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Estado de necessidade Colisão de deveres Causação do resultado; violação do dever de cuidado; imputação objectiva do resultado; conexão de ilicitude;

2ª Subsecção Ilicitude.

I. Estado de necessidade Colisão de deveres Causação do resultado; violação do dever de cuidado; imputação objectiva do resultado; conexão de ilicitude;

comportamento lícito alternativo; doutrina do aumento do risco; princípio da confiança.

CASO nº 24:

A é médico e o único especialista em doenças dos rins na região. Na noite de Fim de Ano, cerca da uma hora, A foi chamado de urgência por D, sua doente, que vem sendo submetida a diálises periódicas. Dado o estado da paciente, A sabia que na ausência de cuidados imediatos a vida de D correria perigo. Por isso, e porque tinha ingerido uma boa quantidade de álcool (como médico sabia que a taxa de álcool no sangue deveria andar por 1,4 g/l, como efectivamente acontecia), chamou um táxi. Foi em vão: não havia táxis disponíveis àquela hora. Contrariado, acabou por se pôr ao volante do seu próprio carro, a caminho da casa de D. Quando, porém, seguia por uma das ruas da localidade, de repente, sem que nada o fizesse prever, apareceu-lhe na frente do carro H, que saíra alegremente de uma festa ali ao lado e por breves instantes tinha estado parado atrás de um muro, à beira da rua, sem que o condutor o pudesse ter visto antes. Foi-lhe impossível evitar embater no peão, não obstante seguir a velocidade que não era superior à velocidade regulamentar de 50 km/h. A vítima sofreu ferimentos graves e caiu, inconsciente, no chão. A parou, saiu do carro, mas viu logo que para salvar a vida de H tinha que o transportar imediatamente ao hospital. E assim fez, pelo caminho mais rápido, sabendo muito bem que punha em jogo a vida da sua doente renal. Logo que deixou H no hospital, A dirigiu-se imediatamente para casa da doente. Mal chegou, apercebeu-se da morte desta, ocorrida poucos minutos antes. Se A tivesse chegado uns minutos mais cedo, D, muito provavelmente teria sido salva. A deu conhecimento do atropelamento à polícia. Cf. M. Aselmann e Ralf Krack, Jura 1999, p. 254 e ss., cuja proposta de solução serviu de apoio a estas notas. Cf., igualmente, Bockelmann / Volk, AT, p. 99, e Otto, AT, p. 131.

Punibilidade de A ? 1. O atropelamento de H.

Punibilidade de A por ofensas corporais por negligência (artigo 148º, nº 1).

Do acidente resultaram ofensas corporais graves na pessoa de H, pelo que A pode estar comprometido com o disposto no artigo 148º, nº 1.

A estava obrigado a pôr na condução que empreendeu os necessários cuidados. Seguia

pela via pública, ao volante do seu automóvel, não obstante a taxa de álcool no sangue ser superior a 1,2 g/l e deste modo contrariar o comando do artigo 292º do Código Penal. Todavia, é duvidoso que o resultado típico, as lesões corporais na pessoa de H, possa

ser objectivamente imputado a A. A causação do resultado e a violação do dever de cuidado, só por si, não preenchem o correspondente ilícito típico. Tratando-se de ofensas à integridade física, acresce a necessidade da imputação objectiva do evento. Este critério normativo pressupõe uma determinada conexão de ilicitude: não basta para a imputação de um evento a alguém que o resultado tenha surgido em consequência da conduta descuidada do agente, sendo ainda necessário que tenha sido precisamente em virtude do carácter ilícito dessa conduta que o resultado se verificou.

