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INTERAÇÃO USUÁRIO-PRODUTO/MATERIAL

2.1 SISTEMA SENSORIAL

Sensação é processo pelo qual um estímulo externo ou interno provoca uma reação específica pro- duzindo uma percepção visual, tátil, gustativa, olfativa ou auditiva. Nesse processo, o que mais importa é o contato físico direto entre o organismo e o seu ambiente, sendo ele regido pelas leis da física, química e bio- logia resultando na ativação das áreas primárias do córtex cerebral. Trata-se de uma vivência simples, pro- duzida pela ação de um estímulo, como por exemplo, o som sobre um órgão sensorial correspondente, no caso o sistema de audição, transmitido ao cérebro através do sistema nervoso.

Do ponto de vista fisiológico, os sentidos são classificados por três grupos de receptores do sistema nervoso, que culminam na mente humana, conforme mostrados na Figura 31, conforme descritos em Oka- moto (2002). Apesar de serem grupos de receptores distintos, ao mesmo tempo eles funcionam de forma integrada.

1. Exteroreceptores: referem-se aos órgãos receptores que captam os estímulos exteriores ao organis- mo que são a visão, olfato, paladar, audição e tato.

2. Proprioreceptores: monitoram as informações sobre a velocidade, a posição do corpo e de nossos membros, sob influência da ação da gravidade ou do contato com objetos externos. São os recepto- res do sentido do movimento, vestibular e cinestésico.

3. Interoreceptores: fornecem informações gerais sobre as condições dentro do corpo. Os receptores são: sentido da nutrição (fome); sentido da hidratação (sede); sentido do hormônio (sexo, rubor), oxigenação (respiração) e orgânico (sentido da vitalidade).

O sistema interceptor aciona as experiências rotuladas como toque ou pressão, a temperatura (quente ou fria), dor (incluindo coceira e cócegas), bem como as sensações de movimento muscular e po- sição conjunta incluindo postura, circulação e expressão facial (propriocepção).

Complementa-se ainda ao grupo de receptores o sentido psíquico-mental (consciência) que é o conjunto dos sentidos: (a) holístico, corporal e mental, que processam várias informações conjuntamente, saltos intuitivos, avalia o todo, curiosidades e defesa; (b) sentido espacial (movimento cinestésico e vestibu- lar); (c) sentido proxêmico (íntimo, pessoal, social e público); e (d) sentido do prazer (OKAMOTO, 2002).

Para reconhecer um objeto, o cérebro coordena as informações procedentes de cada modalidade sensorial. Esta tarefa é facilitada pelo fato de todos os receptores falam a mesma linguagem, ou seja, que a informação vinda de cada órgão sensorial pode ser traduzida num sinal nervoso (Damásio, 1996).

Todas as nossas modalidades sensoriais estão em interação permanente com o ambiente evoluindo com o nosso conhecimento deste. O homem aprende percebendo e o saber influencia uma nova percepção (Hall, 2005). Assim a percepção não é unicamente um processo passivo de recolhimento de informação, mas também um processo ativo de criação de informação. A figura 32 mostra o processo simplificado da passagem de uma informação sensorial bruta (1) dando-lhe uma coerência e tornando-a compreensível. O sistema nervoso central (2) contrabalança a informação sensorial bruta procedente de uma modalidade sen- sorial com dados sensoriais que provêm de outras modalidades a fim de corrigir o estímulo inicial, resultan- do na percepção consciente (3).

Merleau-Ponty (1990) salienta que é impossível decompor uma percepção, fazer dela uma reunião de partes ou de sensações, uma vez que nela o todo é anterior às partes e que esse todo não é um todo ideal. Segundo o autor, as pessoas percebem um mesmo objeto de maneira particular e a percepção é somente da pessoa quem provou determinada sensação. A percepção humana refere-se ao meio e “o nosso corpo é tanto um objeto entre objetos como aquele que nos vê e nos toca” (MERLEAU-PONTY, 1990).

As diferenças culturais e interindividuais tornam-se, portanto, preponderantes, na medida em que dois indivíduos procedentes de contextos diferentes e confrontados com um objeto idêntico não perceberão a mesma coisa, dando-lhes um sentido diferente (HALL, 1966; DAMÁSIO, 1996). Assim, a cultura e as parti- cularidades de um indivíduo influenciam fortemente sobre a sua percepção do mundo externo.

