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CAPÍTULO 1 O MODELO DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS NO

1.1 Juizados Especiais Criminais

1.1.6 Sujeitos processuais intervenientes

1.1.6.1 Ministério público

O art. 127 da CF/88 preleciona que “O Ministério Público é instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis.” Dentre suas funções institucionais destaca-se: a promoção da ação penal pública, na forma da lei; e zelar pelo efetivo respeito dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia (art. 129, incisos I e II, da CF/88). A presença do Ministério Público é fundamental no Juizado Especial Criminal, sob pena de nulidade.

Embora a atuação do Ministério Público quanto à exclusiva promoção da ação penal, por ser o titular (art. 129, inciso I, da CF/88), tenha sido mitigada pelo art. 98, inciso I, da CF/88 - que trouxe a possibilidade da criação dos Juizados Especiais Criminais e o oferecimento de proposta de transação penal e suspensão condicional do processo -, ele continua responsável pelo oferecimento dessas medidas alternativas, desde que presentes os requisitos legais para a sua concessão.

Portanto, o Ministério Público não pode deixar de formular a proposta quando estiverem presentes os requisitos legais, por motivo de oportunidade e conveniência. Neste sentido, Fernando Fernandes66 leciona que “[...] a proposta de transação surge como um direito subjectivo para o autor do facto e um poder-dever para o ministério público, em virtude da natureza regulada ou regrada, do poder discricionário que possui este último.”

Nas palavras de Gomes67, a atuação do Ministério Público,

[...] no fundo, não fugirá da legalidade: o princípio da oportunidade regrada nada mais é que expressão da legalidade. Exatamente porque não foi adotado o princípio da oportunidade ‘pura’, nada pode ser feito fora das linhas político-criminais traçadas pelo legislador.

66 FERNANDES, Fernando. O processo penal como instrumento de política criminal. Coimbra: Almedina,

2001. p. 594. Em sentido contrário e minoritariamente, Jardim não vê a transação penal como um direito subjetivo do autor do fato, também não a admitindo como um poder-dever do Ministério Público, mas sim “[...] uma faculdade de oferecer uma pena menor, abrindo mão do exercício da obrigatoriedade da ação penal.” (Cf. JARDIM, Afrânio Silva. Direito processual penal. 7. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1999. p. 349). Também nesse sentido, Pazzaglini Filho et al entendem que a transação penal não pode ser imposta pelo Ministério Público, ao autuado, sob pena de deixar de ser considerada uma transação. (Cf. PAZZAGLINI FILHO, Marino et al. Juizado especial criminal. São Paulo: Atlas, 1996. p. 52).

67 GOMES, Luiz Flávio. Suspensão condicional do processo penal: e a representação nas lesões corporais, sob

a perspectiva do novo modelo consensual de justiça criminal. 2. ed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1997. p. 296.

Em que pese a doutrina se dividir entre os que entendem ser um poder-dever do Ministério Público e uma faculdade68, a grande maioria entende ser um direito subjetivo do autor do fato a proposta de transação penal. Para tanto, há posicionamento no sentido de que a recusa do promotor em oferecer a proposta ensejaria o oferecimento desta pelo juiz, e de ofício.69

Contrariando este entendimento, Mirabete70 leciona que cabe exclusivamente ao Ministério Público a titularidade do jus persequendi in judicio, por força do art. 129, inciso I, da CF/88, pois a proposta apresentada de ofício pelo juiz, e por ele próprio homologada, equivaleria ao exercício de jurisdição sem ação. E continua o autor, dizendo que o princípio da discricionariedade regrada autoriza o Ministério Público – e somente ele – examinar a conveniência de apresentar a proposta de transação penal ou a denúncia.