"Podemos conceber situações em que há uma violação do dever objectivo de cuidado e, todavia, em termos de imputação objectiva, o resultado não poder ou não dever ser imputado ao agente. Basta para isso pensar em um qualquer caso que a jurisprudência e a doutrina alemãs já sedimentaram, transformando-os em exemplos de escola. Enunciemo-los: a) o caso do ciclista embriagado (A) que é ultrapassado por um camião que ao desrespeitar as regras de trânsito o atropela mortalmente com o rodado anterior; b) a hipótese do farmacêutico que não cumprindo a receita médica avia, várias vezes, a pedido da mãe, doses de fósforo para uma criança que vem a morrer por intoxicação; c) o caso do director de uma fábrica que, não cumprindo as disposições legais, não desinfecta os pelos de cabra, importado da China, provocando, assim, a morte de quatro trabalhadores; d) a hipótese do médico que anestesia com cocaína, não cumprindo as leges artis, já que o indicado na situação seria a aplicação de novocaína, o que provoca a morte do paciente. (...). Uma tal enunciação e o seu tratamento pela doutrina alemã permite-nos ter imediata consciência de que, para uma parte da doutrina, alguns daqueles casos, conquanto haja em todos violação de dever objectivo de cuidado, se radicalizam em uma ausência de imputação objectiva do facto ao agente. Daí que, se a violação do dever objectivo de cuidado é condição necessária para que o facto nas acções negligentes possa ser objectivamente imputado ao agente, é também certo que a não imputação do facto passa necessariamente pela ausência de violação do dever objectivo de cuidado. Por outras palavras: as acções negligentes de resultado pressupõem uma estrutura limitadora da responsabilidade que se perfila de forma dúplice: de um lado, a violação de um dever objectivo de cuidado (...), valorado também pelo critério individual e geral, e de outro, a exigência de um especial nexo, no "sentido de uma conexão de condições entre a violação do dever e o resultado". Prof. Faria Costa, O perigo em direito penal, p. 487.

Na altura do acidente, A circulava à velocidade regulamentar, fazendo-o pela sua mão de trânsito. Um condutor sóbrio não teria procedido de outra maneira —nomeadamente, não poderia ter previsto que um peão saísse inopinadamente detrás de um muro, à beira da estrada, e se atirasse em correria para debaixo do automóvel, sem dar ao condutor a mínima possibilidade de travar ou de se desviar para não embater na vítima. Ora, uma vez que temos como apurado que o comportamento lícito alternativo provocaria igualmente o resultado danoso, este não deverá ser imputado ao condutor. Não obstante a elevada taxa de álcool no sangue (TAS) do condutor, não se pode concluir que os

perigos daí advindos se tivessem concretizado no resultado típico, i. e. nas ofensas à integridade física graves sofridas pelo atropelado. A doutrina do aumento do risco chegaria aqui a idênticos resultados, porquanto a alcoolémia do condutor não aumentou o risco de embater no peão. Observe-se, por outro lado, que, de acordo com os critérios correntes do princípio da confiança, "ninguém terá em princípio de responder por faltas de cuidado de outrem, antes se pode confiar em que as outras pessoas observarão os deveres que lhes incumbem" (Figueiredo Dias, Direito penal, sumários e notas, Coimbra, 1976, p. 73). Quem actua de acordo com as normas de trânsito pode pois contar com idêntico comportamento por banda dos demais utentes da via e A podia confiar em que ninguém, de repente, sairia de detrás do muro nas apontadas circunstâncias. O condutor só pode confiar que, pelo facto de agir segundo o direito, não pode ser penalmente responsabilizado por factos que não pode evitar. No caso, o condutor não podia evitar o que aconteceu, porque, para além do mais, não previu — nem tinha que prever — o resultado. Falta também aqui, como se vê, um elemento essencial à imputação por negligência, que é a previsibilidade. Podemos assim concluir que A não cometeu o crime de ofensas à integridade física por negligência do artigo 148º, nº 1.

"Há quem entenda — quanto a nós bem, adiante-se — que o interagir motivado pelo tráfego rodoviário só tem sentido se for compreendido através do princípio geral da confiança. Mais do que o cumprimento das regras de cuidado, o que importa ter presente é que, objectivamente, vigora a ideia de que qualquer utente da via tem de confiar nos sinais, nas comunicações, dos outros utentes e tem, sobretudo, de confiar, em uma óptica de total reciprocidade, na perícia, na atenção e no cuidado de todos os outros utilizadores da via pública." Prof. Faria Costa, O Perigo, p. 488.

Punibilidade de A pelo crime de condução perigosa de veículo rodoviário (artigo 291º).

