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MODELO – PERCEPÇÃO DOS MATERIAIS PELOS USUÁRIOS (PERMATUS)

3.4.4.2 PERFIL SUBJETIVO DO MATERIAL

O perfil subjetivo de um material é definido pelas características intangíveis, ou seja, os significados atribuídos e as emoções evocadas, que não podem ser puramente identificadas com valores numéricos ou quantificadas.

Relacionando o processo cognitivo envolvido na percepção dos materiais com as funções do produ- to, já mencionadas no item 1.2.2 “Forma, função e materiais”, resulta no esquema apresentado na Figura 66. Assim, a função estética do produto tem relação com o processo cognitivo da impressão estética dos materi- ais; a função prática, com a interpretação semântica; e a função simbólica tem relação com a associação simbólica. No mesmo nível, encontram-se as outras influências relativas ao perfil dos usuários e do seu com- portamento, fator geográfico, fatores culturais, entre outros.

Figura 66 – A percepção dos materiais e sua relação com as funções dos produtos. Os termos se referem a (1) CRILLY; MOULTRIE; CLARK- SON (2004); (2) BAXTER (1998); (3) IIDA (2006); (4) NORMAN (2006); (5) DESMET (2003a) e (5) JORDAN (2007)

As informações acerca dos atributos subjetivos dos materiais foram encontradas em diversos auto- res, como Manzini (1993), Norman (2006), Gibson (1966), Schmid (2005), Pallasmaa (2006), Baudrillard (1973), Bürdek (2006), Dormer (1995), Russo e Hekkert (2008), Karana (2004b), Ljungberg e Edwards (2003), Ashby e Johnson (2002 e 2003), Ono (2006), Jordan (2007), Baxter (1998), Fisher (2004) e Lup- ton (2002).

Além das fontes acima citadas, buscaram-se outras fontes secundárias de pesquisas, tais como: ban- co de dados de materiais, materiotecas on-line, catálogos de produtos e revistas especializadas em divulga- ção de produtos (como design, arquitetura, decoração e computação).

Todas as informações disponíveis foram organizadas em quatro grupos dos atributos subjetivos: es- tético, prático, simbólico e outras influências que afetam a percepção dos materiais.

Atributos subjetivos estéticos do material

Estes atributos têm relação direta com a impressão estética que sentimos sobre um objeto por meio dos sentidos. No agrupamento dos prazeres de Jordan (2007), equivalem ao prazer fisiológico: tem a ver com o corpo e os órgãos sensoriais.

Na classificação de Desmet (2003a), estes atributos provocam as emoções estéticas. Para Norman (2006), eles se encontram no nível visceral do design: “a figura, a forma, as sensações físicas do tato, a tex- tura dos materiais, o peso, ou seja, todos os aspectos que podem criar um impacto emocional de imediato e funcionam bem se for agradável”.

Em outros termos, quando consideramos que uma coisa é “bonita”, emitimos um juízo proveniente diretamente do nível visceral, que no mundo do design, conforme Norman (2006), é mal visto por se tratar

de um aspecto superficial, se visto de maneira única ou isolada em um objeto.

A relação entre o design industrial e a semiótica está bem resumido nas palavras de Floch apud Rognoli e Levi (2004): o design depende de uma simbiose estabelecida da relação mútua entre a forma da expressão e a forma do conteúdo de um objeto. Floch destaca que os objetos, antes de serem bens de con- sumo, são textos que se oferecem à interpretação dos consumidores. Assim, o designer deve ser capaz de incorporar sentidos e de comunicar através das mais variadas matérias expressivas.

A dimensão estética e expressiva dos materiais pode ser traduzida nos atributos: forma, cor, transpa- rência, brilho, tato, textura, som, cheiro, sabor, temperatura, propriedades físicas e mecânicas, e expressão pelo processo de fabricação (ver descrição detalhada dos atributos de 1 a 12 no Apêndice 2).

Atributos práticos do material

Os atributos práticos têm relação com o design comportamental proposto por Norman (2006) e com a maioria dos processos que controlam o comportamento cotidiano. Estes atributos são aqueles que se relacionam diretamente ao uso, manuseio e experiência dos usuários com os objetos, resultando no prazer e efetividade.

