com a vida corrida e a falta de tempo estamos nos tornando incap

quenos detalhes que nos fazem sentir bem. Materiais podem nos trazer de volta lembranças e nos fazer pensar em coisas novas a serem feitas com eles.

signer japonês) faz a seguinte consideração:

Tenho interesse na relação que se estabelece entre os diferentes materiais e o corpo humano.

volvimento ou o uso de novos materiais. [...] Materiais podem agora ser flexíveis, se transfor- mar, modelar, mudar de cor e de temperatura, em decorrência do movimento do “material inte- ligente”. [...] Meus materiais favoritos são os que podem ter uma aparência quase imaterial, como o vidro ou plásticos. Os plásticos possuem a mais ampla variedade de performance, aca- bamento e propriedades diversas. Eles me inspiram para formas fluidas, macias, orgânicas, qua- se humanas.

(b)

Figura 15 – Uso de materiais sintéticos nos objetos: (a) cadeira dupla de plástico, Karim Rashid; (b) cadeiras de plástico, Felipe Starck

Philippe Starck, tam suas relações com os materiais:

o conviver, porque nosso objetivo principal é o ser humano. Não existe material que valha a pena existir se ele não traz algum benefício, qualquer que seja para a natureza humana. novo termo, uma expressão adicional que nos permite criar um

Starck também mostra-se um defensor dos materiais sintéticos (ver Figura 15 b), cujas razões são:

Meus materiais favoritos têm sido sempre os sintéticos por várias razões: porque são estrutural- em. Atualmente, as capacidades extra- u- redução de preço e capacidade de multiplicá-lo ao infinito de forma a criar um produto de me-

bém designer, fala de

[...] não é material em si ou a sua cor que importam, mas o que irá levar para as pessoas que com eles irã

[...] cada novo material é um

novo conceito. É a possibilidade de contar uma nova história.

mente admiráveis, já que são fruto da inteligência do hom

ordinárias de alguns materiais sintéticos ultrapassam as possibilidades de alguns materiais nat rais. [...] apenas os materiais sintéticos nos permitem cobrir a qualidade de um produto com

lhor qualidade para um maior número de pessoas. Os sintéticos são necessários para democra- tizar o design, em outras palavras, para a democratização de boas idéias.

ionais que desenvolvem materiais, destacam-se alguns trechos de uma entrevista publica- gner, professor e autor de vários livros sobre materiais) faz os seguintes comentários:

[...] materiais

Na ótica dos profiss

da no boletim da empresa Dow Corning: Chris Lefteri (desi

devem fazer sentido no ciclo inteiro de vida de novos produtos.

[...] Há sempre a tentação de buscar novos materiais que sejam mais inovadores sem olhar ao redor e ver o que já existe.

Chip Reeves (diretor de design da Dow) complementa a idéia com o seguinte:

A empresa (Dow Corning) inova constantemente em novas tecnologias e temos atualmente um portfolio de 7.000 produtos (materiais) e a maioria deles não é conhecida pelos designers. A- creditamos que há muitas oportunidades para inovação utilizando esses materiais já disponíveis.

No Brasil, os irmãos Fernando e Humberto Campana são exemplo que ilustra, de maneira ímpar, a questão du- ão de móveis e objetos com utilização de materiais dos mais diversos tipos (ver Figura 16) e, muitas vezes,

cia; bonecas de pano; fibras natu- rais mescladas com

tre a formação cria conceito nasce a par

(a) Figura 16 – Cadeiras dos I fios têxteis

inados materiais específicos, é possível verificar a importância do

element a,

características expressivas e sens

Embora que os designers possuam abordagens particulares para trabalhar com determinados mate-

riais, como vistas nos depoi parte das empresas, em adotar

critérios mais sistemáticos, ferramentas e rotinas para a seleção dos materiais, que serão tratados no próxi- mo item.

dos materiais e designers. Eles são conhecidos, internacionalmente, pela criação, experimentação e pro ç

inusitados: restos de couro, tecido, borracha e de madeira; bichos de pelú

plásticos; metais; pneus, entre outros. Os móveis são resultados da estreita interação en- tiva e teórica do arquiteto Fernando e do conhecimento dos materiais do Humberto. O

tir dessa interação dos conhecimentos individuais.

(b) (c)

rmãos Campana em diversos materiais: (a) madeira, (b) arame de aço e (c) estrutura de tubos de aço e estofado de

Apesar das diferentes opiniões dos designers a respeito de como os materiais podem inspirá-los nos seus projetos e a preferência por determ

o “material” para os profissionais. Os aspectos mais relevantes estão relacionados à forma, estétic oriais, funcionalidade, desempenho, questões sociais e ambientais. mentos apresentados, há uma preocupação, por

1.5 SELEÇÃO

Selecionar materiais é muito mais do que, simplesmente, combinar requisitos de um produto com o

bre o material; (b) na criação de um novo produto para uma empresa que já tenha um processo produtivo que pré-determina uma classe de ma- teriais; (c) modificações de um produto, ou o seu redesign em função da necessidade de um melhor desem- penho técnico; (d) a alteração do material para a redução de custos; (e) trabalhar sempre com materiais disponíveis e com custos reduzidos; e outras situações.

Do ponto de vista do designer, sempre é mais motivador trabalhar numa situação em que haja a li- berdade de selecionar o material mais adequado, sem que ocorram limitações do processo de manufatura.

Seja qual for a situação e, independente do setor ou porte da empresa, sempre é desejável que haja a mento do produto, segundo Kindlein Júnior e Busko (2006). Tradicionalmente, a atividade é realiza- da pela

ma que a manufatura seja capar de produzi-lo. O processo se estende ao acompanhamento do produto após forma a realizar eventuais mudanças, necessárias nas especificações inici- ais, até, finalmente, planejar a descontinuidade do produto no mercado.

mostra a Figura 17, que se inicia com o planeja- mento do projeto (considerado ainda um pré-desenvolvimento); passa pelas fases: informacional, conceitual e de det