Outros entendem que por se tratar de uma transação penal, representando clara manifestação da justiça consensual, não se poderia retirar do Ministério Público essa função - eis que titular do direito de acusar nos crimes de ação penal pública - de importante forma de resolução consensual de conflitos, deixando a solução entre o juiz e o autuado.71 Ante a recusa imotivada do Ministério Público em não oferecer a proposta de transação penal, até mesmo por um excessivo rigor na análise dos requisitos, caberia a remessa dos autos pelo juiz ao Procurador-Geral de Justiça, em analogia ao art. 28 do Código de Processo Penal.72 Nesse caso, se o Procurador-Geral discordar da opinião do promotor, oferecerá a proposta

68 Mirabete defende que “Sendo uma faculdade limitada concedida ao titular da ação penal, a decisão de não

apresentar a proposta de transação deve ser justificada pelo Ministério Público, em obediência ao que dispõe no art. 129, VIII, última parte, da Constituição Federal, art. 43, III, da Lei 8.825/1993 e art. 169, VII, da Lei Complementar 734/1993.” (Cf. MIRABETE, Júlio Fabbrini. Juizados especiais criminais. São Paulo: Atlas, 1996. p. 85).

69 Nesse sentido, BATISTA, Weber Martins; FUX, Luiz. Juizados especiais cíveis e criminais e suspensão

condicional do processo penal. Rio de Janeiro: Forense, 1997. p. 321. Também é o entendimento da décima

terceira conclusão da Comissão Nacional de Interpretação da Lei 9.099/95: “Se o Ministério Público não oferecer proposta de transação penal e suspensão do processo nos termos dos arts. 79 e 80, poderá o juiz fazê-lo.”

70 MIRABETE, 1996, op. cit., p. 86. No mesmo sentido: PAZZAGLINI FILHO, Marino et al. Juizado especial

criminal. São Paulo: Atlas, 1996. p. 172.

71 FERNANDES, Antônio Scarance. Processo penal constitucional. 5. ed. São Paulo: Ed. Revista dos

Tribunais, 2007. p. 208.

72

O STF entende que na hipótese do juiz discordar da manifestação do Ministério Público que deixar de propor a suspensão condicional do processo, aplica-se, por analogia, do art. 28 do CPP. (Cf. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. HC 83.458. Relator: Min. Joaquim Barbosa. Primeira Turma. Julgado em: 18 nov. 2003. Diário

da Justiça, Brasília, DF, 6 fev. 2004. p. 38. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listar

Jurisprudencia.asp?s1=%28proposta+transa%E7%E3o+penal+poder%2Ddever+do+minist%E9rio+p%FAblic o%29&base=baseAcordaos> Acesso em: 2 jan. 2013). Também é o entendimento do STJ: SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. RESP 613.833/SP. Relator: Min. Hamilton Carvalhido. Sexta Turma. Julgado em: 25 jun. 2004. Diário da Justiça, Brasília, DF, 6 dez. 2004. p. 378. Disponível em: <http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/doc.jsp?livre=resp+261570&&b=ACOR&p=true&t=&l=10&i=4 #> Acesso em: 3 jan. 2013. Nesse sentido, Fernando Fernandes filia-se nos que defendem a possibilidade de controle pelo próprio juiz. Cf. FERNANDES, Fernando. O processo penal como instrumento de política

pessoalmente ou designará outro promotor para fazê-lo. 73 Destaca-se que esta é a posição dominante para o caso em análise.74 Contudo, ainda existem autores que, embora entendam tratar-se de um direito subjetivo do autor do fato, não admitem a formulação da proposta pelo juiz, tampouco o envio das peças de informação ao Procurador-Geral de Justiça (art. 28 do CPP), propondo a via do habeas corpus para a solução do caso.75

Para os que defendem a possibilidade do juiz oferecer a proposta de transação penal76, face ao não oferecimento pelo Ministério Público, verifica-se essa impossibilidade, pois, como afirmado por Jardim77, “[...] não é papel do juiz no sistema acusatório.”

Como se pode observar, apesar de entendimento contrário78 quanto ao poder-dever de atuação do Ministério Público, o certo é que ele existe, não podendo deixar de ser exercido. Do mesmo modo que representa um direito subjetivo do autor do fato ter o benefício da transação penal. Ora, se a Lei 9.099/95 trouxe esses benefícios, visando evitar a pena de prisão de curta duração e a diminuição de processos nas varas criminais de todo o país, por meio da utilização dos institutos despenalizadores, aliados aos princípios da oralidade, celeridade, economia processual e simplicidade, não haveria razão para o não oferecimento do benefício, se preenchidos os requisitos legais, o não oferecimento significaria uma afronta à lei.