A conduzia em estado de embriaguez e atropelou H, que sofreu ferimentos graves. O

artigo 291º castiga quem conduzir veículo automóvel, com ou sem motor, em via pública ou equiparada, não estando em condições de o fazer com segurança, por se encontrar em estado de embriaguez ou sob influência de álcool. Ponto é que se crie deste modo perigo para a vida ou para a integridade física de outrem. Trata-se, portanto, de crime de perigo concreto: o perigo é elemento típico do crime. Para haver crime, seria então necessário demonstrar que no caso o resultado de perigo teve origem na condução em estado de embriaguez de A. Como logo se vê, houve um perigo que se concretizou, chegou a ocorrer

uma situação de dano para a integridade física do atropelado, de que essa situação de perigo concreto foi um estádio intermédio. Todavia, não foi o perigo decorrente da condução em estado de embriaguez que cristalizou no evento danoso — a condução não ultrapassou o risco permitido na correspondente actividade. Na verdade, só a conduta inadequada de H pode explicar a realização do risco que ficou caracterizado. A não cometeu este crime.

Punibilidade de A pelo crime de condução de veículo em estado de embriaguez (artigo 292º).

A conduzia com uma TAS (taxa de álcool no sangue) superior a 1,2 g/l. Fazia-o, como já

se disse, por ser médico, com suficiente conhecimento de que a taxa andaria por esse valor, e consequentemente com dolo eventual, na medida em que igualmente se conformou com a condução nessas circunstâncias (artigo 14º, nº 3). Ainda assim, e porque a taxa estava muito perto do seu valor mínimo, sempre se poderia afirmar, pelo menos, a negligência do condutor, sendo certo que a norma prevê igualmente a punição desta forma de culpa.

Repare-se que em caso de conflito no cumprimento de deveres jurídicos não é ilícito o facto de quem satisfizer dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrificar (artigo 36º, nº 1).

Existe uma situação de conflito de deveres quando o agente se encontra pelo menos perante dois deveres jurídicos, com a consequência inevitável de só poder satisfazer um à custa do outro. Em geral, distinguem-se três grupos de hipóteses. Ou o agente tem de obedecer a dois comandos (deveres de acção), por ex., se um médico em caso de acidente presta os primeiros socorros apenas a uma das vítimas, embora se lhe impusesse o dever de acudir a todas. Ou pode haver colisão entre uma acção e uma omissão (conflito entre

um dever de acção e um dever de omissão), "questão que, como é sabido, foi

abundantemente tratada após (e em consequência das ordens criminosas dadas pelos "superiores" nazis) a segunda grande guerra — é, hoje, maioritariamente, entendido que é uma questão a equacionar e a resolver segundo os princípios e disposições do direito de necessidade (geral — C. P., art. 34º — ou especiais — casos de detenção em flagrante por autoridade (...)". Prof. Taipa de Carvalho, A Legítima Defesa, p. 172. Há quem não

aceite, porém, que se possa dar uma situação de colisão entre dois deveres de omissão. O condutor que entra na auto-estrada pela via de acesso errada não pode voltar para trás nem seguir para a frente — nem pode ficar ali parado, mas isso provavelmente não representa qualquer colisão de deveres, uma vez que a situação se esgota em transgredir a norma que na condução em estrada proíbe que se circule contra a mão.

No caso que nos ocupa, A, por um lado, tinha o dever de omitir a condução em situação de alcoolémia (dever de omissão), por outro, era seu dever prestar em tempo útil os cuidados de que a sua paciente estava tão necessitada (dever de acção).

Acontece que a situação assim desenhada representa mais fielmente um direito de necessidade.

"O chamado "conflito de deveres", quando, verdadeiramente, coenvolver um problema de justificação (de exclusão da ilicitude), é ao direito de necessidade que se deve subsumir e como tal ser resolvido." Prof. Taipa de Carvalho, A Legítima Defesa, p. 173.