Numa visão prática e relacionada aos materiais, pode-se distinguir sensação e percepção da seguinte maneira: a pergunta sensória seria: quão áspera a superfície parece ser? Ao passo que as perguntas percepti- vas poderiam ser: você pode identificar essa superfície como metálica ou polímero? É confortável tocar? Faci- lita a torção, ou o aperto? Outro exemplo pode reforçar melhor o entendimento: “quando ouvimos um tom musical, de início é difícil identificar a qual melodia ele pertence. Quando seguramos um puxador de uma porta ou empunhamos um martelo, apenas podemos perceber a pressão nos nossos dedos e palma indepen- dente de como o sentimos o objeto”. Por outro lado, em condições bem controladas de laboratório, podem- se isolar as sensações, que são isentas de significado, contexto, experiência de passado, e assim por diante.

A seguir serão detalhadas as principais modalidades sensoriais, dando destaque àquelas mais perti- nentes ao estudo da percepção dos materiais, que são os sentidos visual, tátil e háptico.

2.1.1 SENTIDO VISUAL

Do ponto de vista fisiológico, os mecanismos correlatos à visão dependem do sistema visual (o o- lho), da presença da luz (as ondas eletromagnéticas no espectro visível) e do objeto (aquilo que será perce- bido). A luz é emitida ou refletida pelos objetos do ambiente e as lentes dos olhos projetam as imagens des- ses objetos na retina, que, por sua vez, transmitem a mensagem ao cérebro.

A visão requer a intervenção de zonas especializadas do cérebro – o córtex visual –, como mostra a Figura 33. Essa parte do cérebro contém mapas especializados do mundo visual (percepção da cor, da textu- ra, o movimento, a forma e o contorno), que permitem ao cérebro construir uma imagem mental visual em etapas de níveis gradativos de percepção, como em Okamoto (2002):

1. a configuração dos objetos e seres; 2. a visão do volume (jogo de luz e sombra); 3. a sensação do peso e textura.

O resultado destas três etapas conduz a uma percepção invariante do objeto, ou seja, independente do ponto de vista do observador.

A rapidez da percepção dependerá também da novidade do produto. Se esse for familiar, sua visuali- zação será mais rápida, pois para um produto estranho se exigirá mais tempo para ser bem apreendido visu-

almente. Isso se dá porque a soma global de informação que se pode obter num determinado espaço de tempo é limitada, e vale como regra geral da percepção, quer a informação se apresente via visual, sonora ou tátil. No entanto, há uma coordenação das informações recebidas pelos diversos sentidos, de modo que, ao reconhecer objetos em um ambiente semi-escuro, se esse forem tocados e examinados com os dedos, torna-se mais aptos a distingui-los visualmente.

Com base no mecanismo fisiológico, se pressupõe que os processos correlatos à percepção das formas sejam passivos e lineares. No entanto, a visão se destaca pela sua capacidade de explorar ativamente seu ambiente. Ao olhar para um objeto, se procura alcançá-lo. “Com um dedo invisível movemos através do espaço que nos circunda e nos transportando para lugares distantes onde as coisas se encontram, tocamos, agarramos, traçamos seus contornos e exploramos suas texturas (ARNHEIM, 2006, p. 39)”. O ato de perce- ber formas é uma ocupação ativa.

Pallasmaa (2006, p.21) defende a mesma idéia sobre o caráter ativo da visão e acrescenta o fator velocidade: “a visão é o único sentido o suficientemente rápido para seguir o ritmo no incremento de veloci- dade e simultaneidade do mundo tecnológico”. A quantidade de imagens absorvidas impede a concepção de imagens internas, afirma Ninio (1991). A percepção mudou de ritmo, antes a imagem percebida passava por lenta maturação, seguia a realidade com atraso e deixava espaço para as imagens internas oriundas da memória. Atualmente, a percepção funciona em outra velocidade com fluxos de estímulos externos muito mais intensos.

As bases da estética formal foram estabelecidas na pesquisa da percepção, especialmente com a percepção visual, que foi o principal foco das pesquisas. O maior avanço nas teorias se deu no final do sécu- lo 19 com Hermann Helmholtz (1821–1894), que defendeu que a percepção é um processo cognitivo com- plexo, que depende de inferências inconscientes baseadas na experiência passada.