Na classificação dos prazeres de Jordan (2007), equivale ao prazer psicológico, o qual tem relação com as reações cognitivas, mentais e emocionais dos indivíduos. O prazer é resultante da experiência com produtos, facilidade de uso e eficiência. Para Desmet (2003a), estes atributos têm relação com as emoções instrumentais. Cabe lembrar que o cumprimento das funções é imprescindível, especialmente os produtos onde os fatores racionais e práticos predominam.

A avaliação de uma utilidade aparente do design e qualidades percebidas pode ser obtida por meio da interpretação semântica, de acordo com Crilly, Moultrie e Clarkson (2004) e Krippendorff (2006). Isso quer dizer que os materiais têm “significados” quando especificado para uma utilidade do objeto e sua in- terpretação pelo usuário deve refletir as qualidades associadas ao material. Essa interpretação se limita a que o objeto comunica sobre si, e o que ele reflete sobre a identidade de seus usuários tem relação com a asso- ciação simbólica, que veremos no próximo item.

As dimensões práticas e de uso dos materiais podem ser expressas nos atributos: identificação; usa- bilidade; ergonomia; affordance; contexto de uso; conforto; segurança; limpeza e higiene; saúde e salubri- dade; sustentabilidade; qualidade; desempenho; confiabilidade; resistência; eficiência energética e durabili- dade (ver descrição detalhada dos atributos de 13 a 28 no Apêndice 2).

Atributos simbólicos do material

A função simbólica do produto é determinada por aspectos de estima, psíquicos e sociais. Baxter (1998) assinala que um produto desperta confiança na medida em que reflete a auto-imagem do consumi- dor e ajuda na construção da sua imagem diante dos outros.

com a compreensão, o entendimento e a razão; resultado da imagem de nós mesmos, nossa experiência, satisfação pessoal e recordações. Nos níveis anteriores – visceral e comportamental – somente há afeto sem interpretação ou consciência, sendo que no nível reflexivo residem os níveis superiores da sensibilidade, que são a emoção e a cognição. É uma condição mais vulnerável, sujeita às variações sociais e culturais, à expe- riência do indivíduo, ao nível intelectual, às diferenças individuais e dos valores de cada um e da coletivida- de.

O parâmetro simbólico agrupa o prazer social e o ideológico propostos por Jordan (2007). O social tem relação com o relacionamento das pessoas com a sociedade e incluem status, marca, e imagem. O ideo- lógico refere-se à estética do produto e aos valores que ele incorpora. Já na classificação de Desmet (2003a), os parâmetros simbólicos equivalem às emoções sociais dos indivíduos.

A dimensão simbólica dos materiais pode ser evidenciada em atributos como: identidade; reconhe- cimento; memória; cultura; natural e artificial; autêntico e imitações; artesanal e industrial; valores; preço; valor do material local e de território; estilos de design; associações e personalidade (ver descrição dos atri- butos 29 a 47 no Apêndice 2).

Outras influências para a percepção do material

As características pessoais dos usuários (idade, gênero, experiência, instrução), as características geográficas, psicográficas e socioeconômicas (estilo de vida, consumo de luxo-popular), influências de comportamento (tendências, estilos do design, benefícios esperados) e influências culturais são igualmente importantes no processo perceptivo (ver descrição detalhada dos atributos de 55 a 58 no Apêndice 2). 3.4.4.3 COMO DEFINIR O PERFIL DO MATERIAL

Identificar os atributos do material

A Figura 67 mostra o resultado final do perfil do material:

‚ na parte superior da figura, tem-se a identificação do material quanto à sua família, classe e mem- bros;

‚ na coluna da esquerda estão listados os atributos objetivos; e

‚ nas duas colunas à direita, os atributos subjetivos possíveis, listados de A1 a A58.

O perfil serve para orientar a equipe de projeto na identificação dos atributos pertinentes a cada projeto em estudo. Dessa maneira, ele é genérico e possui atributos que muitas vezes não são aplicáveis para determina- dos materiais-produtos em estudo. Não se trata de uma lista fechada e conclusiva. Pelo contrário, o perfil pode e deve ser ampliado ou reduzido na medida da necessidade de cada situação de projeto. Cada um dos 58 atributos subjetivos da Figura 67 estão descritos detalhadamente e ilustrados no Apêndice 2 – Atributos dos materiais e vocabulário.