De acordo com o artigo 34º, não é ilícito o facto praticado como meio adequado para afastar um perigo actual que ameace interesses juridicamente protegidos de terceiro. Ponto é que se verifiquem os requisitos das três alíneas seguintes. No caso concreto, existia um perigo actual para a vida da paciente, existia, portanto, uma situação de necessidade. Conduzir em estado de alcoolémia até à casa da doente (acção em estado de necessidade) deveria ser —e era, objectivamente—, a maneira necessária de afastar o perigo, coberta, subjectivamente, pela vontade de salvar a vida da doente. A procurou em noite de Fim de Ano um táxi, consciente de que não podia conduzir a sua própria viatura, mas sem êxito. Por outro lado, A não estava em posição de chamar um colega que fizesse o seu trabalho, pois era o único especialista da região e o único que podia acudir à paciente. De forma que se não descortina um meio menos gravoso, rodeado de menores custos, de afastar o perigo. Além disso, A actuou com conhecimento da situação de necessidade. Finalmente, pode muito bem garantir-se que o interesse a salvaguardar era sensivelmente superior ao interesse a sacrificar. Havia claramente um perigo concreto para a vida da doente renal em contraposição com um perigo abstracto que era a segurança do trânsito rodoviário. Os bens jurídicos protegidos num caso e no outro serão idênticos, mas a segurança do trânsito tem a ver, de forma abstracta, com a protecção da

vida dos que andam nas ruas e estradas. O que é decisivo é a proximidade e a probabilidade de se verificar o perigo. No crime de perigo abstracto que é o do artigo 292º ocorre simplesmente a possibilidade, a eventualidade, de pôr em perigo a vida de uma qualquer pessoa, é uma situação de perigo presumido. O que estabelece a diferença com o artigo 291º é que aqui se exige a concretização de um perigo para a vida de uma ou mais pessoas. E assim, concretizado o perigo, a pessoa cuja vida correu perigo é A — ou

A e B —, e já não simplesmente A ou B ou C ou D , etc. Basta atentar nas penas

cominadas para os dois tipos de crime para se concluir que o peso recai mais intensamente no crime de perigo concreto. Pode por isso dizer-se que a protecção da vida da doente, que estava em risco de morrer e morreu mesmo, representa um interesse sensivelmente superior aos que têm a ver com a segurança abstracta dos participantes no trânsito rodoviário. Com isto, podemos concluir que a conduta de A está justificada por aplicação dos artigos 31º, nºs 1, e 34º.

Todavia, e como se deixou dito, a solução poderá já ocorrer no domínio do artigo 36º, no âmbito do conflito de deveres, com a vantagem de não ser necessário assentar na sensível superioridade do interesse a salvaguardar, já que, no caso de conflito no cumprimento de deveres jurídicos, não é ilícito o facto de quem satisfizer dever de valor igual ou superior ao do dever que sacrificar. Contentando-se a lei com um dever de valor igual, a tarefa do intérprete ficará muito mais facilitada.

Apontamento jurisprudencial. Cf. o acórdão da Relação de Lisboa de 5 de Maio de 1998, CJ 1998, tomo III, p. 141: A, em estado de embriaguez, conduziu a mulher ao hospital, depois de esta ter sido acometida de doença súbita e grave — e de A ter, sem sucesso, diligenciado por conseguir outro transporte. Apenas se admitiu no acórdão a exclusão da culpa (artigo 35º). O Prof. Figueiredo Dias (Textos, p. 224) cita o acórdão da mesma Relação de 19 de Junho de 1996 e comenta que no caso em que A, embriagado, conduziu um automóvel para socorrer a mãe, que, sofrendo de doença grave e vivendo só, lhe tinha telefonado dizendo que se sentia mal e necessitava de assistência — pode ser uma conduta justificada se ela traduzir o meio único de conduzir em tempo um doente grave ao hospital.

2. O que aconteceu depois.

Punibilidade de A: comissão por omissão do crime dos artigos 10º e 131º.

Uma vez que A não prestou o auxílio médico à sua paciente e esta morreu, A pode ter cometido o crime em referência.

Deu-se o resultado mortal e isso pode ser imputado a A, já que este, com uma probabilidade quase a raiar a certeza, o podia ter evitado.

A causalidade omissiva constrói-se em termos hipotéticos e não em termos naturalísticos. O juízo formulado em matéria de causalidade omissiva é, por sua própria natureza, fundado num método de estrutura probabilística e será tanto mais válido quanto mais perto da certeza se encontrar.

"Uma vida não vale nada, mas nada vale uma vida”. (Arthur Koestler, Um Testamento Espanhol).