No início do século 20, destacam-se os estudos da psicologia da Gestalt, especialmente na Alema- nha. Seus grandes precursores foram o médico e psicólogo Karl Bühler (1879-1963) que fundou a pesquisa semântica da linguagem. As mais importantes contribuições se desenvolveram na Escola de Berlim, cujos psicólogos foram: Max Wertheimer (1889–1943) que demonstrou como os objetos são percebidos e agru- pados no ambiente ou no tempo e Wolfgang Köhler (1887–1967) o qual defendeu existir uma analogia entre a forma percebida no espaço e aquela que o funcionamento dos nossos órgãos perceptivos adota. Kurt Koff- ka (1886–1941) publicou seus “Princípios da Psicologia da Gestalt”, considerada a mais completa obra com os resultados das pesquisas nessa linha, descrito em mais de 100 leis e ainda na atualidade, constroem importantes fundamentos para o design.

Os estudos de Rudolf Arnheim (1904–2007) sobre a percepção visual concluíram que “longe de ser um registro mecânico de elementos sensórios, a visão prova ser uma apreensão, verdadeiramente criadora da realidade – imaginativa perspicaz e inventiva”.

Os psicólogos começaram também a ver que esse fato não era coincidência: os mesmos princípios atuam em todas as várias capacidades mentais porque a mente sempre funciona como um todo. Toda per- cepção é também pensamento, todo raciocínio é também intuição, toda observação é também invenção. “Ver é compreender”, conclui Arnheim (2006, p. 39).

2.1.2 SENTIDO AUDITIVO

A atividade do sentido auditivo é orientar para o som. A audição consiste em uma função sensorial capaz de captar os sons pelo ouvido e transmiti-los, por intermédio do nervo auditivo, ao cérebro, onde são recebidos e analisados. A vibração do ar é o meio que permite o estímulo à audição, podendo variar em fre- qüência e intensidade. Assim, conforme Edholm (1968), escutar um som ou um ruído é uma maneira de nosso corpo reagir a uma vibração.

A freqüência das variações de pressão determina a altura da nota, fazendo com que uma baixa fre- qüência gere uma nota grave e uma alta freqüência, uma nota aguda. A amplitude das vibrações determina a intensidade do som. O ser humano é capaz de perceber uma variedade grande de sons diversos, mas tam- bém é muito sensível às suas variações, especialmente o ruído. Para a maioria das pessoas, os ruídos agudos são mais desagradáveis que os graves e os barulhos imprevistos desviam mais a atenção que os sons regula- res e, por isso, funciona bem como uma forma de sinalização eficiente.

Há uma relação estreita entre o ouvido e o sentido espacial, formando o sentido do equilíbrio. Quando estamos andando, por exemplo, nossas conversas são mal compreendidas e para ouvirmos bem é necessário parar. É que o sentido do equilíbrio está atuando para controlar o corpo, ficando o sentido acús- tico prejudicado, como explica Okamoto (2002).

2.1.3 SENTIDO OLFATIVO

O olfato é o nosso sentido mais evocativo. Ou seja, aquele que mais exercita a memória, a lembrança e a imaginação para a sua percepção. As memórias que incluem lembrança de odores têm tendência para ser mais intensas e emocionalmente mais fortes. Um odor que tenha sido encontrado só uma vez na vida po- de ficar associado a uma única experiência e então a sua memória pode ser evocada automaticamente quan- do se reencontra esse odor. Entretanto, os odores remetem para as emoções vividas, muito mais do que para os fatos que as causaram.

De acordo com Axel1 (2005), cada indivíduo possui uma identidade olfativa única capaz de detectar e distinguir uma grande diversidade de odores, podendo reconhecer 10 mil aromas diferentes, do mais pra- zeroso ao mais aversivo cheiro. O amplo espectro de odores que detectamos de maneira consciente provoca respostas emocionais e cognitivas variadas.

O olfato, mais do que qualquer outro sentido, está intimamente ligado às partes do cérebro que pro- cessam emoções e a aprendizagem associativa. Dowdey (2007) explica que, no cérebro, o bulbo olfativo or- ganiza sensações em percepções e é parte do sistema límbico – sistema que inclui a amígdala e o hipocam-

1 Os pesquisadores americanos Richard Axel e Linda B. Buck especializaram no estudo na biologia molecular da percepção, em especial do