Figura 67 – Perfil do material: possíveis atributos objetivos e subjetivos. Fontes: (1) ASHBY E JOHNSON (2002); (2) JOHN ET AL. (2007) e (3) proposta da autora

Vocabulário (léxico)

Além da descrição para cada atributo subjetivo, foi desenvolvido um vocabulário apropriado para auxiliar a aplicação do modelo no sentido de evitar inadequações ou inconsistências nas etapas de avaliação com os usuários. O vocabulário ou léxico pode ser definido como o conjunto de palavras que as pessoas de uma determinada língua têm à sua disposição para expressar-se, oralmente ou por escrito. Pode-se dizer que uma característica básica do léxico é sua mutabilidade, já que ele está em constante movimento. Um produto considerado “agressivo” hoje pode parecer “divertido” amanhã, a utilização de materiais translúcidos pode ser “moderno” hoje, mas amanhã pode ser “artificial”, conforme exemplificam Johnson et al (2003).

Os termos (substantivos, adjetivos e verbos) foram identificados entre os mais freqüentemente em- pregados em pesquisas semânticas, em estudos similares, na literatura (livros e artigos), bem como em ou- tras fontes secundárias de pesquisas, como catálogos de produtos, websites de produtos em geral e revistas especializadas em divulgação de produtos. Muitos dos termos foram traduzidos e adaptados à língua portu- guesa, o mais coloquial possível, de maneira a evitar inadequações.

O vocabulário também está disponível no Apêndice 2, apresentado juntamente com cada atributo. Os termos escolhidos foram os mais diversos e amplos possíveis, mas o vocabulário deve ser moldado a cada estudo em particular. Alguns atributos não possuem um vocabulário próprio, como é o caso do estilo de vi- da. Nesse caso, não há como generalizar o vocabulário sem antes dispor de uma pesquisa de mercado pon- tual para o estudo.

Exemplificando um perfil do material

A idéia subjacente a essa etapa é que a equipe de projeto possa identificar, com mais facilidade, quais os atributos mais importantes a pesquisar junto aos usuários. Assim, as descrições e vocabulários dos atributos servem como referência para a elaboração das questões dos instrumentos de pesquisa (questioná- rios, entrevistas individuais ou em grupo) e nas observações que serão avaliadas no experimento. A equipe deve escolher os atributos que sejam relevantes e o vocabulário consistente, evitando ambigüidades, termos similares e ruídos na comunicação com os usuários. É interessante incluir a participação de usuários repre- sentativos nesse processo. Deve-se evitar um número excessivo de atributos e se isso acontecer, o ideal é consultar outros designers e especialistas para reduzi-los e fixar aqueles realmente importantes. Recomenda- se a definição clara e simples dos atributos escolhidos (glossário) como forma de esclarecer os termos e facilitar a comunicação entre pesquisador e usuário.

Retomando o exemplo da cafeteira elétrica, a equipe de projeto após detalhar os elementos do pro- duto, suas características e funções; estudar as interações e suas respectivas sensações; já dispõe de infor- mações suficientes para definir o perfil geral do material.

A Figura 68 demonstra uma exemplificação simples do perfil do material para a fabricação da alça do bule para café. Na parte inferior da figura foram selecionados os atributos objetivos e subjetivos.

Figura 68 – Etapa 4: Definição básica do perfil do material em estudo. Proposto pela autora

Os atributos objetivos deverão ser levados em consideração na seleção técnica do material, ou seja, um equilíbrio entre a engenharia e o design do produto.

De início, nota-se que pela descrição das funções do elemento 7, o elemento a ser estudado – alça do bule – possui funções estéticas, práticas e simbólicas, embora a dimensão prática seja a mais forte. Con- tudo, não se deve desprezar os aspectos estéticos e os simbólicos por esse motivo. Os atributos se enqua- dram nas funções estéticas (cor, brilho, cheiro, cheiro, tátil, textura e temperatura); nas funções práticas (usabilidade, ergonomia, segurança, proteção, conforto, limpeza, equilíbrio, confiabilidade, resistência e durabilidade); nas funções simbólicas (associação, personalidade do produto, cultura e tradição); e, por fim, alguns atributos relacionados ao estilo de vida dos usuários, contexto de uso, tendências e benefícios do produto.

Para cada atributo escolhido, a equipe deve consultar o Apêndice 2 e identificar um vocabulário que permita elaborar as questões para a avaliação junto aos usuários. Para o exemplo da alça da cafeteira, o vo- cabulário selecionado para se estudar os aspectos subjetivos com os usuários pode ser ilustrado como no Quadro 15.