Como a doente estava a ser tratada por A, este encontrava-se em posição de garante por vias do contrato estabelecido entre ambos (critério tradicional) ou por assunção do dever de protecção e auxílio (critério doutrinal mais recente). A conhecia a sua posição de garante, sabia que havia a possibilidade de salvar a vida da doente e que esta podia morrer — houve, por isso, dolo da sua parte. Não intervém o artigo 34º porque falta a sensível superioridade do interesse a salvaguardar, que é requisito da alínea b). A conduta poderá todavia analisar-se no âmbito da colisão de deveres. É certo que A tinha o dever de garante perante a sua doente renal e não o tinha relativamente ao atropelado — neste caso, a ingerência não vem acompanhada da culpa do condutor, nem o acidente lhe pode ser ilicitamente atribuído. O responsável pelo acidente foi sem dúvida nenhuma o peão. O dever de acudir à paciente renal seria valorativamente mais elevado do que o de ajudar o peão atropelado. Há-de notar-se contudo que no artigo 36º se não faz uma valoração deste tipo, o bem jurídico da vida não é mensurável em função da idade ou de privilégios sociais, nem em função de critérios exteriores como aqueles que vinham sendo apontados. A estava em posição de apenas poder salvar uma das vidas —e foi isso que

fez. A conduta não é portanto ilícita.

“Autêntico conflito de deveres susceptível de conduzir à justificação existe apenas quando na situação colidem distintos deveres de acção, dos quais só um pode ser cumprido”. Figueiredo Dias, Textos, p. 239.

Mas se se rejeitarem os pressupostos justificadores da situação, i. e, se se concluir que a conduta de A é ilícita, não se lhe poderá recusar os efeitos do estado de necessidade

O direito de necessidade é uma causa de justificação que tem a ver com a ponderação de

interesses. (19) O direito de necessidade (estado de necessidade justificante)

aproxima-se da legítima defesa: desde logo, a "agressão" é uma manifestação de "perigo" para a pessoa do defendente, é um caso especial de perigo (Kühl). E aproxima-se do estado de necessidade desculpante, primeiro, pela semelhança dos respectivos elementos típicos; depois, por cumprirem a sequência legal dos artigos 34º e 35º. Mas têm consequências diferentes, que é bom ter sempre em atenção. Por outro lado, são várias as manifestações do estado de necessidade justificante, incluindo as dos artigos 34º do Código Penal e 339º do Código Civil e o já aludido estado de necessidade defensivo, supra-legal. Todas essas formas do estado de necessidade justificante são concretizações dos princípios da necessidade e da ponderação de interesses. Justifica-se a conduta típica quando, em situação de necessidade, havendo sensível superioridade do interesse a salvaguardar relativamente ao interesse sacrificado, for razoável impor ao lesado o sacrifício do seu interesse, i.e, dá-se a salvaguarda de um dos interesses à custa do outro (artigo 34º). Mas logo se vê que a ponderação de interesses só se suscita como requisito do direito de necessidade. Fora de uma situação de "necessidade" fica afastada tanto a possibilidade de a conduta ser justificada como a de o agente ser desculpado.

Dá-se uma situação de necessidade quando um perigo actual para um bem jurídico só for removível através de uma acção típica que lesa ou põe em perigo um outro bem jurídico. Bockelmann / Volk, AT, p. 96. São numerosas as situações de necessidade em que existe um bem ou um interesse jurídico em perigo, cujo afastamento se faz à custa de outro bem ou interesse jurídico. Um desses casos é a situação de legítima defesa — o agressor cria um perigo que vai ser afastado à sua própria custa, mas podem configurar-se muitas outras variantes. A fonte do perigo pode, por ex., ser uma coisa (ataques de animais, o fogo numa mata), ou pode empregar-se coisa alheia para afastar o perigo, e então teremos o afastamento do perigo à custa de terceiro. Cf. Haf, p. 87.

19 “Há situações da vida em que uma acção, que pelo seu recorte externo preenche a factualidade típica de um crime, constitui o único meio de defesa de um bem jurídico ou o cumprimento de um dever imposto ou reconhecido pelo direito. Em tais casos, a qualificação como conforme ao direito, não proibida ou ilícita, da mesma acção terá de decidir-se a partir das relações de valor entre os bens jurídicos ou deveres

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